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COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES Apoio à utilização partilhada dos recursos do espetro radioelétrico no mercado interno /* COM/2012/0478 final */


COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES

Apoio à utilização partilhada dos recursos do espetro radioelétrico no mercado interno

(Texto relevante para efeitos do EEE)

1.           Introdução

A União Europeia encontra-se perante um crescimento exponencial do tráfego de dados sem fios. A conectividade sem fios está a tornar-se cada vez mais importante para a economia. Fontes da indústria preveem que o tráfego móvel global de dados aumentará 26 % anualmente até 2015. Nessa altura, existirão 7,1 mil milhões de telefones, tablets e outros dispositivos móveis capazes de se ligar à Internet. A banda larga sem fios tornou-se uma forma omnipresente de acesso à Internet para os cidadãos na Europa e os operadores da rede móvel terão de responder a uma procura crescente por parte dos utilizadores. Muitos outros setores económicos para além das comunicações eletrónicas devem também beneficiar das inovações em matéria de comunicação sem fios e aplicações de transmissão de dados a alta velocidade, que podem melhorar a produtividade e garantir um crescimento sustentável.

A resposta às necessidades crescentes de espetro em matéria de conectividade sem fios é limitada pela falta de espetro livre e pelo preço elevado associado à redistribuição de espetro para novas utilizações, em termos de custo, tempo de resposta e a necessidade ocasional de desconectar utilizadores estabelecidos. Para satisfazer a procura crescente, é essencial inovar e uma utilização mais eficiente. Durante a próxima década, o progresso tecnológico pode permitir a partilha dos direitos de acesso simultâneo a uma banda de frequência específica a um número cada vez maior de utilizadores. Todavia, é necessário que o quadro regulamentar permita esta realidade.

A utilização partilhada do espetro envolve diferentes utilizadores que dispõem todos do direito de utilizar uma dada banda de frequência numa variedade de diferentes relações. Na prática, esta possibilidade disponibiliza recursos espetrais adicionais e diminui as dificuldades de acesso ao espetro para novos utilizadores. Um estudo realizado para a Comissão Europeia revela que a obtenção de recursos adicionais de espetro partilhado para a banda larga sem fios poderia criar benefícios económicos líquidos significativos para a UE. Com um aumento de entre 200 a 400 MHz no espetro de acesso partilhado para a banda larga sem fios, os cenários analisados no estudo revelam um aumento líquido, até 2020, do valor da economia europeia na ordem de várias centenas de milhar de milhões de euros[1].

Dado que a gestão do espetro é um pré-requisito essencial para o mercado único digital, esta iniciativa contribui, por conseguinte, diretamente para o cumprimento dos objetivos da Estratégia Europa 2020 e, uma vez implementada, poderá contribuir para o reforço da economia europeia. Beneficiar plenamente de todas as vantagens da partilha de espetro exige não só a eliminação das atuais barreiras normativas ao lançamento de tecnologias inovadoras de acesso rádio mas também a facilitação ativa da partilha. De acordo com o Programa da Política do Espetro Radioelétrico (RSPP)[2], a Comissão procura nesse sentido o maior apoio político possível para as fases propostas em matéria de estímulo ao desenvolvimento de inovações nas tecnologias sem fios na UE, de modo a garantir que o espetro atualmente atribuído seja explorado o mais possível.

A presente comunicação estabelece o quadro regulamentar, os impulsionadores, os estimuladores e os desafios inerentes a uma utilização mais partilhada do espetro. A secção 5 descreve a nova abordagem proposta para incentivar a partilha do espetro e oferecer-lhe segurança jurídica. A secção 6 propõe as próximas fases para promover a utilização partilhada do espetro no mercado interno em bandas não licenciadas e licenciadas.

2.           Quadro regulamentar

O quadro regulamentar da UE para as comunicações eletrónicas[3] procura facilitar o acesso ao espetro com base no sistema de autorização o menos oneroso possível. É favorecida a utilização de autorizações gerais, exceto quando sejam claramente necessárias licenças individuais, por exemplo, para assegurar proteção contra interferências prejudiciais. O quadro define os princípios de utilização e gestão eficientes do espetro, bem como a neutralidade tecnológica e em matéria de serviço. O RSPP alarga estes princípios a todas as áreas políticas da UE relevantes[4]. No sentido de aumentar a eficiência e a flexibilidade, o quadro exige que os Estados‑Membros, em cooperação com a Comissão, promovam, sempre que adequado, a utilização coletiva do espetro, bem como a sua utilização partilhada[5].

