23.12.2015   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 434/24


P7_TA(2012)0470

Estratégia para a Liberdade Digital no âmbito da política externa da UE

Resolução do Parlamento Europeu, de 11 de dezembro de 2012, sobre uma Estratégia para a Liberdade Digital na Política Externa da UE (2012/2094(INI))

(2015/C 434/03)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta a resolução do Conselho de Direitos Humanos da ONU, de 5 de julho de 2012, intitulada «The promotion, protection and enjoyment of human rights on the Internet» (A promoção, proteção e gozo dos direitos humanos na Internet), que reconhece a importância da proteção dos direitos humanos e da livre circulação de informação em linha (1),

Tendo em conta os relatórios do Relator Especial das Nações Unidas, Frank La Rue, de 16 de maio de 2011, (A/HRC/17/27) e, de 10 de agosto de 2011, (A/66/290) sobre a promoção e proteção para a liberdade de opinião e de expressão, que destaca a aplicabilidade das normas e padrões internacionais em matéria de direitos humanos relativos ao direito da liberdade de opinião e expressão na Internet enquanto meio de comunicação,

Tendo em conta a resolução do Conselho de Direitos Humanos da ONU, de 28 de março de 2008, (7/36) estabelecendo o mandato do Relator Especial sobre a promoção e proteção para a liberdade de opinião e de expressão,

Tendo em conta o relatório das Nações Unidas, de 16 de junho de 2011, intitulado «Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos: Implementação do quadro de referência 'Proteger, Respeitar e Reparar' das Nações Unidas» (o qual reflete o trabalho do Representante Especial das Nações Unidas, John Ruggie),

Tendo em conta a resolução aprovada pelo Conselho da União Interparlamentar em 19 de outubro de 2011 (2),

Tendo em conta o Quadro Estratégico para os Direitos Humanos e a Democracia, adotado pelo Conselho em 25 de junho de 2012 (3),

Tendo em conta a sua Recomendação ao Conselho, de 13 de junho de 2012, relativa ao Representante Especial da UE para os Direitos Humanos (4),

Tendo em conta a sua Resolução de 12 de junho de 2012, intitulada «Proteção das infraestruturas críticas da informação — realizações e próximas etapas: para uma cibersegurança mundial» (5),

Tendo em conta a sua Resolução de 20 de abril de 2012, intitulada «Um mercado único digital competitivo — a administração pública em linha como força motriz» (6),

Tendo em conta a sua Resolução de 18 de abril de 2012 sobre o Relatório Anual sobre os Direitos Humanos no Mundo e a política da União Europeia nesta matéria, incluindo as implicações para a política estratégica da UE em matéria de direitos humanos (7),

Tendo em conta a sua Resolução de 16 de fevereiro de 2012 sobre o acesso das pessoas invisuais a livros e a outros produtos impressos (8),

Tendo em conta o Orçamento Geral para 2012, de 29 de fevereiro de 2012, em especial o apelo à criação de um «Fundo Global de Liberdade da Internet» (9),

Tendo em conta a Comunicação, de 12 de dezembro de 2011, pelo Comissário para a Agenda Digital sobre a Estratégia «No Disconnect»,

Tendo em conta a Comunicação Conjunta da Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 12 de dezembro de 2011, intitulada «Os direitos humanos e a democracia no centro da ação externa da UE — rumo a uma abordagem mais eficaz» (COM(2011)0886),

Tendo em conta a sua Resolução de 17 de novembro de 2011 sobre a Internet aberta e a neutralidade da rede na Europa (10),

Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 25 de outubro de 2011, intitulada «Responsabilidade social das empresas: uma nova estratégia da UE para o período de 2011-2014» (COM(2011)0681),

Tendo em conta os princípios orientadores das Nações Unidas sobre empresas e direitos humanos,

Tendo em conta a sua Resolução de 13 de setembro de 2011 sobre uma estratégia eficaz para a Europa no domínio das matérias-primas (11),

Tendo em conta a sua Resolução de 7 de julho de 2011 sobre as políticas externas da UE a favor da democratização (12),

Tendo em conta a Comunicação Conjunta da Comissão Europeia e da Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, de 25 de maio de 2011, intitulada «Uma nova estratégia para uma vizinhança em mutação» (COM(2011)0303),

Tendo em conta a sua Resolução de 12 de maio de 2011 sobre as dimensões culturais das ações externas da UE (13),

Tendo em conta a sua Resolução de 25 de novembro de 2010 sobre a responsabilidade social das empresas nos acordos de comércio internacionais (14),

