23.7.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 218/46


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação eficaz da supervisão orçamental na área do euro»

[COM(2010) 524 final — 2010/0278 (COD)]

2011/C 218/08

Relator: Vincent FARRUGIA

Em 6 de Dezembro de 2010, o Conselho decidiu, nos termos dos artigos 136.o e 121.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação eficaz da supervisão orçamental na área do euro

COM(2010) 524 final — 2010/0278 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 8 de Abril de 2011.

Na 471.a reunião plenária de 4 e 5 de Maio de 2011 (sessão de 5 de Maio), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 139 votos a favor, 10 votos contra e 33 abstenções o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE reconhece que é necessária uma reforma do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) para resolver os problemas provocados pela crise de 2008, bem como problemas de longa data que já eram patentes antes da crise. Além disso, o CESE salienta que o PEC não permitiu prevenir e conter os desequilíbrios fiscais devidos a outras causas, incluindo desequilíbrios macroeconómicos e insuficiências ao nível das práticas e da regulamentação dos sectores bancário e financeiro.

1.2   Embora acolha favoravelmente a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação eficaz da supervisão orçamental na área do euro, que considera um passo na direcção de uma reforma que se impõe, o CESE chama a atenção para a necessidade de uma revisão adequada dos elementos das vertentes preventiva e correctiva nela incluídos.

1.3   O CESE entende que as regras orçamentais devem ter devidamente em conta:

a questão da qualidade das actividades fiscais, no que toca à melhoria do contributo dos mecanismos da receita e da despesa para o lado da oferta da economia;

que a melhor maneira de garantir a sustentabilidade das situações orçamentais e financeiras é uma maior ênfase na prevenção, mais do que em medidas correctivas;

que os mecanismos baseados em incentivos têm mais probabilidades de êxito do que os mecanismos assentes apenas em medidas punitivas.

Este ponto de vista não menoscaba a importância das medidas correctivas, essenciais para promover a disciplina orçamental.

1.3.1   Esta abordagem é considerada consentânea com o objectivo da Estratégia Europa 2020 de um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo.

1.4   No que respeita à vertente preventiva, e de acordo com os objectivos definidos na Análise Anual do Crescimento, a Comissão propõe que a fixação de metas numéricas para os resultados orçamentais se baseie num sistema duplo, com uma abordagem do topo para a base e outra da base para o topo. A primeira centra-se na fixação de um objectivo para o esforço de consolidação orçamental requerido para toda a área do euro, ao passo que a segunda contempla a distribuição desse esforço por acções a levar a cabo por cada Estado-Membro. Isto reforçaria, através de uma abordagem formal, os esforços da Comissão de ter mais devidamente em conta as especificidades nacionais na aplicação do PEC.

1.5   Nesta abordagem, os benefícios decorrentes da credibilidade associada a uma união monetária podem exigir dos Estados-Membros esforços adicionais de consolidação orçamental proporcionais à sua dimensão relativa e à sua capacidade de realizar tais esforços.

1.6   O CESE sugere ainda que a imposição de depósitos remunerados, depósitos não remunerados e sanções seja efectuada de modo a que eles sejam financiados directamente, e antes de mais, através da correcção dos elementos das políticas que estejam a dar origem a uma situação orçamental insustentável. Esta seria determinada mediante uma avaliação dos desvios dos elementos da despesa e da receita em relação à via da convergência determinada através da vertente preventiva. Além disso, o seu valor seria calculado a partir do valor dos elementos da despesa e/ou da receita que possam ser considerados como causadores directos da insustentabilidade da política orçamental. Isto permitiria melhorar a qualidade da política orçamental.

1.7   Sugere-se ainda que as sanções aplicadas no âmbito da vertente correctiva sejam sempre acompanhadas de uma avaliação de impacto rigorosa, para que o seu efeito se traduza numa melhoria da qualidade das políticas orçamentais.

