26.11.2014   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 424/9


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Relações comerciais transatlânticas e o ponto de vista do CESE sobre uma cooperação reforçada e um eventual acordo de comércio livre entre a União Europeia e os Estados Unidos da América»

Parecer de iniciativa

2014/C 424/02

Relator:

Jacek Krawczyk

Correlator:

Sandy Boyle

Na reunião plenária de 11 de julho de 2013, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, n.o 2, do seu Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre

As relações comerciais transatlânticas e o ponto de vista do CESE sobre uma cooperação reforçada e um eventual acordo de comércio livre entre a União Europeia e os Estados Unidos da América.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 20 de maio de 2014.

Na 499.a reunião plenária de 4 e 5 de junho de 2014 (sessão de 4 de junho), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 187 votos a favor, 7 votos contra e 10 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões

1.1

O Comité considera que uma Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) bem sucedida pode contribuir de forma significativa para fomentar o crescimento real e gerar otimismo. Tendo em conta a recuperação lenta, na generalidade, das crises económicas e financeiras de 2008, um acordo equilibrado pode contribuir para que a economia europeia regresse ao crescimento económico e à criação de emprego.

1.2

O Comité acolhe favoravelmente as importantes oportunidades oferecidas por um acordo comercial abrangente entre a UE e os EUA, não apenas para incrementar o comércio e os investimentos de ambos os lados do Atlântico, mas também pelo seu potencial contributo para o desenvolvimento de regras e normas reforçadas a nível mundial que beneficiariam o próprio sistema de comércio multilateral.

1.3

O CESE, tendo em conta o apelo legítimo e generalizado dos cidadãos europeus à transparência total das negociações comerciais, chama a atenção do Conselho e da Comissão para a necessidade de uma aplicação coerente e rigorosa do artigo 218.o do TFUE e, em especial, do seu no 10: «O Parlamento Europeu é imediata e plenamente informado em todas as fases do processo».

1.4

Em consonância com o Tratado de Lisboa, é fundamental que a Comissão reconheça o papel institucional do CESE ao longo das negociações da TTIP. A total transparência e a consulta do Comité e de outros intervenientes da sociedade civil são elementos essenciais para que o acordo obtenha o apoio geral da opinião pública. Os textos devem ser divulgados às partes interessadas o mais cedo possível na fase inicial do processo negocial.

1.5

É importante que os benefícios da TTIP sejam repartidos de forma uniforme entre a comunidade empresarial, os trabalhadores, os consumidores e os cidadãos.

1.6

À medida que decorrem as negociações e que os resultados das avaliações de impacto são conhecidos, deve proceder-se à atualização e monitorização das projeções estatísticas e das previsões económicas.

1.7

As principais vantagens da TTIP dizem respeito à regulamentação. O forte compromisso assumido por ambas as partes de que a TTIP não reduzirá as normas em vigor reveste-se de uma importância decisiva. O respeito deste compromisso será determinante para obter o apoio geral da opinião pública e ao nível político. O Comité reserva-se o direito de avaliar os eventuais resultados das negociações à luz de todas estas considerações.

1.8

Contrariamente a quase todos os outros acordos comerciais bilaterais, os potenciais benefícios e economias proporcionados pela TTIP estão associados aos obstáculos não pautais. Embora se preveja que apenas cerca de 20 % das economias realizáveis resultem da redução dos direitos aduaneiros, há valores demasiado elevados em determinados setores fundamentais que importa equacionar. Em matéria de acesso ao mercado, a reciprocidade é importante.

1.9

É indispensável um sólido capítulo em matéria de comércio e desenvolvimento sustentável e este aspeto será acompanhado de perto pela sociedade civil de ambas as partes.

1.10

O investimento transatlântico pode constituir um importante estímulo para o crescimento. A proposta de introduzir um procedimento de resolução de litígios entre os investidores e os Estados (RLIE) suscitou grandes preocupações por parte da opinião pública de ambos os lados do Atlântico. A Comissão lançou uma consulta pública em linha sobre «Proteção do investimento e RLIE no Acordo TTIP». É essencial estabelecer um diálogo transparente e inclusivo no final deste processo, e o CESE pode desempenhar um papel importante neste campo.

1.11

A TTIP tem suscitado um enorme interesse por parte de todos os setores da sociedade civil, tanto na UE como nos EUA. O CESE já estabeleceu excelentes contactos com organizações empresariais, sindicais, agrícolas, de consumidores e ambientais nos EUA. Existe uma vontade clara de manter e desenvolver esta posição e o CESE está bem colocado para promover e encorajar o diálogo e a cooperação em curso.

1.12

O Comité acolhe favoravelmente o facto de um grupo de monitorização do CESE constituído por três membros vir a ter acesso a documentos em pé de igualdade com o Grupo Consultivo de Peritos estabelecido pela Comissão. O Comité considera que tal reflete o reconhecimento do seu papel de órgão consultivo oficial nos termos do Tratado de Lisboa.

Recomendações

1.13

O CESE deve reconhecer a TTIP como uma prioridade constante durante todo o período de negociações e de execução de um eventual acordo. O CESE deve acompanhar atentamente todos os aspetos das negociações da TTIP. Deve ser adotada uma abordagem baseada em projetos e devem ser identificadas as áreas mais benéficas para trabalho futuro, em consulta com a sociedade civil da UE e dos EUA e com a Comissão Europeia.

1.14

A abordagem em matéria de coerência regulamentar deve ser ambiciosa e transparente e as negociações devem pautar-se por boas práticas. É essencial que sejam respeitadas as garantias oferecidas por ambas as partes de que as normas não serão reduzidas.

