27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/102


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada»

(2007/C 256/19)

Em 13 de Fevereiro de 2007, o Comité Económico e Social Europeu foi solicitado pela próxima Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia a emitir parecer sobre o: «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 18 de Junho de 2007, tendo sido relator Peter CLEVER.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 145 votos a favor e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Antecedentes

1.1

No quadro da Estratégia de Lisboa, os Chefes de Estado e de Governo acordaram em aumentar a taxa de emprego das mulheres para 60 % até 2010. Este objectivo foi confirmado nas orientações integradas (Orientação 17) adoptadas em 2005, que se constituem como elemento central do novo mecanismo orientador da Estratégia de Lisboa.

1.2

A Estratégia de Lisboa atingirá mais rapidamente, e de um modo mais sustentável, os objectivos ambiciosos que se propõe nos domínios do crescimento, do emprego e da competitividade se, apesar do decréscimo da população em idade activa, decorrente do envelhecimento demográfico, lograrmos continuar a aumentar nos próximos anos o número de trabalhadores na UE, melhorando as suas qualificações. Há boas possibilidades de se atingir ambos os objectivos através de uma taxa de emprego das mulheres nitidamente superior, uma vez que a nova geração de mulheres pretende participar mais no mercado de trabalho e usufrui de melhor formação. Mas há ainda obstáculos a ultrapassar.

1.3

Para que estes objectivos possam ser concretizados, os Estados-Membros acordaram, entre o mais, no seguinte:

adoptar medidas resolutas para aumentar a taxa de emprego das mulheres e reduzir as disparidades de género em termos de emprego, desemprego e remuneração; e

alcançar uma melhor conciliação do trabalho com a vida privada e disponibilizar estruturas acessíveis e económicas de acolhimento de crianças e de outras pessoas a cargo (Orientação 18).

1.4

A Presidência portuguesa solicitou ao Comité Económico e Social Europeu que elaborasse um parecer exploratório sobre o tema «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada».

1.5

Na óptica dos parceiros sociais, a conciliação da vida profissional, familiar e privada representa um contributo importante para o crescimento económico, o bem-estar e a competitividade na Europa.

1.6

Por outro lado, a conciliação da vida profissional, familiar e privada é uma das prioridades estabelecidas pela Comissão Europeia no roteiro para a igualdade entre homens e mulheres, adoptado em Março de 2006 (1). Para atingir este fim, a Comissão definiu no roteiro três áreas de intervenção prioritárias:

1.

Flexibilidade na organização do tempo de trabalho para homens e mulheres;

2.

Aumento do número das estruturas de cuidados;

3.

Melhores políticas de conciliação que beneficiem tanto homens como mulheres.

1.7

Na sequência da Comunicação intitulada «O futuro demográfico da Europa: transformar um desafio em oportunidade», que já fora anunciada no roteiro, a Comissão Europeia organizou, em 12 de Outubro de 2006, uma primeira consulta aos parceiros sociais sobre a conciliação da vida profissional, familiar e privada, com base no artigo 138.o do Tratado CE.

1.8

Na primeira parte da consulta, a Comissão realça a importância do tema da conciliação da vida profissional, familiar e privada. Tendo como pano de fundo a evolução demográfica e as pressões que esta exerce nos sistemas de segurança social, é imprescindível melhorar a taxa de emprego das mulheres. Salienta-se, igualmente, o papel da conciliação no contexto da concretização dos objectivos definidos pela Comissão.

1.9

Nas suas respostas, os parceiros sociais europeus realçaram a importância do tema da conciliação da vida familiar e profissional, precisamente no contexto da insuficiente participação das mulheres no mercado de trabalho e de uma população cada vez mais envelhecida. Um outro aspecto prende-se com a concretização dos objectivos fixados pelo Conselho Europeu de Barcelona, em 2002, no sentido de aumentar o número das estruturas de acolhimento de crianças. Os parceiros sociais são consensuais ao referir que as três áreas de intervenção prioritárias mencionadas no roteiro para a igualdade podem convergir para a prossecução desses objectivos. Os parceiros sociais referem ainda que, precisamente no contexto da evolução demográfica, a conciliação da vida profissional, familiar e privada e a questão da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no meio profissional devem ocupar um papel central no debate político. Especial atenção deve ser dada também à questão de ultrapassar os papéis estereotipados atribuídos à mulher e ao homem, sem o que será muito difícil promover mudanças.