1.8   Para alcançar um equilíbrio entre os incentivos e as sanções na vertente correctiva, o CESE propõe que os depósitos remunerados e não remunerados possam ser obtidos pelo Estado-Membro em causa sempre que seja conseguida uma redução da dívida pública pelo menos equivalente aos juros e susceptível de ser sustentável no futuro. As sanções, por seu turno, serão orientadas para o Mecanismo Europeu de Estabilidade.

1.9   O CESE está convicto de que uma reforma adequada da supervisão orçamental será essencial para reforçar a governação e restabelecer a credibilidade da área do euro.

2.   Execução eficaz da supervisão orçamental na área do euro

2.1   A crise financeira e económica global de 2008 provocou um aumento significativo dos défices orçamentais e da dívida pública. Esses défices agravaram preocupações de há mais longa data quanto à sustentabilidade financeira. O desempenho orçamental assimétrico dos Estados-Membros – havendo, em alguns casos, uma possibilidade real de incumprimento da dívida –, associado à insuficiência da coordenação orçamental e dos mecanismos de compensação, é outro grande desafio. A esses receios juntam-se as lacunas dos sistemas financeiros e bancários e das infra-estruturas de regulação, associadas à possibilidade de incumprimento da dívida.

2.2   O PEC, um conjunto de regras para a coordenação das políticas orçamentais nacionais no âmbito da União Económica e Monetária, foi instituído com o objectivo específico de fomentar a disciplina orçamental, mas a experiência recente pôs a descoberto lacunas e fragilidades do sistema que podem comprometer seriamente a estabilidade do euro. Deu-se assim início a um debate sobre a importância da governação económica da UE (1), na sequência do qual a Comissão apresentou, em Setembro de 2010, um pacote legislativo desdobrado em seis comunicações. O pacote é constituído por:

Um reforço do PEC com a introdução de um princípio de prudência na política orçamental (2),

A prevenção e a correcção dos desequilíbrios macroeconómicos (3),

A instituição de quadros orçamentais nacionais de qualidade (4) e

Uma execução mais rigorosa (5).

2.3   O presente parecer centra-se especificamente nas medidas de execução constantes da proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação eficaz da supervisão orçamental na área do euro (6). Note-se que o CESE também está a elaborar um projecto de parecer sobre o documento COM(2010) 527 final (7).

3.   Contexto

3.1   O principal instrumento de coordenação e supervisão das políticas orçamentais na área do euro é o PEC, que aplica as disposições do Tratado em matéria de disciplina orçamental. Em Junho de 2010, o Conselho Europeu chegou a acordo sobre a necessidade urgente de reforçar a coordenação das políticas económicas e, mais concretamente, quanto ao seguinte:

(i)

reforço das vertentes preventiva e correctiva do PEC – incluindo a aplicação de sanções – tomando em devida consideração a situação específica de cada Estado-Membro da área do euro;

(ii)

atribuição, no âmbito da supervisão orçamental, de um papel muito mais relevante aos níveis e à evolução da dívida e à sustentabilidade em geral;

(iii)

garantia de que todos os Estados-Membros têm, a nível nacional, regras e quadros orçamentais de médio prazo consentâneos com o PEC;

(iv)

garantia da qualidade dos dados estatísticos.

3.2   No que respeita à execução eficaz da supervisão orçamental na área do euro, a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho visa a introdução de novas alterações nos regulamentos (CE) n.os 1466/97 e 1467/97, que lançaram as bases do PEC (8). O regulamento proposto procura, sobretudo, consolidar a vertente preventiva e reforçar a vertente correctiva do PEC.

3.2.1   No que respeita à vertente preventiva, a proposta de regulamento refere que o actual objectivo orçamental a médio prazo (OMP), indicado nos programas de estabilidade e convergência, e o requisito da convergência anual de 0,5 % do PIB serão mantidos, mas tornar-se-ão operativos graças à introdução de um novo princípio de prudência na política orçamental. De acordo com a proposta, esse princípio implica que o ritmo de crescimento anual da despesa não deverá exceder uma taxa prudente de crescimento do PIB a médio prazo, salvo se o excesso for compensado por um aumento da receita pública ou se uma eventual redução discricionária da receita for contrabalançada pela diminuição da despesa. Em caso de desvio em relação à política orçamental prudente, a Comissão emitirá uma recomendação baseada num mecanismo de execução criado ao abrigo do artigo 136.o do Tratado, impondo um depósito remunerado de valor equivalente a 0,2 % do PIB.