Tendo em conta a sua Resolução de 15 de junho de 2010 sobre «O governo da Internet: as próximas etapas» (15),

Tendo em conta a sua Resolução de 15 de junho de 2010 sobre a Internet das coisas (16),

Tendo em conta a sua Resolução de 14 de fevereiro de 2006 sobre a cláusula relativa aos direitos humanos e à democracia nos acordos da União Europeia (17),

Tendo em conta as suas resoluções sobre casos urgentes de violações de direitos humanos, da democracia e do Estado de direito, caso suscitem preocupações relacionadas com as liberdades digitais,

Tendo em conta a sua Posição de 27 de setembro de 2011 sobre a proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, que altera o Regulamento (CE) n.o 1334/2000, que cria um regime comunitário de controlo das exportações de produtos e tecnologias de dupla utilização (18),

Tendo em conta o Regulamento (UE) n.o 36/2012 do Conselho, que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Síria, e que revoga o Regulamento (UE) n.o 442/2011, de 18 de janeiro de 2012, e apresenta restrições de exportação sobre as TIC e os instrumentos de monitorização (19),

Tendo em conta o Regulamento (UE) n.o 264/2012, de 23 de março de 2012, do Conselho, que altera o Regulamento (UE) n.o 359/2011 relativo a certas medidas restritivas específicas contra determinadas pessoas, entidades e organismos tendo em conta a situação do Irão e apresenta restrições de exportação sobre as TIC e os instrumentos de monitorização (20),

Tendo em conta os artigos 3.o e 21.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,

Tendo em conta o artigo 207.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,

Tendo em conta as orientações da União Europeia relativas aos direitos humanos,

Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos Humanos e todos os instrumentos internacionais pertinentes sobre direitos humanos, incluindo o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais,

Tendo em conta a Convenção da ONU para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, de 17 de abril de 2003 (21),

Tendo em conta a Carta das Nações Unidas,

Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e as negociações em curso sobre a adesão da UE à convenção,

Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,

Tendo em conta o artigo 48.o do seu Regimento,

Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Externos e o parecer da Comissão do Comércio Internacional (A7-0374/2012),

A.

Considerando que os desenvolvimentos tecnológicos permitem aos cidadãos de todo o mundo utilizarem as novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e aceder à Internet, fomentando, assim, mudanças revolucionárias nas sociedades, no funcionamento da democracia, na governação, na economia, nas atividades comerciais, na comunicação social, no desenvolvimento e no comércio;

B.

Considerando que a Internet é um instrumento essencial para o acesso à informação, a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, a liberdade de reunião e para o desenvolvimento económico, social, político e cultural;

C.

Considerando que existe um consenso global, refletido no direito internacional, quanto ao imperativo de que as restrições aos direitos fundamentais estejam previstas na lei;

D.

Considerando que a UE necessita proteger e promover os direitos humanos, «online» e «offline»;

E.

Considerando que a inclusão, o incentivo às cibercompetências (e-skills) e a supressão do fosso digital são elementos-chave para explorar o potencial de capacitação da Internet e das TIC;

F.

Considerando que as TIC — embora se tenham revelado instrumentos fundamentais para a organização de protestos e movimentos sociais em diversos países, especialmente no que respeita à Primavera Árabe — também são utilizadas como instrumentos de repressão através da censura (em massa), e de vigilância, investigação e localização de informações e pessoas;

G.

Considerando que as TIC também podem representar um instrumento útil para as organizações terroristas prepararem e executarem ataques;

H.

Considerando que o contexto no qual as tecnologias são utilizadas determina, em grande medida, o impacto que podem ter na qualidade de impulsionador de desenvolvimentos positivos ou, pelo contrário, de repressão;

I.

Considerando que estas mudanças criam novos contextos que exigem a aplicação adaptada da legislação em vigor com base numa estratégia de integração da Internet e das TIC em toda a ação externa da UE;

J.

Considerando que a Internet prosperou e se desenvolveu organicamente como uma plataforma de enorme utilidade pública; que, contudo, a utilização abusiva das novas oportunidades e instrumentos disponibilizados pela Internet também cria novos riscos e perigos;

K.

Considerando que a Internet também se tornou um fator de desenvolvimento do comércio internacional que exige uma vigilância contínua, em particular, relativamente à proteção dos consumidores;

L.