1.10

Por sua vez, os parceiros sociais (BUSINESS EUROPE/UEAPME, o CEEP e a CES) (2) criaram, em 2005, um quadro de acção para a «Igualdade entre homens e mulheres» (3) como contributo para a promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no meio profissional. A conciliação da vida familiar e profissional também faz expressamente parte das quatro áreas em que a actuação dos parceiros sociais nacionais incidirá até 2010. Por conseguinte, é correcto que o Conselho de Ministros deixe ao critério dos parceiros sociais a organização do tempo de trabalho — um aspecto que se reveste da maior importância para a conciliação da vida familiar e profissional —, a fim de pôr em prática soluções adequadas às necessidades de todos os interessados.

1.11

Ao contribuírem para o melhoramento das condições de trabalho, os parceiros sociais podem facilitar a vida às famílias. Desempenham, pois, um papel determinante neste contexto. O quadro de acção é um dos contributos dos parceiros sociais para a aplicação da Estratégia de Lisboa. Visto que as causas dos desequilíbrios existentes nos mercados de trabalho são complexas e estão interligadas, os parceiros sociais europeus estão convencidos de que a solução dos problemas pressupõe uma estratégia integrada para promover a igualdade entre homens e mulheres. A conciliação da vida familiar e profissional é aqui um dos factores mais influentes.

1.12

Embora nos últimos anos algumas empresas tenham vindo a apostar cada vez mais na conciliação entre família e emprego, de tal modo que a promoção de um ambiente favorável às famílias passou a fazer parte integrante da política de pessoal e da filosofia empresarial, como é confirmado no primeiro balanço conjunto relativo ao acordo dos parceiros sociais, publicado em Fevereiro de 2007, subsistem défices, ao nível das empresas, dos parceiros sociais e dos Estados-Membros, que importa colmatar (4).

1.13

A noção de igualdade de oportunidades no local de trabalho, a introdução de iniciativas de apoio à conciliação da vida familiar e profissional e a criação de um modelo de gestão de «empresa de igualdade de oportunidades» fazem parte do conceito de responsabilidade social das empresas, que as incita a criar boas práticas e a agir de forma responsável para com os seus trabalhadores.

2.   Análise da situação

2.1

As estruturas familiares diferenciaram-se significativamente como reflexo das mudanças ocorridas na sociedade. Uma política que vise a conciliação da vida profissional, familiar e privada precisa de considerar todas as formas de família existentes (por exemplo, famílias uniparentais, famílias patchwork (onde cada parceiro leva para a nova relação os filhos do último casamento), pais solteiros, pais divorciados, pais adoptivos, trabalhadores estudantes, uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo, pessoas que vivem sozinhas). O número crescente de pessoas idosas e de idade avançada traduz-se numa necessidade crescente de serviços de assistência prestados por familiares ou terceiros.

2.2

Paralelamente à profissão que exercem, as mulheres, ao contrário dos homens, continuam a cuidar mais do lar e da família e, portanto, estão permanentemente sobrecarregadas, confrontando-se amiúde com situações de stress. As mulheres no meio rural e as trabalhadoras independentes não escapam a esta regra. Devido a esta situação, as mulheres vêem-se muitas vezes obrigadas a aceitar um trabalho a tempo parcial que resulta em efeitos negativos nas respectivas remunerações, pensões e carreiras. Por conseguinte, a conciliação da vida familiar e profissional é também um instrumento importante para alcançar a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, quer com filhos ou sem eles.