1.15

O acordo deve incluir mecanismos eficazes e prever a cooperação em matéria de regulamentação, a fim de facilitar a consulta prévia sobre novas regulamentações que possam ter repercussões sobre os interesses de qualquer das partes. Além disso, não deve lesar o direito de a UE, os seus Estados-Membros ou os EUA adotarem as medidas regulamentares que considerarem adequadas sobre questões como a proteção da saúde, dos consumidores, dos trabalhadores e do ambiente.

1.16

Ambas as partes devem mostrar-se ambiciosas em matéria de direitos aduaneiros, tendo em vista a sua eliminação total ou progressiva, inclusivamente em domínios sensíveis. Este processo deve ser mutuamente vantajoso.

1.17

A prossecução das negociações comerciais bilaterais não deve enfraquecer o compromisso da UE relativamente à OMC e a um sólido acordo multilateral a nível mundial.

1.18

É fundamental que o acordo contenha um forte e sólido capítulo em matéria de desenvolvimento sustentável, do qual devem constar os seguintes aspetos essenciais:

reafirmação das obrigações das partes enquanto membros da Organização Internacional do Trabalho (OIT);

estabelecimento de um patamar mínimo constituído pelas oito convenções fundamentais da OIT acolhidas na Declaração de Singapura da OMC de 1996;

reiteração de um compromisso comum relativamente à implementação eficaz, promoção e controlo da aplicação da legislação e das iniciativas no domínio do ambiente;

estabelecimento de um compromisso no sentido de assegurar e promover a conservação, a utilização sustentável e a gestão dos recursos naturais, bem como os principais acordos multilaterais em matéria de ambiente.

1.19

O CESE deve facilitar um diálogo de caráter amplo sobre a questão da RLIE após a conclusão da consulta da Comissão sobre «Proteção do investimento e resolução de litígios entre investidores e o Estado no Acordo TTIP». A fim de assistir neste processo, a Comissão Europeia deve esclarecer como vai avaliar e ter em conta os resultados da consulta, bem como elaborar uma definição preliminar de termos como «improcedente», no âmbito da pretensão expressa de «eliminar processos improcedentes», ou «objetivo público» no que se refere às exceções previstas para a proibição das expropriações.

1.20

O CESE, no âmbito do seu trabalho em curso sobre a TTIP, deve elaborar um parecer de iniciativa sobre a RLIE.

1.21

O CESE apoia a inclusão de um capítulo dedicado a questões relativas às PME.

1.22

A especificidade dos serviços públicos na UE deve ser preservada, em conformidade com as obrigações decorrentes do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

1.23

Garantir um aprovisionamento energético fiável e o acesso a matérias-primas estratégicas reveste-se de uma importância fundamental. A TTIP deve igualmente promover a eficácia energética e as energias renováveis, bem como garantir o direito de cada parte de manter ou estabelecer normas e regulamentações neste domínio, trabalhando simultaneamente, na medida do possível, no sentido da convergência entre as normas internas da UE e dos EUA.

1.24

É essencial que os níveis de acesso aos contratos públicos sejam idênticos em ambos os lados do Atlântico. A capacidade de os Estados-Membros da UE, bem como os órgãos de poder local e regional, prosseguirem as suas próprias políticas sociais e ambientais acordadas democraticamente não pode ser posta em causa.

1.25

Ambas as partes no acordo devem reconhecer que a promoção e a proteção dos interesses dos consumidores são indispensáveis para que um eventual acordo obtenha o apoio geral da opinião pública.

1.26

Os critérios agrícolas e agroalimentares em vigor na UE devem ser tidos em conta, e o princípio da precaução consagrado no Tratado de Lisboa deve ser respeitado.

1.27

A TTIP deve encontrar uma maneira prática de garantir segurança jurídica para as empresas, com base em indicadores geográficos.

1.28

Durante todo o período de negociações, devem continuar a ser organizadas as sessões de informação dirigidas à sociedade civil no final de cada ronda, devendo as mesmas prosseguir até à última fase de consulta antes da rubrica do acordo. Essas sessões de informação teriam um apoio muito maior da opinião pública se a Comissão Europeia tornasse claro que se trata de consultas e que as opiniões manifestadas pelas partes interessadas serão devidamente tidas em conta pelos negociadores.

1.29

É essencial que o acordo inclua um forte mecanismo conjunto de monitorização pela sociedade civil. Este mecanismo deve estabelecer a obrigação, para cada parte, de consultar os representantes da sociedade civil nacional através de um grupo consultivo interno que preveja uma representação equilibrada dos interesses económicos, sociais e ambientais. Do lado da UE, o CESE deve desempenhar um papel fundamental neste mecanismo. Os grupos consultivos internos devem:

dispor de poderes para apresentar recomendações às autoridades nacionais e às autoridades políticas conjuntas do acordo (por ex. comité misto do comércio e desenvolvimento sustentável); as autoridades políticas devem tratar eficazmente as recomendações num determinado prazo;

ser autorizados a receber contributos formais de outras organizações da sociedade civil sobre a implementação do capítulo relativo ao desenvolvimento sustentável e a transmiti-los às autoridades políticas para resposta;

dispor do direito de emitir pareceres e recomendações na sequência dos contributos de terceiros.

ter a possibilidade de, sob determinadas condições, solicitar às partes que iniciem um procedimento de consulta ou de resolução de litígios por incumprimento das disposições do capítulo relativo ao desenvolvimento sustentável.

1.30

É igualmente essencial prever que os mecanismos de monitorização nacional das duas partes se reúnam pelo menos uma vez por ano enquanto organismo conjunto, a fim de rever a implementação do capítulo relativo ao desenvolvimento sustentável e emitir comunicações e recomendações conjuntas às partes.