Considerando que só deverão aplicar-se restrições em caso de utilização da Internet para atividades ilícitas, como sejam o incitamento ao ódio, à violência e a atitudes racistas, a propaganda totalitária e o acesso por parte de crianças à pornografia ou a respetiva exploração sexual;

M.

Considerando que a natureza global e sem fronteiras da Internet requer novas formas de cooperação e governação internacional com múltiplas partes interessadas;

N.

Considerando que, nos termos do artigo 21.o do Tratado da União Europeia, «a União vela pela coerência entre os diferentes domínios da sua ação externa e entre estes e as suas outras políticas. O Conselho e a Comissão, assistidos pela Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, asseguram essa coerência e cooperam para o efeito»;

O.

Considerando que a neutralidade da rede é um princípio essencial para a Internet aberta, garantindo a existência de concorrência e a transparência;

P.

Considerando que a segurança digital e a liberdade digital são ambas essenciais e que uma não pode substituir a outra;

Q.

Considerando que a UE é líder em liberdades digitais somente quando estas são preservadas na UE;

Direitos humanos e desenvolvimento

1.

Reconhece que o acesso não censurado à Internet aberta, aos telemóveis e à TIC teve impacto nos direitos humanos e nas liberdades fundamentais, exercendo um efeito habilitador, expandindo o âmbito de liberdade de expressão, o acesso à informação, o direito à privacidade e à liberdade de reunião a nível mundial;

2.

Reconhece o vasto potencial habilitador, criador e catalisador da Internet aberta e das TIC para o desenvolvimento da coletividade, a sociedade civil, o desenvolvimento global económico, social, científico, cultural e político, contribuindo assim para o progresso da humanidade como um todo; não obstante, tem consciência dos novos riscos e perigos em matéria de direitos humanos decorrentes da utilização abusiva das TIC;

3.

Reconhece que a Internet e as redes sociais permitem aos governos praticar diplomacia direta e facilitam o aumento dos contactos interpessoais em todo o mundo; realça que os debates públicos sobre ideias podem ajudar a refutar o extremismo e melhorar a comunicação e o entendimento intercultural;

4.

Considera a cultura como um facilitador do acesso e do contacto quando as relações políticas estão bloqueadas ou perturbadas; reconhece que a liberdade e a cultura estão intimamente interligadas e que a diplomacia cultural digital se reveste de interesse estratégico para a UE;

5.

Reconhece o papel da liberdade artística e da liberdade de imitar e reutilizar como pedras angulares da criatividade e da liberdade de expressão e de ideias; reconhece a presença significativa de exceções e limitações no ecossistema dos direitos de autor, especialmente nas áreas do jornalismo, citação, sátira, arquivos, bibliotecas e na garantia do acesso e da possibilidade de utilização do património cultural;

6.

Exorta a Comissão a abordar devidamente o facto de haver países que utilizam a repressão e o controlo de cidadãos, organizações da sociedade civil e ativistas, enquanto, em alguns países, as atividades comerciais pressupõem uma componente tecnológica cada vez maior, através do bloqueio de conteúdos e da monitorização e identificação de defensores dos direitos humanos, jornalistas, ativistas e dissidentes; exorta ainda a Comissão a atuar contra a criminalização da expressão legítima em linha e a adoção de legislação restritiva para justificar essas medidas; reitera, portanto, que essas práticas são contrárias aos critérios de Copenhaga;

7.

Realça que o reconhecimento e aplicação dos princípios da responsabilidade social das empresas pelos fornecedores de serviços de Internet, criadores de software, produtores de hardware, meios/serviços de redes sociais, etc., é necessário para garantir a liberdade de ação e a segurança dos defensores dos direitos humanos, bem como a liberdade de expressão;

8.

Salienta que a promoção e a proteção de liberdades digitais devem ser integradas e revistas anualmente para garantir a responsabilização e a continuidade, em todas as ações externas, políticas e instrumentos de financiamento e ajuda da UE, sob a liderança da Alta Representante e do SEAE; exorta à adoção de uma abordagem dinâmica a este respeito e de medidas que garantam uma cooperação e coordenação horizontais entre as instituições e agências pertinentes da UE e no seio destas;

9.

Subscreve o reconhecimento, por parte da Comissão, de que o acesso seguro à Internet faz parte dos critérios de Copenhaga e que a imposição de limitações à liberdade de expressão, também na Internet, deve ser justificada por uma necessidade social premente e, em particular, ser proporcional ao objetivo legítimo pretendido;

10.

