18.5.2010   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 128/111


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Preço dos géneros alimentícios na Europa»

[COM(2008) 821 final]

(2010/C 128/21)

Relator: József KAPUVÁRI

Em 9 de Dezembro de 2008, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Preço dos géneros alimentícios na Europa

COM(2008) 821 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente que emitiu parecer em 2 de Setembro de 2009.

Na 457.a reunião plenária de 4 e 5 de Novembro de 2009 (sessão de 5 de Novembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 75 votos a favor, 5 votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1.   Os esforços para melhorar a cadeia de abastecimento alimentar e aumentar a sua eficiência e competitividade não devem ter como objectivo reduzir o preço dos géneros alimentícios. Isto faria com que a cadeia se mantivesse no caminho errado, como acontece actualmente. É necessário garantir que a relação qualidade-preço se mantém a um nível realista. A antecipação de preços baixos na cadeia de produção acaba por restringir o investimento e a capacidade de inovação dos fornecedores agro-alimentares, bem como a escolha dos consumidores, pelo que a Comissão tem de ter estes factores em conta a médio e longo prazo, assim como os seus efeitos secundários, e abandonar a sua orientação exclusiva para os benefícios imediatos dos preços baixos. Seria errado afirmar que a obtenção de produtos alimentares a preços baixos é do interesse do consumidor. Pelo contrário, para os consumidores a existência de preços realistas é benéfica, já que estes asseguram a qualidade, a quantidade e o serviço correspondentes às suas exigências. Contudo, uma abordagem que vise reduzir a amplitude da volatilidade dos preços é adequada, porque permite tornar a cadeia de abastecimento alimentar mais fiável e previsível.

1.2.   A União Europeia tem interesse em assegurar que os consumidores beneficiam, a longo prazo, de géneros alimentícios seguros. Nesse sentido, importa garantir um elevado nível de auto-suficiência. Por sua vez, só é possível assegurar a sustentabilidade da agricultura através da investigação e do desenvolvimento, da inovação e do desenvolvimento tecnológico. Para isso, os recursos da PAC são indispensáveis, mas o acesso aos mesmos deve ser organizado de maneira a encorajar a adaptação às condições do mercado, tornando a prestação de informação e a cooperação obrigatórias e dando especial atenção às questões do desenvolvimento rural.

1.3.   As possibilidades de acção só podem ser alargadas caso se realize uma concertação social o mais ampla possível. Para cada uma das áreas de acção, é necessário analisar o contexto, elaborar um plano de acção preciso e definir claramente as competências e responsabilidades. Tudo isto é fulcral, tendo em conta que qualquer medida relativa aos preços dos géneros alimentícios afecta um conjunto complexo de factores. Os géneros alimentícios constituem o principal factor de coesão social, além de serem importantes do ponto de vista estratégico e gozarem da confiança dos consumidores. Consequentemente, as condições de produção devem ser organizadas de maneira a não prejudicarem a sustentabilidade a longo prazo.

1.4.   Não é possível restringir os investimentos nos produtos de base, que sucedem geralmente nas bolsas de valores. Contudo, há que encontrar uma forma de reduzir o impacto dos factores que não reflictam a procura real, dado que perturbam as cadeias de abastecimento de produtos agrícolas. Embora a UE esteja ciente das suas responsabilidades em matéria de abastecimento alimentar nos países em desenvolvimento, não deve esquecer que a sua principal tarefa é assegurar aos seus cidadãos o fornecimento de uma gama completa de géneros alimentícios seguros, reduzindo a dependência relativamente a mercados mundiais e preservando, assim, a sua autonomia.

1.5.   O CESE apoia a iniciativa no sentido de criar um Grupo de Alto Nível sobre a Capacidade Concorrencial da Indústria Agro-Alimentar, lançada pela Decisão da Comissão, de 28 de Abril de 2008 (2008/359/CE), e aguarda com expectativa os resultados dos trabalhos desse grupo, sendo que um dos seus objectivos principais deveria ser atingir a maior estabilidade possível nos mercados agro-alimentares.

