4.10.2012   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 299/103


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria, para o período de 2014 a 2020, o Programa Justiça»

COM(2011) 759 final – 2011/0369 (COD)

2012/C 299/19

Relator: Edouard DE LAMAZE

Em 9 de fevereiro de 2012, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria, para o período de 2014 a 2020, o Programa Justiça

COM(2011) 759 final — 2011/0369 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, que emitiu parecer em 28 de junho de 2012.

Na 482.a reunião plenária de 11 e 12 de julho de 2012 (sessão de 11 de julho), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 126 votos a favor, 1 voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE congratula-se com o objetivo de simplificação e de racionalização da presente proposta de regulamento e acolhe favoravelmente o facto de a Comissão ter optado pela opção B. A aglutinação dos programas Justiça Civil e Justiça Penal justifica-se pela semelhança de objetivos, de atores e de tipos de ações a financiar.

1.2   Em contrapartida, no que toca a este novo Programa Justiça para o período 2014-2020, e apesar das justificações de ordem jurídica apresentadas na proposta, o CESE continua a questionar a pertinência de associar aos dois primeiros objetivos específicos – a boa aplicação da legislação da União nos domínios da cooperação judiciária em matéria civil e penal e facilitar o acesso à justiça – um terceiro objetivo relativo à prevenção e à redução da procura e da oferta de droga. Para além de este último parecer decorrer do primeiro objetivo, o CESE chama a atenção para as consequências, em termos de mensagem veiculada, da enunciação de tal objetivo num texto de natureza regulamentar, com repercussões fortes, imediatas e diretas nos particulares, nas associações, nas ONG e noutros potenciais destinatários das subvenções, ou seja, poderia dar a impressão de que outras questões igualmente prementes, como por exemplo o combate ao tráfico de seres humanos, não são objeto de igual interesse por parte da Comissão.

1.3   Mais importante ainda, o CESE está preocupado com a mensagem transmitida pela Comissão e reitera a sua opinião, expressa repetidas vezes, de que as medidas de combate à droga se devem abordar mais sob uma perspetiva educativa, sanitária e social e menos sob uma perspetiva repressiva (1).

1.4   O CESE compartilha com a Comissão a preocupação de flexibilizar ao máximo a gestão dos fundos do presente programa, de modo a adaptar-se melhor às necessidades da sociedade civil, a proporcionar a máxima liberdade possível aos potenciais candidatos, bem como a promover a criatividade dos projetos e a ter em conta orientações políticas ulteriores.

1.5   No entanto, não sendo possível preestabelecer as dotações afetadas às diferentes prioridades, o CESE sublinha a importância de poder dispor antecipadamente de uma repartição do orçamento por objetivo, ainda que a título indicativo.

1.6   O CESE toma nota da intenção da Comissão de não atribuir ao objetivo específico relativo à droga mais fundos do que o orçamentado. O Comité solicita que a Comissão respeite escrupulosamente os seus compromissos e propõe a este respeito que os fundos arrecadados com o congelamento ou o confisco de produtos provenientes do tráfico de droga possam financiar parte deste objetivo, como previsto pela futura diretiva sobre o congelamento e o confisco de produtos do crime.

1.7   Apesar da complexidade do regulamento financeiro vigente, o CESE sublinha a importância de dar a conhecer aos cidadãos interessados as condições de acesso aos fundos, de forma clara e pedagógica e em todas as línguas da União. Tal encorajaria o surgimento de projetos e promoveria incontestavelmente a pertinência dos mesmos, incluindo nos Estados-Membros até à data sub-representados nos programas selecionados. Com efeito, o CESE salienta a necessidade de promover o igual acesso de todos os cidadãos da UE a estes programas.

1.8   O CESE defende que também se deve definir melhor a noção de valor acrescentado europeu, que constitui o principal critério de seleção dos programas. Dado o montante, por natureza limitado – ainda que em crescendo, o que é motivo de agrado para o CESE – da dotação financeira para o programa, o CESE destaca a importância de canalizar de forma mais rigorosa as subvenções para projetos em que o valor acrescentado europeu tenha sido claramente determinado. Devem-se encorajar os projetos transnacionais.