3.2.2   A vertente correctiva está associada à obrigação dos Estados-Membros da área do euro de evitarem défices e dívidas que excedam os limiares numéricos de 3 % e 60 % do PIB, respectivamente, sendo que, no caso da dívida, também se considera aceitável uma redução sensível que a aproxime de um valor que respeite o critério da dívida.

3.2.2.1   A proposta da Comissão reconhece que a importância central dada ao equilíbrio orçamental anual pode levar a uma concentração excessiva em considerações de curto prazo, e que a dívida merece mais atenção como indicador da sustentabilidade orçamental a longo prazo.

3.2.2.2   O regulamento proposto prevê, relativamente à vertente correctiva, que as medidas de execução sejam reforçadas com a introdução de um novo conjunto de sanções financeiras aplicáveis aos Estados-Membros da área do euro, que serão impostas numa fase mais precoce do processo e de forma gradual. Quando se declarar que um determinado país apresenta um défice excessivo, será exigida a constituição de um depósito não remunerado de valor equivalente a 0,2 % do PIB. Em caso de incumprimento, o depósito será convertido em multa.

3.2.3   A Comissão propõe que os aspectos operacionais da execução, tanto da vertente preventiva como da correctiva, fiquem sujeitos a um procedimento de votação invertida, nos termos do qual a Comissão recomendará ao Conselho que intime o Estado-Membro em causa a constituir o depósito. Essa recomendação mantém-se salvo se o Conselho deliberar em contrário por maioria qualificada e no prazo de dez dias a partir da data da apresentação da recomendação.

3.2.4   A proposta de regulamento dispõe que o Conselho pode reduzir o montante do depósito por unanimidade com base ou em circunstâncias excepcionais ou num pedido fundamentado apresentado pelo Estado-Membro em causa. No caso da vertente preventiva, uma vez o Conselho satisfeito com a forma como o Estado-Membro resolveu a situação, o depósito, acrescido dos juros vencidos, será devolvido ao Estado-Membro em questão. No caso da vertente correctiva, a proposta de regulamento dispõe que o depósito não remunerado é liberado após correcção da situação de défice excessivo, mas os juros vencidos e o montante das multas cobradas serão distribuídos pelos Estados-Membros da área do euro que não tenham défices excessivos nem estejam sujeitos a procedimentos relativos a desequilíbrios excessivos.

3.2.5   A proposta enquadra-se no âmbito de uma tendência no sentido de uma avaliação macroeconómica mais ampla, que inclua o apuramento de desequilíbrios estruturais com efeitos negativos para a competitividade. Neste sentido, foram também publicadas uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às medidas de execução para corrigir os desequilíbrios macroeconómicos excessivos na área do euro (9) e uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre prevenção e correcção dos desequilíbrios macroeconómicos (10).

3.3   Uma supervisão orçamental eficaz na área do euro deve andar a par com uma atenção especial aos quadros orçamentais nacionais.

3.4   Estas propostas inserem-se numa reforma mais ampla da governação económica, que foi impulsionada na sequência da fixação dos objectivos da Estratégia Europa 2020. Prevê-se que a coordenação das políticas económicas, que integra a supervisão da situação orçamental através da verificação do cumprimento das regras orçamentais e das reformas estruturais, seja incluída no Semestre Europeu, que define um período durante o qual as políticas orçamentais e estruturais dos Estados-Membros serão analisadas tendo em vista a detecção de eventuais incongruências e desequilíbrios emergentes, e o reforço da coordenação, enquanto se encontram ainda em preparação decisões orçamentais de grande importância (11).

4.   Observações na generalidade

4.1   As reformas do PEC tendentes a corrigir as fragilidades do sistema são necessárias dadas quer as debilidades que se manifestaram com a emergência da crise excepcional de 2008, quer os problemas que já antes eram evidentes.