1.31

Os diálogos transatlânticos sobre o trabalho e o ambiente previstos pelo Conselho Económico Transatlântico têm de ser ativados, reiterando assim o apelo lançado pelo CESE no seu parecer de março de 2009 (1).

1.32

O CESE deve instituir um grupo de contacto UE-EUA como primeira prioridade.

2.   Introdução e contexto

2.1

Ao anunciarem a abertura das negociações sobre uma abrangente Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento entre a UE e os EUA, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy e o presidente dos EUA, Barack Obama, publicaram uma declaração conjunta afirmando que «com esta negociação, os Estados Unidos e a União Europeia terão a oportunidade não apenas de incrementar o comércio e o investimento de ambos os lados do Atlântico, mas também de contribuir para o desenvolvimento de regras a nível mundial que podem fortalecer o sistema comercial multilateral».

2.2

Estas declarações salientam as potencialidades deste acordo para o estabelecimento de normas num contexto multilateral. Nos últimos tempos, a UE tem aberto, e, em alguns casos, concluído, negociações sobre uma série de acordos comerciais bilaterais. Embora estes acordos possam apresentar potencialidades consideráveis, o CESE reafirma a sua clara preferência por um sólido acordo multilateral negociado no âmbito da OMC. É importante que a UE prossiga este caminho e continue a trabalhar com base nos modestos resultados da Conferência Ministerial de Bali de 2013.

3.   Contexto político

3.1

Existe uma enorme vontade política de ambos os lados do Atlântico e nos dois campos políticos dos EUA no sentido de concluir com êxito as negociações da TTIP. O objetivo é concluir as negociações durante o mandato da atual administração americana.

3.2

O Comité reitera o seu compromisso relativamente ao caráter cordial e positivo das conversações, que contribuirá para alcançar resultados positivos. O Comité é encorajado pelas garantias oferecidas por ambas as partes de que estas negociações não implicarão a redução das normas. Por se tratar de matéria muito sensível e a sociedade civil exigir a máxima transparência, o CESE acompanhará atentamente as negociações e aguarda com interesse um intercâmbio de boas práticas neste domínio.

3.3

O Comité assinala que toda e qualquer fase do processo de negociação, até à conclusão de um eventual acordo, exigirá o apoio inequívoco dos cidadãos europeus, «diretamente representados, ao nível da União, no Parlamento Europeu» (artigo 10.o, n.o 2, do TUE). O CESE insta, por isso, o Conselho e a Comissão a aplicarem escrupulosamente os procedimentos previstos no artigo 218.o do TFUE, em particular o seu n.o 10: «O Parlamento Europeu é imediata e plenamente informado em todas as fases do processo».

3.4

É necessário que os parceiros de negociação envidem esforços significativos para consultar e informar regularmente a sociedade civil ao longo de todo o processo de negociação. É essencial uma total transparência e indispensável que os textos sejam transmitidos às partes interessadas o mais cedo possível, a fim de permitir a apresentação de observações construtivas em tempo útil, numa fase do processo de negociação em que o seu teor possa ser tido em conta. Tal contribuiria igualmente para uma transição harmoniosa aquando da nomeação da nova Comissão Europeia.

3.5

O clima das relações transatlânticas tem sido perturbado pelas revelações sobre a espionagem da NSA. Estabelecendo uma ligação entre a questão sensível da NSA e as negociações comerciais em curso, a chanceler alemã Angela Merkel afirmou no Bundestag, em 18 de novembro, que «as relações transatlânticas e, por consequência, as negociações sobre um acordo de comércio livre estão, sem dúvida, a ser postas à prova atualmente pelas acusações contra os EUA. São acusações graves que carecem de explicações e, mais importante ainda para o futuro, há que restabelecer a confiança». O Parlamento Europeu aprovou uma resolução (2) em que afirma claramente que a aprovação pelo Parlamento do acordo comercial entre a UE e os EUA «está comprometida» se as atividades de vigilância em larga escala levadas a cabo pela Agência Nacional de Segurança (NSA) dos EUA não cessarem. O Comité espera que os problemas neste domínio possam ser resolvidos graças à diplomacia e à boa vontade.

3.6

As negociações da TTIP serão um teste decisivo para o restabelecimento da confiança, e é importante lembrar o tom positivo da comunicação do Gabinete Executivo do Presidente dos EUA ao presidente da Câmara dos Representantes (março de 2013), que estabeleceu a tónica das negociações: «os potenciais benefícios justificam largamente o esforço». As considerações do Comité são precisamente imbuídas deste espírito.

4.   Estudos sobre o impacto económico, social e ambiental da TTIP

4.1

O ceticismo em relação às perspetivas de êxito final é legítimo, em particular à luz de experiências anteriores, nomeadamente a iniciativa de 1998 de Sir Leon Brittan e os mais recentes diálogos transatlânticos da década de 2000. Para que a situação seja vantajosa para ambas as partes, é necessário ter em consideração estudos conjuntos que analisem mais atentamente as perspetivas de criação de emprego nos dois lados do Atlântico e identifiquem os setores que podem perder postos de trabalho. No entanto, a criação de novos postos de trabalho não é possível sem crescimento. As conclusões do estudo realizado pela Copenhagen Economics em 2010 sobre o impacto do investimento direto da UE no exterior — segundo as quais não haveria impacto negativo mensurável sobre o emprego — são igualmente relevantes neste contexto.

4.2

Para que as negociações da TTIP sejam bem sucedidas, a UE deve ser ambiciosa e, em matéria de acesso ao mercado, a reciprocidade é importante. Estudos recentes (3), nomeadamente a avaliação de impacto realizada pela Comissão, indicam que só um acordo abrangente trará benefícios.

