23.7.2011 |
PT |
Jornal Oficial da União Europeia |
C 218/118 |
Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1234/2007 do Conselho no que respeita às normas de comercialização»
[COM(2010) 738 final — 2010/0354 (COD)]
2011/C 218/23
Relator: Antonio POLICA
Em 27 de Janeiro de 2011 e em 18 de Janeiro de 2011, o Conselho e o Parlamento Europeu decidiram, respectivamente, consultar o Comité Económico e Social Europeu nos termos do artigo 43.o, n.o 2, e, para o título II, ainda do artigo 118.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia sobre a
Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1234/2007 do Conselho no que respeita às normas de comercialização
COM(2010) 738 final — 2010/0354 COD.
Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente que emitiu parecer em 6 de Abril de 2011.
Na 471a reunião plenária de 4 e 5 de Maio de 2011 (sessão de 4 de Maio) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 152 votos a favor, 5 votos contra e 10 abstenções o seguinte parecer:
1. Síntese das conclusões e recomendações do CESE
1.1 O CESE congratula-se com a proposta da Comissão de pôr em prática uma política coerente de qualidade dos produtos agrícolas, destinada a facilitar a comunicação, pelos agricultores, das qualidades, características e atributos dos seus produtos e a proporcionar aos consumidores informação adequada. O Comité está, além disso, convicto de que o pacote «Qualidade» pode contribuir para aumentar as oportunidades de trabalho e de actividades nas zonas rurais, impedindo o despovoamento e contribuindo para a preservação das especificidades culturais, a melhoria da relação entre o homem e o ambiente e uma gestão mais correcta dos recursos naturais.
1.2 O Comité vê com bons olhos a melhoria dos sistemas referentes às especificidades agroalimentares (denominação de origem, indicações geográficas protegidas, especialidades tradicionais garantidas), de modo a simplificar e racionalizar os seus requisitos e a reforçar o seu modelo. Espera também que seja reforçada a protecção contra as práticas comerciais desleais e considera que a aplicação generalizada de normas de comercialização pode contribuir para esta melhoria.
1.3 Tal como já sublinhou em pareceres anteriores (1), estima que a rastreabilidade, entendida como a possibilidade de seguir um produto ao longo de toda a fileira, desde a produção à venda, é um instrumento importante que permite a aplicação eficaz de todas as menções que forem adoptadas logo que sejam introduzidas normas de comercialização específicas. Não considera suficientes apenas as menções que constam do rótulo, mas deverá ser assegurada a possibilidade de um controlo objectivo dos dados nelas contidas.
1.4 Convirá não só asseverar a exactidão das informações mercê de instrumentos eficazes de rastreabilidade, mas também aumentar e garantir a sua eficácia, reproduzindo no rótulo menções claras, completas e compreensíveis, num justo equilíbrio entre o direito do consumidor a toda a informação e a legibilidade material associada à dimensão dos caracteres de imprensa, evitando assim a complexidade, o tecnicismo ou o tamanho excessivos, que poderiam desorientar o consumidor e dissuadi-lo de ler o rótulo.
1.5 Para garantir a pertinência e a eficácia dos controlos, recomenda-se que mesmo as facturas e, de um modo geral, toda a documentação que acompanha os produtos comportem as informações contidas nas normas de comercialização do sector ou produto específico. Deve ser dada especial atenção aos produtos de países terceiros importados pela União, a fim de combater e desencorajar práticas comerciais desleais (2).
1.6 A rede de controlos, necessários para verificar a conformidade dos produtos com as disposições actuais e futuras e aplicar as sanções administrativas adequadas em caso de infracção às normas de comercialização, deveria ser acompanhada de esforços e iniciativas no sentido de uma maior responsabilização dos agentes do sector e reforçar uma cultura do respeito pelas regras cada vez mais generalizada.
1.7 No entender do Comité, o recurso ao instrumento dos actos delegados para regulamentar a matéria das normas de comercialização é coerente com a abordagem de simplificação legislativa introduzida pelo Tratado de Lisboa, está em conformidade com o artigo 290.o do TFUE e em sintonia com a aproximação adoptada até à data pela Comissão e, em situações análogas, aprovadas pelo Comité (3). Recomenda-se, no entanto, uma utilização cuidadosa deste instrumento, o qual, se não for acompanhado da necessária selectividade e especificidade, poderia perturbar sectores já sujeitos a normas de comercialização precisas, em particular o sector das frutas e produtos hortícolas (4).
