21.6.2012   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 181/68


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1060/2009 relativo às agências de notação de risco

COM(2011) 747 final – 2011/0361 (COD)

2012/C 181/13

Relator: Viliam PÁLENÍK

Em 13 de dezembro e 30 de novembro de 2011, respetivamente, o Conselho e o Parlamento Europeu decidiram, nos termos dos artigos 114.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social sobre a:

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1060/2009 relativo às agências de notação de risco

COM(2011) 747 final — 2011/0269 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 7 de março de 2012.

Na 479.a reunião plenária de 28 e 29 de março de 2012 (sessão de 29 de março), o Comité Económico e Social adotou, por 118 votos a favor, 32 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O presente parecer foi elaborado no âmbito do processo de adoção da proposta da Comissão que visa colmatar as graves lacunas em termos de transparência e de independência, de conflitos de interesse e de qualidade dos métodos utilizados no estabelecimento e no processo das notações de risco. O CESE congratula-se com o facto de o regulamento proposto procurar eliminar estes problemas, ainda que seja, simultaneamente, de opinião que a reação da Comissão a esta situação é tardia e inconsequente.

1.2   As agências de notação de risco desempenham um papel importante nos mercados financeiros mundiais, uma vez que as suas notações são utilizadas por muitos dos participantes nestes mercados. Assim, estas agências exercem uma influência considerável sobre quem deseja tomar decisões de investimento e de financiamento com conhecimento de causa. Por esta razão, é imprescindível que as atividades de notação de risco sejam exercidas de acordo com os princípios da integridade, transparência, responsabilidade e boa governação, um objetivo para o qual o regulamento relativo às agências de notação de risco em vigor contribui já consideravelmente.

1.3   O CESE é de opinião que os mercados, em si, não são capazes de cumprir a função de autorregulação, pelo que é imprescindível introduzir regras o mais rigorosas possível que garantam um nível adequado de execução e de supervisão. Contudo, a proposta apresentada não é suficientemente clara no que diz respeito à forma de implementar o regulamento. O CESE duvida, além disso, seriamente que um maior rigor das regras baste por si só para alcançar os resultados almejados. Isso contribuiria antes para reduzir ainda mais a responsabilidade dos vários organismos de supervisão que deveriam, pelo contrário, ser mais associados à avaliação dos pareceres emitidos pelas agências.

1.4   O CESE considera que a dimensão europeia do regulamento proposto deve ser apoiada, tanto quanto possível, de negociações, ao nível dos países do G20, para que adotem no seu território regulamentação idêntica para garantir a coerência ao nível mundial.

1.5   Para um leque mais amplo de notações de risco, a proposta estabelece uma rotatividade obrigatória das agências que as atribuem. O CESE, contudo, pergunta-se se a introdução desta regra levará realmente ao cumprimento do objetivo almejado.

1.6   O CESE é de opinião que um dos problemas fundamentais reside na credibilidade das notações de risco atribuídas pelas agências sediadas na sua maioria nos EUA e expostas a múltiplos conflitos de interesse. Por isso mesmo, o CESE pede à Comissão a criação de uma agência europeia de notação de risco independente, que possa notar a dívida soberana tendo em conta o interesse comum. A credibilidade das agências de notação de risco foi, também, consideravelmente afetada devido à sua incapacidade histórica de prever a evolução futura. Apesar da existência de sinais claros do mercado e da evolução económica, estas agências não tiveram a capacidade ou a vontade de identificar atempadamente os riscos de investimento e, em muitos casos, fracassaram no cumprimento da sua tarefa fundamental.

1.7   É necessário examinar mais atentamente a falta de transparência dos métodos utilizados pelas agências nas suas notações de risco, que têm algo de profético e axiomático (self-fulfilling prophecy), quando se sabe perfeitamente que são incapazes de prever cabalmente o que o futuro trará.

1.8   O CESE tem muitas dúvidas quanto à independência das notações atribuídas, está mesmo convencido da sua dependência parcial, sobretudo por causa do modelo «emitente-pagador» aplicado. É evidente que o emitente tem todo o interesse em obter a mais alta notação possível, o que faz duvidar de certo modo da independência da notação emitida, pois atrás desta avaliação esconde-se muitas vezes uma manobra especulativa ditada, no mínimo, pelo efeito causado pelo anúncio da notação.