2.   Comunicação da Comissão

2.1.   A subida dos preços dos produtos agrícolas acelerou na segunda metade de 2007, tendo causado o aumento significativo do preço de retalho dos géneros alimentícios. A Comissão respondeu a esta situação com a Comunicação «Fazer face à subida dos preços dos géneros alimentícios – Orientações para a acção da UE» (COM(2008) 321 final).

2.2.   Para atingir este objectivo, a Comissão considera fundamental identificar e resolver os problemas de funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar em termos de regulamentação e concorrência. A comunicação, composta de cinco secções, analisa a situação e recomenda medidas para resolver os problemas.

2.3.   De acordo com a Comissão, o aumento dos preços dos produtos agrícolas de base resultou de uma combinação de factores estruturais e pontuais. Os primeiros, como o crescimento global da população, o aumento dos rendimentos nas economias emergentes e o desenvolvimento de novos mercados de escoamento, fortaleceram a procura mundial.

2.4.   «De Agosto de 2007 até Julho de 2008, a inflação dos preços dos géneros alimentícios (com excepção do álcool e do tabaco) representou cerca de 1,0 pontos percentuais (pp.) da inflação total.» A evolução dos preços foi marcada, entre outros aspectos, por subidas de preços diferentes nos alimentos transformados e nos não transformados, devido a razões de «composição».

2.5.   A Comissão prevê que a inflação dos preços dos géneros alimentícios e que a importância desses preços na inflação em geral diminua nos próximos dois anos.

2.6.   A Comissão considera que as restrições às exportações agrícolas impostas por alguns países no último ano foram mais nocivas do que benéficas porque anularam os sinais do mercado.

2.7.   Desde o começo de 2006, verificou-se um surto de investimento nestes mercados, como indica o total dos contratos de futuros sobre produtos agrícolas ainda detidos pelos operadores.

2.8.   A comunicação inclui um quadro que sintetiza as práticas mais preocupantes em matéria de concorrência, a saber:

cartéis,

acordos de compra,

imposição de preços de revenda,

marca única,

produtos de marca branca,

subordinação,

acordos de fornecimento exclusivo,

regimes de certificação.

2.9.   À luz desta análise, a Comissão propõe um roteiro para melhorar o funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar, dividido em quatro componentes principais.

2.10.   A Comissão espera que as recomendações do Grupo de Alto Nível sobre a Capacidade Concorrencial da Indústria Agro-Alimentar, constituído na Primavera de 2008, contribuam para a melhoria geral da competitividade da cadeia de abastecimento alimentar.

2.11.   Para melhor responder a potenciais práticas anti-concorrenciais, consideradas «preocupantes» na secção 4, a Comissão continuará o diálogo no contexto da Rede Europeia da Concorrência com as autoridades nacionais competentes, de modo a assegurar a coerência e aplicação coordenada das regras da concorrência em toda a UE, em prol dos consumidores europeus.

2.12.   No âmbito da revisão nacional e/ou comunitária de regulamentação potencialmente problemática para o funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar, a comunicação menciona as seguintes regulamentações e práticas:

a regulamentação que restringe a entrada de novas empresas no mercado, que deve ser revista;

a regulamentação que reduz as oportunidades de as empresas competirem nos preços, que também deve ser revista;

as práticas que distorcem a relação entre fornecedores e retalhistas, que devem ser desencorajadas.

2.13.   A Comissão examinará, juntamente com os reguladores dos mercados dos produtos de base e em estreito contacto com outras autoridades regulamentares não europeias (em particular, nos EUA onde se dá a maioria das trocas), as medidas que podem ser tomadas para reduzir a volatilidade dos preços dos produtos agrícolas de base.

2.14.   Com base no programa de trabalho proposto e nas respectivas medidas, a Comissão examinará a possibilidade de empreender outras acções e propõe que o Conselho Europeu reexamine esta questão em Dezembro de 2009.