Em linha com o objetivo político da União de atribuir atempadamente o espetro suficiente e adequado e para satisfazer melhor a crescente procura de tráfego de dados sem fios, o RSPP tem por objetivo identificar pelo menos 1 200 MHz até 2015, bem como facilitar o acesso ao espetro através de autorizações gerais[6]. São explicitamente referidas abordagens para a partilha do espetro, por exemplo, redes de rádio de acesso local (RLAN), pequenas estações celulares de base e redes em malha[7]. O RSPP exige também que a Comissão, em cooperação com os Estados-Membros, avalie a viabilidade de expandir a atribuição de espetro não licenciado para sistemas de acesso sem fios[8]. O cumprimento destes objetivos exige soluções adaptadas às diferentes situações de autorização. Para além das bandas isentas de licença e das bandas licenciadas exclusivamente, existem também bandas para as quais um conjunto de utilizadores possuem licenças, ou seja, para as quais os direitos de utilização não são exclusivos.

Por fim, o RSPP estabelece um inventário de espetro para identificar, nomeadamente, oportunidades de partilha de espetro[9]. Ao executar estas ações, a Comissão deve garantir que os direitos consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da UE são respeitados[10].

3.           Fatores de impulso e de estímulo da utilização partilhada do espetro

A utilização partilhada do espetro refere-se a situações em que se permite a um conjunto de utilizadores e/ou dispositivos independentes o acesso à mesma gama de frequências sob determinadas condições. Tal como ilustrado pelos três exemplos seguintes, as partes interessadas estão a adotar cada vez mais possibilidades de partilha emergentes para dar resposta às necessidades crescentes em termos de conectividade sem fios. Para maximizar as vantagens da utilização eficiente do espetro, importa apoiar esta tendência garantindo, ao mesmo tempo, que não se verifica uma deterioração da qualidade dos serviços prestados.

3.1.        Banda larga sem fios

As redes Wi-Fi são os exemplos mais conhecidos da forma como os cidadãos e as empresas europeus partilham atualmente o espetro. Funcionando em bandas harmonizadas para RLAN[11], as infraestruturas de banda larga sem fios baseadas em tecnologias Wi-Fi já suportam ligações Internet a preços acessíveis e de fácil acesso em alguns Estados-Membros. Esta característica estimula o desenvolvimento de serviços em linha para realizar o crescimento potencial e o desenvolvimento de soluções empresariais novas e inovadoras na Europa[12].

Mais de metade do tráfego de todos os telefones inteligentes parece ser dirigido através de redes Wi-Fi e este tráfego nómada está a crescer 4 a 6 vezes mais rapidamente do que o tráfego móvel. As vendas globais de equipamento com ligação Wi-Fi deverão alcançar 3,5 mil milhões de unidades em 2014[13]. Os operadores de redes móveis apoiam-se também nas mesmas frequências RLAN isentas de licenças para efetuarem o offloading de dados no sentido de aumentar a capacidade da rede, melhorar a cobertura no interior de edifícios e reduzir despesas.

Os operadores que dispõem de licenças exclusivas podem também aumentar a eficiência das respetivas redes móveis através da utilização comum de frequências em zonas geográficas específicas. Em 2011, o Grupo para a Política do Espetro de Radiofrequências (RSPG) concluiu que a partilha do espetro poderia fomentar uma utilização mais eficiente dos recursos, desde que as implicações em termos de concorrência sejam cuidadosamente consideradas e que os acordos de partilha necessários sejam permitidos em todos os Estados‑Membros[14].

A utilização partilhada de frequências de banda larga sem fios licenciadas ou isentas de licença permite a redução de despesas por parte dos operadores de redes móveis, conectividade à Internet a preços acessíveis e possibilidades de partilha de infraestruturas.