4.2   Com efeito, já vários anos antes da crise vários países da área do euro mantinham défices orçamentais acima do valor de referência de 3 % e estavam a aumentar os rácios da dívida pública (12). A emergência da crise financeira e económica redundou numa significativa deterioração da situação orçamental, de tal modo que se estima que, na área do euro, o défice orçamental médio e o rácio da dívida pública se tenham fixado, no final de 2010, em 6,3 % e 84,1 % do PIB, respectivamente (13). O PEC não foi concebido para prevenir esses desequilíbrios, que em muitos casos se deveram igualmente a fortes tensões na situação macroeconómica e financeira global.

4.3   Há duas observações fundamentais a fazer a respeito do PEC. A primeira diz respeito aos aperfeiçoamentos que podem ser introduzidos no mecanismo de execução. A segunda tem a ver com a confiança excessiva no critério do défice orçamental e o relativo esquecimento a que foi votada a questão da dívida. O ciclo económico não foi suficientemente tido em conta na aplicação do PEC.

4.3.1   No que respeita ao incumprimento, foram vários os países que, ao longo dos anos, violaram tanto o critério do défice como o da dívida. A não aplicação de sanções favoreceu práticas orçamentais que descuravam quer a sustentabilidade orçamental dos Estados-Membros que as adoptaram, quer o impacto de uma política orçamental insustentável de qualquer Estado-Membro da UEM no conjunto desta. O incumprimento que se verificou no passado fragilizou o PEC e reduziu a sua credibilidade.

4.3.1.1   Espera-se que as reformas das vertentes preventiva e correctiva do Pacto, que incluirão um conjunto de novas e mais severas sanções financeiras, corrijam esta falha. Falta, porém, saber até que ponto as medidas de execução serão efectivamente aplicadas.

4.3.1.2   Num certo sentido, poder-se-á afirmar que a adopção de um pacote ineficaz seria, neste momento, um risco demasiado elevado. Os mercados financeiros seguirão com redobrada e inusitada atenção a evolução dos equilíbrios orçamentais e macroeconómicos nos países da área do euro. A falta de credibilidade das medidas de execução ditará o fracasso do PEC, afectando seriamente a estabilidade da área do euro.

4.3.1.3   Importa igualmente ter em conta o facto de as propostas de reforço da supervisão estarem a ser adoptadas no rescaldo de uma crise sem precedentes, num momento em que continua a registar-se um fraco crescimento económico. Os governos viram-se obrigados a intervir para evitar o colapso total do sistema financeiro, injectando dinheiro nos bancos. Também tiveram de agir para minimizar os custos sociais e económicos da crise.

4.3.2   Quanto à confiança excessiva no critério do défice, é notório que a revisão do PEC feita em 2005 procurou recentrá-lo nos défices estruturais, de modo a ter em conta a situação cíclica de cada Estado-Membro. Não obstante, a disciplina orçamental numa perspectiva de longo prazo não foi contemplada. O destaque acrescido dado ao critério da dívida corrigirá, em certa medida, esta falha.

4.3.2.1   Em todo o caso, o mecanismo deve ter em conta as razões subjacentes à acumulação da dívida. A dívida contraída para financiar projectos públicos de elevada rentabilidade económica e social não pode ser equiparada à que se destina a cobrir despesas de baixa rentabilidade.

4.3.2.2   Embora se preveja que a reforma dos mecanismos de supervisão tenha em conta as especificidades de cada país, nomeadamente a composição da dívida, os riscos associados à estrutura da dívida, o endividamento do sector privado e as responsabilidades relacionadas com o envelhecimento da população, seria igualmente importante fazer a distinção entre dívida externa e dívida interna, já que esta última concorre para a estabilidade macroeconómica.

4.3.2.3   Outra crítica ao mecanismo de supervisão prende-se com a importância atribuída a certos valores de referência, que são essencialmente arbitrários (14). Não obstante, é reconhecido que a adopção de valores de referência tem vantagens importantes em termos de simplificação, transparência e eficiência da governação.

