16.2.2008   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 44/27


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a protecção do consumidor relativamente a determinados aspectos da utilização a tempo parcial de bens móveis e imóveis (timeshare), produtos de férias de longa duração, sua revenda e troca»

COM(2007) 303 final — 2007/0113 (COD)

(2008/C 44/06)

Em 28 de Junho de 2007, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 4 de Outubro de 2007, sendo relator J. PEGADO LIZ.

Na 439.a reunião plenária de 24 e 25 de Outubro de 2007 (sessão de 24 de Outubro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 129 votos a favor, 3 votos contra e 1 abstenção, o seguinte parecer:

1.   Síntese do Parecer

1.1

O CESE, no seguimento do que foram os seus Pareceres sobre o Livro Verde relativo ao acervo comunitário (1) e sobre a Comunicação da Comissão acerca da aplicação da Directiva relativa às vendas à distância (2), apoia a iniciativa da Comissão de proceder a uma revisão da Directiva 94/47/CE (3) de 26.10.1994 nos moldes em que é proposta (4), com as observações e as recomendações que se deixam exaradas.

1.2

O Comité, na generalidade, concorda, no essencial, com a Proposta da Comissão no que se refere ao alargamento do âmbito da sua aplicação, à definição e caracterização dos novos produtos, ao reforço das obrigações de informação pré-contratual e contratual, bem como à uniformização do período de retratação e à proibição de qualquer pagamento, a qualquer título, durante esse período.

1.3

Embora concordando com a aproximação minimal da presente Proposta, deixando aos Estados-Membros a possibilidade de ir mais além na protecção dos consumidores, na obediência aos princípios do Tratado, o Comité considera, no entanto, que, se havia domínio em que, pela natureza «sui generis» do direito em causa e pelas profundas divergências nacionais na conceitualização e caracterização da sua natureza jurídica plúrima com consequências marcadamente diversas dos respectivos regimes jurídicos nacionais, designadamente no que toca à duração mínima e máxima, à anulação ou nulidade, à resolução ou rescisão dos contratos, se justificaria, segundo a óptica da Comissão, conforme consta do Livro Verde relativo ao Acervo Comunitário, uma harmonização máxima, seria precisamente o presente caso.

1.4

O CESE discrepa, assim, da Comissão quando, pese embora esta reconheça que a maioria dos problemas decorrentes deste sector são frequentemente de natureza transfronteiriça e, consequentemente, a respectiva resolução não possa ser conseguida, de modo adequado, pelos Estados-Membros, a título individual, dadas as disparidades nas legislações nacionais, vem, afinal e tão somente, consagrar apenas alguns aspectos relativos a estes direitos, deixando, mais uma vez, ao livre arbítrio dos Estados-Membros um conjunto de situações que em quase nada altera o estado actual dos problemas elencados.

1.5

O CESE, assim, apesar de concordar com a adopção de um sistema de «harmonização mínima», entende, em consonância com outras instituições comunitárias (5), que o nível das medidas protectoras dos direitos dos consumidores foi colocado demasiado baixo, sendo certo que a experiência demonstra que a grande maioria dos Estados-Membros não tirou partido dessa mesma cláusula, efectuando, em sentido inverso, uma abordagem de tipo literal (6), e por conseguinte, não se tendo atingido um nível adequado de protecção dos consumidores, pelo que insta a Comissão, no respeito pelo principio da subsidiariedade, a regular outros aspectos, igualmente importantes, na Proposta de Directiva, tendo como premissa um nível mais elevado de protecção dos consumidores.

1.6

O CESE, consequentemente, sugere que sejam melhoradas algumas disposições relativas ao regime jurídico dos direitos em causa, da estipulação contratual principal e do seu relacionamento com os contratos complementares, designadamente de crédito não ligados, para reforço e garantia da adequada protecção dos consumidores.

1.7

O CESE reforça, aliás como em anteriores pareceres (7), a necessidade de se acentuar a efectiva informação das partes contratantes, com especial incidência nos contratantes menos esclarecidos, e, consequentemente entende que não deverá ser excluída liminarmente a possibilidade de os Estados-Membros adoptarem sanções penais, proporcionais e dissuasoras, para práticas gravemente ofensivas dos direitos previstos na directiva, devidamente caracterizadas nos seus elementos essenciais.