3.2.        A sociedade ligada sem fios

As necessidades crescentes de conectividade sem fios surgem não só da banda larga sem fios mas também de aplicações, por exemplo, comunicações para contadores/redes ou máquina‑máquina (M2M). Atualmente, cerca de 80 % das novas tecnologias sem fios abrangidas pelo Instituto Europeu de Normas de Telecomunicações (ETSI) são desenvolvidas para funcionar em bandas partilhadas isentas de licença[15]. Essas inovações geram vantagens de várias formas, por exemplo, aplicações domóticas baseadas em sensores sem fios que podem aumentar a sustentabilidade do quotidiano dos cidadãos da UE - por exemplo, desligando as luzes quando não estamos em casa ou regulando os sistemas de ar condicionado de acordo com a temperatura.

A Conferência Europeia das Administrações dos Correios e Telecomunicações (CEPT) constatou recentemente que, por exemplo, apenas na banda harmonizada isenta de licença 863-870 MHz, são vendidos anualmente na Europa pelo menos 40 milhões de dispositivos sem fios (incluindo comandos à distância, alarmes e sensores)[16]. Estes chamados Equipamentos de Curto Alcance (SRD)[17] também tornam as empresas mais eficientes através da redução das despesas e do aumento da produtividade, por exemplo, com recurso a sistemas RFID em aplicações logísticas e de venda a retalho.

Todas estas aplicações da Internet das Coisas (IoT) funcionam em bandas harmonizadas isentas de licença. O valor destas bandas é significativo, visto serem livremente acessíveis por qualquer dispositivo que cumpra as normas relevantes de acesso ao espetro para evitar interferências sem necessidade de obter uma licença de espetro.

No entanto, as PME e os inovadores, para os quais este acesso é especialmente importante, têm também de garantir que as suas tecnologias podem responder ao potencial de interferência em bandas partilhadas sempre que os direitos de proteção não sejam assegurados por uma Autoridade Reguladora Nacional (ARN). Por conseguinte, as inovações sem fios não são apenas estimuladores para a partilha de espetro mas tornam-se também impulsionadores para uma utilização mais partilhada, tal como demonstrado pelos acordos de partilha emergentes[18].

A tendência para uma sociedade conectada demonstra o valor acrescentado da existência de barreiras reduzidas ao acesso ao espetro em bandas partilhadas isentas de licença como a base para a inovação sem fios que estimula o desenvolvimento e a implantação de tecnologias sem fios mais resilientes.

3.3.        Investigação e tecnologias inovadoras

A exploração de todas as vantagens da partilha do espetro exige investigação dedicada ao acesso dinâmico ao espetro, tal como apoiada pelo 7.º Programa-Quadro (PQ7), com projetos dedicados a tecnologias que fomentam a partilha de radiocomunicações cognitivas, espetro dinâmico e agregação do espetro[19]. Desde o início do PQ7, foram investidos cerca de 50 milhões de euros ao abrigo de cada um dos programas de trabalho bienais em investigação relacionada com o espetro.

Estes projetos deram origem a avanços sucessivos. A partilha dinâmica do espetro já está incluída nas normas atuais para RLAN a 5 GHz por forma a permitir a partilha com os radares. As tecnologias de radiocomunicações cognitivas oferecem serviços em coexistência com transmissores de televisão, os serviços primários na banda UHF, mediante a utilização de informação com base na localização para determinar espetro não utilizado nas e entre as bandas de frequência de transmissão (denominados «espaços brancos»). As experiências na Alemanha, na Eslováquia e no Reino Unido demonstram que esta abordagem se aproxima da implantação prática.

A Comissão apoia esta tendência emitindo um mandato de normalização para harmonizar o acesso a informação baseada na localização para estas tecnologias através de bases de dados de geolocalização[20]. Por forma a permitir o desenvolvimento e a utilização de tais tecnologias na Europa, o mandato identifica áreas em que são necessárias normas para fomentar o cumprimento da legislação da UE e nacional relativa à colocação no mercado e à utilização de equipamento rádio, nomeadamente com a Diretiva R&TTE[21].