1.8 Quanto às informações que devem constar obrigatoriamente do rótulo, é, sem dúvida, positiva a introdução de uma base jurídica que preveja a obrigação, em todos os sectores, de mencionar o «local de produção» (5), a fim de responder às expectativas de transparência e de informação dos consumidores e evitar outras referências potencialmente enganosas. Pelo contrário, afigura-se pouco coerente prever um «nível geográfico adequado» a estabelecer caso a caso. Seria preferível, como já em certa medida solicitado anteriormente pelo Comité (6), mencionar no rótulo o local de produção entendido como o local de cultivo ou de criação, ou seja, o país donde provém o produto agrícola não transformado ou utilizado na preparação de um alimento.
1.9 O Parlamento e o Conselho exprimiram claramente a vontade de prever regulamentação e protecção legislativa para os produtos fundamentais para a alimentação dos cidadãos europeus. A este propósito a União já muito fez no passado e dispõe das mais amplas competências técnico-jurídicas para o poder fazer novamente. O Comité mostra-se desfavorável, em particular, à adaptação automática a normas de comercialização pertinentes adoptadas por organizações internacionais (7) sem uma análise e avaliação prévias para determinar a sua eficácia e a sua coerência com o novo quadro regulamentar.
1.10 O Comité concorda com o princípio da proporcionalidade incluído nos elementos jurídicos da proposta, mas está preocupado com o facto de a sua aplicação às menções de qualidade facultativas poder levar a controlos menos coercivos e a uma menor observância das próprias normas. O objectivo a perseguir deverá ser a simplificação e redução da burocracia, mantendo, ao mesmo tempo, um sistema de controlo adequado para protecção dos consumidores.
1.11 As medidas previstas na proposta teriam maior eficácia se fossem amplamente divulgadas directamente junto dos consumidores através das associações que os representam. Os meios de comunicação social são, de facto, largamente utilizados para estimular as vendas, mas não suficientemente para informar melhor os cidadãos da União sobre as normas que os defendem e permitir-lhes escolhas mais conscientes.
2. Introdução – O documento da Comissão
2.1 O objectivo do pacote «Qualidade» é melhorar tanto as disposições da União Europeia relativas à qualidade dos produtos como o funcionamento dos sistemas nacionais e privados de certificação, para os tornar mais simples, mais transparentes e mais compreensíveis, adaptáveis à inovação e menos complicados para os produtores e as administrações.
2.1.1 O pacote «Qualidade» está em sintonia com as outras políticas da União. A recente comunicação da Comissão sobre a PAC após 2013 pôs, com efeito, em evidência nomeadamente a necessidade de manter a diversidade das actividades agrícolas nas zonas rurais e de reforçar a competitividade. A própria comunicação Europa 2020 – Estratégia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, ao estabelecer as prioridades da União, define como objectivo estratégico a promoção de uma economia mais competitiva, tendo em conta que a qualidade é um dos pontos fortes da agricultura europeia.
2.2 Em 2009, a Comissão publicou a comunicação sobre a política de qualidade dos produtos agrícolas (COM(2009) 234 final) com as seguintes orientações estratégicas:
— |
melhorar a comunicação entre os agricultores, os compradores e os consumidores no respeitante às qualidades dos produtos agrícolas; |
— |
tornar mais coerentes os instrumentos utilizados na política da União Europeia no domínio da qualidade dos produtos agrícolas; |
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reduzir o grau de complexidade para que seja mais fácil para os agricultores, os produtores e os consumidores utilizarem e compreenderem os vários sistemas e as menções de rotulagem. |
2.3 O pacote inclui:
2.3.1 |
uma proposta de regulamento destinada a simplificar a gestão dos sistemas de qualidade, agrupando-os num único instrumento legislativo. Esse regulamento garante a coerência dos diversos instrumentos e torna os sistemas mais facilmente compreensíveis para as partes interessadas; |
2.3.2 |
uma proposta de regulamento relativo às normas de comercialização destinado a aumentar a transparência e simplificar os procedimentos aplicáveis; |
2.3.3 |
orientações para boas práticas na implantação e gestão de sistemas de certificação de produtos agrícolas e de géneros alimentícios; |
2.3.4 |
orientações relativas à rotulagem de géneros alimentícios em cuja composição entram produtos com denominação de origem protegida (DOP) ou indicação geográfica protegida (IGP). |
2.4 Denominações de origem e indicações geográficas
A proposta conserva e reforça o sistema de qualidade vigente para os produtos agrícolas e os géneros alimentícios, com excepção dos sistemas de indicações geográficas dos vinhos, bebidas aromatizados e bebidas alcoólicas. Além disso, o actual procedimento de registo antecipa os prazos previstos, introduz uma série de normas mínimas comuns para os controlos oficiais e mantém o âmbito de aplicação do regulamento (produtos destinados ao consumo humano e outros produtos).