1.8

O CESE insta a Comissão a proceder a uma análise detalhada das respostas recebidas ao «Consultation Paper»  (8), mormente no que respeita aos Estados-Membros consultados através deste documento, que não tenham sido abrangidos pelos resultados do Relatório (9) sobre a Aplicação da Directiva apenas em 15 Estados-Membros, e da «Comparative Analysis», esta já relativa a 25 Estados-Membros (10), atenta a diversidade existente em todos os Estados-Membros.

1.9

O CESE, na especialidade, propõe uma série de modificações (11) e aponta um conjunto de recomendações tendentes a melhorar aspectos de técnica jurídica da Proposta e a consolidar e compatibilizar noções, conceitos ou práticas já adquiridos noutras directivas, designadamente na Directiva relativa às Práticas Comerciais Desleais (12), cuja ponderação deverá ser tida em linha de conta para a promoção da segurança e da confiança dos consumidores neste tipo de contratos a que tantas vezes subjazem esquemas agressivos de marketing e de vendas (13).

2.   Breve Súmula da Proposta de Directiva

2.1

Com a presente proposta, a Comissão entende proceder à revisão da Directiva 94/47/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Outubro de 1994, relativa à protecção dos adquirentes quanto a certos aspectos dos contratos de aquisição de um direito de utilização a tempo parcial de bens imóveis, no seguimento das Conclusões do Conselho de 13.4.2000 relativas ao seu Relatório sobre a aplicação da referida Directiva (14) e das Recomendações do Parlamento Europeu constantes da sua Resolução de 4.7.2002 (15).

2.2

Desde a Comunicação da Comissão sobre a Estratégia da Política dos Consumidores para 2002-2006 (16) que a revisão desta directiva está prevista e a mesma faz parte do denominado «acervo comunitário em matéria de direito do consumo», constante do respectivo Livro Verde (17).

2.3

Atenta a identificação de algumas situações problemáticas na aplicação da Directiva, a Comissão considera que, face à evolução do mercado neste sector, se assistiu a uma substancial criação de novos produtos que, pese embora configurem, de facto, a utilização de um alojamento de férias, não se enquadram no âmbito da aplicação da Directiva.

2.4

O Relatório da Comissão elaborado em 1999 sobre a aplicação da Directiva 94/47/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (18), já apontava para inúmeras deficiências de transposição, cujas conclusões vieram a ser adoptadas pelo Conselho em Abril de 2000 (19), enumerando este um conjunto de elementos que deveriam ser tidos em conta, aquando da revisão da Directiva.

2.5

Também o Parecer da Comissão do Meio Ambiente, Saúde e Defesa do Consumidor, elaborado em 2001 (20), salientava o «mais baixo nível aceitável de medidas de protecção do consumidor», estabelecido pela Directiva.

2.6

Por sua vez, o Parlamento Europeu na Resolução de 4 de Julho de 2002, recomendava que a Comissão adoptasse medidas para garantir um elevado nível de defesa dos consumidores.

2.7

Por estas razões a Comissão considera a revisão isolada da presente directiva como «urgente», constituindo mesmo uma «prioridade» em razão dos «problemas enfrentados pelo consumidor, em especial no que diz respeito à revenda e aos novos produtos», «comercializados de modo semelhante e em termos gerais semelhantes do ponto de vista económico à utilização a tempo parcial de bens imóveis (Timeshare)», do tipo dos «clubes de férias com desconto e dos contratos de revenda».

2.8

Das principais causas justificativas para a presente proposta de revisão a Comissão ressalta a necessidade de actualizar os requisitos relativos à informação pré-contratual e contratual, de uniformizar o regime da proibição dos depósitos ou de pagamentos de sinal no período da retratação, de harmonizar o período de retratação e de considerar a possibilidade de introdução de sanções penais.