4.3

As negociações devem apoiar-se nos casos de sucesso. Estima-se que as relações entre a UE e os EUA asseguram já um total de 13 milhões de postos de trabalho e cerca de 3,9 biliões de USD em investimento, e representem 45 % do PIB mundial.

4.4

Já foram realizadas algumas projeções estatísticas exaustivas. Segundo o Centro para a Investigação Económica, um acordo abrangente resultaria num aumento do PIB no valor de 119 mil milhões de euros na UE e de 95 mil milhões de euros nos EUA.

A Business Coalition for Transatlantic Trade (Coligação de Empresas para o Comércio Transatlântico) calcula que a TTIP criaria 500 mil postos de trabalho altamente remunerados na UE e nos EUA.

4.5

No entanto, há previsões menos otimistas: por exemplo, o Centro de Investigação de Política Económica (CEPR) estima que a criação de emprego ocorrerá principalmente em setores pouco qualificados, ao passo que se assistirá a uma diminuição significativa dos empregos altamente qualificados no setor da eletrónica na UE. Calcula-se que a mudança de emprego poderá abranger entre 0,2 % e 0,5 % da mão de obra da UE em virtude da reestruturação económica provocada pela TTIP. É importante que estas mutações sejam reconhecidas numa fase inicial e que sejam tomadas medidas adequadas nos setores e nos Estados-Membros afetados, a fim de identificar as competências transferíveis e assegurar a reconversão desta força de trabalho qualificada.

4.6

É inevitável que o impacto da TTIP seja desigual em função de variáveis nacionais, regionais e setoriais. Por consequência, à medida que as negociações decorrem, as projeções estatísticas devem ser constantemente atualizadas e monitorizadas; as promessas devem ser confrontadas com a realidade em evolução.

4.7

É fundamental que o Comité promova estudos de avaliação do impacto e se mantenha a par dos mesmos, nomeadamente nos domínios da criação de emprego, da mobilidade profissional, da qualidade do trabalho e da aplicação da tecnologia.

4.8

Os referidos estudos já fazem parte dos procedimentos da UE (por exemplo, a avaliação do impacto do acordo comercial na sustentabilidade, que está a ser realizada a pedido da Comissão Europeia (4)), mas é fundamental que tenham um caráter amplo, aberto e transparente e incluam o contributo constante da sociedade civil. Por sua vez, o Comité espera poder oferecer regularmente o seu contributo fundamental neste domínio. Deve ser assegurado um compromisso permanente e construtivo e um reconhecimento fundamental do papel da sociedade civil ao longo de todo o processo. O presente parecer constitui o contributo inicial do CESE neste sentido.

4.9

O Comité reserva-se o direito de avaliar os resultados finais das negociações à luz de todos estes compromissos.

5.   Eliminação de direitos aduaneiros no comércio transatlântico

5.1

Ainda que sejam relativamente reduzidos, são aplicáveis, em ambas as partes do Atlântico, alguns direitos aduaneiros muito elevados sobre produtos estratégicos como tabaco, têxteis e vestuário, açúcar, calçado, laticínios e alguns vegetais. Além disso, os EUA mantêm direitos aduaneiros elevados sobre as preparações alimentícias, peixe e preparados de carnes, preparações à base de cereais, massas alimentícias e chocolate. Para os operadores destes setores, a eliminação dos direitos aduaneiros poderia constituir um incentivo concreto ao desenvolvimento de atividades de exportação.

5.2

Além disso, o comércio transatlântico é caracterizado por um volume significativo de transações comerciais entre empresas e de transações de bens intermédios. Os produtos finais são frequentemente resultado de uma cadeia de abastecimento bastante complexa, em que mesmo direitos aduaneiros reduzidos podem ter efeitos significativos sobre a competitividade dos produtos. Por conseguinte, haverá que suprimir, à partida, o maior número possível de direitos aduaneiros. Os direitos remanescentes beneficiarão de um período transitório que não pode exceder 5 anos.

6.   Superar diferenças fundamentais no que respeita à regulamentação e ao estabelecimento de normas

6.1

É geralmente aceite, tanto nos EUA como na UE, que o maior potencial da TTIP reside na vertente da regulamentação. O CESE congratula-se com o forte compromisso assumido pelo negociador da UE, Ignacio Garcia Bercero, de que «o objetivo destas negociações não é, repito, a redução das normas.»

6.2

Esta questão é fundamental para o CESE e é com base nesta declaração e no facto de ela ter sido igualmente reiterada pelo negociador principal dos EUA, Dan Mullaney, no decurso de uma reunião de informação com a sociedade civil em novembro de 2013 que o CESE não aborda no presente parecer as apreensões que poderão surgir se este compromisso não for integralmente respeitado.

6.3

Os EUA não são apenas o maior parceiro comercial da UE, são também um dos parceiros com os quais partilhamos muitos ideais e valores. Os pontos em comum entre a União Europeia e os Estados Unidos excedem de longe as nossas divergências. Trata-se de uma situação rara e de uma excelente base para um resultado ambicioso. A fim de libertar o pleno potencial das exportações, devemos concentrar-nos na eliminação e na resolução dos obstáculos não pautais de forma vantajosa para ambas as partes, mantendo, ao mesmo tempo, o nível atual de proteção e de normas no que respeita aos cidadãos, aos consumidores, aos trabalhadores e ao ambiente. É esta a base em que o nosso trabalho deverá assentar.