1.9   Dado que os programas de trabalho anuais devem detalhar determinados aspetos essenciais da implementação do programa (nomeadamente a repartição do orçamento), o CESE considera que a sua adoção pela Comissão enquanto atos de execução deve obedecer ao procedimento de exame e não ao procedimento consultivo, como previsto na presente proposta. Garantir-se-ia, assim, que estes programas não são adotados pela Comissão caso não estejam conformes com o parecer do comité estabelecido a título do Regulamento n.o 182/2011 (composto pelos representantes dos Estados-Membros).

1.10   No que diz respeito à necessidade de identificar melhor quais das ações suscetíveis de ser financiadas (artigo 6.o) são prioritárias, o CESE considera que a tónica deve ser claramente posta na justiça em linha, domínio em que há ainda muito a fazer para facilitar o acesso à justiça.

1.11   O CESE congratula-se com a nova orientação que transparece da presente proposta que visa integrar nas ações de formação judiciária europeia todos os profissionais da justiça, e os advogados em particular, que, tal como os juízes e os magistrados, contribuem para a boa aplicação do direito da União. É a eles que os particulares recorrem em primeiro lugar para aceder à justiça e são eles quem dá início ao processo.

1.12   Ademais, o CESE sublinha a premência de integrar os vários profissionais do direito nas redes de cooperação judicial transfronteiras, dando o apoio financeiro necessário para o efeito. De forma a estar em sintonia com o recente impulso político a favor do reforço dos direitos da defesa, o CESE solicita, mais concretamente, que se encontre, tão rápido quanto possível, uma solução para uma situação que julga ser inaceitável: a exclusão dos advogados, de facto ou de direito, da maioria das redes de cooperação judicial transfronteiras.

1.13   No intuito de se criar um quadro comum de direitos, nomeadamente no atinente ao direito da família, o CESE chama a atenção para a necessidade de fazer da Carta dos Direitos Fundamentais o fio condutor da harmonização. Num contexto ainda marcado por culturas e conceções jurídicas substancialmente diferentes, o CESE teve oportunidade de sublinhar, de forma reiterada, e recentemente no âmbito dos regimes e efeitos patrimoniais (2), a importância de promover o recurso a um regime europeu suplementar e opcional (o denominado 28.o regime).

2.   Conteúdo da proposta

2.1   Num esforço de simplificação e de racionalização, a Comissão decidiu reduzir a quantidade de programas de financiamento destinados a concretizar o espaço europeu de direitos e justiça, assegurando que todos – cidadãos, parceiros ou profissionais da justiça – possam conhecer os seus direitos e saibam como os exercer ou aplicar. Paralelamente ao Programa Direitos e Cidadania (3), o Programa Justiça para o período de 2014-2020 agrupa os programas Justiça Civil, Justiça Penal e Informação e Prevenção em matéria de Droga.

2.2   A presente proposta de regulamento atribui a este programa uma dotação financeira de 472 milhões de euros, o que deverá permitir o financiamento das atividades em que a intervenção da UE gere valor acrescentado relativamente à ação isolada dos Estados-Membros. O objetivo global é contribuir para o espaço europeu de justiça, promovendo a cooperação judiciária em matéria civil e penal. Este objetivo desdobra-se em objetivos específicos: promover a boa aplicação da legislação da União neste domínio (com base nos artigos 81.o e 82.o do TFUE), facilitar o acesso à justiça e prevenir e reduzir a procura de droga, sendo este último abordado não numa perspetiva de saúde mas de luta contra a criminalidade (com base no artigo 84.o do TFUE).

2.3   Estes objetivos justificam, nomeadamente, o apoio a atividades de formação destinadas aos magistrados e aos profissionais da justiça, incluindo advogados e notários, a ações de cooperação sob a forma de redes que promovam o conhecimento recíproco e a confiança mútua e a ações de sensibilização do público.

2.4   A dotação financeira servirá também para financiar uma base de análise para apoiar e elaborar as políticas da União. Quanto ao aumento da flexibilidade, a proposta não prevê uma dotação financeira específica por domínio de ação.

2.5   As prioridades anuais do programa são adotadas pela Comissão sob a forma de atos de execução, no âmbito do procedimento consultivo.