4.3.2.4   Por outro lado, a divergência de alguns Estados-Membros em relação a esses valores indica até que ponto a convergência é difícil na UE. É desejável uma rápida convergência entre os diferentes países e o destaque recentemente dado pelo Conselho Europeu a este assunto é justificado. Por outro lado, isso exige um equilíbrio delicado a nível de cada país entre o empenho na disciplina orçamental e as necessidades específicas de reestruturação, investimento e crescimento, que podem justificar a concessão de apoios orçamentais.

4.4   Importa reiterar que a sustentabilidade orçamental não pode ser avaliada independentemente dos desequilíbrios macroeconómicos. Justifica-se, por isso, uma supervisão macroeconómica mais alargada para acompanhar a correcção dos desequilíbrios.

4.5   Os motivos que aconselham a criação de quadros orçamentais nacionais em complemento do PEC assentam no reconhecimento de que, apesar de a disciplina orçamental ser uma preocupação comum a todos os países da área do euro, a definição da política orçamental compete aos órgãos legislativos nacionais.

4.5.1   Até que ponto pode uma abordagem mais descentralizada da disciplina orçamental pode ser seguida dependeria, em última análise, de alterações significativas do Tratado, que submeteriam o interesse nacional aos interesses comuns, mas também pode resultar de disposições mais flexíveis acordadas pelo Estado-Membro. Se estas alterações não forem feitas, é provável que haja uma tendência para promover o interesse nacional, por muito importantes que sejam os interesses comuns (15). Por isso, é importante examinar o papel que as regras de responsabilidade orçamental a nível nacional podem assumir na promoção da disciplina orçamental, promovendo, através da sua aplicação com êxito, a sustentabilidade fiscal em toda a área do euro.

5.   Observações na especialidade

5.1   Embora os objectivos do regulamento proposto, baseados no reforço do PEC com instrumentos que facilitam uma aplicação eficaz, sejam louváveis, há determinados detalhes das vertentes preventiva e correctiva do Pacto que, no entender do CESE, devem ser tidos em conta.

5.2   O objectivo da despesa, descrito na vertente preventiva e baseado numa taxa prudente de crescimento do PIB a médio prazo, não tem em conta a composição da despesa pública, embora um objectivo global quanto à despesa seja útil no interesse da simplificação e da eficiência da governação. O mesmo acontece com as regras orçamentais, que se centram apenas em indicadores globais como os critérios do défice e da dívida. Estes critérios não têm em consideração o crescimento a longo prazo do lado da oferta induzido por algumas categorias da despesa pública e pela melhoria da qualidade da despesa orçamental e dos mecanismos geradores de receitas em geral.

5.2.1   Por conseguinte, é necessário dar muito maior destaque à qualidade das finanças públicas através de uma avaliação da composição e eficácia da despesa pública. Isto pode ser especialmente importante para o investimento no capital humano através de despesas com a educação e a saúde, com a investigação e o desenvolvimento, com infra-estruturas públicas e com o desenvolvimento de instituições (16)  (17). Assim, propõe-se que este tipo de despesa fique excluído do limite de despesas, sobretudo quando seja financiado por programas da UE e co-financiado a nível nacional. A fim de preservar a qualidade das despesas sociais, os elementos não discricionários dos subsídios de desemprego também deveriam ficar excluídos. Além disso, a concretização dos objectivos orçamentais deve estar inteiramente de acordo com os objectivos da Estratégia Europa 2020 de um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, e o alcance desses objectivos pode implicar mais despesas estatais (18).

5.2.2   Para evitar a incerteza da regulamentação, o CESE propõe igualmente uma definição clara dos termos «política orçamental prudente», «taxa prudente de crescimento a médio prazo do PIB» e «circunstâncias excepcionais».

5.3   O mecanismo de execução deve ser accionado não apenas devido a desvios dos valores numéricos, mas também tendo em conta considerações de ordem mais ampla, nomeadamente em relação às condições económicas, políticas e sociais que prevalecem no Estado-Membro. Esta proposta destina-se não a enfraquecer o mecanismo de prevenção, mas sim a permitir que sejam tidas em conta as condições específicas em cada país da área do euro. Isto é congruente com a proposta de regulamento relativo aos desequilíbrios macroeconómicos, segundo o qual, uma vez accionado o mecanismo de alerta, deve ser feita uma análise completa do Estado-Membro em questão.