Centrando-se na criação de economias de escala para as primeiras implantações, a importância da utilização dos «espaços brancos» não se limita a uma banda específica. Podem efetuar-se progressos no sentido da exploração de tecnologias de radiocomunicação cognitivas através, por exemplo, da deteção de outros utilizadores do espetro. Está também a investigar-se a forma de criar redes auto-organizativas que terão por objetivo minimizar a interferência cruzada entre pequenas estações celulares de base em gerações futuras de tecnologia de banda larga sem fios.

A investigação permitiu a abertura do acesso ao espetro numa base partilhada, garantindo ao mesmo tempo a proteção dos serviços primários. As tecnologias de radiocomunicação cognitivas estão hoje a ser desenvolvidas com o apoio de mandatos para normas harmonizadas e experiências em projetos europeus de investigação. Podem esperar-se progressos na área da deteção e da utilização de pequenas estações celulares de base.

4.           Desafios a uma maior utilização partilhada do espetro

Tal como os exemplos da secção anterior demonstram, o espetro rádio é um recurso natural extremamente valioso e finito que pode ser reutilizado mais eficientemente com recurso aos avanços da tecnologia. Em 2011, o RSPG detetou uma grande procura de utilizações partilhadas e constatou: «existe uma necessidade de mais progressos em matéria de mecanismos reguladores adequados no que se refere à partilha do espetro»[22].

O desafio principal para as ARN é encontrar formas adequadas de autorizar o acesso partilhado ao espetro de uma banda, ou seja, permitir que dois ou mais utilizadores utilizem a mesma gama de frequência ao abrigo de um acordo de partilha definido. Até à data, os utilizadores que partilham bandas isentas de licença, tais como SRD, não têm o direito de ser protegidos contra interferências prejudiciais, ao passo que os utilizadores que partilham frequências com base em licenças individuais podem beneficiar de garantias regulamentares a este respeito. Para se verificarem progressos nesta matéria, as ARN têm de responder aos desafios mencionados infra.

4.1.        Gerir interferências prejudiciais para eliminar a incerteza

É essencial garantir a coexistência de diferentes aplicações na mesma gama de frequências para que possam ser exploradas oportunidades de partilha. As aplicações não devem interferir entre si ao ponto de degradar gravemente as respetivas funções. Têm de ser definidos níveis aceitáveis de interferências e estratégias adequadas para a sua redução entre utilizadores ou definir condições regulamentares para o acesso partilhado a uma banda.

A redução das interferências pode ser alcançada mediante acordos de partilha fiáveis baseados em regras e condições de partilha de uma banda claras e eficientes, criando certeza para utilizadores estabelecidos e potenciais.

Além disso, pressupostos transparentes em estudos de compatibilidade iniciais e direitos de proteção claros para os utilizadores primários, incluindo o controlo da aplicação dos níveis acordados de redução de interferências, são fatores importantes para aumentar a previsibilidade e a aceitação mútua dos acordos de partilha.

4.2.        Criar incentivos e salvaguardas suficientes para todas as partes interessadas

Encontrar o equilíbrio entre o impacto para o utilizador estabelecido e as limitações de utilização para qualquer utilizador adicional constitui um desafio. Apesar de ser necessário assegurar aos utilizadores estabelecidos que os utilizadores adicionais cumprirão as regras de partilha, podem também existir despesas para os utilizadores estabelecidos com a garantia de uma boa qualidade de serviço para os novos utilizadores relacionadas, por exemplo, com tecnologias de redução de interferências ou recetores mais resilientes.

A partilha tem de oferecer vantagens a todos os utilizadores. Os utilizadores estabelecidos, que são sujeitos a uma definição de preço do espetro ou que tenham de implantar tecnologias melhoradas que permitam aos utilizadores adicionais o acesso mediante acordos de partilha atraentes, poderão solicitar uma compensação financeira.

Será também necessário garantir que os acordos de partilha entre utilizadores não afetem negativamente a concorrência (em conformidade com as disposições do Tratado[23]) e ter em consideração o impacto das possibilidades de partilha na conceção de procedimentos futuros de atribuição de espetro nos Estados-Membros.