3.   Observações na generalidade

3.1.   Os factores estruturais que causaram o aumento dos preços dos produtos agrícolas manter-se-ão a médio prazo, mas as flutuações dos últimos dois anos sugerem que o mercado destes produtos terá de se adaptar à crescente volatilidade dos preços. A actual crise económica prejudicou o aumento da procura nos mercados mundiais e, como consequência, os processos que se iniciaram em meados de 2007 poder-se-ão repetir a qualquer momento, tornando os mercados agrícolas ainda menos previsíveis. Além disso, a adaptação à procura causada pela manipulação especulativa dos preços, que não reflecte a verdadeira procura, é impossível, porque requer um nível de flexibilidade incompatível com as características e o potencial da produção agrícola.

3.2.   A União Europeia está ciente de que as flutuações nos preços dos produtos agrícolas afectam, não só todo o sector agrícola, mas também a totalidade dos consumidores através dos preços dos produtos alimentares. As flutuações abruptas e fortes demonstraram ser necessário repensar a posição do sector agrícola da UE. O Grupo de Alto Nível sobre a Capacidade Concorrencial da Indústria Agro-Alimentar é um fórum apropriado para esta reflexão. Neste contexto, importa definir: 1) o futuro do sector agrícola da UE; 2) a posição futura da agricultura nas políticas comunitárias; 3) a resposta às consequências da abertura dos mercados; e 4) como restabelecer o equilíbrio nas relações da cadeia de abastecimento alimentar.

3.3.   Embora a especialização territorial na UE não tenha progredido desde o início da PAC, há sinais claros deste fenómeno nos mercados internacionais. Dada a abertura gradual dos mercados da UE a produtos de países terceiros, os produtores agrícolas comunitários vêem-se forçados a competir em condições não equitativas. Consequentemente, estão a perder terreno nos mercados. A médio prazo, esta tendência poderá representar uma ameaça séria à economia rural na Europa. Assim, a UE só poderá promover uma política de comércio livre se continuar a prestar várias formas de apoio financeiro aos produtores agrícolas e fornecer os incentivos suficientes para manter os níveis de produção.

4.   Observações na especialidade

4.1.   Evolução dos preços dos produtos agrícolas de base e dos géneros alimentícios

4.1.1.   No pós-crise, é provável que o crescimento da procura de produtos agrícolas ultrapasse mais uma vez o crescimento da oferta. Consequentemente, é possível que estes produtos se tornem novamente mais atraentes para o capital de risco, o que poderá desencadear flutuações semelhantes às dos dois últimos anos, se as variações nos preços dos produtos agrícolas gerarem rendimentos mais elevados do que os proporcionados por outros produtos do mercado financeiro. Dada a conjuntura económica no pós-crise, as hipóteses de isto acontecer são menores do que em 2007. Não obstante, temos de estar preparados para uma contínua volatilidade dos preços, a médio prazo.

4.1.2.   Conforme salientado pelo Parlamento Europeu na sua resolução de 26 de Março de 2009 (2008/2175(INI)), a margem do preço de venda a retalho dos géneros alimentícios que chega aos produtores agrícolas e à indústria de transformação alimentar é cada vez mais pequena. Assim sendo, é óbvio que as flutuações dos preços no início da cadeia de abastecimento alimentar só terão um impacto limitado e tardio nos preços de venda a retalho.

O aumento dos preços de venda a retalho dos géneros alimentícios afecta todos os que despendem grande parte do seu rendimento nestes produtos. Este fenómeno está intimamente ligado ao nível de desenvolvimento económico de cada país. Por esta razão, o aumento do preço dos géneros alimentícios teve maior impacto na inflação dos novos Estados-Membros da UE. Nestes países, onde os rendimentos são menores, as despesas com a alimentação podem representar entre 40 % a 50 % do orçamento total das famílias.

4.1.3.   Nos próximos anos, o preço dos géneros alimentícios permanecerá, provavelmente, acima da média do período de 2002 a 2006, mas abaixo dos níveis registados no final de 2007. Ao mesmo tempo, os preços continuarão extremamente voláteis. Uma das alterações desfavoráveis dos últimos dois anos é o facto de os preços terem ficado mais sensíveis às informações do mercado. Dada a probabilidade de se verificar um aumento das informações sobre os factores que determinam tanto a oferta como a procura, as flutuações dos preços deverão continuar. Neste contexto, o papel dos meios de comunicação social também é importante, pois se actuarem de forma eficaz, informarão imediatamente os mercados sobre tudo o que se passa no mundo.