2.9

As principais partes interessadas foram consultadas em reuniões ocorridas entre 2004 e 2006.

2.10

Tendo recebido queixas sobre timeshare, com especial incidência para os novos produtos — o caso dos clubes de férias, contratos turísticos de descontos e de troca e revenda, a Comissão publicou um «Consultation Paper» (21). Estas questões foram também discutidas na Reunião do Grupo de Trabalho Permanente de Peritos nos Estados-Membros sobre a revisão do acervo, em Março de 2006.

2.11

A proposta de revisão está incluída no Programa da Comissão para actualização e simplificação do acervo comunitário (22).

2.12

A Comissão entende que a base jurídica para a presente Proposta se deve manter circunscrita ao artigos 95.o do Tratado (realização do mercado interno) e considera que, por força do principio da subsidiariedade, não se deve pronunciar sobre a natureza jurídica dos direitos de timeshare, deixando-a à diversidade «das perspectivas dos Estados-Membros».

2.13

Por outro lado a Comissão, pondo o acento tónico nos aspectos transfronteiriços e considerando mesmo que «a maioria das queixas de consumo é de natureza transfronteiriça», orienta a sua Proposta no sentido de apenas se pronunciar sobre os aspectos considerados «mais problemáticos e por conseguinte necessitados de uma acção a nível comunitário», deixando tudo o resto para as respectivas legislações nacionais, inclusivamente eliminando tudo o que se referia aos direitos de rescisão e de resolução dos contratos, mesmo quando conexos com o direito de retratação, e que se encontravam regulados na Directiva 94/47/CE.

3.   Principais Observações à Proposta

3.1   Na generalidade

3.1.1

O CESE aprecia positivamente a iniciativa da Comissão, mas constata o seu atraso, atendendo a que os problemas já haviam sido detectados em 1999, e por conseguinte, já há muito poderiam ter sido equacionadas as respectivas soluções.

3.1.2

O CESE recorda, aliás, que algumas das questões ora denunciadas já tinham sido por ele denunciadas, aquando do seu Parecer emitido em 24 de Fevereiro de 1993 (23) na fase da elaboração da Directiva.

3.1.3

O CESE considera que a base jurídica não deverá ser o art. 95.o do Tratado, mas antes o art. 153.o, uma vez que não se trata de matéria exclusivamente respeitante ao mercado único, mas atinente à política de protecção dos consumidores.

3.1.4

O CESE concorda com o alargamento do âmbito de aplicação da proposta a certos bens móveis, por responder de forma adequada à constante evolução do mercado.

3.1.5

O CESE concorda com as alterações introduzidas nas definições (24) da presente proposta, por se revelarem mais adequadas aos novos produtos comercializados, neste sector.

3.1.6

O CESE concorda não só com a manutenção da proibição de qualquer pagamento ou tipo de depósito, na medida em que esta proibição constitui uma forma eficaz de permitir ao consumidor o exercício do direito de retratação, sem qualquer pressão do ponto de vista económico, como também considera que o alargamento da norma para os terceiros, abrange, de forma adequada, os contratos de troca e revenda.

3.1.7

O CESE concorda com o aumento do período de reflexão para 14 dias, uniformizando, desta forma, o respectivo prazo, embora preferisse que o referido prazo fosse contado em dias úteis e não em dias de calendário, aliás como já referido em anteriores pareceres seus (25), importando recordar que o Conselho, aquando da aprovação da Directiva 97/7/CE, emitira uma declaração, instando a Comissão a estudar a possibilidade de harmonizar o método de cálculo, para efeitos de prazo de reflexão, existentes nas directivas de protecção dos consumidores.

3.1.8

Tal como em pareceres anteriores (26), e sem prejuízo do disposto no 3.o parágrafo do art. 1.o da Proposta de Directiva, o CESE entende imprescindível que a Comissão proceda a uma mais perfeita caracterização da natureza, vícios e efeitos dos direitos de retratação, rescisão e resolução, dado que, de outra forma, não se atingirá a pretendida aproximação das legislações, uma vez que cada Estado-Membro adoptará as suas próprias regras, com as inerentes consequências negativas para o desenvolvimento das relações transfronteiriças.