4.3.        Capacidade de bandas isentas de licença

Dado que os utilizadores em bandas isentas de licença não beneficiam de qualquer proteção regulamentar relativamente à congestão, não é claro se as bandas partilhadas existentes possuem capacidade suficiente - por exemplo, as atuais bandas RLAN podem acomodar o crescimento do acesso privado à banda larga e ao offloading dos dados do tráfego móvel? No sentido de definir objetivamente previsões de congestão e melhorar a fiabilidade dos acordos de partilha nestas bandas para todos os utilizadores, as ARN podem beneficiar de uma monitorização da utilização.

Uma nova geração de equipamento RLAN (conhecido como 802.11ac), cuja entrada no mercado está prevista para finais de 2012, poderá aproximar-se das velocidades para o utilizador das redes de linhas fixas. Apesar de dependerem do espetro RLAN existente a 5 GHz, estes progressos irão exigir canais de frequência muito larga, cujo número é atualmente limitado.

Dados os atuais padrões de utilização de Wi-Fi, incluindo por operadores móveis para o offloading de dados, deve também ter-se em conta a eventual necessidade de se identificar mais espetro «fixo sem fios» não licenciado como parte da busca de espetro de banda larga ou como um recurso comum complementar.

Fomentar uma maior utilização partilhada do espetro exige:

-           Responsabilizar mutuamente os utilizadores em relação aos limites aceitáveis de interferências e estratégias adequadas para a sua redução;

-           Oferecer segurança jurídica sobre regras e condições aplicáveis, procedimentos de controlo da execução, bem como transparência sobre pressupostos de compatibilidade e direitos de proteção;

-           Incentivar o investimento em tecnologias melhoradas benéficas para os utilizadores estabelecidos e adicionais, salvaguardando e fomentando a concorrência;

-           Identificar canais de frequência de banda larga para o desenvolvimento das RLAN e fornecer previsões de congestão por forma a aumentar a previsibilidade e a fiabilidade das bandas partilhadas mais importantes;

-           Garantir que qualquer transição de direitos de utilização exclusiva para utilização partilhada aumenta a concorrência de utilizadores adicionais e não cria, nomeadamente, vantagens concorrenciais indevidas para os atuais ou futuros detentores de direitos.

5.           Em direção a um quadro comum para o acesso partilhado ao espetro na Europa

Na medida em que as tecnologias sem fios emergentes são cada vez mais capazes de cooperar «inteligentemente» entre si para evitar interferências mútuas, as ARN têm necessidade de meios adequados para pôr em prática acordos de partilha apropriados para fomentar a utilização partilhada dos recursos do espetro. Por conseguinte, a Comissão propõe desenvolver dois dispositivos adicionais para oferecer mais oportunidades de acesso ao espetro para tecnologias inovadoras e para incentivar uma maior e mais eficiente utilização dos recursos do espetro existentes:

(1) Uma abordagem da UE para identificar oportunidades de partilha benéficas em bandas harmonizadas ou não harmonizadas; assim como

(2) Direitos de acesso partilhado ao espetro sob a forma de dispositivos regulamentares para autorizar possibilidades de partilha licenciadas com níveis garantidos de proteção contra interferências.

5.1.        Identificação de oportunidades de partilha benéficas

Podem ser identificadas no mercado interno oportunidades de partilha benéficas (OPB), em bandas de frequência licenciadas e isentas de licença, sempre que o benefício socioeconómico líquido combinado decorrente da partilha de uma banda por várias aplicações seja superior ao benefício socioeconómico líquido de uma única aplicação, tendo em conta as despesas adicionais decorrentes da utilização partilhada[24].

Identificar OPB numa banda específica exige transparência sobre os acordos de partilha que seriam aplicáveis, nomeadamente i) as condições de partilha, ou seja, os parâmetros técnicos definidos pela ARN que determinam a hierarquia de acesso numa banda partilhada[25]; e ii) as regras de partilha, ou seja, as disposições comuns de utilização que permitem a partilha, as quais podem ser mandatadas pela ARN ou definidas pelos utilizadores com base em normas, protocolos comuns ou acordos de partilha que cumpram as leis da concorrência[26].