6.4

Porém, devido às diferentes abordagens em matéria de regulamentação e de estabelecimento de normas, haverá que proceder a uma análise muito mais aprofundada de determinados setores como os produtos químicos, a segurança alimentar, a agricultura, os veículos a motor, os cosméticos, os produtos têxteis e de vestuário e os produtos farmacêuticos. Deve ser possível obter vantagens para ambas as partes, em muitos domínios, graças a uma maior coerência normativa, à harmonização e ao reconhecimento recíproco de ensaios e de avaliações da conformidade, com vista a obter resultados semelhantes a partir de processos semelhantes. Qualquer que seja o caminho escolhido, deverá respeitar as normas internacionais.

6.5

No interesse da facilitação do comércio, a modernização dos procedimentos e a cooperação aduaneira deverão conduzir à simplificação e eliminação de inspeções e de despesas desnecessárias.

6.6

Uma das características essenciais de uma cooperação mais estreita entre a UE e os EUA em matéria de regulamentação deverá consistir em promover o intercâmbio de boas práticas e melhorar a segurança, a saúde e o bem-estar económico dos cidadãos de ambos os lados do Atlântico.

6.7

O mesmo nível de ambição deve nortear as negociações sobre os obstáculos técnicos ao comércio (OTC); neste campo, um capítulo «OTC-plus», inspirado pelo objetivo de não reduzir as normas, pode ser uma das formas de reforçar a confiança nos respetivos sistemas de regulamentação.

6.8

Importa prever mecanismos eficazes para evitar novos obstáculos, recorrendo a uma consulta oportuna sobre a regulamentação que possa ter um impacto significativo na indústria dos EUA ou da UE, desde que todas as partes interessadas tenham a possibilidade de dar os seus contributos. Mas isto não deve prejudicar o direito de regular em conformidade com o nível de proteção da saúde, dos cidadãos e dos consumidores e com as normas laborais e ambientais que as partes considerarem adequadas por motivos de interesse público.

6.9

É importante que as práticas de adoção de decisões em matéria de regulamentação seguidas em ambos os lados do Atlântico, bem como a cooperação em matéria de regulamentação entre ambas as partes se baseiem em princípios como a transparência, a responsabilização e a definição de políticas ancoradas em elementos oriundos, de forma imparcial e aberta, de todos os setores da sociedade.

6.10

As diferenças entre as partes em matéria de regras e de normas poderão ser consideravelmente reduzidas no futuro mediante um diálogo e uma consulta atempados e de caráter amplo que são de molde a esbater as diferenças e a reduzir os custos para os produtores e os consumidores.

7.   Desenvolvimento sustentável e aplicação de normas diferentes

7.1

A União Europeia e os Estados Unidos da América desempenham um papel importante no debate sobre o desenvolvimento sustentável a nível mundial, bem como em ações de cooperação internacional destinadas a contribuir para os objetivos estabelecidos. Ao mesmo tempo, é importante que as partes envidem esforços tendo em vista o desenvolvimento sustentável assentes nos seus três pilares — crescimento económico, desenvolvimento social e proteção do ambiente — para o bem-estar dos seus cidadãos. Neste contexto, a TTIP e, em particular, a sua vertente relacionada com o comércio e o desenvolvimento sustentável dará a ambas as partes a oportunidade de reiterarem o seu compromisso de apoiar o desenvolvimento sustentável através das suas respetivas políticas, bem como através do reforço do comércio e dos fluxos de investimento, do diálogo e da cooperação no quadro do futuro acordo.

7.2

Desde dezembro de 2009, e em conformidade com o Tratado de Lisboa (5), a UE procurou incluir um capítulo sobre comércio e desenvolvimento sustentável em todos os acordos comerciais que negociar. Esta posição é apoiada firmemente pelo CESE e pelo Parlamento Europeu.

7.3

É importante que o novo acordo reafirme o direito das partes de regularem e definirem as suas próprias prioridades de desenvolvimento sustentável, as políticas e a sua legislação, em consonância com o compromisso das partes em relação às normas e aos acordos internacionais.

7.4

É de louvar o compromisso da Comissão, frequentemente citado, de não baixar a fasquia das normas da UE em matéria de saúde, segurança, ambiente, trabalho e proteção dos consumidores. O CESE também deve acompanhar esta situação para se certificar de que esta garantia não está a ser posta em causa.

7.5

Devemos avançar nesta direção, identificando as principais preocupações e sugerindo passos positivos, nomeadamente no que se refere a questões sociais. O CESE deve reconhecer a TTIP como uma prioridade durante o período de negociações e de execução.

7.6

As partes devem reiterar o seu empenho em aplicar efetivamente e em controlar a aplicação das respetivas legislações laborais. Devem também reiterar as suas obrigações decorrentes do estatuto de membros da Organização Internacional do Trabalho (OIT), incluindo a Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho, adotada em 1998 e vinculativa para todos os seus membros. As oito convenções fundamentais da OIT (incorporadas na Declaração Ministerial de Singapura, aprovada pela OMC em 1996) devem continuar a ser a base mínima dos aspetos sociais de um eventual capítulo sobre desenvolvimento sustentável a inserir na TTIP, à semelhança do que foi feito em todos os acordos de comércio livre recentemente celebrados pela UE (6).

7.7

A UE sempre promoveu a «Agenda social» na conclusão do seu próprio mercado interno e, na verdade, o CESE é um exemplo vivo do compromisso da UE de diálogo e de consenso. Embora respeite o modelo social dos Estados Unidos, em vários aspetos diferente do da União Europeia, a UE deve fomentar e proteger energicamente o seu próprio modelo baseado na solidariedade social.