4.1.4.   Os produtores agrícolas da UE têm de estar preparados para uma procura de géneros alimentícios em constante crescimento. Importa melhorar tanto a quantidade como a qualidade da produção agrícola comunitária. No entanto, a PAC é, em grande medida, responsável por assegurar que a abertura gradual dos mercados da UE não compromete a competitividade dos sectores agro-alimentares europeus. A UE necessita de uma estratégia a longo prazo para a agricultura, que defina o nível de auto-suficiência a alcançar pela Comunidade no fornecimento de vários produtos. No entanto, temos de aceitar que, a médio prazo, a UE precisará de importar numerosos produtos.

4.2.   Papel da especulação nos preços dos produtos alimentares de base

4.2.1.   O volume do capital dos vários fundos de pensão, de investimento e soberanos está em constante crescimento nos mercados financeiros internacionais, através dos swaps, dos bancos e dos grupos multinacionais. Graças à sua dimensão, estes últimos influenciam consideravelmente os mercados em que operam. Não tendo obtido rendimentos suficientes dos investimentos convencionais, viraram-se para os mercados dos produtos de base.

4.2.2.   Tendo em conta a sua natureza especulativa, os investimentos de alto risco influenciam os preços no curto prazo e não a longo prazo. É necessário que a agricultura tenha presente este desenvolvimento, assim como as evoluções nos mercados financeiros em geral. Os produtos financeiros que causam flutuações significativas nos preços dos produtos agrícolas, sem reflectirem os fluxos reais dos produtos, têm um impacto negativo na flutuação dos preços nos mercados físicos.

4.3.   Funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar

4.3.1.   Conforme assinalado pela Comissão no seu documento de trabalho sobre esta matéria (SEC(2008) 2972), há uma estreita correlação entre os eventos que ocorreram nos mercados agrícolas nos últimos dois anos e as perturbações verificadas na cadeia de abastecimento alimentar. A repartição dos preços dos produtos agrícolas pela cadeia de abastecimento reflecte com precisão a capacidade de cada elo da cadeia de defender os seus próprios interesses.

4.3.2.   Avaliar o efeito anti-concorrencial do processo de consolidação da cadeia de abastecimento alimentar pode revelar-se uma tarefa muito difícil para as autoridades da concorrência. É importante lidar com as práticas anticoncorrenciais e com os problemas de concorrência que ocorrem, por vezes, entre os fornecedores agro-alimentares e a fase de comercialização da cadeia de produção, e aos quais a Comissão fez referência, de forma a ajustar as regras às reais condições económicas e de mercado. Conforme sublinhou a Comissão, é necessário garantir um cumprimento coerente e coordenado das regras da concorrência em toda a UE. A cadeia de abastecimento está suficientemente fragmentada para assegurar que as transacções individuais aparentem não ter um impacto anti-concorrencial na perspectiva do mercado único. As práticas referidas no documento mostram que, para cada país e produto, um determinado grau de concentração pode afectar gravemente a concorrência. O surgimento de capacidades de transformação, susceptíveis de dominarem um determinado mercado de produtos graças às economias de escala, pode reduzir a escolha dos consumidores e afastar as pequenas e médias empresas do mercado. Isto tem-se verificado principalmente desde que as marcas brancas começaram a exercer uma influência significativa. Paralelamente, o facto de a competitividade dos preços dominar actualmente as políticas comerciais das empresas pode dar origem a produtos com valor nutritivo mais baixo. Embora o nível de segurança alimentar seja cada vez maior, a substituição de ingredientes naturais por ingredientes artificiais com valores nutritivos mais baixos faz com que os géneros alimentícios deixem de conseguir responder às necessidades dos consumidores em termos de qualidade de nutrição.