1.9   É imprescindível que todos os pontos enunciados na proposta não fiquem apenas no papel, mas sejam realmente colocados em prática, tanto ao nível da UE como ao nível nacional. O CESE entende ser necessário criar capacidades suficientes na Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA – European Securities and Markets Authority), para garantir a execução do regulamento em análise.

1.10   Neste contexto, o CESE aplaude as modificações relativas à responsabilidade civil das agências de notação e exorta a Comissão a melhorar a proteção efetiva dos consumidores de produtos financeiros, criando vias de recurso eficazes que lhes permitam exercer os seus direitos e aceder a indemnizações, sem prejuízo das sanções que o órgão supervisor possa impor à agência.

1.11   O problema dos conflitos de interesse, que a proposta apresentada procura resolver através de algumas medidas, continua a ser uma questão fundamental em aberto. O CESE releva, contudo, uma vez mais que estas medidas não são suficientes para alcançar o objetivo estabelecido. O problema deve-se à aplicação do modelo «emitente-pagador», sobretudo no caso da emissão das notações solicitadas e da atribuição de notações a países. Notações e perspetivas de notação negativas das dívidas soberanas são vantajosas para os adquirentes das correspondentes obrigações emitidas em resultado das taxas de juro e dos prémios de risco mais elevados. Em certos casos, poderão surgir conflitos de interesse se esses adquirentes são também os «emitentes» que pagam às agências de notação de risco para notarem os seus instrumentos financeiros.

1.12   É com o agrado que o CESE, para além das tentativas de eliminar alguns problemas (transparência, conflitos de interesse, independência, concorrência) e do reforço da supervisão do funcionamento das agências de notação de risco enquanto importantes participantes nos mercados financeiros, verifica que o regulamento de 2011 se debruça também sobre outras questões importantes, sobretudo a criação de um quadro europeu para a supervisão das agências de notação de risco (1).

1.13   O CESE considera, no entanto, que a questão das agências de notação é mais política que jurídica. A melhor via para proteger a dívida soberana das consequências muitas vezes nefastas das notações emitidas pelas agências será, por conseguinte, para além de melhorar e reduzir as regras em vigor:

proibir as agências de emitir pareceres sobre a dívida soberana;

ampliar o mandato do BCE conferindo-lhe um estatuto jurídico análogo ao de todos os outros bancos centrais do mundo, por forma a eliminar as desvantagens de que padece atualmente;

melhorar a gestão da dívida soberana da área do euro em relação à situação atual (ver parecer ECO/307 – CESE 474/2012).

2.   Justificação

2.1   A atual crise de crédito, cada vez mais profunda, sucede à anterior crise da banca, resultante das graves lacunas no âmbito da regulação e da supervisão das instituições financeiras, à qual a Comunidade Europeia reagiu de forma acertada e rápida com a adoção do Regulamento (CE) n.o 1060/2009. Esta nova crise evidencia a necessidade de melhorar a eficácia do funcionamento de várias atividades no âmbito da regulação e da supervisão das instituições financeiras. O Regulamento (CE) n.o 1060/2009 relativo às agências de notação de risco estabelece regras de conduta rigorosas para estas agências, sobretudo com o objetivo de minimizar possíveis conflitos de interesse e de assegurar uma qualidade elevada e transparência nas notações de risco e no processo de atribuição de notações.

2.2   Não se deve perder de vista o facto de as agências de notação de risco serem incapazes de prever as evoluções futuras, o que significa que têm um impacto francamente negativo nas economias nacionais. A lista dos erros cometidos por estas agências é longa, pelo que referimos apenas alguns exemplos:

em 1975, a cidade de Nova Iorque recebeu uma notação muito favorável na véspera de declarar falência (suspensão de pagamentos),

um pouco mais tarde, a agência Standard and Poor’s garantiu aos investidores que o Orange County (Califórnia) se encontrava em boa situação económica e que estava a ser muito bem gerido, apesar de se terem desfeito em fumo 2 mil milhões de dólares devido a especulações com derivados. Posteriormente, a agência teve de responder a várias ações judiciais (2),

