30.8.2008   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 224/8


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à participação da Comunidade num programa de investigação e desenvolvimento destinado a melhorar a qualidade de vida das pessoas de idade através da utilização das novas tecnologias da informação e das comunicações (TIC), levado a cabo por vários Estados-Membros»

COM(2007) 329 final — 2007/0116 (COD)

(2008/C 224/02)

Em 10 de Julho de 2007, o Conselho decidiu, nos termos dos artigos 169.o e 172.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

«Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à participação da Comunidade num programa de investigação e desenvolvimento destinado a melhorar a qualidade de vida das pessoas de idade através da utilização das novas tecnologias da informação e das comunicações (TIC), levado a cabo por vários Estados-Membros»

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 6 de Maio de 2008, tendo sido relatora Anna Maria Darmanin.

Na 445.a reunião plenária, realizada em 28 e 29 de Maio de 2008 (sessão de 29 de Maio), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por unanimidade, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE saúda a proposta da Comissão destinada a melhorar a qualidade de vida das pessoas de idade através da utilização das novas tecnologias da informação e da comunicação. O programa comum AAD (assistência à autonomia no domicílio) pode ser um meio de garantir eficazmente e primordialmente a qualidade de vida não apenas das pessoas de idade, como também de qualquer pessoa impossibilitada de estar na sua casa por motivos de saúde.

1.2

O CESE está firmemente convicto de que a investigação e o desenvolvimento no domínio das TIC devem, sobretudo, ir ao encontro dos beneficiários, identificando e satisfazendo as suas necessidades. A abordagem a aplicar deve, pois, ser da base para o topo; importa, em primeiro lugar, identificar as necessidades dos utilizadores e, posteriormente, proceder à investigação e ao desenvolvimento requeridos.

1.3

O CESE opina que uma importante parte interessada na AAD é a pessoa que, em última instância, beneficiará desta tecnologia. Assim, interessa não só perceber as necessidades das pessoas em questão, como também prepará-las para a utilização destas tecnologias e implicá-las na sua concepção e ensaio.

1.3.1

Também por esta razão, o CESE considera importantes as políticas comunitárias relacionadas com a aprendizagem ao longo da vida e a info-inclusão. Neste contexto, o Comité opina que a Comissão deve adoptar uma abordagem integrada entre o programa AAD e as referidas políticas.

1.4

O CESE entende que este programa não é apenas mais um programa de I&D, é um projecto de carácter muito «humano». Embora se trate de um verdadeiro programa de investigação, destina-se a enfrentar as circunstâncias sociais frequentemente associadas a uma fase delicada da vida.

1.5

Como se explicitará abaixo, o CESE considera que os quatro principais domínios a tratar equilibradamente ao abrigo do programa AAD são: as necessidades do utilizador, a segurança do utilizador, as organizações sociais e de saúde (bem como as associações que representam os profissionais destes sectores) e a escolha da tecnologia.

1.6

O CESE sublinha, em conformidade com as orientações internacionais, que devem ser tidas na devida conta as questões éticas e de protecção da vida privada. Assim, felicita a comunicação da Comissão pelo reconhecimento de tais questões.

2.   Síntese da comunicação da Comissão

2.1

A proposta da Comissão visa concretamente:

Incentivar a emergência de produtos e serviços inovadores baseados nas TIC que permitam envelhecer bem, melhorando assim a qualidade de vida das pessoas de idade e reduzindo os custos dos cuidados de saúde e da assistência social;

Melhorar as condições de exploração para as empresas, proporcionando um enquadramento europeu coerente para desenvolver abordagens comuns, facilitar a localização e reduzir o custo dos serviços;

Criar e alavancar uma massa crítica de investigação, desenvolvimento e inovação ao nível comunitário em tecnologias e serviços no domínio do envelhecimento.

2.2

A proposta em análise vem no seguimento de um plano de acção, lançado pela Comissão, sobre Envelhecer bem na sociedade da informação. Este plano de acção é visto como um elemento-chave para enfrentar os desafios sociais e económicos com que a Europa se depara devido às alterações demográficas. Prevê-se que a população europeia com idades compreendidas entre os 65 e os 80 anos aumente cerca de 40 % entre 2010 e 2030 (1). As TIC poderão proporcionar uma melhor qualidade de vida à referida faixa etária, aumentar a sua autonomia e ajudá-la a manter-se saudável.