Está ciente das preocupações, existentes em todos os países, relacionadas com a proteção e promoção dos direitos humanos e das liberdades em linha, mas reconhece as distinções críticas que afetam o contexto em que são usadas as TIC, como a existência do Estado do direito e o direito de recurso;

11.

Exorta a Comissão a garantir a coerência entre a ação externa da UE e as suas próprias estratégias internas quando defender restrições aos direitos fundamentais que sejam estritamente necessárias e proporcionais — em particular, ao afirmar princípios básicos do direito internacional, nomeadamente, que as restrições devem basear-se na lei e não serem impostas de forma «ad hoc» pela indústria;

12.

Incentiva o Representante Especial da UE para os Direitos Humanos a designar as liberdades digitais e a Estratégia «No Disconnect» entre as suas prioridades fundamentais;

13.

Sublinha que, para serem eficazes, as políticas da UE em matéria de desenvolvimento e direitos humanos tornam necessária a integração das TIC e a supressão do fosso digital, fornecendo infraestruturas tecnológicas básicas, facilitando o acesso ao conhecimento e à informação e promovendo a literacia digital em todo o mundo;

14.

Considera que as TIC são potenciadoras da transparência e da boa governação, da literacia, da educação, da saúde sexual e reprodutiva, da monitorização eficaz das eleições e da assistência em catástrofes, especialmente em áreas remotas e sociedades em desenvolvimento;

15.

Realça que as políticas da UE em matéria de desenvolvimento e de direitos humanos devem incluir programas de ajuda que promovam as liberdades digitais, principalmente em sociedades de países não democráticos e naqueles que atravessam transições pós-conflito ou políticas; acredita que os peritos da UE em legislação são interlocutores essenciais para efeitos da formação de homólogos e da integração dos direitos e princípios fundamentais na nova regulamentação e legislação (sobre meios de comunicação) em países terceiros; realça que a ajuda sob a forma de construção de infraestruturas de TIC pode ser condicionada à aplicação e preservação do acesso aberto à Internet e à informação em linha, bem como à liberdade digital, em termos mais amplos;

16.

Chama a atenção para a importância de desenvolver as TIC em zonas de conflito para promover atividades de consolidação da paz ao nível da sociedade civil, a fim de proporcionar comunicações seguras entre as partes envolvidas na resolução pacífica de conflitos e, desta forma, ultrapassar ativamente os riscos e obstáculos físicos que afetam os contactos bilaterais a favor de pessoas e organizações dessas zonas;

17.

Espera que a utilização adequada das novas tecnologias das comunicações — em particular, as redes sociais — ajude a reforçar a democracia direta entre os cidadãos da UE e de países terceiros, criando plataformas sociais para a elaboração de legislação;

18.

Destaca que a recolha digital e a divulgação de provas de violações de direitos humanos pode contribuir para a luta global contra a impunidade; considera que estes materiais devem ser admissíveis nos termos do direito internacional (penal) como prova em processos judiciais;

19.

Salienta a necessidade de garantir que as terras raras utilizadas na produção de TIC sejam obtidas em condições de respeito dos direitos humanos, laborais e ambientais e não sejam subordinadas a práticas monopolistas ou a restrições do acesso ao comércio causadas por motivos meramente políticos; considera que uma abordagem multilateral para garantir o acesso às terras raras em condições humanas constitui um requisito para alcançar estes objetivos;

Comércio

20.

Reconhece que a Internet se tornou um espaço do domínio público que dá lugar a novas formas de comércio transfronteiriço, bem como a um desenvolvimento de mercado inovador e à interação social e cultural; considera que a liberdade digital e o comércio transfronteiriço devem estar em sintonia para criar e otimizar oportunidades de negócio para as empresas europeias na economia digital mundial;

21.

Está ciente da preocupação de que, cada vez mais, algumas pessoas ouvem a expressão «direitos de autor» e odeiam o que lhe está subjacente; reconhece o papel importante que a política de comércio externo tem desempenhado na conceção de mecanismos de aplicação dos direitos de autor;

22.

Lamenta que tecnologias e serviços da UE sejam, por vezes, usados em países terceiros para violar os direitos humanos através da censura de informação, vigilância generalizada, monitorização e investigação e localização de cidadãos e das suas atividades em redes telefónicas (móveis) e na Internet; exorta a Comissão a tomar todas as medidas necessárias para pôr termo a este «comércio de armamento digital»;

23.