Para fomentar a inovação nas tecnologias sem fios e para estimular a identificação de OPB, as partes interessadas têm de dispor da possibilidade de solicitar à ARN pertinente, com base num processo transparente, o direito de utilizar bandas do espetro numa base partilhada. Qualquer requerente OPB teria de demonstrar a capacidade de partilhar uma banda sem comprometer indevidamente o direito do utilizador estabelecido de utilizar as frequências.

Para potenciar as economias de escala do mercado interno por forma a incentivar os investimentos, a UE tem de definir um processo de identificação de OPB para garantir uma aplicação coerente e consistente em todos os Estados-Membros quando estes tiverem de responder a casos individuais. Aplicado às bandas harmonizadas e às não harmonizadas, este processo poderia incluir os seguintes elementos principais:

· Um calendário harmonizado;

· Uma possibilidade de negociação entre o requerente e o utilizador estabelecido, na qual a ARN agiria como mediador, para clarificar os termos da OPB, incluindo i) os dispositivos para prevenir a deterioração da qualidade de serviço e ii) a distribuição das despesas relacionadas com a partilha (caso existam);

· A análise dos benefícios socioeconómicos teria de ter em conta, entre outros fatores i) as condições sob as quais as atribuições existentes foram feitas, incluindo as despesas efetuadas, e ii) as expectativas legítimas dos detentores de direitos estabelecidos bem como dos requerentes OPB. Igualmente importantes são iii) os efeitos dinâmicos que as OPB poderiam ter sobre a concorrência, bem como sobre os incentivos ao investimento para os utilizadores estabelecidos e potenciais novos utilizadores, respetivamente, no contexto de tecnologias convergentes;

· As formas para a ARN aprovar uma OPB e garantir uma maior utilização partilhada do espetro no sentido de alcançar a utilização mais eficaz possível do espetro, de acordo com a legislação da UE e nacional. Se adequado, e tendo em conta os direitos existentes, poderá incluir-se a possibilidade de aplicar medidas como incentivos tarifários ao nível do custo socioeconómico identificado da oportunidade;

· O fornecimento de informação a nível da UE sobre os pedidos de OPB e sobre o resultado dos processos nacionais subsequentes, bem como a possibilidade de avaliar as OPB no contexto do inventário do espetro e a identificação de OPB adequadas para pedidos em todo o mercado interno.

Na medida em que os avanços tecnológicos permitam mais oportunidades de partilha benéficas (OPB) no mercado interno, é necessário incentivar o investimento e encorajar os utilizadores do espetro a fazer uma melhor utilização do seu espetro atribuído definindo, em estreita cooperação com os Estados-Membros, um processo e os critérios principais a nível da UE para identificar OPB (por exemplo, numa Recomendação).

5.2.        Autorização do acesso ao espetro partilhado licenciado

Uma vez identificada e aprovada uma OPB numa banda específica, a mesma pode resultar num dividendo partilhado dos recursos adicionais do espetro partilhado, se as ARN dispuserem dos dispositivos adequados para autorizar o acesso partilhado ao espetro. Tais autorizações devem ser concedidas em conformidade com a legislação da UE e nacional aplicável, nomeadamente os artigos 3.º, 5.º, 6.º, 7.º, 13.º e 14.º da Diretiva relativa às autorizações[27] e tendo em conta os direitos existentes do utilizador estabelecido.

Para facilitar a identificação de OPB com incentivos baseados no mercado, os contratos de partilha de espetro poderiam servir como acordos juridicamente vinculativos que permitem aos utilizadores estabelecidos e aos requerentes OPB definir os respetivos direitos e obrigações, i. e., partilha de tecnologia e/ou de despesas. Para facilitar tais contratos, as ARN poderiam ser mandatadas para agir como conselheiros técnicos imparciais e para registar os termos de tais acordos. Os referidos contratos poderiam ser necessários para alterar os direitos de utilização existentes a nível nacional em acordo com o utilizador estabelecido.

Os detentores de direitos estabelecidos poderiam beneficiar da tranquilidade mútua que proporciona um contrato de partilha adequado propondo OPB, por exemplo, entidades públicas poderiam oferecer acesso a capacidades de espetro a operadores comerciais em troca de cofinanciamento das infraestruturas de rede para aplicações de banda larga dedicadas à proteção civil e assistência em situações de catástrofe (PPDR).