2.3

A Comissão visa lançar um programa de 6 anos designado Assistência à Autonomia no Domicílio (AAD), como complemento das actividades relativas às TIC para Envelhecer Bem ao abrigo do 7.o PQ e também do Programa de Competitividade e Inovação. O programa AAD deverá receber fundos no valor de cerca de 300 milhões de euros para o período 2008-2013, provindos equitativamente da Comunidade e dos Estados-Membros.

2.4

O quadro jurídico em que o programa AAD se baseia é o artigo 169.o do Tratado. Em conformidade com as disposições do artigo 169.o do Tratado CE, a Comunidade Europeia pode participar em programas de investigação realizados por vários Estados-Membros, incluindo a participação nas estruturas criadas para a execução de programas nacionais. Este quadro jurídico específico foi seleccionado para o programa AAD com o objectivo de alcançar uma maior eficácia nesta área de investigação através da maximização da perícia transfronteiriça, do empenho dos Estados-Membros que financiam parte da investigação, da garantia de uma abordagem coerente na matéria ao nível europeu e a garantia de se impor no mercado único uma verdadeira interoperabilidade das soluções TIC relativas ao envelhecimento.

3.   Antecedentes da proposta da Comissão

3.1

Uma iniciativa prévia apresentada ao abrigo do artigo 169.o, citada pela proposta da Comissão como ensaios clínicos em África, EDCTP (Parceria Europa — Países em Desenvolvimento para a Realização de Ensaios Clínicos), sublinhou a importância do empenho inequívoco dos Estados-Membros no financiamento plurianual do projecto. De facto, prevê-se que o programa AAD receba um contributo em partes iguais dos fundos comunitários e dos fundos nacionais.

3.2

Os trabalhos preparatórios para este programa foram executados através de um projecto de apoio específico Assistência à Autonomia no Domicílio ao abrigo da prioridade tecnologias da sociedade da informação (TSI) no âmbito do 6.o Programa-Quadro que decorreu entre 1 de Setembro de 2004 e 31 de Dezembro de 2006. O consórcio reuniu parceiros da Áustria, Alemanha, França, Finlândia, Itália, Bélgica e Suiça, tanto do sector privado como do sector público e de uma Universidade.

3.3

A entidade jurídica do Programa Comum AAD é a Associação AAD. Actualmente, a associação é composta por representantes de 21 Estados-Membros. Sendo um programa impulsionado da base para o topo, foram estabelecidos nos Estados-Membros diversos pontos de contacto relativos à associação.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE aplaude a iniciativa AAD apresentada ao abrigo do artigo 169.o. Reconhece-se em particular que a iniciativa tem em linha de conta as tendências demográficas que afectarão os cidadãos europeus.

4.1.1

O CESE considera que, para melhorar a coesão económica, social e territorial dos Estados-Membros que não têm infra-estruturas suficientes para executar a presente proposta, seria necessária a adopção de «medidas específicas», tais como as que estabelece o artigo 159.o do Tratado UE, para corrigir os principais desequilíbrios regionais patentes na União Europeia.

4.2

O CESE é de opinião que a iniciativa não deve ser entendida como uma mera oportunidade para pôr em prática sistemas-piloto destinados a demonstrar a validação do conceito. É muito importante que se aproveite a oportunidade para reunir o vasto leque de partes interessadas cuja participação é imprescindível para tornar duradouro o impacto da iniciativa.

4.2.1

As principais partes interessadas são os beneficiários finais da AAD. A AAD visa, acima de tudo, prolongar a autonomia das pessoas de idade e também garantir que permanecem em sua casa o mais tempo possível. Importa ter consciência de que não se restringe às pessoas de idade, destina-se também a qualquer indivíduo temporariamente impossibilitado de viver em casa de forma autónoma por motivos de saúde. Esta iniciativa tem de garantir que as necessidades e as exigências das referidas partes são o verdadeiro cerne da investigação.

4.3

Outros actores importantes são as organizações de saúde e de assistência social. A iniciativa tem de ter em linha de conta as suas necessidades organizacionais. Para ter êxito, o CESE recomenda que estas organizações tenham a oportunidade de pôr em evidência, junto de outras partes interessadas, questões como a integração e a interoperabilidade dos sistemas.