2.6   A proposta prevê obrigações em matéria de acompanhamento e de avaliação (incluindo intercalar).

3.   Observações na generalidade

3.1   O estabelecimento de um espaço europeu de justiça representa um bem público para a UE, benéfico para todos, sejam cidadãos ou parceiros. Na verdade, tem impacto em aspetos essenciais da vida e em práticas quotidianas (divórcio, direito de guarda e de visita dos filhos, sucessão, tutela, litígios comerciais, litígios de consumo, etc., mas também o respeito pelos direitos em matéria penal) e contribui para reforçar a segurança no espaço europeu promovendo a cooperação em matéria de luta contra a criminalidade.

3.2   O CESE recorda a complementaridade funcional entre o Programa Justiça e o Programa Direitos e Cidadania e considera que o espaço europeu de justiça e de liberdade só terá sentido em função dos direitos de que cada cidadão da UE possa gozar concretamente, onde quer que se encontre. Por conseguinte, o presente programa deve ser avaliado à luz desta realidade.

3.3   No intuito de se criar um quadro comum de direitos, nomeadamente no atinente ao direito da família, o CESE chama a atenção para a necessidade de fazer da Carta dos Direitos Fundamentais o fio condutor da harmonização. Num contexto marcado por culturas e conceções jurídicas diferentes, o CESE teve oportunidade de sublinhar, de forma reiterada, e recentemente no âmbito dos regimes e efeitos patrimoniais (4), a importância de promover o recurso a um regime europeu suplementar e opcional (o denominado 28.o regime). Instaurar este regime permite evoluir no reconhecimento dos direitos dos cidadãos da UE, lutando eficazmente contra as discriminações de que estes podem ser vítimas caso a legislação do Estado-Membro a que pertencem lhes conceda menos direitos do que a de outros Estados-Membros.

3.4   O respeito pelos direitos na UE, em particular pelos direitos fundamentais, é um fim em si para o qual deve contribuir a cooperação judicial em matéria civil e penal. No entanto, o efeito impulsionador no mercado único, em termos de crescimento e de emprego, pode ser importante e deve ser fomentado, nomeadamente apoiando o esforço de formação dos profissionais do direito (5). O CESE recorda, com efeito, que uma melhor cooperação em matéria civil e, consequentemente, uma resolução mais expedita dos litígios transfronteiras, teria um impacto considerável no dinamismo da atividade transnacional das empresas.

3.5   Apesar de os trabalhos de avaliação terem comprovado a eficácia dos programas precedentes (Justiça Civil, Justiça Penal e Informação e Prevenção em matéria de Droga para o período de 2007 a 2013), a redução dos programas e, consequentemente, das modalidades de gestão, é positiva. A consecução dos diferentes objetivos será assim mais fácil. Para além de harmonizar os procedimentos, o CESE destaca a importância de se reduzir a sua complexidade intrínseca.

3.6   Em particular, o CESE acolhe muito favoravelmente a medida de simplificação e de racionalização que representa a aglutinação dos programas Justiça Civil e Justiça Penal, que se justifica pelo abandono do terceiro pilar no Tratado de Lisboa, bem como pela semelhança de objetivos, de atores e de tipos de ação a financiar nestes dois domínios da justiça (nomeadamente em matéria de justiça em linha e de formação).

3.7   O CESE recomenda que se fomentemos projetos em matéria de justiça penal, nomeadamente nos Estados-Membros que, até hoje, pouco beneficiaram das subvenções disponíveis. Visto que esta vertente é relativamente recente, a abordagem da UE na matéria ainda não é clara e deve ser desenvolvida.

3.8   No entanto, já em relação ao programa Informação e Prevenção em matéria de Droga, cuja base jurídica reporta à saúde pública, o CESE nutre algumas reservas. Além de pretender que se continue a dar prioridade à cobertura das questões relativas à saúde pública, o CESE chama a atenção para a inevitabilidade de uma abordagem exclusivamente orientada para a repressão gerar sobreposições com atividades financiadas no âmbito do futuro Fundo para a Segurança Interna. O Comité reitera a sua mensagem sobre a importância de desenvolver, em matéria de luta contra a droga, uma abordagem essencialmente preventiva, oferecendo aos toxicodependentes a possibilidade de serem ajudados e de se curarem. É importante sensibilizar os juízes e os advogados a este respeito.