Apela para a interdição da exportação de tecnologias e serviços de repressão para regimes autoritários; acredita que esta proibição deve tornar-se um precedente para medidas restritivas estruturais; considera, contudo, prudente especificar que esta proibição tem de ser aplicada numa base individual, tendo em conta as especificidades ao lidar com zonas de conflito ou regimes autoritários;

24.

Considera que alguns serviços e produtos tecnológicos de bloqueio, vigilância, monitorização e interceção constituem aparelhos de utilização única, pelo que exorta à criação duma lista — a ser regularmente atualizada — dos países que violam a liberdade de expressão no contexto dos direitos humanos e para os quais deve ser proibida a exportação de aparelhos de utilização única;

25.

Sublinha a necessidade de aplicar e monitorizar as sanções da UE relacionadas com tecnologias ao nível da União, a fim de garantir o cumprimento uniforme por parte de todos os Estados-Membros e a preservação da igualdade de condições de concorrência;

26.

Realça que a Comissão deve poder fornecer às empresas que tenham dúvidas quanto a requerer uma licença de exportação informações em tempo real sobre a legalidade ou os efeitos potencialmente nocivos de acordos comerciais, bem como às empresas da UE ou nela sediadas que estabeleçam relações contratuais com governos de países terceiros, seja para obterem licenças de exploração ou negociarem cláusulas de «standstill», seja através da aceitação de envolvimento público em operações comerciais ou da utilização pública das suas redes e serviços;

27.

Realça a importância da proteção dos direitos dos consumidores no âmbito de acordos internacionais relativos às TIC;

28.

Exorta a Comissão a apresentar, o mais tardar durante o ano de 2013, propostas que exijam das empresas sediadas na UE uma maior transparência e responsabilização e a divulgação de políticas de avaliação do impacto sobre os direitos humanos, a fim de melhorar o controlo da exportação de TIC e dos produtos e serviços destinados ao bloqueio de páginas da Internet, à vigilância maciça, à deteção e controlo de indivíduos, à ingerência em comunicações privadas (e-mail) ou à filtragem dos resultados de buscas;

29.

Exorta a Comissão a apresentar propostas de criação de um quadro jurídico da UE que obrigue as empresas que participam em concursos públicos nos Estados-Membros a submeter as TIC utilizadas a avaliações de impacto sobre os direitos humanos, começando pela fase de I&D, e a zelar pela não cumplicidade em possíveis violações dos direitos humanos em países terceiros;

30.

Considera que as empresas devem conceber e implementar práticas comerciais destinadas a controlar o possível impacto de novos produtos das TIC nos direitos humanos, inclusivamente na fase de investigação e desenvolvimento, e a zelar pela não cumplicidade em possíveis violações dos direitos humanos em países terceiros; apela à Comissão para que proporcione às empresas da UE uma vasta gama de informações, a fim de garantir o equilíbrio correto entre os interesses comerciais e a responsabilidade social das empresas.

31.

Lamenta, a este respeito, a participação ativa de empresas europeias e empresas internacionais que operam na UE em países cujos governos praticam políticas repressivas contra ativistas dos direitos humanos e dissidentes políticos no que respeita aos direitos digitais, ao acesso à Internet e às TIC; exorta a Comissão a excluir as empresas envolvidas em tais atividades dos procedimentos de adjudicação de contratos e de concursos públicos da UE;

32.

Insta a Comissão a disponibilizar às empresas da UE um vasto leque de informações e orientação, com base nos «Princípios Ruggie» das Nações Unidas, para garantir o respeito dos interesses comerciais e da responsabilidade social das empresas;

33.

Sublinha a necessidade de considerar o efeito da fixação de padrões tecnológicos para as TIC e para os produtos e serviços de telecomunicações na UE, quando esses bens e serviços são exportados para países terceiros nos quais conceitos como «interceção legal» têm implicações diferentes, por exemplo onde o Estado de direito não exista;

34.

Reconhece que a Internet se tornou um espaço público, bem como um mercado, para o qual a livre circulação de informações e o acesso às TIC são indispensáveis; portanto, considera que é imperativo promover e proteger simultaneamente as liberdades digitais e o comércio livre para incentivar e apoiar o livre intercâmbio de ideias e para aumentar as oportunidades comerciais para os cidadãos da UE numa economia global cada vez mais digital;

35.

Insta a inclusão de cláusulas de condicionalidade nos ACL da UE, estipulando medidas de proteção transparentes, preservando o acesso ilimitado à Internet e garantindo a livre circulação da informação;

36.