7.8

As partes devem reconhecer a importância da governação ambiental mundial e das normas destinadas a enfrentar os desafios comuns no setor do ambiente. Devem reafirmar o seu compromisso de aplicar e de controlar a aplicação as respetivas legislações ambientais. Além disso, as partes devem reiterar o seu compromisso de continuar a tomar medidas no sentido de garantir e promover a conservação, a utilização sustentável e a gestão dos recursos naturais. Neste contexto, as partes devem também reiterar o seu compromisso nos acordos ambientais multilaterais.

7.9

A TTIP deve constituir igualmente uma oportunidade para a UE e os EUA incrementarem as trocas comerciais e o investimento em prol do desenvolvimento sustentável, por exemplo a liberalização do comércio de bens e serviços ecológicos (em consonância com a iniciativa anunciada em Davos, em 24 de janeiro de 2014, a que ambas as partes pertencem), bem como a promoção da responsabilidade social das empresas, etc.

7.10

Ao contrário dos Estados Unidos, a UE ainda não incorporou no procedimento geral de resolução de litígios as questões laborais e ambientais abrangidas pelo capítulo sobre desenvolvimento sustentável; estas questões são remetidas para um procedimento de consulta que não pode dar lugar a sanções comerciais. A lógica subjacente a esta posição não é clara, pelo que o CESE convida a Comissão a clarificá-la.

8.   Investimentos

8.1

A UE goza de competências em matéria de investimento na sequência da entrada em vigor do Tratado de Lisboa. Um novo acordo substituirá todos os tratados bilaterais de investimento (TBI) entre os Estados Unidos e nove Estados-Membros.

8.2

A nível multilateral, a UE e os EUA são partes no Acordo da OMC sobre as medidas de investimento relacionadas com o comércio. No entanto, este acordo aplica-se unicamente às medidas que afetam o comércio de mercadorias, mas não aos serviços ou a outros domínios essenciais que se têm desenvolvido nos últimos vinte anos. Além disso, a UE e os EUA chegaram a acordo, em abril de 2012, sobre um ambicioso conjunto de princípios de investimento e convidaram outros países a seguir este exemplo.

8.3

A questão da inclusão de um mecanismo de resolução de litígios entre os investidores e o Estado suscitou grande interesse por parte do público e preocupação em ambos os lados do Atlântico. O CESE congratula-se com o facto de a Comissão reconhecer a preocupação dos cidadãos face à dureza de certos litígios (7)e de ter decidido proceder a uma consulta pública especificamente consagrada à proteção dos investimentos e à RLIE em virtude do elevado nível de interesse suscitado por este assunto. Este exercício de consulta pública lançado em 27 de março de 2014 é um bom exemplo de como incentivar a participação da sociedade civil nas negociações.

8.4

O CESE considera essencial que quaisquer disposições em matéria de RLIE previstas na TTIP não prejudiquem a capacidade de os Estados-Membros da UE legislarem a favor do interesse público. O CESE regista os esforços no sentido de uma maior transparência e elaborará um parecer de iniciativa sobre a RLIE.

8.5

No ponto 8 da sua ficha informativa de 3 de outubro de 2013, a Comissão apresenta propostas para acabar com os possíveis abusos de processos de resolução de litígios. O Comité considera que a definição de vários termos, entre os quais «processos improcedentes» e «objetivo público» não é suficientemente clara. É essencial e urgente que a Comissão formule estas definições devidamente.

8.6

O CESE considera importante que a posição negocial da UE preveja diversas condições para a inclusão do mecanismo de resolução de litígios entre os investidores e o Estado no texto do acordo, uma das quais diz respeito ao facto de que as disposições pertinentes devem permitir aos Estados-Membros prosseguir os objetivos legítimos de política pública, nomeadamente nos domínios social, do ambiente, da segurança, da proteção dos consumidores, da estabilidade do sistema financeiro, da saúde e da segurança públicas de forma não discriminatória. É importante que esta declaração seja o princípio que norteie os negociadores da UE, fato que deve ser claramente mencionada no acordo.

9.   PME

9.1

Tanto na Europa como nos Estados Unidos as PME e as start-up são os motores fundamentais do crescimento e da criação de emprego. Mais de 20 milhões de empresas da UE e 28 milhões nos EUA são PME. Em ambos os lados do Atlântico, as PME constituem uma fonte importante de inovação, de novos produtos e de novos serviços e beneficiam já das trocas comerciais transatlânticas.

9.2

A TTIP será especialmente importante para as PME, dado que os obstáculos ao comércio tendem a pesar desproporcionadamente sobre as empresas de menor dimensão, que têm menos recursos para as ultrapassar do que as empresas de maior dimensão. Entre os potenciais benefícios da TTIP para as PME figuram os direitos aduaneiros, as questões de regulamentação e os obstáculos não pautais, os serviços, o comércio eletrónico, os contratos públicos, as alfândegas e a facilitação do comércio, e os direitos de propriedade intelectual.

9.3

O CESE apoia a inclusão na TTIP de um capítulo sobre questões relativas às PME. Esse capítulo poderia criar mecanismos em que ambas as partes possam colaborar para facilitar a participação das PME no comércio transatlântico. As disposições poderiam igualmente prever um comité para as PME que interaja com as pequenas empresas e o desenvolvimento de informações na Web e outros recursos para ajudar as PME a compreender as disposições do acordo e a dele poderem beneficiar.