3.9   Ademais, para que o objetivo específico relativo à droga não absorva uma parte desproporcional da dotação financeira global, o CESE propõe que este objetivo possa ser parcialmente financiado pelos fundos arrecadados com o congelamento ou o confisco de produtos provenientes do tráfico de droga, como previsto pela futura diretiva sobre o congelamento e o confisco de produtos do crime (6).

3.10   Ainda que continue a não ver com clareza que ações em concreto serão financiadas em matéria de prevenção da criminalidade associada ao tráfico ilegal de droga, o CESE congratula-se com o facto de a dotação financeira de 472 milhões de euros para a implementação do presente programa parecer indicar um aumento substancial do apoio da Comissão.

3.11   Para que o orçamento da UE seja realmente utilizado para financiar «bens públicos da UE», bem como «ações [nos] domínios em que possam ser obtidos melhores resultados» (7), o CESE reitera a necessidade de canalizar melhor os recursos para os projetos que possam gerar valor acrescentado à escala europeia (artigo 3.o), nomeadamente em matéria penal, domínio no qual os Estados-Membros têm ainda algumas reticências quanto à intervenção do direito comunitário.

3.12   Para que a afetação dos fundos provenientes do orçamento da UE seja eficaz, o CESE sublinha também a importância de garantir a coerência, a complementaridade e as sinergias entre os diferentes programas de financiamento, nomeadamente com o Programa Direitos e Cidadania para o período 2014-2020. Por outro lado, os riscos de duplicação devem ser objeto de maior vigilância.

3.13   O CESE congratula-se com o facto de os projetos, ainda que selecionados no quadro de programas de trabalho anuais, poderem ter uma duração de vários anos, o que dá tempo para se desenvolverem e atingirem os seus objetivos. Se, por um lado, o CESE concorda com o princípio do cofinanciamento, por outro, duvida que uma eventual modulação se justifique (8).

3.14   Apesar da complexidade do regulamento financeiro vigente, o CESE sublinha ser importante que as condições de acesso aos fundos sejam dadas a conhecer a todos os cidadãos, de forma clara e pedagógica e em todas as línguas da União. O CESE considera que seria vantajoso definir melhor a noção de valor acrescentado à escala europeia. Tal encorajaria o surgimento de projetos e promoveria incontestavelmente a pertinência dos mesmos, inclusive nos Estados-Membros até à data sub-representados nos programas selecionados. Com efeito, o CESE salienta a necessidade de se promover o igual acesso de todos os cidadãos da UE a estes programas.

3.15   O CESE também constata com perplexidade que da ficha financeira legislativa não consta nenhuma repartição do orçamento, indicativa que seja, em função dos objetivos específicos. Sem pôr em questão a necessidade legítima de flexibilidade na gestão dos fundos, o CESE chama a atenção para a importância de se dar alguma indicação prévia na matéria.

4.   Observações na especialidade

4.1   Sobre a formação judiciária europeia

4.1.1   Tendo em conta que não pode haver verdadeiros progressos sem confiança mútua, o CESE incita a que se apoiem ações concebidas no intuito de instaurar uma cultura europeia comum, decididamente orientada para a prática e exercício dos direitos e sustentada no conhecimento e compreensão dos sistemas judiciais nacionais. Para que a entreajuda funcione na UE, é indispensável que as pessoas em causa num processo noutros sistemas nacionais possam ter a garantia de que os seus direitos processuais são protegidos.

4.1.2   O CESE considera que a formação judiciária europeia dos profissionais do direito é uma vertente essencial do novo programa que merece maior destaque. O direito europeu é ainda aplicado de forma demasiado heterogénea nos diferentes Estados-Membros devido à falta de interesse e à pouca sensibilização dos profissionais competentes para este problema. Em matéria aduaneira esta realidade é flagrante. O CESE reitera a este propósito a necessidade de aumentar de forma consequente o apoio à formação judiciária europeia. A imperatividade desta medida é ainda mais evidente se se tiver em conta o objetivo fixado pela Comissão de formar, até 2020, 20 000 profissionais do direito por ano, isto é, um total de 700 000 (9). Como a Comissão bem assinala, a formação linguística é uma condição prévia indispensável a uma melhor comunicação para além das fronteiras nacionais entre profissionais do direito no espaço europeu de justiça e de liberdade.