4.4

Recomenda-se vivamente que sejam associados, desde a fase inicial, os utilizadores dos sistemas a desenvolver ao abrigo desta iniciativa na qualidade de elementos-chaves dos trabalhos. O CESE recomenda que, sempre que possível, os consórcios optem por direccionar os métodos em função do utilizador, como a concepção participativa para a sua metodologia de desenvolvimento, tendo como principal objectivo a facilidade de utilização dos aparelhos e interfaces. O Comité saúda também, em conformidade com as orientações internacionais, a intenção de ter na devida conta as questões éticas e de protecção da vida privada.

4.5

O CESE reconhece que o projecto de proposta defende as PME e aprova o reconhecimento das organizações empresariais na qualidade de principais partes interessadas susceptíveis de apoiar modelos empresariais inovadores e orientados para o mercado que demonstrem vias claras e inerentes para a exploração. Felicita, em particular, o reconhecimento de que as PME podem contribuir para a investigação com um prazo mais curto para chegar aos mercados (cerca de 2 anos).

4.5.1

Encorajamos o reconhecimento de que as PME são, por vezes, tecnologicamente ágeis e têm potencial para introduzirem no mercado novas tecnologias e modelos de negócio a um ritmo mais rápido do que as grandes empresas ou as organizações de saúde e de assistência social. Esta característica das PME inscreve-se no âmbito desta iniciativa. A parceria entre as grandes organizações e as PME é, por conseguinte, vantajosa para ambas.

4.6

A AAD baseia-se na premissa de ajudar as pessoas a viver em casa durante mais tempo. Para alcançá-la, é requerida uma vasta gama de sensores, accionadores, interfaces de utilização, processadores e equipamento de comunicação, que muitas vezes só podem ser disponibilizados por muitas PME europeias diferentes.

4.7

O CESE defende as medidas da iniciativa que, em todos estes grupos de intervenientes, promovem a criação de redes pluridisciplinares entre técnicos, clínicos e o pessoal das organizações de saúde e de assistência social, sobretudo com os utilizadores, quer os que permanecem no domicílio, quer os prestadores de cuidados ou os familiares.

4.8

No contexto de um sistema europeu de inovação, esta iniciativa representa a oportunidade de adoptar novos modelos de inovação em sintonia com a evolução actual em matéria de inovação aberta e dirigida ao utilizador, que articulam a Estratégia de Lisboa com um novo sistema europeu de inovação mais dirigido para o utilizador.

4.9

O CESE está convicto de que é importante que todos os tipos de organizações de todos os Estados-Membros tenham igualdade de acesso à iniciativa.

4.10

Ademais, todos os governos nacionais devem ser encorajados a participar. Actualmente, a Áustria, a Bélgica, Chipre, a Dinamarca, a Eslovénia, a Espanha, a Finlândia, a França, a Hungria, a Irlanda, a Itália, os Países Baixos, a Polónia, Portugal, a Roménia e a Suécia e ainda Israel, a Noruega e a Suíça concordaram em coordenar as actividades conjuntas que contribuam para o programa comum AAD.

4.11

O CESE receia que alguns países não participem devido ao custo do co-financiamento da investigação. Os países em causa deviam poder participar em qualquer fase do programa uma vez que cumpram os requisitos do programa (sobretudo o co-financiamento).

4.12

O CESE reconhece que a AAD pode traduzir-se numa redução dos custos do sistema de assistência social. Todavia, reitera que o seu objectivo não é a redução de custos, mas a eficácia na garantia da qualidade de vida para uma categoria de cidadãos. A redução de custos é uma consequência bem aceite.

5.   Observações na especialidade

5.1

O CESE está convicto de que o programa AAD deve reger-se pelas especificidades das seguintes três vertentes: o utilizador, as organizações de saúde e a tecnologia utilizada.

5.2

Por vezes, os beneficiários e principais partes interessadas serão as pessoas de idade. É primordial que o programa se centre nas necessidades dos utilizadores finais. Cometer o erro de recorrer aos utilizadores apenas para testar a investigação em ambientes de investigação poderá, infelizmente, dar origem a inovações que podem não corresponder realmente àquilo de que necessitam os beneficiários principais. Por esta razão, há que ter em linha de conta as necessidades dos utilizadores, tais como a reduzida mudança de comportamento, a mobilidade, as opções, a melhoria da qualidade de vida e respeito pela privacidade.