2.3

Precisamente porque os problemas subjacentes e as possibilidades de solução variam não só de um Estado-Membro para outro, mas também de região para região e até mesmo de empresa para empresa, não há uma solução única que sirva para todos os casos. O CESE considera, neste contexto, que os parceiros sociais têm também responsabilidade na procura de soluções. Com base nas estruturas existentes em cada país, os parceiros sociais podem influir decisivamente no dia-a-dia das famílias, empenhando-se no sentido da conciliação entre vida familiar e profissional.

2.4

Conquanto a decisão de ter ou não ter filhos seja do foro pessoal, o mesmo acontecendo com a decisão de familiares ou de outras pessoas mais chegadas à família de providenciar, no domicílio, cuidados e assistência a pessoas doentes, deficientes ou idosas, no entanto a sociedade no seu todo é afectada com estas decisões. A falta crescente de crianças significa que, no futuro, haverá inevitavelmente falta de trabalhadores especializados, gestores, clientes, colaboradores, empresas, investigadores e cientistas, com consequências negativas para a sociedade no seu conjunto (5). Assim, incumbe ao Estado assumir particular responsabilidade principalmente em áreas como:

Apoio material e financeiro, atribuição de prestações pecuniárias, reconhecimento das prestações de pensão de velhice;

Infra-estruturas de apoio (guarda de crianças, escolas que funcionam todo o dia, acompanhamento extra-escolar e durante as férias escolares, ocupação dos tempos livres — garantidos por organizações de voluntários — e apoio, por exemplo, a serviços de assistência ambulantes);

Licença parental adequada para ambos os progenitores (incluindo as licenças por adopção);

Mundo do trabalho favorável à família.

2.5

Na opinião da Comissão, a flexibilidade da organização do tempo de trabalho é importante para explorar ao máximo as potencialidades da força de trabalho, devendo servir equitativamente homens e mulheres. Neste domínio, afigura-se desejável que houvesse um quadro legal. Contudo, o facto de serem mais as mulheres do que os homens a recorrerem a essas disposições gera um desequilíbrio entre uns e outras, que se repercute negativamente na situação das mulheres no local de trabalho e na sua independência económica. Há que encorajar os homens a assumirem responsabilidades familiares, em especial através de incentivos ao exercício da licença parental e da licença por paternidade, de modo a partilharem com as mulheres, de forma justa e no respeito pelo outro parceiro, as tarefas domésticas não remuneradas e a guarda dos filhos e de outros familiares.

3.   Papéis sociais masculino e feminino

3.1

As mudanças na sociedade, que permitiram um aumento considerável dos níveis de qualificação das mulheres, estão também associadas a mudanças dos papéis sociais das mulheres e dos seus ideais. Hoje em dia, na Europa, as jovens têm melhores qualificações do que os rapazes e o exercício de uma actividade profissional passou a fazer parte dos seus projectos de vida. A melhoria dos níveis de qualificação das mulheres deveria levar também à redução das desigualdades salariais entre homens e mulheres. As actuais diferenças na remuneração explicam-se essencialmente pelo número elevado de mulheres que trabalham a tempo parcial, por interrupções mais prolongadas da actividade profissional e, portanto, menos anos de experiência profissional, bem como pelo número mais reduzido de mulheres em posições de chefia e pelo baixos níveis de qualificação das mulheres mais idosas. Embora as convenções colectivas estabeleçam que homens e mulheres, com qualificações iguais, recebem o mesmo salário pelo mesmo trabalho, a desigualdade salarial persiste. Além disso, para uma verdadeira liberdade de escolha do projecto de vida pessoal é necessário que haja condições, na sociedade, para que as mulheres e os homens se possam decidir por um projecto de vida de acordo com as suas aspirações, sem terem de se confrontar com juízos críticos da sociedade — positivos ou negativos — sobre a decisão que tenham tomado.