houve uma situação semelhante com o fundo de retorno absoluto Long Term Capital Management, do Bank of Credit and Commerce International (BCCI), da falência de seguradoras americanas e das falências fraudulentas da Enron, da Tyco, etc., e ainda no caso do Lehman Brothers (3),

antes da crise financeira, as agências chegaram mesmo a atribuir a classificação AAA aos derivados hipotecários mais suspeitos (subprimes), convencendo, assim, os investidores, por exemplo, os fundos de pensões, a comprá-los em massa (4),

antes do início da crise financeira, em 2008, as agências de notação de risco atribuíam unanimemente a melhor classificação a bancos e fundos que possuíam títulos sem qualquer valor, inventados pelos especuladores, como no caso da seguradora americana AIG (5);

por exemplo, em dezembro de 2009, a Standard and Poor’s atribuiu a classificação A- à dívida grega, ou seja, a mesma que foi atribuída à Estónia, a qual se preparava para entrar na área do euro (6).

2.3   Na situação atual, em que toda a Europa se debate com a crise da dívida e alguns países se encontram à beira da bancarrota, será muito importante que a Comissão faça tudo o que está ao seu alcance para o relançamento da economia. Esta proposta constitui um instrumento adequado para estribar estes esforços, mas deve ser mais ambiciosa.

2.4   Não aprofunda suficientemente a questão da notação da dívida soberana, cujo objeto já é em si muito questionável, uma vez que países com igual classificação pagam juros diferentes. Daí resulta também a questão, ainda em aberto, do valor político das classificações atribuídas pelas agências de notação de risco.

2.5   No seu documento de consulta (7), elaborado na sequência da consulta pública realizada ao longo de 2010, a Comissão Europeia apresentou opções para resolver os problemas associados à excessiva dependência dos participantes no mercado das notações de risco, realçou a necessidade de uma avaliação independente de riscos de crédito por empresas de investimento, disse apoiar uma maior concorrência no mercado das notações de risco, introduziu a responsabilidade civil das agências de notação de risco e opções para resolver potenciais conflitos de interesse resultantes da aplicação do modelo «emitente-pagador».

2.6   Alguns dos participantes na consulta pública organizada pela Comissão Europeia entre 5 de novembro de 2010 e 7 de janeiro de 2011 manifestaram-se preocupados face à dependência excessiva, ou até sistemática, relativamente às notações de risco, defendendo, simultaneamente, a diminuição progressiva de referências às notações na legislação. Sublinharam, simultaneamente, que a busca de soluções adequadas consistirá essencialmente em encontrar instrumentos apropriados para substituí-las.

2.7   O Parlamento Europeu corroborou a necessidade de melhorar o quadro regulamentar para as agências de notação de risco e de tomar medidas adequadas para reduzir a excessiva dependência relativamente às notações de risco, adotando, em 8 de junho de 2011 (8), uma resolução não legislativa sobre as agências de notação de risco.

2.8   O Conselho Europeu concluiu, em 23 de outubro de 2011 (9), que o reforço da regulamentação financeira continuava a ser uma prioridade decisiva para a UE e congratulou-se com os progressos conseguidos desde 2008, graças à reforma do quadro regulamentar e de supervisão. Apelou, contudo, a que se redobrasse esforços para detetar e eliminar os pontos fracos do sistema financeiro, com o fito de evitar crises futuras.

2.9   A nível internacional, o Conselho de Estabilidade Financeira (CEF) estabeleceu, em outubro de 2010, princípios para reduzir a dependência das autoridades e das instituições financeiras relativamente às classificações das agências de notação de risco (10). Aprovados pela Cimeira do G20 de Seul, de novembro de 2010, esses princípios apontam para a eliminação ou substituição das referências a essas notações na legislação, nos casos em que se disponha de normas alternativas adequadas destinadas a avaliar a qualidade do crédito e a exigir dos investidores que realizem as suas próprias avaliações neste sentido.