Se os inovadores puderem comparar oportunidades de partilha num mercado interno competitivo, os incentivos económicos encorajariam propostas para contratos de partilha com base em tecnologias inovadoras e fomentariam a coexistência de normas tecnológicas.

Além disso, permitir que os utilizadores negociem um nível adequado de proteção contra interferências prejudiciais e concluam contratos de partilha tornaria possível determinar OPB com base na utilização real do espetro. Esta situação constituiria uma melhoria em relação aos estudos tradicionais de compatibilidade técnica com base em modelos estatísticos de partilha do espetro.

No sentido de fornecer às partes contratantes as garantias regulamentares que justifiquem os investimentos necessários, as ARN necessitariam de poder atribuir direitos de acesso partilhado ao espetro (SSAR) com base em contratos de partilha juridicamente vinculativos para todos os utilizadores de uma gama de frequências específica.

Os SSRA poderiam, assim, tornar-se um dispositivo adicional para as ARN autorizarem o acesso partilhado ao espetro em bandas onde forem identificadas e aprovadas OPB, por exemplo, com licenças individuais para os utilizadores adicionais.

O RSPG frisou recentemente que uma abordagem de acesso partilhado licenciado (LSA) forneceria aos utilizadores adicionais direitos de acesso ao espetro e uma qualidade de serviço garantida. Concluiu afirmando que esta situação permitiria aos «utilizadores estabelecidos continuarem a utilizar o espetro fornecendo, ao mesmo tempo, capacidade em termos de espetro a outros utilizadores»[28].

Os contratos de partilha de espetro oferecerem aos utilizadores segurança jurídica, criando ao mesmo tempo incentivos com base no mercado, incluindo compensação financeira, para identificar mais OPB no mercado interno, se as ARN atribuírem direitos de acesso partilhado ao espetro a utilizadores adicionais de uma banda de frequência.

6.           Próximas etapas

Para incentivar o desenvolvimento de inovações sem fios na UE, é necessário melhorar continuamente as oportunidades de acesso harmonizado ao espetro em bandas isentas de licença e de espetro licenciado e criar novos dispositivos para uma maior utilização partilhada dos recursos do espetro radioelétrico no mercado interno. A Comissão propõe, assim, realizar as seguintes ações:

(1)       Identificar OPB em bandas de frequência licenciadas e isentas de licença:

· Desenvolvendo, em cooperação com os Estados-Membros, um processo coerente e consistente para identificar OPB, bem como critérios para avaliar os pedidos OPB apresentados a nível nacional em conformidade com a legislação da UE e nacional aplicável e tendo em conta os elementos principais mencionados na secção 5.1;

· Utilizando dados recolhidos durante o inventário efetuado pelo RSPP;

· Permitindo o desenvolvimento e a implantação de Dispositivos de Espaços Brancos com base em normas harmonizadas para bases de dados de geolocalização a conceber em resposta ao futuro mandato da Comissão. A parte inferior da banda UHF (nomeadamente, 470-698 MHz) deve constituir uma oportunidade de partilha pioneira, abrindo o caminho para a utilização desta abordagem noutras bandas.

(2)       Considerar a disponibilização de espetro isento de licença, harmonizado a nível da UE, em quantidade suficiente para inovações sem fios:

· Garantindo acordos de partilha previsíveis e fiáveis em bandas SRD, aplicando ao mesmo tempo os princípios de neutralidade tecnológica e de serviço, mediante atualizações contínuas da Decisão 2006/771/CE;

· Estudando e medindo a atual capacidade e potencial de congestão das bandas 2.4 e 5 GHz para o offloading de dados;

· Dependendo dos resultados dos estudos técnicos de partilha e do impacto no mercado, considerar a designação de espetro harmonizado isento de licença adicional para serviços RLAN (Wi-Fi) em 5 GHz, através de uma revisão da Decisão 2005/513/CE.