3.1.9

O CESE entende que, tendo esta Directiva como escopo a aproximação das legislações nacionais relativas a este tipo de direitos, contrariamente ao considerando 4 da proposta e não obstante as diferenças existentes nos diferentes países, a Comissão deveria ir mais longe, definindo a natureza jurídica (27) destes direitos, sejam eles configurados como direitos reais ou direitos creditícios, sob pena de a presente proposta não contribuir para a resolução dos problemas detectados, na definição dos requisitos essenciais para o preenchimento do direito, e em particular, caso configure um direito real, os inerentes efeitos registrais.

3.1.9.1

O CESE apela assim à Comissão para que esta consagre uma definição da natureza jurídica do direito — timeshare — seja este configurado como direito real ou como direito pessoal de natureza obrigacional — direito a uma prestação de serviços — com as inerentes consequências nos preceitos aplicáveis do Regulamento de Bruxelas e do Regulamento de Roma I, sob pena de não se atingir a tão desejada harmonização e a confiança dos consumidores e das empresas. Aliás, o CESE, no seu Parecer antes referido (28) já contribuía para essa definição ao referir que «o contrato de timeshare é um direito real ou pessoal, e nunca uma relação locatícia, pois na locação não há alienação. O direito transferido recai sobre uma parte indivisa de uma coisa, um apartamento indiviso e assume ou pode assumir a natureza de um direito real imobiliário».

3.1.10

Sem prejuízo da necessária configuração jurídica deste direito, eventualmente com características «sui generis», e até por isso mesmo, o CESE concorda com a proposta de Directiva quando esta aponta para alguns dos seus elementos estruturantes, seja o seu objecto mediato bens móveis ou imóveis, enquanto direito de uso e fruição de um alojamento (implicando uma estadia com dormida), mediante uma contrapartida, com a duração mínima de um ano.

3.1.11

Contudo, o CESE insta à Comissão que, para além dos produtos já elencados no art. 2.o da Proposta, consagre uma cláusula (com a necessária definição dos elementos estruturantes) por forma a adaptar-se a eventuais e futuros produtos (29) que venham a ser comercializados, após a entrada em vigor da Directiva e relativamente aos quais se verifique a impossibilidade de preenchimento dos requisitos constantes das definições dos novos produtos.

3.1.12

O CESE entende que a possibilidade de o consumidor efectuar qualquer reembolso ou pagar qualquer quantia, em virtude de ter exercido atempadamente o direito de retratação, configura um manifesto desvirtuamento deste direito, caracterizado pelo facto de o consumidor não ter que indicar qualquer motivo ou pagar qualquer quantia, pelo que os n.os 5 e 6 do art. 5.o da proposta devem ser eliminados.

3.1.13

O CESE alerta a Comissão para a remissão efectuada para a Directiva, recentemente aprovada, sobre as Práticas Comerciais Desleais (30) com a qual concorda mas chama a atenção para o facto de nos seus art.os 14.o e 15.o não se consagrar referência à presente Directiva, nem essa referência estar prevista na presente proposta, ora em análise.

3.1.14

O CESE, apesar de concordar com a harmonização mínima, entende que esta Proposta de Directiva é mais redutora que a vigente, na medida em que consagrando embora a possibilidade de os Estados-Membros adoptarem medidas mais protectoras dos direitos dos consumidores, o admite tão somente no respeitante ao direito à retractação (momento, modalidades e exercício) enquanto a Directiva em vigor, nomeadamente, no seu art 11.o  (31) consagra essa possibilidade, de forma mais abrangente, pelo que insta a Comissão a manter uma norma semelhante a esta.

3.1.15

O CESE considera que a Comissão deveria prever um regime sancionatório eficaz, tendo em vista não só a dissuasão das práticas infractoras relativas às obrigações previstas na Directiva, como também por razões de certeza e segurança jurídica (32); o CESE apoia a possibilidade de, no quadro previamente definido pela Comissão (33), serem introduzidas, pelos Estados-Membros, que não pela Comissão, sanções penais, proporcionais mas suficientemente dissuasoras das práticas infractoras, quando especialmente graves.