2.10   Por todos estes motivos, foi necessário alterar e completar o Regulamento (CE) n.o 1060/2009 relativo às agências de notação de risco, nomeadamente para reduzir potenciais riscos associados a uma excessiva dependência dos participantes nos mercados financeiros relativamente às notações de risco, bem como o elevado grau de concentração no mercado da prestação de serviços de notação de risco, para introduzir a responsabilidade civil das agências de notação de risco perante os investidores e prevenir eventuais conflitos de interesse resultantes do modelo «emitente-pagador» e da estrutura acionista das agências de notação de risco.

3.   Síntese das alterações ao Regulamento (CE) n.o 1060/2009

3.1   Extensão do âmbito de aplicação do regulamento de modo a abranger as perspetivas de notação de risco

3.1.1   A proposta da Comissão alarga o âmbito das normas relativas às notações de risco de modo a abrangerem, quando adequado, as «perspetivas de notação de risco». A importância das perspetivas de notação para os investidores e para os emitentes, bem como os seus efeitos sobre os mercados, são comparáveis à importância e aos efeitos das próprias notações de risco. Exige-se, por isso, que as agências de notação de risco tornem público o horizonte temporal no qual se espera uma variação da notação.

3.2   Alterações relativas à utilização de notações de risco

3.2.1   A proposta de regulamento relativo às agências de notação de risco impõe a determinadas instituições financeiras a obrigação de procederem às suas próprias avaliações do risco de crédito, para evitar uma dependência excessiva, exclusiva ou até sistemática relativamente às notações de risco externas ao avaliarem a qualidade creditícia de ativos.

3.3   Alterações relativas à independência das agências de notação de risco

3.3.1   É necessário reforçar a independência das agências de notação de risco no modelo atual «emitente-pagador», de forma a aumentar o nível de credibilidade das notações.

3.3.2   Uma das medidas que visa aumentar a independência através da eliminação dos conflitos de interesse consiste na regra que proíbe que qualquer membro ou acionista de uma agência de notação de risco, que nela detenha uma participação de pelo menos 5 %, tenha uma participação superior a 5 % em qualquer outra agência de notação de risco, a menos que as agências em causa sejam membros do mesmo grupo.

3.3.3   É introduzida uma regra de rotatividade para as agências de notação de risco contratadas pelo emitente para notarem o próprio emitente ou seus instrumentos de dívida. Estabelece-se, simultaneamente, a obrigação segundo a qual a agência de notação de risco em cessação de funções deve fornecer à agência que a substitui um ficheiro de transferência que inclua todas as informações pertinentes.

3.3.4   São igualmente adaptadas as regras de rotação interna dos funcionários, de modo a impedir que os analistas se transfiram para outra agência de notação de risco com ficheiros de clientes.

3.3.5   As agências de notação de risco não deverão emitir notações de risco quando existam conflitos de interesse criados pelo envolvimento de pessoas que tenham uma participação superior a 10 % do capital ou dos direitos de voto da agência em causa ou que detenham uma outra posição importante.

3.3.6   As pessoas que detenham uma participação superior a 5 % do capital ou dos direitos de voto na agência de notação de risco ou que estejam de outra forma em posição de exercer uma influência significativa não poderão prestar serviços de consultoria ou de aconselhamento à entidade que é objeto de notação.

3.4   Alterações relativas à divulgação de informações sobre as metodologias seguidas pelas agências de notação de risco e sobre as notações de risco e perspetivas por elas emitidas

3.4.1   Propõem-se procedimentos para o desenvolvimento de novas metodologias de notação ou a alteração das existentes, sendo necessário integrar neste processo também consultas das partes interessadas. A ESMA, enquanto autoridade competente, avaliará a conformidade de novas metodologias com os requisitos existentes, só podendo estas ser utilizadas após a aprovação pela ESMA.

3.4.2   Se forem detetados erros nas metodologias, a agência de notação de risco terá a obrigação de eliminar os mesmos, bem como de informar a ESMA, as entidades notadas e o público em geral sobre esses erros.

3.4.3   As agências de notação de risco deverão informar o emitente sobre os principais factos nos quais uma notação de risco se baseia, no mínimo, com um dia útil completo de antecedência face à publicação da mesma, para permitir detetar possíveis erros da notação.

3.4.4   As agências de notação de risco deverão divulgar informação sobre todas as entidades ou instrumentos de dívida que sejam submetidos à sua análise inicial ou para notação preliminar de risco.