5.4   Sugere-se ainda que a imposição de depósitos remunerados, depósitos não remunerados e multas seja sempre efectuada de modo a que os mesmos sejam directamente financiados mediante uma correcção dos elementos das políticas que estejam a dar origem a uma situação orçamental imprudente e insustentável determinada com base nos desvios às disposições da vertente preventiva. Além disso, o seu valor seria calculado a partir do valor dos elementos da despesa e/ou da receita que possam ser considerados como causadores directos da insustentabilidade da política orçamental. Esta abordagem evitaria o risco de os depósitos e as multas serem financiados através das despesas públicas de elevada rentabilidade. Embora se deva reconhecer que não é fácil detectar os comportamentos insustentáveis, há que envidar esforços para adoptar definições inequívocas e viáveis que possam ser usadas neste contexto.

5.4.1   Adicionalmente, é imprescindível que o depósito só seja liberado mediante compromisso do Estado-Membro em causa de redireccionar esses fundos para despesas produtivas. A este respeito, o recurso a abordagens custo-benefício, semelhantes às utilizadas para a repartição das dotações dos fundos estruturais e do Fundo de Coesão (19), poderia ser justificado.

5.5   É necessário, ainda, ter em devida conta as implicações da execução nos casos em que a imposição de depósitos não remunerados e sanções possa ocorrer numa altura em que o quadro económico e social do Estado-Membro pode ser considerado vulnerável. Consequentemente, qualquer recomendação feita pela Comissão no sentido de accionar a vertente correctiva deve ser alvo de uma avaliação de impacto a fim de determinar de que modo a sua aplicação levaria efectivamente a uma melhoria da qualidade da política orçamental em cada Estado-Membro e na área do euro em geral. Importa que a execução não dê origem a mais erros do que aqueles que procura solucionar.

5.6   O artigo 7.o do regulamento diz respeito à distribuição do montante dos juros e multas obtido pela Comissão, que deve ser feita proporcionalmente à parte de cada Estado-Membro no rendimento nacional bruto total dos países da área do euro que não apresentam défice nem desequilíbrios excessivos. O sistema de distribuição pode assim provocar maiores desequilíbrios na UEM, contribuindo potencialmente para o aprofundamento das divergências entre os Estados-Membros da área do euro que não cumprem os requisitos de uma união monetária.

5.7   Para alcançar um equilíbrio entre os incentivos e as sanções na vertente correctiva, o CESE propõe que os depósitos remunerados e não remunerados possam ser obtidos pelo Estado-Membro em causa sempre que seja conseguida uma redução da dívida pública pelo menos equivalente aos juros e susceptível de ser sustentável no futuro. As sanções, por seu turno, serão orientadas para o Mecanismo Europeu de Estabilidade.

5.8   A premissa subjacente a esta sugestão é a de que o PEC deve servir de incentivo à adopção de práticas sustentáveis e não como mecanismo estritamente punitivo.

5.9   Embora se reconheça que o objectivo da procura da convergência económica e orçamental básica se deve fundamentar em metas comuns, há quem defenda que, para avaliar a sustentabilidade orçamental no curtíssimo prazo, poderá ser necessário aplicar, com alguma flexibilidade, um objectivo universal, pelo menos até se ter atingido uma convergência económica mínima entre os diferentes países, mas também sem esquecer a forma desigual como a recente recessão afectou os vários Estados-Membros.

5.9.1   É igualmente importante criar condições de enquadramento que permitam que todos os Estados-Membros beneficiem dos factores externos de credibilidade favoráveis que se esperam de uma grande união monetária. Daqui decorre que aos países poderão ser exigidos esforços adicionais de consolidação orçamental proporcionais à sua dimensão relativa na zona monetária e à sua capacidade de empreender esses esforços, de modo a que o objectivo global comum da área do euro seja alcançado com coerência. Esta abordagem beneficiaria directamente todos os países através da credibilidade económica que daí resultaria para a área como um todo, e sobretudo graças às políticas dos países com melhor desempenho.