Apela à Comissão e ao Conselho para que garantam que os mandatos de negociações comerciais multilaterais e bilaterais, assim como o desenrolar das negociações propriamente ditas, conduzem efetivamente à concretização de objetivos importantes da UE, nomeadamente a promoção dos seus valores da democracia e do Estado de direito, a concretização de um verdadeiro mercado único digital e o respeito da sua política de cooperação para o desenvolvimento;

37.

Convida a UE a conceder apoio político às empresas europeias que sejam confrontadas com pedidos para remover conteúdos gerados pelos utilizadores ou prestar informações pessoais recorrendo a meios que violam os direitos fundamentais e reduzem a liberdade de atividade comercial;

38.

Convida a UE a recusar e a minimizar o impacto extraterritorial da legislação de países terceiros sobre cidadãos e empresas da UE em linha;

39.

Salienta que o comércio eletrónico se desenvolveu fora dos quadros de regulamentação tradicionais; sublinha a importância de uma maior cooperação internacional a nível da OMC e da OMPI, a fim de proteger e garantir o desenvolvimento do mercado digital mundial; insta a uma revisão e atualização do atual Acordo sobre as Tecnologias da Informação (ATI) na OMC e convida a UE a explorar as possibilidades de um Acordo Internacional sobre a Economia Digital (AIED);

40.

Convida a Comissão a não transferir a aplicação e a reivindicação de direitos de autor para operadores económicos em futuros acordos comerciais, assim como a garantir que as ações que interferem com a lei relativa à liberdade da Internet apenas podem ser levadas a cabo ao abrigo do primado do Direito e sob uma autoridade judicial;

41.

Considera que o acesso limitado para empresas e consumidores em linha da UE a mercados (digitais) através da censura generalizada em países terceiros constitui uma medida protecionista e um entrave comercial; convida a Comissão a apresentar uma estratégia que desafie as medidas de países terceiros destinadas a limitar o acesso das empresas da UE aos seus mercados em linha;

42.

Insta a UE a empenhar-se para garantir que a regulamentação da Internet e das TIC se mantenha a um nível justificado e adequado e seja empreendida apenas quando a UE o considerar necessário;

43.

Insta a que as tecnologias de repressão visadas sejam incluídas no Acordo de Wassenaar;

44.

Convida a Comissão, o Conselho e o Serviço Europeu para a Ação Externa a darem apoio político às empresas europeias que operam em países terceiras e sejam confrontadas com pedidos para remover conteúdos gerados pelos utilizadores, reduzir a liberdade de prestação de serviços ou prestar informações pessoais recorrendo a meios que violem os direitos fundamentais; salienta que as empresas do setor digital operam habitualmente à escala internacional e que a legislação de um país terceiro pode afetar negativamente os utilizadores e consumidores europeus; convida ainda, por conseguinte, o Conselho e a Comissão a zelarem por que o impacto da legislação de países terceiros nas pessoas singulares ou coletivas que operam na UE seja minimizado;

45.

Salienta que um maior envolvimento e regulação governamental da Internet prejudicam a sua natureza aberta e sem restrições, limitando assim o potencial de aumento do comércio eletrónico e a atividade das empresas da UE que operam na economia digital; considera que a abordagem multilateral é a mais adequada para garantir o equilíbrio entre os interesses públicos e privados na Internet e no mercado mundial; apela a um esforço internacional no sentido da construção das infraestruturas necessárias para a expansão da economia digital, incluindo regimes regulamentares liberais, e exorta os países em desenvolvimento a aumentarem os benefícios mútuos em conformidade com o princípio do comércio para a mudança;

46.

Considera que o acesso limitado das empresas da UE aos mercados digitais e aos consumidores em linha através, nomeadamente, da censura estatal maciça ou do acesso restrito ao mercado de fornecedores europeus de serviços em linha em países terceiros constituem uma barreira comercial; convida a Comissão e o Conselho a incluírem um mecanismo de salvaguarda em todos os acordos comerciais futuros, nomeadamente os que contenham disposições com impacto nos serviços em linha e nas comunidades de utilizadores em linha que partilham informações, a fim de garantir que as empresas de TIC da UE não sejam forçadas por terceiros a limitar o acesso a sítios Web, remover conteúdos gerados pelos utilizadores ou facultar informações pessoais, como endereços IP pessoais, de uma forma que viole os direitos e liberdades fundamentais; convida, além disso, o Conselho e a Comissão a desenvolverem uma estratégia que desafie as medidas de países terceiros destinadas a limitar o acesso das empresas da UE aos mercados mundiais em linha;

47.