3.2

Há factores que condicionam decisivamente a concepção dos projectos de vida, nomeadamente as infra-estruturas de guarda de crianças do país em que se vive e a percepção que a sociedade tem das mães que trabalham e dos pais que se dedicam à família. A atitude dos parceiros sociais em relação a estas questões influi também na visão que a sociedade tem delas. As experiências dos países escandinavos e da Alemanha mostraram que a atribuição de prestações pecuniárias a uma família, como por exemplo parcelas do subsídio parental, ou o aumento dos subsídios pode ser útil apenas quando também o pai assumir por um determinado período de tempo a responsabilidade pelos cuidados do filho. Os pais dispõem assim de um quadro legal que lhes permite mais facilmente dedicarem-se, por um período de tempo limitado, à educação dos filhos. Quanto às mães, a aplicação desta regra permite-lhes um reingresso mais rápido no mercado de trabalho.

3.3

O CESE salienta que uma mera alteração de factores isolados é insuficiente para que as mulheres sobrecarregadas de trabalho, em casa e no emprego, possam conciliar a sua vida familiar, profissional e privada. O objectivo deverá ser, sobretudo, uma nova divisão entre homens e mulheres das tarefas familiares não remuneradas, como a educação dos filhos, a prestação de cuidados a familiares e a organização das tarefas domésticas. Os homens devem ser levados a partilhar efectivamente com o cônjuge/companheira as tarefas domésticas e os cuidados em relação aos filhos. Tal requer mudanças estruturais profundas e sensibilização para a mudança de atitudes.

4.   Apoio dos parceiros sociais à aplicação nas empresas de medidas de conciliação da vida familiar, profissional e privada

4.1

A evolução da estrutura demográfica e as transformações daí decorrentes têm repercussões significativas, tanto nos trabalhadores como nos empregadores. Os parceiros sociais podem contribuir, a todos os níveis, para a conciliação da vida profissional, familiar e privada.

4.2

O sucesso de uma política de conciliação nas empresas depende de uma política de pessoal que, ajustada às necessidades das empresas e dos trabalhadores, favoreça um equilíbrio justo entre responsabilidades laborais, familiares e pessoais. Cada Estado-Membro deverá velar por que sejam preenchidas as seguintes condições essenciais:

Infra-estruturas adequadas de acolhimento de crianças (incluindo adolescentes) compatíveis com as necessidades existentes;

Oferta suficiente de serviços de qualidade na prestação de cuidados e assistência a idosos e deficientes;

Modalidades de tempo de trabalho justas;

Medidas para evitar que os regimes de licenças e de trabalho a tempo parcial por motivo de prestação de cuidados a menores e a pessoas dependentes afectem as prestações futuras; e

Pessoal qualificado e justamente remunerado.

Não só os trabalhadores e as empresas, mas também o próprio Estado e a sociedade, beneficiam da existência generalizada deste tipo de infra-estruturas.

4.3

O leque de instrumentos de política de pessoal — alguns deles acordados entre os parceiros sociais — que podem ser utilizados pelas empresas é diversificado e passa por:

Introdução de modelos inovadores de organização do tempo de trabalho — sem consequências penalizantes para os trabalhadores (horários flexíveis, acumulação de empregos) —, do teletrabalho, de licenças sabáticas e de contas de tempo de trabalho;

Segurança jurídica nos contratos de trabalho estável;

Empresas contactam os seus trabalhadores em gozo de licença parental com ofertas de trabalho ocasionais;

Apoio à organização do acompanhamento de crianças, desde creches nas empresas a lugares em creches financiados pelas empresas e apoio financeiro;

Apoio à prestação de cuidados a familiares idosos ou dependentes;

Apoio a medidas de desenvolvimento pessoal.

Apoio à reinserção profissional após períodos de licença ou de trabalho a tempo parcial para prestação de cuidados a menores e a pessoas com dependência.