5.9.2   A eficácia desta abordagem depende em grande medida do mecanismo de supervisão proposto pela Comissão, que garante que os países que ficam para trás façam o necessário para, com a rapidez ideal, atingirem a convergência. Importa salientar o mais possível a importância de dados estatísticos correctos e de melhorar esses dados e os relatórios de forma a assegurar que informações credíveis estejam sempre disponíveis em tempo útil.

5.9.3   O Comité sugere, pois, que, de imediato e até ser alcançada uma convergência económica adequada entre os vários Estados-Membros, seja utilizado um sistema com duas abordagens – do topo para a base e da base para o topo – a fim de reforçar e complementar os esforços actualmente despendidos para restaurar a sustentabilidade da área do euro, introduzindo-lhes os elementos de flexibilidade necessários de forma programada e bem regulada.

5.9.4   A abordagem do topo para a base baseia-se na fixação de uma meta para toda a área do euro que determine o esforço de consolidação orçamental requerido a esse nível. Alcançar essa meta reforçará a credibilidade da área do euro em geral, o que beneficiará todos os Estados-Membros. A abordagem ascendente implica a distribuição do esforço a realizar em toda a área por acções a levar a cabo por cada Estado-Membro. Essa distribuição terá em conta vários critérios económicos objectivos como, por exemplo, o nível de desenvolvimento, as necessidades de investimento, a amplitude da reforma do regime de pensões e das reformas estruturais, a qualidade das finanças públicas e a eficácia do regime fiscal. Além disso, impedirá que uma aplicação demasiado restritiva do PEC cause danos permanentes ao crescimento de certos países.

5.9.5   Por um lado, esta forma de proceder introduzirá um elemento de solidariedade justificável entre os países da área do euro e, por outro, constitui um importante passo no sentido de uma melhor coordenação e integração orçamental. Assim que tenha sido atingido um nível mínimo de convergência económica, a distribuição dos esforços entre os Estados-Membros equivalerá a uma situação em que todos os países prosseguem objectivos numéricos comuns. Entretanto, a necessária flexibilidade deixará de se verificar país a país, como aconteceu frequentemente no passado em situações aparentemente pontuais e talvez injustificadas, e passará a fazer parte de um sistema coeso e consistente para realizar os necessários esforços de consolidação orçamental ao nível da área do euro. Esta abordagem pode contribuir em grande medida para manter a credibilidade no sistema.

5.9.6   Esta abordagem é de natureza semelhante à da adoptada no processo de determinação dos objectivos da Estratégia Europa 2020, nos termos do qual os Estados-Membros fixam os seus objectivos nacionais em conformidade com os objectivos globais definidos para a UE. Com efeito, o anexo 1 da Análise Anual do Crescimento, que apresenta objectivos temporários diversificados para os Estados-Membros, refere que um dos elementos importantes da Estratégia é o facto de cada Estado-Membro fixar o seu grau de ambição relativamente aos objectivos gerais da Estratégia «Europa 2020». Diz-se que o cumprimento desses objectivos é facilitado pelo debate político interno necessário para os estabelecer, no qual são tidas em conta as situações de partida e considerações de ordem nacional. Dessa forma, pode propor-se igualmente a definição de períodos de transição explícitos, com um calendário realista de consolidação, para os países que tenham de realizar esforços de consolidação particularmente substanciais.

5.9.7   Esta solução não equivale a enfraquecer o mecanismo preventivo proposto pela Comissão, uma vez que assenta num alinhamento a longo prazo pelas mesmas metas numéricas para todos os países da área do euro. Destina-se, isso sim, a permitir um enquadramento formal que permita diferentes ritmos de convergência para cada país da área do euro, de modo análogo às abordagens específicas por país propostas pela própria Comissão. Esta seria igualmente uma forma não despicienda de promover a credibilidade do sistema, inscrevendo formalmente a flexibilidade nos planos de convergência para cada país.