3.1.16

O CESE concorda com a inclusão de uma cláusula de revisão regular, inexistente na actual Directiva, que evitará a sua rápida obsolescência.

3.1.17

Não obstante terem sido intentadas acções contra alguns Estados-Membros (34), por infracções a uma correcta transposição de algumas disposições da Directiva, o CESE estranha a falta de actuação, por parte da Comissão, mormente no que respeita ao incumprimento do prazo limite para a respectiva transposição (30.4.1997), sendo certo que apenas 2 Estados-Membros (35) cumpriram o referido prazo, instando para que, relativamente à nova Directiva, a Comissão seja menos laxista perante tão flagrantes violações na implementação do direito comunitário.

3.2   Na especialidade

3.2.1

O CESE considera que a definição constante da alínea g) do n.o 1 do artigo 2.o, relacionada com o disposto no artigo 7.o, é demasiado restritiva porquanto o elemento caracterizador da acessoriedade dos contratos é a relação de complementaridade entre os mesmos. Ora, é justamente a relação de complementaridade e não tanto a subordinação, que deve ser considerada, uma vez que, em particular na generalidade dos contratos de crédito conexos, se trata de uniões extrínsecas de contratos que, pela sua natureza jurídica, apresentam, entre si, uma autonomia jurídica e como tal incompatível com a definição ora proposta.

3.2.2

O CESE discorda da redacção constante do n.o 2 do art. 3.o, mormente no que respeita ao documento informativo, o qual apenas será entregue ao consumidor desde que este «o solicite» e só «se necessário». Ora, tendo em conta que este artigo respeita a informação pré-contratual, com base na qual o consumidor forma a sua vontade de contratar, considera que este documento deve ser objecto de entrega obrigatória, instando a Comissão a estipular nesse sentido.

3.2.3

O CESE apela à Comissão para que esta substitua o n.o 4 do art. 3.o, o n.o 1 do art. 4.o e as alíneas l) do Anexo I, alínea f) do Anexo III, alínea d) do Anexo IV, por norma semelhante à constante do artigo 4.o da actual Directiva (36), por se tratar de norma mais protectora, não só no que respeita à obrigatoriedade do estabelecimento da língua da nacionalidade do consumidor, como também à necessária consagração da tradução certificada na língua do Estado-Membro em que se situa o bem, designadamente por questões relacionadas com eventuais formalidades registrais.

3.2.3.1

Com efeito, o CESE antevê a adopção generalizada, por parte dos profissionais, de propostas — contratos de adesão — em que o consumidor se limita a declarar ter sido aquela a língua escolhida, sem qualquer liberdade de estipulação ou negociação, com potenciais graves prejuízos para os seus interesses económicos.

3.2.4

O CESE insta a Comissão a alterar a redacção consagrada no n.o 2 do art. 4.o, nomeadamente, através da eliminação da expressão «salvo indicação expressa em contrário das partes», dado tratarem-se de informações substanciais, as quais não poderão estar sujeitas à autonomia privada das partes. A prática tem demonstrado que a manutenção desta expressão levará os profissionais a propor unilateralmente, contratos de adesão, em que o consumidor se limita a aceitar.

3.2.4.1

O CESE entende ainda que a Comissão deve clarificar/tipificar as circunstâncias, independentes da vontade do profissional, que farão parte integrante do contrato, nos termos do n.o 2 do art. 4.o, por questões de certeza e segurança jurídica.

3.2.4.2

O CESE, ainda a propósito deste mesmo artigo, insta a Comissão a consagrar o modo de comunicação destas informações, as quais deverão ser efectuadas, de forma adequada, objectiva e clara (37), devendo ainda ser «utilizados caracteres de tamanho que permitam uma legibilidade fácil» (38).

3.2.5

O CESE sugere à Comissão que clarifique a expressão «o profissional alerta expressamente», constante do n.o 3 do art. 4.o, cujo significado técnico jurídico não é claro.