3.5   Alterações relativas às notações de risco de entidades ou dívidas soberanas

3.5.1   As normas que se aplicam às notações de risco de entidades ou dívidas soberanas serão reforçadas, com vista a melhorar a qualidade dessas notações, aumentando a periodicidade do cálculo das mesmas para seis meses, no mínimo.

3.5.2   Ao emitirem ou alterarem notações soberanas, as agências de notação de risco deverão ser obrigadas a publicar um relatório de investigação completo, de modo a melhorar a transparência e a compreensão por parte dos utilizadores.

3.5.3   As agências de notação de risco fornecerão igualmente dados discriminados sobre o seu volume de negócios, incluindo dados sobre as receitas geradas pelas diferentes classes de ativos. Esta informação deverá permitir avaliar em que medida as agências de notação de risco afetam os seus recursos à emissão de notações soberanas.

3.6   Alterações relativas à comparabilidade das notações de risco e comissões cobradas pelas notações de risco

3.6.1   Todas as agências de notação de risco deverão comunicar as suas notações à ESMA, que publicará todas as notações disponíveis para um instrumento de dívida, sob a forma de um índice europeu de notações de risco (EURIX).

3.6.2   A ESMA terá poderes para elaborar projetos de normas técnicas, que deverão ser aprovadas pela Comissão, para uma escala harmonizada de notações. Todas as notações seguirão as mesmas normas em termos de escala, assegurando que as notações podem ser mais facilmente comparáveis.

3.6.3   As comissões cobradas pelo fornecimento de notações deverão ser não discriminatórias e não deverão basear-se em qualquer forma de contingência, isto é, devem basear-se no custo real e em critérios transparentes de preço e não depender do resultado do trabalho realizado. As agências de notação de risco deverão entregar anualmente a lista das comissões cobradas aos clientes por todos os serviços.

3.6.4   A ESMA deverá também assumir funções de supervisão no que toca à concentração do mercado, aos riscos decorrentes da concentração e ao seu impacto para a estabilidade global do setor financeiro.

3.7   Alterações relativas à responsabilidade civil das agências de notação de risco perante os investidores

3.7.1   Em caso de infração, intencional ou por negligência grave, das obrigações decorrentes do Regulamento relativo às agências de notação de risco, as novas disposições propostas pela Comissão preveem a possibilidade de interpor uma ação pelos danos causados por esta infração, se a mesma tiver afetado uma notação de risco na qual um investidor se tenha baseado.

3.8   Outras alterações

3.8.1   O âmbito de aplicação do regulamento também é alargado, em alguns pontos relativos às agências de notação de risco, às agências «certificadas» estabelecidas em países terceiros.

4.   Observações na generalidade

4.1   A proposta da Comissão altera, de forma adequada, o Regulamento (CE) n.o 1060/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho atualmente em vigor, sobretudo no que diz respeito a uma dependência excessiva relativamente às notações de risco por parte dos participantes nos mercados financeiros, ao elevado grau de concentração que se verifica no mercado da prestação de serviços de notação de risco, à responsabilidade civil das agência de notação de risco perante os investidores, aos conflitos de interesse associados ao modelo «emitente-pagador» e à estrutura acionista das agências de notação de risco. No entanto, o CESE observa que algumas passagens do regulamento são pouco concretas e outras, bastante vagas. Acredita que, onde isso for possível e conveniente, a versão final do regulamento será mais concreta, mais clara e menos ambígua.

4.2   O CESE tem dúvidas quanto à verdadeira credibilidade futura das autoavaliações de risco e à fiabilidade das mesmas, uma vez que, atualmente, as notações que inspiram mais confiança são as das agências sediadas fora do território da UE. Se as instituições financeiras continuarem a confiar nestas notações, o regulamento proposto está condenado ao fracasso. Além disso, fica-se sem saber de que modo a Comissão tenciona impor a realização dessas avaliações.

4.3   O mesmo se aplica à regra de rotatividade: mesmo que esta regra leve à constituição de uma nova agência para ampliar o leque de opiniões, pode-se partir do princípio de que as notações desta nova agência serão influenciadas pelos pareceres das agências de notação de risco já estabelecidas, não havendo azo, portanto, à diversidade de opiniões esperada.