5.10   Por último, importa sublinhar que o diálogo social tem um papel importante a desempenhar. A nível nacional, o diálogo social é importante para o desenvolvimento de um quadro político nacional centrado na política orçamental e na supervisão macroeconómica. Um diálogo social e político maduro e global permite enfrentar os desafios sociais e económicos, em particular os de longo prazo como o da reforma do regime de pensões e o das despesas da saúde. Para que os governos possam alcançar objectivos como a sustentabilidade orçamental e o equilíbrio macroeconómico, são necessárias fortes parcerias sociais e uma intensa colaboração, incluindo um consenso político.

5.10.1   O CESE também tem um papel importante a desempenhar ao proporcionar um diálogo eficaz entre os seus membros sobre sustentabilidade orçamental. Para o efeito, o CESE poderá fazer, em estreita colaboração com o diálogo social nacional, recomendações e sugestões sobre as reformas. Como é sugerido no parecer sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Banco Central Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Reforçar a coordenação das políticas económicas com vista à estabilidade, crescimento e emprego – Instrumentos para uma melhor governação económica da UE, o CESE poderá realizar sessões anuais especificamente dedicadas à formulação de recomendações e sugestões sobre as reformas. O CESE poderá ainda desempenhar um papel relevante velando por que os parceiros sociais e outras organizações da sociedade civil estejam em sintonia com os objectivos da União relacionados com o desenvolvimento social e económico.

Bruxelas, 5 de Maio de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver parecer do CESE, JO C 107 de 6.4.2011, p. 7.

(2)  COM(2010) 522 final e COM(2010) 526 final.

(3)  COM(2010) 527 final.

(4)  COM(2010) 523 final.

(5)  COM(2010) 524 final e COM(2010) 525 final.

(6)  COM(2010) 524 final.

(7)  Ver parecer do CESE sobre Desequilíbrios macroeconómicos, Ver página 53 do presente Jornal Oficial.

(8)  Os regulamentos foram alterados em 2005 pelos Regulamentos (CE) n.os 1055/2005 e 1056/2005 e complementados pelo Relatório do Conselho de 20 de Março de 2005 sobre «Melhorar a aplicação do PEC».

(9)  COM (2010) 525 final.

(10)  COM (2010) 527 final.

(11)  O Semestre Europeu foi lançado através da Análise Anual do Crescimento (COM (2011) 11 final), publicada em Janeiro de 2011. Esta publicação reúne as diferentes medidas que são essenciais para a aceleração da recuperação a curto prazo, concentrando-se igualmente nos objectivos da Estratégia Europa 2020.

(12)  Estatísticas do Eurostat, 16.12.2010.

(13)  Comissão Europeia, Previsões Económicas Europeias, Outono de 2010.

(14)  Wyplosz, C (2002), Fiscal Discipline in EMU: Rules or Institutions? [Disciplina Orçamental na UEM: Regras ou Instituições?], Instituto Universitário de Altos Estudos Internacionais, Genebra, e CEPR.

(15)  Direcção-Geral das Políticas Internas da União – Departamento de Política Geral, Direcção A: Políticas Económicas e Científicas, Assuntos Económicos e Monetários, «Multilateral Surveillance» [«Supervisão multilateral»] (Charles Wyplosz).

(16)  Salvador Barrios e Andrea Schaechter (2008), «The Quality of Public Finances and Growth» [«A Qualidade das Finanças Públicas e o Crescimento»], Comissão Europeia, Economic Papers, 337.

(17)  António Afonso, Werner Ebert, Ludger Schuknecht e Michael Thöne (2005), «Quality of Public Finances and Growth» [«A Qualidade das Finanças Públicas e o Crescimento»], BCE, Working Paper Series n.o 438.

(18)  Ver parecer do CESE, JO C 107 de 6.4.2011, p. 7.

(19)  Comissão Europeia (2008), Direcção-Geral da Política Regional, Guide to Cost-Benefit Analysis of Investment Projects [Guia da análise custo-benefício dos projectos de investimento], Junho de 2008.