10.   Interesse dos consumidores

10.1

A confiança dos consumidores é fundamental para o êxito da TTIP. Trata-se de um elemento que induz os consumidores a consumirem com efeitos positivos para o crescimento e o emprego. Por conseguinte, é indispensável fornecer aos consumidores garantias aptas a gerar confiança no mercado transatlântico. A declaração inequívoca de que não haverá redução das atuais normas é um importante ponto de partida. O desafio consiste em transformar este compromisso em realidade, criando um quadro regulamentar claro que impossibilite essa redução e, entre outras iniciativas, mantendo a sociedade civil devida e atempadamente informada sobre o processo de convergência regulamentar. Importa prever também disposições que mantenham o direito dos cidadãos de exigirem o cumprimento da regulamentação, em caso de violação.

10.2

Receia-se que a abertura das fronteiras e a eliminação dos obstáculos ao comércio possam levar a uma maior difusão e impacto dos alimentos contaminados. A TTIP oferece uma excelente oportunidade para desenvolver um sistema de alerta que abranja tanto a União Europeia como os Estados Unidos. O objetivo é melhorar a proteção dos consumidores e minimizar os efeitos negativos sobre o comércio em caso de crise.

10.3

A rastreabilidade dos ingredientes alimentares e seus derivados é essencial para assegurar a segurança, a qualidade e a escolha informada dos consumidores. A TTIP é uma oportunidade para a UE e os EUA compreenderem melhor a complexidade das cadeias e das redes mundiais de abastecimento alimentar e desenvolverem abordagens sólidas, compatíveis e interoperacionais para assegurar a rastreabilidade e a autenticidade dos alimentos, em particular os sistemas de identificação.

10.4

É necessário instaurar regimes obrigatórios de informação e intercâmbio de informações sobre novos produtos para acompanhar a introdução no mercado de nanomateriais, para os quais haveria que elaborar um inventário, aberto ao escrutínio público.

11.   Serviços

11.1

Muitos dados estatísticos demonstram que o incremento do comércio e do investimento no setor dos serviços poderá ter grandes potencialidades de crescimento. Por conseguinte, é importante que ambas as partes negoceiem compromissos concretos em matéria de serviços (incluindo serviços financeiros). A melhoria do acesso ao mercado é considerada uma prioridade para as empresas da UE.

11.2

As negociações devem também ter plenamente em consideração a especificidade dos serviços públicos na UE, que deve ser preservada em conformidade com as obrigações decorrentes do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

11.3

A cooperação em matéria de regulamentação deve igualmente abranger os serviços e prever melhor cooperação entre as autoridades de regulamentação, maior transparência e a eliminação de requisitos supérfluos e onerosos.

12.   Agricultura e setor agroalimentar

12.1

O acordo deve ser ambicioso no que respeita às questões sanitárias e fitossanitárias (SPS), devendo os Estados Unidos e a União Europeia procurar negociar um capítulo ambicioso «SPSplus» nesta matéria.

12.2

Os modos de produção agrícola e agroalimentar desenvolvem-se em condições muito diversas consoante ocorrem nos EUA ou na UE (por exemplo, em matéria de bem-estar dos animais e normas de segurança dos alimentos e de utilização de pesticidas). Nos EUA são tidos exclusivamente em conta critérios de natureza científica para determinar se um produto pode ou não ser colocado no mercado, ao passo que na Europa este tipo de decisão rege-se pelo «princípio da precaução». Devem ter-se em conta estas diferenças de abordagem nas negociações.

12.3

Os compromissos acima mencionados, assumidos pela Comissão, de não baixar a fasquia das normas europeias, nomeadamente no que diz respeito à proteção dos consumidores, significam que devemos estar atentos às questões de segurança alimentar (informações sobre OGM, hormonas nos alimentos, alimentos limpos com produtos químicos, etc.), velando sempre pelo respeito do princípio da precaução (consagrado no Tratado de Lisboa). Os esforços para melhorar a compatibilidade dos quadros regulamentares dos EUA e da UE devem respeitar o alto nível das normas de segurança dos alimentos em ambos os lados do Atlântico.

13.   Contratos públicos

13.1

Os contratos públicos são uma questão particularmente sensível sobre a qual a UE deverá adotar, no entanto, uma abordagem mais ofensiva, visto que as empresas dos EUA beneficiam atualmente de maior abertura do mercado europeu do que as empresas europeias do mercado americano. Num eventual acordo, é essencial que os níveis de acesso aos contratos públicos sejam idênticos em ambos os lados do Atlântico.

13.2

Os negociadores devem assegurar que o direito de os Estados-Membros da UE e de os órgãos de poder local e regional prosseguirem as suas próprias políticas sociais e ambientais democraticamente aprovadas não será posto em causa.

14.   Proteção de dados

Receia-se que a TTIP possa levar ao enfraquecimento das normas de proteção de dados quer na UE quer nos EUA, expondo os cidadãos à eventual violação de dados pessoais e da vida privada. Em conformidade com o compromisso referido no ponto 6.1, é fundamental que as normas de proteção neste domínio não sejam reduzidas e que, nos seus contactos com empresas localizadas nos EUA, os cidadãos da UE beneficiem garantidamente do mesmo grau de proteção que lhes é conferido pela legislação europeia em vigor em matéria de proteção de dados pessoais.

15.   Energia e matérias primas estratégicas

15.1

É crucial que se garanta o aprovisionamento fiável de energia. A TTIP deve ter em consideração a elaboração de disposições sobre a segurança do aprovisionamento de energia e de matérias primas estratégicas, com o objetivo de identificar os estrangulamentos atuais e futuros em matéria de aprovisionamento e infraestruturas que podem afetar o comércio da energia, bem como prever mecanismos para gerir crises e interrupções de aprovisionamento.