Insta a Comissão a apresentar um novo projeto de quadro regulamentar para a exportação de produtos de dupla utilização que aborde a exportação potencialmente nociva de produtos e serviços das TIC para países terceiros e que preveja um papel de coordenação e de controlo por parte da Comissão;

Governo da Internet

48.

Considera que um processo de tomada de decisões transparente e realizado em cooperação é essencial para garantir o respeito pela natureza aberta e participativa da Internet; considera que qualquer debate sobre a regulamentação relativa à Internet deve ser aberto e envolver todas as partes interessadas — especialmente as especializadas na proteção dos direitos fundamentais — e os utilizadores quotidianos da Internet; considera que a UE deve desempenhar um papel de liderança no desenvolvimento das regras de base da liberdade digital e das regras de comportamento no ciberespaço, incluindo mecanismos de resolução de litígios, tendo também em conta conflitos de jurisdição;

49.

Observa que atualmente a estrutura da Internet é relativamente não regulamentada e que é governada por uma abordagem multiparticipada; sublinha a necessidade de a UE garantir que o modelo multiparticipado seja inclusivo e que as pequenas empresas, bem como os utilizadores e os intervenientes da sociedade civil não sejam dominados por um número reduzido de grandes empresas e intervenientes governamentais;

50.

Considera que a cooperação entre governos e agentes privados em questões de TIC não se deve basear na imposição de obrigações diretas e indiretas aos prestadores de serviços de Internet no sentido de adotarem papéis delegados de execução da lei através do policiamento e regulação da Internet;

51.

Frisa a importância de uma estratégia global da UE para o governo da Internet, bem como para questões relacionadas com a regulamentação de telecomunicações, recordando que é governada a nível internacional através da União Internacional das Telecomunicações, na qual cada um dos EstadosMembros da UE tem direito de voto;

52.

Manifesta a sua preocupação quanto às propostas de coligações governamentais e empresariais que procuram introduzir supervisão regulamentar e um aumento do controlo privado e governamental sobre as operações da Internet e das telecomunicações;

53.

Exorta a UE a abordar e a resistir ao impacto extraterritorial da legislação de países terceiros, nomeadamente a legislação em matéria de DPI dos Estados Unidos, sobre cidadãos, consumidores e empresas da UE; neste contexto, apela à Comissão para que apresente rapidamente a sua estratégia de computação em nuvem na UE, como realçado na Agenda Digital para a Europa;

54.

Recorda que a Internet, o armazenamento e a ligação de dados e as TIC são partes essenciais da infraestrutura crítica da UE;

55.

Lamenta a pressão existente na UE para exigir mais poderes para bloquear páginas da Internet, tendo em conta que tal deveria ser sempre uma medida de último recurso;

56.

Apoia fortemente o princípio da neutralidade da Internet, ou seja, assegurar que os fornecedores de serviços de Internet não bloqueiam, discriminam, prejudicam ou degradam — inclusivamente através do preço — a capacidade de qualquer um utilizar um serviço para aceder, usar, enviar, publicar, receber ou oferecer qualquer conteúdo, aplicação ou serviço da sua escolha, independentemente da fonte ou do alvo;

57.

Considera que é necessária uma maior cooperação mundial para manter e modernizar os direitos de propriedade intelectual no futuro, o que é fundamental para garantir a inovação, o emprego e um comércio mundial aberto;

58.

Apela aos Estados-Membros e à Comissão para que desenvolvam uma política em matéria de DPI, a fim de que aqueles que assim o desejem possam continuar a criar os seus próprios conteúdos e a partilhá-los sem adquirirem DPI;

59.

Insta a Comissão a propor um novo quadro regulamentar para o comércio em linha transfronteiriço, uma avaliação e revisão da Diretiva relativa à Sociedade da Informação (2001/29/CE) para garantir a previsibilidade e flexibilidade do regime relativo aos direitos de autor da UE e uma revisão da Diretiva sobre o Respeito pelos Direitos de Propriedade Intelectual (IPRED), que equilibraria a necessidade da devida reforma e proteção dos direitos de autor com a necessidade de proteger os direitos fundamentais em linha e preservar a Internet aberta e serviria como base para disposições sobre os direitos de propriedade intelectual e acordos em futuros ACL;

Uma estratégia de liberdade digital

60.

Reconhece que os direitos humanos também devem ser protegidos em linha e acredita que as TIC devem ser integradas em todos os programas da UE, especialmente na Política Europeia de Vizinhança e nas parcerias estratégicas, para promover este esforço;

61.