3.2.6

A entender-se que o artigo 5.o n.o 1 prevê dois períodos para o exercício do direito de retratação, o CESE insta a Comissão a consagrar uma disposição que preveja uma só possibilidade conferida ao consumidor do direito de retratação, no prazo de 14 dias, após a assinatura de contrato definitivo, se este tiver sido antecedido de um contrato prévio vinculativo, desde que o bem não tenha sido utilizado entretanto.

3.2.7

O CESE apela à Comissão, aliás como em anteriores pareceres, a consagrar a natureza da comunicação do exercício do direito de retratação, assegurando-se, desta forma, às partes, a prova do mesmo. Aliás, a redacção constante da actual Directiva é mais adequada (39).

3.2.8

O CESE considera que a epigrafe do art. 8.o deveria ser substituída pela expressão «Carácter injuntivo dos direitos», dado que a «ratio legis» não tem por objectivo estabelecer a imperatividade da Directiva, mas antes proibir que aqueles direitos sejam excluídos ou restringidos, independentemente da legislação aplicável.

3.2.9

O CESE considera mais adequadas as disposições constantes da Directiva das Práticas Comerciais Desleais (40) relativas às acções de carácter judicial e administrativo constantes dos art. 11.o e 12.o, por configurarem disposições mais abrangentes e completas, pelo que insta a Comissão a substituir o art. 9.o da presente Proposta por regras semelhantes àquelas.

3.2.10

O CESE chama a atenção da Comissão para a redacção das versões linguísticas da sua Proposta na medida em que situações há que deverão ser objecto de tradução mais cuidada (41).

4.   Questões omissas

4.1

O CESE entende que, para além das omissões já anteriormente referidas, outras questões existem ainda a merecer eventual reapreciação, numa revisão da Directiva e que não foram objecto de consagração na proposta:

É o caso designadamente:

a)

Do regime do ónus da prova;

b)

Da prevenção dos riscos de incumprimento do contrato ou do cumprimento defeituoso;

c)

Da consagração da restrição da utilização dos contratos de timeshare (alojamento) a edifícios e partes afectas a actividades turísticas ou de lazer (42), contribuindo, desta forma, para um reforço da qualidade, e evitando a sua utilização perversa no sector imobiliário;

d)

Da consagração de regras relativas ao licenciamento e autorização para exercício da actividade, demonstrando capacidade técnica e financeira;

e)

Da consagração de um regime de garantias financeiras para salvaguarda de eventuais situações de insolvência ou falência, aliás como decorre de outros instrumentos comunitários (43), e não apenas relativa a imóveis em construção;

f)

Da consagração de um sistema de inscrição prévia no país em que seja promovida a comercialização e/ou no Estado-Membro em que se situa a sede (44);

g)

Da criação de um sistema de certificação, a nível europeu, destes profissionais, assegurando simultaneamente a existência de um sistema de alerta entre os Estados-Membros, tendo em vista a denúncia de infracções relevantes para efeitos de perda de certificação e divulgação junto dos consumidores (45);

h)

Da consagração nos Anexos da informação relativa às transmissões realizadas livres de quaisquer ónus ou encargos, sob pena de os consumidores se verem privados do direito, por exemplo caso seja executada uma hipoteca (46);

i)

Da consagração, no Anexo II, do direito que deve assistir ao consumidor de inspeccionar a propriedade, caso se trate de imóvel, a fim de verificar a conformidade com o projecto de construção;

j)

Da consagração de protecção de dados pessoais, nas transmissões dos direitos a terceiros.

Bruxelas, 24 de Outubro de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  JO C 256 de 27.10.2007, de que foi relator o conselheiro ADAMS.

(2)  JO C 175 de 27.7.2007, de que foi relator o conselheiro PEGADO LIZ.

(3)  Directiva 94/47/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Outubro de 1994, relativa à protecção dos adquirentes quanto a certos aspectos dos contratos de aquisição de um direito de utilização a tempo parcial de bens imóveis (JO L 280 de 29.10.1994, p. 83). — Parecer do CESE: JO C 108 de 19.4.1993, p. 1.