5.3

De notar também que as pessoas de idade são, possivelmente, o estrato da população que mais sofre de exclusão digital, importando, por conseguinte, eliminar a barreira digital. Ademais, a conectividade é essencial; devem, pois, ser envidados esforços para que todas as regiões, em especial as mais rurais, tenham acesso à Internet (quer em termos físicos quer financeiros).

5.3.1

Fundamentalmente, sublinhe-se que:

A tecnologia não substitui o contacto humano com os prestadores de cuidados, nomeadamente de saúde;

Os cuidados preventivos e os cuidados próprios são o mais importante;

Um dos principais objectivos é a inclusão social;

A AAD deve ser integrada no próprio modo de vida e associado aos outros serviços.

Dadas as circunstâncias específicas do utilizador, a tecnologia utilizada deve ser segura e convivial.

5.3.2

Assim, o CESE está convicto de que a AAD deve assumir uma abordagem da base para o topo. Todo o processo, tal como a sua razão de ser, deve girar em torno das necessidades dos utilizadores e não na tecnologia em si. Deve efectuar-se um estudo claro com o objectivo de identificar todo o espectro de necessidades, entre as quais a necessidade de estar em contacto com outras pessoas, sobretudo numa idade avançada (neste contexto, o skype e o correio electrónico revelaram-se instrumentos eficazes e baratos); a falta de motivação para ficar a par das rápidas mudanças tecnológicas; a capacidade para dominar as mudanças tecnológicas; a disponibilidade para fazer uso de tais tecnologias. Além disso, os utilizadores devem participar na criação, na aplicação e na avaliação dessas tecnologias.

5.4

As organizações de saúde e de assistência social, os seus representantes e as famílias dos utilizadores são, em última instância, quem recorre às tecnologias com o objectivo de proporcionar os cuidados requeridos ao utente. É essencial que estas organizações participem nas várias fases da investigação, tendo em vista garantir que o produto obtido se integra no sistema operacional das mesmas. Poder-se-á antecipar que será necessário proceder a mudanças organizacionais para aplicar as novas tecnologias da AAD; é, pois, imperativo que as organizações de assistência social estejam prontas para tais mudanças e a elas se adaptem suavemente, maximizando o potencial das tecnologias da AAD.

5.4.1

O prestador de cuidados desempenha um papel verdadeiramente importante em todo o processo de assistência, inclusive no âmbito da AAD. Por conseguinte, devia ambicionar-se uma mudança de paradigma não só ao nível organizacional, como também ao nível do prestador de cuidados, tendo em vista garantir que a pessoa que contacta directamente com o utente da AAD não só é competente na utilização das tecnologias, como acredita de tal forma na sua utilidade que o persuade a entender esses instrumentos como um meio de melhorar a qualidade de vida.

5.4.2

O CESE considera ainda que o sistema de saúde deve ser avaliado cuidadosamente para verificar não só se estão reunidas as condições organizacionais para pôr em prática a AAD, como também se as organizações de saúde e sociais podem, de facto, assumir o encargo de um maior número de pessoas domiciliadas.

5.4.3

Ademais, a adopção da AAD torna ainda mais urgente melhorar a cooperação e a articulação entre as organizações de saúde e de assistência social. Também neste caso, a tecnologia pode ser um meio de melhorar tal cooperação, no entanto, mais fundamental ainda é a consciencialização da necessidade e da vontade de cooperar.

5.5

Prevê-se que os sistemas de AAD sejam complexos, logo a interoperabilidade deve ser um dos objectivos principais do programa. Importa aplicar a inovação e a tecnologia em larga escala e de modo personalizado, integrado e pró-activo.

5.6

O CESE opina que a Comissão também deve adoptar uma abordagem integrada para a AAD e para as políticas como a aprendizagem ao longo da vida. De facto, a formação e as políticas afins devem orientar-se em função das partes interessadas do programa AAD, pois a formação é parte integrante do êxito de tal tecnologia.

Bruxelas, 29 de Maio de 2008.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2007) 329 final.