Insta a UE a reconhecer as liberdades digitais como direitos fundamentais e como pré-requisitos indispensáveis para desfrutar dos direitos humanos universais, como a privacidade, a liberdade de expressão, a liberdade de reunião e o acesso à informação e para garantir a transparência e a responsabilidade na vida pública;

62.

Insta a Comissão e o Conselho a apoiarem, formarem e habilitarem os defensores dos direitos humanos, os ativistas da sociedade civil e os jornalistas independentes que usam TIC nas suas atividades e a defenderem os direitos fundamentais conexos de privacidade, liberdade de expressão, liberdade de reunião e liberdade de associação em linha;

63.

Solicita aos Estados-Membros que não usem a exceção à ordem pública como medida restritiva para limitar os direitos fundamentais de reunião e de manifestação das organizações da sociedade civil e recorda que tal exceção tem de ser fundamentada e proporcional;

64.

Solicita apoio político e diplomático para as liberdades digitais em países beneficiários de ajuda da UE, para além de programas de assistência;

65.

Considera que a limitação das liberdades digitais deve ser plenamente tomada em conta nas relações da UE com países terceiros e que os países beneficiários de ajuda da UE, à exceção dos países em situações de conflito graves ou de catástrofe, ou em situações de pós-catástrofe e pós-conflito imediatas, devem ser obrigados a utilizar as TIC para aumentar a transparência e a responsabilização;

66.

Insta o Conselho e a Comissão a incluírem, em negociações de adesão e negociações sobre acordos-quadro com países terceiros, diálogos sobre direitos humanos, negociações comerciais e todas as formas de contacto relacionadas com os direitos humanos, cláusulas de condicionalidade que estipulem a necessidade de respeitar e garantir o acesso ilimitados à Internet e as liberdades digitais em linha;

67.

Insta a Comissão e o Conselho a promoverem e preservarem padrões elevados de liberdade digital na UE, nomeadamente através da codificação do princípio de neutralidade da rede em regulamentação apropriada, a fim de reforçar a credibilidade da União no âmbito da promoção e defesa das liberdades digitais em todo o mundo;

68.

Considera que a sinergia do comércio, da segurança e das políticas externas da UE e a coerência entre os seus valores e os seus interesses são indispensáveis caso a União pretenda alavancar plenamente o seu poder económico e atuar como interveniente global na defesa das liberdades digitais;

69.

Considera essencial para uma ação eficaz e ágil que haja coordenação e iniciativas diplomáticas conjuntas com outros países da OCDE em matéria de desenvolvimento e execução duma estratégia de liberdade digital;

70.

Exorta a Comissão e o Conselho a adotarem, o mais depressa possível, uma Estratégia para a Liberdade Digital na política externa da UE;

o

o o

71.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e Vice-Presidente da Comissão e ao SEAE.


(1)  http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/HRC/RegularSessions/Session20/Pages/ResDecStat.aspx

(2)  Resolução aprovada por unanimidade pelo Conselho da UIP na sua 189.a sessão (Berna, 19 de outubro de 2011) — http://www.ipu.org/english/issues/hrdocs/189/is01.htm

(3)  http://eeas.europa.eu/delegations/un_geneva/press_corner/focus/events/2012/20120625_en.htm

(4)  Textos Aprovados, P7_TA(2012)0250.

(5)  Textos Aprovados, P7_TA(2012)0237.

(6)  Textos Aprovados, P7_TA(2012)0140.

(7)  Textos Aprovados, P7_TA(2012)0126.

(8)  Textos Aprovados, P7_TA(2012)0059.

(9)  JO L 56 de 29.2.2012, p. 1.

(10)  Textos Aprovados, P7_TA(2011)0511.

(11)  Textos Aprovados, P7_TA(2011)0364.

(12)  Textos Aprovados, P7_TA(2011)0334.

(13)  JO C 377 E de 7.12.2012, p. 135.

(14)  JO C 99 E de 3.4.2012, p. 101.

(15)  JO C 236 E de 12.8.2011, p. 33.

(16)  JO C 236 E de 12.8.2011, p. 24.

(17)  JO C 290 E de 29.11.2006, p. 107.

(18)  Textos Aprovados, P7_TA(2011)0406.

(19)  JO L 16 de 19.1.2012, p. 1.

(20)  JO L 87, 24.3.2012, p. 26.

(21)  http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001325/132540e.pdf