(4)  Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a protecção do consumidor relativamente a determinados aspectos da utilização a tempo parcial de bens moveis e imóveis (time-share), produtos de férias de longa duração, sua revenda e troca, COM(2007) 303 final de 7.6.2007.

(5)  Relatório de 1999 sobre a aplicação da Directiva 94/47//CE do Parlamento Europeu e do Conselho, SEC(1999) 1795 final e Relatório do Parlamento Europeu de 2002 in RR\470922PT.doc, PE 298.410.

(6)  Dinamarca, Finlândia, Países Baixos, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Suécia, Alemanha e Áustria.

(7)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu sobre a aplicação da Directiva 1997/7/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Maio de 1997, relativa à protecção dos consumidores em matéria de contratos à distância», JO C 175 de 27.7.2007.

(8)  Consultation Paper Review of the Timeshare Directive, in:

ec.europa.eu/consumers/cons_int/safe_shop/timeshare/consultation_paper 010606_en-doc_.

(9)  Relatório sobre a aplicação da Directiva 94/47/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 26.10.1994, SEC(1999) 1795 final.

(10)  «Comparative Analysis Timeshare Directive» (94/47) drafted by Hans Schulte- Noke, Andreas Borge and Sandra Fischer in Consumer Law Compendium.

(11)  Em especial aos artigos 2, n.o 1 alínea g), 3.o n.o 2 e 4, 4.o n.o 1, 2 e 3, 5.o n.o 1, 5 e 6, 8.o e 9.o e às alíneas l) do Anexo I, f) do Anexo III e d) do Anexo IV.

(12)  Directiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio de 2005, relativa às práticas comerciais desleais das empresas face aos consumidores no mercado interno e que altera a Directiva 84/450/CEE do Conselho, as Directivas 97/7/CE, 98/27/CE e 2002/65/CE e o Regulamento (CE) n.o 2006/2004 («directiva relativa às práticas comerciais desleais»), JO L 149 de 11.6.2005, p. 22. Parecer do CESE: JO C 108 de 30.4.2004, p. 81.

(13)  Como, aliás, se dava já conta quer no Parecer do CESE sobre a «Proposta de Directiva do Conselho relativa à protecção dos adquirentes nos contratos de utilização bens imóveis em regime de uso e fruição a tempo repartido», em que foi relator Manuel ATÁIDE FERREIRA (JO C 108 de 19.4.1993, p. 1), quer no no Parecer do Comité Económico e Social sobre «Planos de Acções Comunitárias a favor do Turismo», em que foi Relator L. CUNHA, Co-Relator: G. FRANDI (JO C 49 de 24.2.1992).

(14)  SEC(1999) 1795 final.

(15)  Resolução do Parlamento Europeu sobre o acompanhamento da política comunitária relativa à protecção dos adquirentes de direitos de utilização a tempo parcial de bens imóveis (Directiva 94/47/CE) (doc. P5_TA(2002)0369, JO C 271 E, de 12 de Novembro de 2003, p. 578).

(16)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões — Estratégia da política dos consumidores para 2002-2006, COM(2002) 208 final (JO C 137 de 8.6.2002, p. 2). Parecer do CESE: JO C 95 de 23.4.2003, p. 1.

(17)  COM(2006) 744 final. Parecer do CESE: JO C 256 de 27.10.2007.

(18)  SEC(1999) 1795 final.

(19)  Consumers Affairs Council, Luxemburgo, 13 de Abril de 2000.

(20)  PE 298.410 RR\470922PT.doc.

(21)  Consultation Paper Review of the Timeshare Directive, in:

ec.europa.eu/consumers/cons_int/safe_shop/timeshare/consultation_paper 010606_en-doc.

(22)  COM(2006) 629 final.

(23)  JO C 108 de 19.4.1993, p. 1.

(24)  Alteração de «adquirente» para «consumidor» .

(25)  JO C 175 de 27.7.2007, de que foi relator o conselheiro PEGADO LIZ, sobre a protecção dos consumidores em matéria de contratos à distância.

(26)  O acima referido.

(27)  Acórdão do STJ de Portugal, de 04/03/2004.