15.2

A eficiência energética e a promoção das energias renováveis são um aspeto fundamental da política energética da União Europeia e dos Estados Unidos. A TTIP deve promover estes objetivos e assegurar o direito de cada uma das partes de manter ou estabelecer normas e regulamentações em domínios como o desempenho energético dos produtos, os equipamentos e processos, trabalhando simultaneamente, na medida do possível, para uma convergência das normas internas europeias e americanas.

16.   Indicadores geográficos

A UE exporta para os EUA produtos de elevado valor acrescentado e, neste âmbito, o sistema de indicadores geográficos é fundamental. Este sistema protege os produtos europeus contra imitações e fraudes e evita que os consumidores sejam enganados. A TTIP deve prever um modo concreto de garantir segurança jurídica para as empresas, com base em indicadores geográficos.

17.   Papel e participação da sociedade civil

17.1

O CESE congratula-se com o notável processo segundo o qual a sociedade civil é plenamente informada após cada ronda de negociações. É extremamente importante que todas as partes interessadas continuem a ser consultadas e que o CESE seja aceite como um elemento essencial deste processo. No entanto a sociedade civil está preocupada visto que os textos das negociações são desnecessariamente considerados confidenciais, o que obsta ao processo de informação. Esta prática poderia minar gravemente o apoio e a confiança do público num futuro acordo TTIP.

17.2

O Conselho Económico Transatlântico e as deficiências e disparidades entre os cinco diálogos transatlânticos (empresas, consumidores, legisladores, trabalho e ambiente) foram tratados com a devida atenção no parecer do CESE emitido em março de 2009 (8) . Como demonstram os diálogos transatlânticos das empresas e dos consumidores, estes órgãos, se forem corretamente criados e geridos, podem dar um importante contributo para o processo negocial. O CESE reitera, pois, o seu apelo à ativação dos diálogos transatlânticos sobre o trabalho e o ambiente.

17.3

Tal como acima se referiu, a TTIP é fonte de apreensão, mas também de promessas, e o papel da sociedade civil será essencial para a eventual aprovação, ou não, dos resultados das negociações.

A nova geração de acordos comerciais bilaterais celebrados pela UE prevê um mecanismo de controlo por parte da sociedade civil.

17.4

Cada um desses mecanismos será específico, em função das circunstâncias concretas. No entanto, o CESE está convencido de que esse mecanismo específico à TTIP deve ser instaurado o mais rapidamente possível e o CESE deve consultado sobre a sua arquitetura.

18.   Papel do CESE

18.1

É imperativo que o papel institucional do CESE seja reconhecido, e seja mantido um diálogo regular entre o CESE, a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu ao longo de todo o processo negocial da TTIP.

18.2

O Tratado de Lisboa reafirma o papel do Comité enquanto ponte entre a sociedade civil e as outras instituições europeias, papel que constitui parte integrante da cooperação estreita entre o CESE e a Comissão. Dada a potencial importância da TTIP é essencial que:

a Comissão reconheça este papel e informe o Comité sobre todos os aspetos do processo de negociação. Neste contexto, acolhe favoravelmente o facto de um grupo de monitorização do CESE constituído por três membros vir a ter acesso, em pé de igualdade, a todos os documentos disponibilizados ao Grupo Consultivo da DG Comércio;

seja dado à sociedade civil um papel inclusivo ao longo de todo o processo de negociação;

seja criado um mecanismo de controlo conjunto da sociedade civil forte e plenamente representativo, independentemente das circunstâncias prevalecentes no pós-acordo. O CESE tem de desempenhar um papel central num organismo deste tipo.

18.3

Embora os Estados Unidos não possuam uma estrutura equivalente ao CESE, a visita a Washington em fevereiro de 2014 demonstrou a existência de uma estrutura madura de sociedade civil organizada nos EUA. A situação é paralela à estrutura de três grupos que existe no CESE. A TTIP é, por conseguinte, uma excelente oportunidade para o CESE levar por diante a sua política de desenvolvimento, já estabelecida, de relações transatlânticas com a sociedade civil. Para o efeito, recomenda-se que a criação de um grupo de contacto entre a UE e os EUA seja tratada como prioridade imediata.

18.4

O presente parecer é o início, não o fim, da participação do CESE no processo da TTIP. Recomenda-se que o CESE estabeleça um projeto contínuo para participar na monitorização do processo de negociação da TTIP em nome da sociedade civil. Poderiam fazer parte desta iniciativa, por exemplo, pareceres, audições públicas, seminários, conferências, etc., sobre temas como o desenvolvimento sustentável, as PME, RLIE, contratos públicos e análises setoriais específicas.

Bruxelas, 4 de junho de 2014

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Henri MALOSSE


(1)  JO C 228 de 22.9.2009, pp. 32–39.

(2)  http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P7-TA-2014-0230+0+DOC+XML+V0//PT&language=PT

(3)  Ver «Reduzir os obstáculos transatlânticos ao comércio e ao investimento — uma avaliação económica» [Reducing Transatlantic Barriers to Trade and Investment — An Economic Assessment] — Centro de Investigação de Política Económica, Londres, março de 2013. http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2013/march/tradoc_150737.pdf

(4)  http://www.trade-sia.com/ttip/

(5)  Artigo 207.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que delineia os princípios da política comercial da UE; artigo 3.o, n.o 5, do Tratado da União Europeia (TUE) e artigo 21.o do TUE, que definem princípios gerais da ação externa da UE, remetendo também para o apoio da UE ao comércio e ao desenvolvimento sustentável.

(6)  JO L 127 de 14.5.2011, páginas 62 a 65.

(7)  Há casos recentes de processos importantes intentados por empresas privadas contra Estados soberanos, por ex. Veolia contra Egito e Philip Morris contra Austrália.

(8)  JO C 228 de 22.9.2009.