4.4   O CESE tem profundas dúvidas quanto à independência das notações emitidas, sobretudo por causa do mecanismo «emitente-pagador», mesmo no caso das notações de risco da dívida soberana que influenciam as taxas de juro pagos pelos Estados soberanos às instituições financeiras e a outros adquirentes da sua dívida. Face ao exposto, o CESE propõe que a Comissão comece a examinar os mecanismos dos mercados financeiros no seu todo e a hipótese de sujeitá-los a uma regulação mais severa.

4.5   O CESE defende que se examine como são remunerados os vários analistas e que se dissocie a sua remuneração dos resultados da notação. No entanto, não fica claro quais as medidas concretas que a ESMA pretende adotar para controlar o cumprimento da proposta, pelo que sugere que este ponto seja estudado mais a fundo.

5.   Observações na especialidade

5.1   O CESE reitera a necessidade de garantir o cumprimento do quadro jurídico estabelecido, sobretudo, prevendo sanções para os dirigentes e gestores das autoridades europeia e internacional de supervisão dos mercados que não cumpriram as suas obrigações, tendo em conta os prejuízos causados pela sua inação aos bancos e ao bom funcionamento do sistema financeiro, assim como à economia, às empresas e aos cidadãos.

5.2   O CESE regozija-se com a intensificação dos esforços para proteger os consumidores dos produtos financeiros através da introdução da responsabilidade civil das agências de notação de risco pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, com base no parecer anterior do CESE (11). Considera, todavia, que esta parte da proposta deveria ser mais elaborada e muito mais clara. Deveria ainda estar nitidamente associada a sanções aplicáveis pela ESMA.

5.3   O CESE tem algumas dúvidas em relação ao empenho do regulamento em aumentar a concorrência no mercado de notação de risco, através da introdução de uma escala de notação de risco harmonizada. Apoia, contudo, esta alteração por melhorar a comparabilidade das notações de risco.

5.4   O CESE considera que, para aumentar a qualidade, a transparência, a independência, a pluralidade de opiniões e a concorrência na atribuição de notações, a Comissão terá de criar uma agência europeia de notação independente que emita notações independentes sobre a dívida soberana, para assim defender o interesse comum.

5.5   O CESE concorda com a necessidade de limitar a propriedade das agências de notação de risco, de forma a serem consideradas como independentes, mas preferia que fosse garantida a sua independência total. É ainda necessário garantir que nenhum investidor detenha – mesmo indiretamente – mais do que uma determinada percentagem do capital da agência de notação de risco.

5.6   O CESE receia que, mesmo ficando as avaliações de risco a cargo dos próprios participantes nos mercados financeiros ou diminuindo a sua dependência relativamente a notações externas, não será garantida a objetividade das decisões tomadas pelos mesmos nem um leque mais diversificado de opiniões. O CESE também não crê que as instituições financeiras de menor dimensão tenham capacidade para criar unidades de análise dedicadas a essas avaliações.

5.7   O CESE manifesta-se de certo modo apreensivo com a aplicação da responsabilidade civil às agências de notação de risco, uma vez que estas já se enganaram muitas vezes nas suas notações sem – excetuando raríssimos casos – terem de assumir responsabilidade pelos seus erros. O CESE não está, por isso, convencido de que o regulamento apresentado consiga alterar esta situação. O CESE reputa ainda adequado um reforço o mais coerente e eficaz possível da responsabilidade civil das instituições que utilizam as notações de risco na prestação de certos serviços, como por exemplo, a responsabilização dos bancos na prestação de aconselhamento em matéria de investimento.

5.8   O CESE considera que é necessário dar ênfase à revisão do processo de supervisão das atividades das agências de notação de risco, atualmente insuficiente, bem como garantir a realização sistemática, coerente e o mais abrangente possível do mesmo.

5.9   O CESE considera que são essenciais as disposições previstas para o conflito de interesses, mas a proposta apresentada não é suficientemente concreta em pontos relevantes. Haverá, portanto, que elaborá-los mais, sobretudo o que diz respeito à definição da obrigação das instituições que supervisionam o cumprimento dessas disposições.