4.3.3.   O Comité propõe que os métodos de reembolso utilizados pelos grandes retalhistas sejam aditados à lista de práticas anti-concorrenciais presente no quadro 1. Estes métodos permitem dissociar, por um lado, os preços dos fornecedores dos custos reais e, por outro, os preços dos retalhistas dos preços no consumidor. Como consequência, os preços de referência são estabelecidos a níveis demasiado reduzidos, muito abaixo dos níveis alcançáveis através de uma melhor eficiência. As práticas anti-concorrenciais, como os cartéis e os acordos de fornecimento exclusivo, são obviamente inaceitáveis, assim como o recurso a uma posição dominante para impor condições unilaterais aos fornecedores. Ao mesmo tempo, esta técnica de duplicação das margens de lucro – os retalhistas obtêm margens de lucro consideráveis não só dos consumidores, mas também dos fornecedores, devido aos reembolsos – ofusca as margens de lucro comerciais e contribui para a distorção da repartição dos rendimentos na cadeia de abastecimento alimentar. Esta prática é anti-concorrencial porque exige aos fornecedores adaptarem-se a um preço que não reflecte os custos de produção.

4.3.4.   O CESE subscreve plenamente as preocupações da Comissão quanto às práticas anti-concorrenciais que alteram o funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar. A este respeito, parece evidente que o desequilíbrio de poder entre o sector da produção, da transformação e do retalho merece maior atenção. A concentração de poder a jusante coloca os retalhistas numa posição dominante relativamente aos produtores e às indústrias de transformação, dando azo a práticas abusivas indesejáveis. Assim, no interesse do bem-estar do consumidor, dever-se-ia visar preços baixos não só a curto, mas também a longo prazo, tendo em conta os efeitos directos e indirectos, evitando assim dificuldades financeiras para os fornecedores, a falta de inovação, a menor escolha e até preços mais elevados a longo prazo.

5.   Roteiro para melhorar o funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar

Assegurar uma distribuição correcta da remuneração em cada um dos elementos da cadeia de abastecimento alimentar é uma tarefa muito complexa, porque vários dos aspectos envolvidos requerem uma interferência extensiva nos processos do mercado. Estas medidas são, porém, indispensáveis para melhorar a competitividade dos géneros alimentícios europeus numa base real.

5.1.1.   O CESE acolhe favoravelmente a intenção da Comissão de melhorar a transparência do mercado. É sempre útil conhecer melhor a forma como o mercado funciona e o papel desempenhado pelos diferentes elos da cadeia. É muito importante efectuar uma análise meticulosa da cadeia de modo que as autoridades possam tomar as medidas adequadas necessárias no caso de deficiências ou perturbações na mesma. Por conseguinte, o CESE apoia indubitavelmente a actuação proposta pela Comissão na sua comunicação e cooperará plenamente na sua aplicação.

Contudo, a Comissão deve ter presente que as condições variam entre os sectores, e mesmo entre os países, pelo que os factores que determinam os preços também diferem, sendo dinâmicos e não estáticos.

Todos os esforços envidados pela Comissão para conceber e estabelecer um instrumento de vigilância permanente dos preços dos géneros alimentícios e da repartição dos rendimentos na cadeia devem ter por base estes factos. Os resultados desses esforços devem ser vistos como uma referência e não como uma verdade infalível.

5.1.2.   A cadeia de abastecimento alimentar só poderá tornar-se mais competitiva se os vários elos cooperarem de forma significativamente mais estreita. De facto, o próprio termo «cadeia» sugere que cada elo apenas coopera com os elos com está directamente em contacto, mas só o trabalho em conjunto visando o interesse comum poderá assegurar uma verdadeira eficiência. Se a intenção é realmente fazer com que as necessidades dos consumidores determinem, através dos produtos, as condições de funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar, todos os elos da cadeia deverão dedicar-se a uma séria reflexão.