4.1.3   O CESE considera particularmente essencial associar os advogados a estas ações de formação, tanto mais que, em alguns Estados-Membros, advogados e magistrados têm a mesma formação. Os advogados representam a primeira porta de acesso à justiça. Dos seus bons conselhos depende o posterior acesso das pessoas incriminadas ao juiz. Tal como os juízes e os procuradores, os advogados deveriam poder beneficiar das iniciativas de financiamento da UE. Disso depende a qualidade do acesso à justiça no espaço do direito europeu. Esta participação é também indispensável para garantir um maior equilíbrio a favor dos direitos da defesa.

4.1.4   O CESE lamenta a confusão a que se presta o conceito de «funcionários e agentes de justiça» (10) e agradece à Comissão ter clarificado, na presente proposta, que o termo engloba todos os profissionais do direito, incluindo os advogados e os notários, que têm, efetivamente, um papel determinante na boa aplicação do direito da União. O CESE congratula-se pelo facto de a Comissão parecer determinada a seguir esta abordagem no âmbito do projeto-piloto sobre formação judiciária europeia que será lançado este ano.

4.1.5   O CESE considera desejável definir determinados critérios objetivos que os programas de formação judiciária deverão respeitar para serem elegíveis. Entre estes critérios, deverá constar imperativamente, nesta formação, a referência à Carta dos Direitos Fundamentais. A conformidade destes programas com os critérios estabelecidos deverá ser objeto de acompanhamento e de controlo regulares e aprofundados. O CESE sublinha a necessidade de fazer depender a atribuição destas subvenções da qualidade intrínseca dos programas, que devem ser submetidos a uma avaliação rigorosa.

4.1.6   O CESE dá particular importância a que os programas de formação judiciária destinados aos juízes e aos advogados abordem as questões específicas relativas à toxicodependência e que permitam desenvolver uma abordagem judiciária que se articule com uma abordagem sanitária e social, orientada para a prevenção da reincidência.

4.2   Sobre a cooperação judicial transfronteiriça

4.2.1   O CESE solicita que seja posto termo o mais rapidamente possível a uma situação que julga ser inaceitável: a exclusão dos advogados das redes de cooperação judiciária. Ainda que a rede judiciária em matéria penal dependa da Eurojust e não esteja abrangida pelo presente programa, o facto de ela estar vedada aos advogados é significativo. As restrições financeiras não podem justificar o desequilíbrio atual a favor da acusação. Ainda que limitados, os recursos devem permitir que seja respeitada a igualdade de armas em caso de litígios transfronteiras.

4.2.2   Esta exigência pressupõe, nomeadamente no que respeita à aplicação de um mandado de detenção europeu, que os advogados estão aptos a indicar rapidamente um advogado competente noutro Estado-Membro que possa consultar o dossiê e aconselhar sobre as questões de direito processual nacional deste outro Estado-Membro e, de forma mais geral, sobre as especificidades locais do litígio. As novas disposições introduzidas pela proposta de diretiva relativa ao direito de acesso a um advogado em processos penais e que instauram, no âmbito de um mandado de detenção europeu, o princípio de acesso a dois advogados (um no Estado-Membro de emissão e outro no de execução), constituem um argumento adicional, se necessário fosse, para justificar a plena participação dos advogados nas redes europeias de cooperação judiciária. O CESE congratula-se, a este respeito, com o apoio que a futura rede transfronteiras de advogados poderá dar ao trabalho de um número crescente de advogados envolvidos em processos transfronteiras. Por uma questão de coerência e de eficácia, o CESE solicita que a Comissão dê uma resposta financeira à altura das necessidades, no sentido de consolidar esta rede.

4.2.3   Também no atinente à rede judiciária em matéria civil e comercial, o CESE lamenta que os advogados e notários sejam, na prática, marginalizados quando está previsto, desde 1 de janeiro de 2011, que a rede esteja aberta a estes profissionais e aos oficiais de justiça, profissões que participam diretamente na aplicação dos atos comunitários e dos instrumentos internacionais. Também neste caso, o bom funcionamento da rede pressupõe um apoio financeiro suficiente.

4.2.4   Dada a multiplicação de iniciativas por parte de muitos profissionais do direito, através de pequenas estruturas frequentemente onerosas, o CESE recomenda que se melhore a coerência e a coordenação destas redes, tendo em vista a criação de «círculos de coerência» (11) nos quais poderia assentar uma verdadeira arquitetura judiciária europeia.