2.5 Especialidades tradicionais garantidas
É mantido o sistema de reserva, mas é eliminada a possibilidade de registar nomes sem reserva. Simplifica-se o sistema de registo, aumenta-se para 50 anos o critério de tradição e restringe-se o sistema a pratos preparados e a produtos transformados.
2.6 Menções de qualidade facultativas
A proposta visa integrar no regulamento as menções de qualidade facultativas, porquanto apresentam atributos que conferem uma mais-valia aos produtos, e apoiar algumas normas de comercialização específicas (carne de aves de capoeira criadas em liberdade, mel de origem floral, azeite de primeira extracção a frio), adaptando-as ao quadro jurídico do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
2.7 Normas de comercialização
A proposta prevê, como regra geral, que a Comissão adopte as normas de comercialização através de actos delegados. É estabelecida para todos os sectores uma base jurídica que obrigará a indicar na rotulagem o local de produção, ao nível geográfico adequado, consoante a especificidade de cada sector. Será feita uma análise caso a caso, começando pelo sector lácteo.
2.8 A proposta prevê que o controlo de todos os sistemas seja confiado às autoridades competentes nacionais: a supervisão do controlo exercido pelos Estados-Membros deve, além disso, ser feita ao nível mais alto possível, ou seja, a nível da União, para manter a credibilidade da regulamentação aplicável aos géneros alimentícios em toda a União Europeia, em conformidade com os princípios estabelecidos naquele regulamento.
3. Observações na generalidade
3.1 A proposta da Comissão, destinada a facultar aos produtores os instrumentos necessários para comunicarem e aos consumidores as características dos produtos e os referidos atributos, protegendo de práticas comerciais desleais, constitui uma etapa importante de uma série de decisões em matéria de qualidade.
3.2 A rastreabilidade é um instrumento importante para seguir um produto ao longo de toda a fileira e que contribui, juntamente com as informações mencionadas no rótulo, para fornecer ao consumidor informações claras, completas e compreensíveis sobre o produto comercializado. O instrumento de rastreabilidade será constituído, pois, pelo conjunto de certificações, registos e documentação comercial comprovando processos e transferências, que são mantidos por todos os intervenientes na fileira e exibidos se os organismos de controlo o solicitarem.
3.3 A proposta prevê que os Estados-Membros verifiquem, com base numa análise de riscos, se os produtos estão em conformidade com as regras estabelecidas e, se for caso disso, apliquem sanções administrativas. O Comité recomenda que seja favorecida a manutenção de uma rede de controlos eficaz, alargando e fazendo aplicar as competências das respectivas autoridades nacionais de controlo, que velam pelo respeito das normas de comercialização nos sectores em que elas já estão previstas.
3.4 Paralelamente à actividade de vigilância através de um sistema de controlos, utilizando inclusivamente análises, recomenda-se que sejam envidados esforços e iniciativas para responsabilizar mais os agentes do sector e reforçar uma cultura do respeito pelas regras cada vez mais generalizada.
3.5 Quanto às referências ao «local de produção», que devem constar obrigatoriamente do rótulo, a proposta é excessivamente genérica, pois prevê um «nível geográfico adequado» a estabelecer caso a caso. Com efeito, a manter-se este parâmetro, poderia dar-se o caso extremo de um alimento em que no rótulo figurasse apenas um vago «produzido na UE»: esta menção excluiria uma proveniência de países terceiros, mas não reflectiria o esforço louvável de informação e transparência para com os consumidores, de que as novas normas de comercialização dão testemunho.