5.1.3.   A União Europeia tem de aceitar que não pode dar resposta aos factores referidos na comunicação da Comissão apenas com medidas de concorrência. A harmonização da legislação em matéria de concorrência e a cooperação entre as autoridades competentes neste domínio só serão eficientes no caso de práticas anti-concorrenciais convencionais, como os cartéis e a publicidade enganosa. A experiência mostra que o direito da concorrência não é o modo adequado de lidar com as situações enumeradas no quadro 1, devido à complexa interdependência entre as partes envolvidas. A influência de certas cadeias de retalhistas no mercado não justifica per se uma resposta das autoridades da concorrência comunitárias. No entanto, do ponto de vista dos fornecedores, é relevante que a sua dependência em relação a determinados retalhistas ou centros de compra se tenha tornado um factor determinante para a sua sobrevivência no mercado. A cooperação entre retalhistas e fornecedores tornou-se, por conseguinte, unilateral.

Simultaneamente, a previsão de sanções mais pesadas no direito da concorrência poderá desencorajar eficazmente as práticas que induzam os consumidores em erro.

Nos próximos anos, a revisão da protecção dos consumidores prosseguirá. Isto incluirá a qualidade dos géneros alimentícios de países terceiros que chegam ao mercado único graças à maior abertura dos mercados, assim como as condições de produção desses produtos. O aumento das importações reflecte, entre outros aspectos, um maior enfoque nos preços e na procura de géneros alimentícios mais baratos. Contudo, este facto faz-se acompanhar de maiores riscos em matéria de segurança alimentar e protecção dos consumidores, porque os produtos importados provêm de regiões onde a cultura de produção alimentar é claramente inferior à da Europa.

5.1.4.   As possibilidades de intervir nas políticas comerciais dos retalhistas são limitadas. Contudo, há que identificar todos as medidas passíveis de fazer com que as políticas comerciais dos grandes retalhistas deixem de priorizar a redução dos preços (ou, em alguns casos, o alcance do preço mais baixo). Este enfoque é responsável pelo actual desequilíbrio na repartição dos rendimentos na cadeia de abastecimento alimentar, além de afectar também as atitudes dos consumidores.

5.1.5.   A União Europeia só poderá agir eficazmente no sentido de corrigir as deficiências da cadeia de abastecimento alimentar e de a tornar mais eficiente, se puder basear-se em informações válidas. Cabe também à UE a importante tarefa de sensibilizar os consumidores europeus permitindo que estes tomem decisões informadas. Os consumidores são os elementos-chave da sobrevivência e do desenvolvimento sustentável da agricultura e da indústria alimentar europeias. A sensibilização dos consumidores na Europa poderá ajudar a pôr em prática um dos princípios fundamentais da Comunidade, nomeadamente a preferência pelos produtos comunitários, um princípio que passou inevitavelmente para segundo plano nas negociações do GATT e da OMC.

No desenvolvimento de instrumentos de vigilância, há que prever incentivos para que os operadores do mercado forneçam informações fiáveis ao sistema. Isto poder-se-ia traduzir, por exemplo, em inspecções fiscais, isenções e subsídios. A intenção de assegurar a transparência numa base voluntária não é uma opção realista.

5.1.6.   Para atenuar os efeitos negativos da especulação, dever-se-ia considerar a hipótese de desenvolver regulamentação que autorize transacções em mercados bolsistas apenas se estas forem acompanhadas de garantias reais de bens, ao contrário das práticas de mercado actuais que permitem que fluxos de produtos muito reduzidos exerçam uma influência notória sobre os preços do mercado, o que causa, por seu turno, flutuações dos preços no mercado físico.

5.1.7.   Redução do tamanho das cadeias de abastecimento alimentar

A redução do número de intermediários entre os produtores agrícolas e os consumidores poderia ajudar a cadeia a funcionar mais eficazmente. Seguindo os exemplos de programas de distribuição de leite e fruta nas escolas, dever-se-á encorajar as relações directas entre os produtores e os consumidores. Para isso, uma das formas mais evidentes é promover mercados agrícolas tradicionais. Isto contribuiria, entre muitos outros aspectos positivos, para preservar o modo de vida rural, assim como as pequenas e médias explorações agrícolas.

Bruxelas, 5 de Novembro de 2009

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Mario SEPI