(3)       Definir, em cooperação com os Estados-Membros, uma via comum no sentido de permitir mais possibilidades de partilha, com base em acordos contratuais entre utilizadores:

· Recomendando um formato comum para os SSAR, uma terminologia comum para documentar as condições e normas de partilha e as melhores práticas nas autorizações de acesso partilhado, no sentido de facilitar os contratos, incluindo aspetos relacionados com a concorrência;

· Organizando uma consulta pública para identificar as necessidades do utilizador e as melhores práticas em termos de contratos de partilha, bem como eventuais necessidades de normalização para apoiar a adoção de soluções inovadoras;

· Desenvolvendo orientações para salvaguardar a utilização eficiente do espetro e fomentar a concorrência com base em contratos de partilha entre utilizadores que operam nos mercados.

[1]               Ver: Perspectives on the value of shared spectrum access (Perspetivas do valor do espetro de acesso partilhado), SCF Associates, fevereiro 2012 (SCF 2012).

[2]               Decisão 243/2012/UE, de 14 de março de 2012, JO L 81 de 21.3.2012, p. 7, artigo 4.º, n.º 1.

[3]               Diretiva 2009/140/CE, JO L 337 de 18.12.2009, p. 37 e artigo 5.º, n.º 1, e artigo 5.º, n.º 2, 5.º parágrafo, da Diretiva 2002/20/CE, JO L 108 de 24.4.2002, p. 21, com a redação que lhe foi dada em 2009.

[4]               Artigos 2.º e 3.º do RSPP.

[5]               Artigo 4.º, n.º 1, do RSPP.

[6]               Artigo 3.º, alíneas b) e g), do RSPP.

[7]               Nas redes celulares (por exemplo, UMTS, LTE ou WiMAX) utilizam-se as chamadas picocélulas ou femtocélulas para o offloading de dados dentro ou fora das frequências licenciadas, artigo 6.º, n.º 10, do RSPP.

[8]               Artigo 6.º, n.º 7, do RSPP.

[9]               Artigo 9.º, n.º 1, alínea b), do RSPP.

[10]             Comunicação da Comissão «Estratégia para a aplicação efetiva da Carta dos Direitos Fundamentais pela União Europeia», COM(2010) 573.

[11]             As bandas 2 400-2 483.5 MHz, 5 150-5 350 MHz, e 5 470-5 725 MHz.

[12]             Comunicação da Comissão «Um enquadramento coerente para reforçar a confiança no mercado único digital do comércio eletrónico e dos serviços em linha», COM(2011) 942.

[13]             SCF 2012.

[14]             RSPG11-374.

[15]             SCF 2012.

[16]             Projeto de relatório ECC 182.

[17]             Decisão 2006/771/CE.

[18]             Por exemplo, nas bandas 870-876 MHz e 915-921 MHz.

[19]             Nomeadamente, SAPHYRE, CogEU, Sacra, OneFit, Faramir, E3, Socrates, Walter, NEWCOM++, NetWorks, Samurai, EUWB, Ucells, CROWN.

[20]             Mandato de normalização para o CEN, o CENELEC e o ETSI para Sistemas Rádio Reconfiguráveis (RRS).

[21]             Diretiva 1999/5/CE, JO L 91 de 7.4.1999, p. 10.

[22]             RSPG11-392.

[23]             Tal como aprofundado nas Orientações da UE relativas aos acordos de cooperação horizontal, JO C 11 de 14.1.2011, p. 1.

[24]             Uma oportunidade de partilha benéfica (OPB) pode ser calculada mediante a seguinte fórmula: benefício líquido da aplicação A < (benefício líquido da aplicação A+B+C...) – (custo da partilha). Esta avaliação pode ser feita antes ou depois da reorganização de uma banda de espetro.

[25]             Ou seja, se os utilizadores partilham uma banda com base numa prioridade estabelecida ou em pé de igualdade.

[26]             São aplicáveis quer normas de coexistência estáticas para todos os utilizadores de uma banda ou normas de cooperação dinâmicas que determinam o acesso ao espetro para um utilizador de acordo com a utilização da mesma banda por outro utilizador.

[27]             Diretiva 2002/20/CE, JO L 108 de 24.4.2002, p. 21, com a redação que lhe foi dada em 2009.

[28]             RSPG11-392.