5.10   O CESE chegou a uma conclusão semelhante sobre os aspetos técnicos e a forma como o Índice de Notação Europeu (EURIX) é realmente definido, perguntando-se, neste contexto, se este índice poderá fornecer alguma informação suplementar.

5.11   A proposta apresentada refere notações de risco por Estado, mas não define com exatidão o que se entende pelo termo «Estado», uma vez que a situação financeira de um Estado também é influenciada pelos seus fundos de segurança social e de seguros de saúde, direta ou indiretamente interligados com o orçamento de Estado. Os cidadãos têm o direito de saber se está comprometida a cobertura das suas necessidades em matéria de saúde e de segurança social.

5.12   É necessário que as notações de risco por Estado sejam muito bem definidas, uma vez que têm influência em muitos aspetos do funcionamento dos países nos mercados financeiros. A Comissão terá, por conseguinte, de abordar mais atentamente a questão das notações de risco de dívidas soberanas e avançar com uma resposta mais detalhada.

5.13   Uma das principais questões em aberto é a independência insuficiente das agências de notação de risco, decorrente, sobretudo, da aplicação do modelo «emitente-pagador», que pode dar a impressão de que as notações de risco beneficiam o emitente em vez de responderem às necessidades dos investidores. O CESE considera que a introdução da regra de rotatividade não será uma medida reguladora suficiente, capaz de enfraquecer o impacto do modelo «emitente-pagador», pelo que propõe que se pondere outra forma de restringir a possibilidade de o emitente escolher uma agência de notação de risco que sirva os seus próprios objetivos.

5.14   Na opinião do CESE, a regra de rotatividade como é proposta não vai suficientemente longe para corresponder às expectativas que a sua introdução poderia suscitar, especialmente no que respeita à criação de novas oportunidades de mercado. O CESE entende, por conseguinte, que o regulamento deveria estabelecer períodos mais curtos durante os quais o emitente poderia recorrer aos serviços da mesma agência de notação ou períodos mais longos durante os quais não o faria. Outra solução possível seria as agências de notação de risco serem escolhidas por sorteio. O CESE propõe igualmente que se suprima o termo «consecutivos» da frase «mais de dez instrumentos de dívida consecutivos» nos artigos relevantes.

Bruxelas, 29 de março de 2012

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Parecer do CESE sobre «Agências de notação de risco», JO C 54 de 19.2.2011, p. 37.

(2)  Ibrahim Warde, «Ces puissantes officines qui notent les Etats», Le Monde diplomatique, fevereiro de 1997.

(3)  Marc Roche, «Le capitalisme hors la loi», Éditions Albin Michel 2011, p. 70.

(4)  Joseph E. Stilgitz, «Le triomphe de la cupidité», Les lines qui libèrent 2010, p. 166.

(5)  Hervé Kempf, «L'oligarchie ça suffit, vive la démocratie», Éditions du Seuil, Paris 2011, p. 72.

(6)  Idem.

(7)  http://ec.europa.eu/internal_market/securities/docs/agencies/summary-responses-cra-consultation-20110704_en.pdf.

(8)  http://www.europarl.europa.eu/oeil/FindByProcnum.do?lang=en&procnum=INI/2010/2302.

(9)  http://www.consilium.europa.eu/uedocs/cms_data/docs/pressdata/en/ec/125496.pdf.

(10)  http://www.financialstabilityboard.org/publications/r_101027.pdf.

(11)  Parecer do CESE sobre «Agências de notação de risco», JO C 54 de 19.2.2011, p. 37.


ANEXO

ao parecer do Comité

O seguinte texto, que constava do parecer da secção, foi preterido pela assembleia a favor de uma alteração, tendo recebido, contudo, mais de um quarto dos votos expressos.

Ponto 5.4

«5.4

O CESE considera que, para aumentar a qualidade, a transparência, a independência, a pluralidade de opiniões e a concorrência na atribuição de notações, a Comissão terá de criar uma agência europeia de notação independente que emita notações independentes, pagas pelos emitentes, mas que não emita notações soberanas, a fim de evitar possíveis acusações de conflitos de interesse.»

Este texto da secção especializada foi rejeitado por 78 votos contra, 55 votos a favor e 13 abstenções.