4.3   Sobre a Justiça em linha

4.3.1   A desmaterialização da justiça é uma questão fulcral à qual, segundo o CESE, não é prestada a atenção suficiente na presente proposta. O seu impacto em matéria de acesso à justiça, incluindo para os cidadãos em situação de precariedade social ou com deficiência, deve ser analisado com rigor. No interesse dos particulares e dos profissionais do direito muito há ainda a fazer neste domínio.

4.3.2   A este respeito, o CESE espera da Comissão uma orientação clara: a promoção dos instrumentos disponíveis em matéria de justiça em linha, parecem, de momento, mais orientados para o grande público do que para os profissionais. No intuito de garantir a qualidade das decisões da justiça e a sua conformidade com o direito europeu é, no entanto, essencial facilitar e promover o recurso a estas ferramentas junto dos profissionais do direito, os quais devem ser formados para o efeito.

4.3.3   O CESE regozija-se pelo facto de a dotação financeira prevista pela presente proposta poder contribuir para a melhoria das redes informáticas relativas ao programa (artigo 8.o, ponto 2). O CESE tem nomeadamente em mente o projeto de motor de busca de um advogado no Portal Europeu da Justiça e o projeto e-CODEX, que pretende tornar interoperáveis os sistemas nacionais de justiça em linha. O CESE chama a atenção para o facto de que, para garantir a segurança e a eficácia destas redes, a identidade profissional dos advogados deve poder ser certificada pelas ordens.

4.4   Sobre os indicadores

4.4.1   Os indicadores devem, claramente, ser objeto de uma reflexão mais aprofundada. Apraz ao CESE que a Comissão tenha, entretanto, levado a cabo essa reflexão, nomeadamente no que diz respeito à monitorização anual e à avaliação intercalar e final. No que toca ao acesso à justiça, o critério puramente subjetivo (a forma como este acesso é percebido na Europa), em particular, deve ser complementado. Em matéria de formação, seria pertinente valorizar as parcerias público-privado, associando universidades, institutos de formação judiciária e ordens. Ainda que venham a decrescer à medida que o programa vá sendo aplicado, os custos das atividades de controlo (no seu sentido lato), que na ficha financeira legislativa estão estimados entre 3 e 6 % do orçamento total, deveriam, segundo o CESE, ser objeto de um limite máximo.

4.5   Sobre as modalidades de adoção dos programas de trabalho anuais

4.5.1   No atinente aos programas de trabalho anuais que a Comissão adota sob a forma de atos de execução, o CESE questiona a escolha do procedimento consultivo. Considera, na verdade, o procedimento de exame, que garante que estes programas não são adotados pela Comissão em caso de não-conformidade com o parecer do comité estabelecido a título do Regulamento n.o 182/2011 (composto pelos representantes dos Estados-Membros), seria mais adequado.

Bruxelas, 11 de julho de 2012

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho – Para uma resposta europeia mais eficaz na luta contra a droga», adotado em 24.5.2012 (JO C 229 de 31.7.2012, p. 85.

(2)  JO C 376 de 22.12.2011, p. 87–91.

(3)  JO C 191 de 29.6.2012, p. 108-110.

(4)  Ver nota n.o 2.

(5)  No seu relatório «Uma nova estratégia para o mercado único» (9 de maio de 2010), Mário Monti sublinha a importância da boa aplicação do direito da União e da formação de magistrados para o efeito, para melhorar a eficácia do mercado único.

(6)  Ver parecer do CESE (ver página do presente Jornal Oficial).

(7)  COM(2010) 700 final.

(8)  Atualmente, é necessária uma contribuição de 20 % para obter os restantes 80 % sob a forma de subvenções.

(9)  COM(2011) 551 final.

(10)  Nos termos dos artigos 81.o, n.o 2, alínea h), e 82.o, n.o 1, alínea c), do TFUE sobre a cooperação judiciária em matéria civil e penal, respetivamente, que fazem referência aos termos «magistrados» e «funcionários e agentes de justiça».

(11)  Ver Resolução do Parlamento Europeu de 14 de março de 2012 sobre a formação judiciária (2012/2575(RSP)).