3.6 O recurso à utilização generalizada do instrumento dos actos delegados, tal como está previsto na proposta de modificação/integração das normas de comercialização existentes e futuras, não permite para já uma avaliação suficientemente aprofundada da regulamentação no seu todo. É, certamente, positivo que os conteúdos das futuras normas de comercialização tenham sido elaborados com precisão, estabelecendo, até à data, um quadro de dados, informações e indicações exaustivas de todos os processos, manipulações e operações de transporte a que foi sujeito o produto destinado à venda. Todavia, a apreciação sem dúvida positiva da sua aplicabilidade, corroborada pelas análises de impacto efectuadas, não pode ainda ser acompanhada da avaliação da sua aplicação prática e, sobretudo, da sua eficácia, por categoria e por produto. Tal avaliação só poderá ser efectuada depois de as normas serem aplicadas na prática.
3.7 As propostas incluídas no pacote «Qualidade» fazem parte de um projecto único de qualidade integral, o que significa que os vários instrumentos devem ser considerados complementares e devem operar em total sinergia. Será, portanto, necessário velar por que qualquer modificação introduzida num desses instrumentos não tenha repercussões negativas ou indesejáveis nos outros.
4. Observações na especialidade
4.1 Quanto à realização do objectivo da política de qualidade, parece pecar por incoerência o disposto no 112.o–B, alínea c), que considera a priori que um produto destinado a ser comercializado respeita a norma de comercialização geral se for conforme com uma norma que se lhe aplique, adoptada por qualquer das organizações internacionais indicadas no anexo XII-B. O Comité opõe-se, todavia, a esta disposição, que não permite um exame efectivo da conformidade substancial em relação às normas de comercialização, gerais e específicas, consideradas essenciais para a protecção dos cidadãos europeus e da concorrência.
4.2 As derrogações previstas no artigo 112.o-K não são acompanhadas de explicações suficientes sobre as razões pelas quais as autoridades nacionais podem prever derrogações ou manter em vigor disposições nacionais com particular referência para as matérias gordas para barrar e as práticas enológicas. Todavia, se a razão invocada for a de formalizar uma prática existente com o intuito de impedir a proliferação de outros regimes que não sejam abrangidos pelas novas normas de comercialização, o Comité concorda com a escolha, mas pede que figure no texto da proposta uma explicação clarificando e confirmando esta interpretação.
4.3 A proposta do Parlamento e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1234/2007 contém uma disposição que permite à Comissão adoptar, utilizando o instrumento legislativo dos actos delegados, normas de comercialização específicas para todos os produtos enumerados no anexo I da própria proposta, à excepção do álcool etílico de origem agrícola. Recomenda-se, no entanto, particular atenção na utilização desses actos delegados, os quais, se não forem acompanhados da necessária especificidade, poderiam perturbar sectores já sujeitos a normas de comercialização precisas, em particular o sector das frutas e produtos hortícolas.
4.4 Sugere-se, por último, que, dada a complexidade das revogações e substituições introduzidas no regulamento original, o Regulamento (CE) n.o 1234/2007, elas sejam destacadas com particular precisão, facilitando, assim, a sua leitura e compreensão pelos utilizadores finais, em primeiro lugar, os produtores e os consumidores, e contribuindo desse modo para uma aplicação correcta e uniforme.
Bruxelas, 4 de Maio de 2011
O Presidente do Comité Económico e Social Europeu
Staffan NILSSON
(1) JO C 18, de 19.1.2011, p. 5-10, Modelo agrícola comunitário – Qualidade de produção e informação ao consumidor como factores de competitividade.
(2) JO C 100, de 30.4.2009, p. 60-64, Segurança sanitária — Importações agrícolas e alimentares.
(3) JO C 107 de 6.4.2011, p. 30-32 – Apoio ao Desenvolvimento Rural pelo Feader – Regimes de apoio directo aos agricultores no âmbito da PAC.
(4) Regulamento (CE). n.o 1580/2007 alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1221/2008 da Comissão.
(5) COM(2010) 738 final — art. 112.o–E, n.o 3, alínea c).
(6) JO C 77 de 31.3.2009, p. 81, ponto 1.3 e JO C 354, de 28.12.2010, p. 35, ponto 5.5.18.
(7) COM(2010) 738 final — art. 112.o-B, ponto 3, e anexo XII-B.