(28)  Parecer do CESE sobre a Directiva 94/47/CE em que foi relator Manuel Ataíde Ferreira (JO C 108 de 19.4.1993, p. 1).

(29)  À semelhança, por exemplo, do que consta na lei portuguesa (n.o 3 do art. 45 do D.L 180/99 de 22/05) onde se lê: «Os direitos de habitação turística a que se refere o número anterior incluem nomeadamente os direitos obrigacionais constituídos no âmbito de contratos referentes a cartões e clubes de férias, cartões turísticos ou outros de natureza semelhante».

(30)  Directiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de Maio de 2005 (JO L 149 de 11.6.2005, p. 22). Parecer do CESE: JO C 108 de 30.4.2004, p. 81.

(31)  Art. 11.o da Directiva 94/47/CE — «A presente Directiva não impede os Estados-Membros de adoptarem ou manterem disposições mais favoráveis em matéria de protecção de adquirente no domínio por ela abrangido, sem prejuízo das obrigações decorrentes do Tratado».

(32)  O Relatório de 1999 sobre a aplicação da Directiva 94/47/CE constatou as mais variadas sanções para a violação da mesma obrigação, nos diferentes Estados-Membros, desde sanções pecuniárias, nulidade do contrato, aumento do prazo de reflexão, suspensão da actividade e inerente publicidade, etc.

(33)  JO C 256 de 27.10.2007 e Projecto de Parecer CESE 867/2007 fin, ambos do conselheiro Retureau, sobre medidas penais em matéria de propriedade intelectual e de ambiente.

(34)  Espanha, Suécia, Luxemburgo e Irlanda.

(35)  Reino Unido e República Federal da Alemanha.

(36)  Onde se lê:

«Os Estados-Membros deverão prever na respectiva legislação:

que, de entre as línguas oficiais na Comunidade, o contrato e o documento referido no n.o 1 do artigo 3.o serão redigidos na ou numa das línguas do Estado-membro de residência do adquirente ou na ou numa das línguas do Estado-membro de que este é nacional, à escolha do adquirente. Todavia, o Estado-membro de residência do adquirente pode exigir que, de entre as línguas oficiais da Comunidade, o contrato seja sempre redigido, pelo menos, na sua ou suas línguas, e

que o vendedor entregará ao adquirente uma tradução autenticada do contrato na ou numa das línguas, de entre as línguas oficiais da Comunidade, do Estado-Membro em que se situa o bem imóvel.» …

(37)  Como consta por ex. do art. 8.o da Lei de Defesa do Consumidor portuguesa.

(38)  Como referido, por exemplo, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 3.5.2001.

(39)  «de forma susceptível de ser provada».

(40)  Directiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de Maio de 2005 (JO L 149 de 11.6.2005, p. 22. Parecer do CESE: JO C 108 de 30.4.2004, p. 81.

(41)  Na versão portuguesa, é o caso da alínea b) do art. 2.o que falece de sentido, da alínea j) do Anexo I que diz exactamente o contrário do que devia dizer e do n.o 1 do artigo 7.o onde a expressão «dissolvido» deve ser substituída por «resolvido», por razões óbvias de técnica legislativa, aliás em coerência com a própria epígrafe do artigo.

(42)  Parecer do CESE já referido relativo à Directiva 94/47/CE, JO C 108 de 19.4.1993, p. 1.

(43)  Directiva 90/314/CEE do Conselho, de 13 de Junho de 1990, relativa às viagens organizadas, férias organizadas e circuitos organizados (JO L 158 de 23.6.1990, p. 59). Parecer do CESE: JO C 102 de 24.4.1989, p. 27.

(44)  Parecer do CESE, já referido, relativo à Directiva 94/47/CE (JO C 108 de 19.4.1993, p. 1).

(45)  Directiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO L 376 de 27.12.2006, p. 36). Parecer do CESE: JO C 221 de 8.9.2005, p. 113.

(46)  Parecer do CESE anteriormente referido relativo à Directiva 94/47/CE (JO C 108 de 19.4.1993, p. 1).