4.4

Pretende-se, assim, também, alcançar o objectivo de permitir a todos conciliarem mais facilmente a vida profissional, familiar e privada, utilizando-se, para o efeito, modelos de trabalho a tempo parcial — flexíveis e adequados às necessidades de cada um —, num compromisso entre os interesses dos empregadores e os dos assalariados e assalariadas. Mas este objectivo só pode alcançar-se se a decisão de trabalhar a tempo parcial for voluntária. Para o CESE, é indispensável que os trabalhadores do sexo masculino optem mais frequentemente pelo trabalho a tempo parcial, desde que as necessidades da família obriguem um dos pais a optar por essa forma de trabalho. Deste modo, podem demonstrar, na prática, que as responsabilidades domésticas e familiares não incumbem exclusivamente às mulheres e que, portanto, deverá haver uma efectiva partilha de tarefas dentro da família.

4.5

Os parceiros sociais podem ajudar a encontrar respostas para a questão de saber como os pais podem concretizar o modelo de vida idealizado. O procedimento das empresas que viabilizam às trabalhadoras em licença parental a possibilidade de substituírem colegas ausentes do local de trabalho (férias, baixas) ou participarem nas festas da empresa, se assim o desejarem, tem-se revelado também bastante benéfico na medida em que facilita às mães o regresso ao emprego após interrupções para cuidar da família. O CESE chama a atenção para o facto de que a legislação de protecção das trabalhadoras grávidas e de protecção da maternidade e paternidade tem de ser obrigatoriamente cumprida e não pode ser contornada através de discriminações indirectas.

4.6

Outra possibilidade é a prestação de apoio aos pais na organização de serviços de guarda de crianças. Várias empresas ajudam os seus empregados na procura de amas e de lugares em creches e na organização de assistência aos filhos em caso de doença. Através de medidas específicas, algumas empresas tentam também encorajar os trabalhadores do sexo masculino a participarem mais na vida familiar e a passarem mais tempo com os filhos, oferecendo-lhes a possibilidade de usufruírem de um dia de férias por ocasião do aniversário dos filhos. As empresas que aplicam este tipo de medidas devem ser apoiadas. No entanto, na maioria dos casos, as empresas não dão apoio aos trabalhadores com filhos. Agindo deste modo, estão a prejudicar-se a elas próprias, pois o seu comportamento, para além de ser contrário à lei, repercute-se negativamente no ambiente de trabalho e na motivação dos trabalhadores.

4.7

O CESE remete para os estudos científicos realizados pela Prognos AG, cujos resultados indicam que a introdução de medidas especificamente orientadas para satisfazer as necessidades familiares e individuais dos trabalhadores é economicamente rentável para as empresas, uma vez que estes instrumentos de política de pessoal reduzem o absentismo e reforçam a ligação dos trabalhadores à empresa, aumentando a motivação e o rendimento dos mesmos. Acresce que uma política de pessoal concebida nestes moldes contribui para aumentar a atractividade do local de trabalho, sobretudo, e também, se possibilitar que as trabalhadoras com responsabilidades familiares usufruam de licenças e regressem às funções de chefia que ocupavam antes do gozo das mesmas. Uma tal cultura empresarial cria, além disso, um clima de trabalho agradável — um factor determinante de localização —, que se repercute positivamente na respectiva região.

4.8

O CESE assinala que a flexigurança não pode ser esquecida quando se fala da introdução de modelos flexíveis de organização do tempo de trabalho. No contexto da Estratégia de Lisboa, a flexigurança proporciona uma abordagem integrada de reforma do mercado de trabalho, conciliando a necessária e desejada flexibilidade com a segurança e o planeamento convenientes a todos os interessados. A flexibilidade acordada entre os parceiros sociais deve trazer vantagens, quer para as empresas, quer para os(as) trabalhadores(as). Há que ter em conta tanto as adaptações das empresas às exigências do mercado como o interesse crescente dos trabalhadores em dispor de flexibilidade, por exemplo no que diz respeito à organização do tempo de trabalho, para conciliar mais facilmente a vida profissional com a vida familiar e privada, garantindo a segurança e evitando a precarização das relações laborais. O essencial aqui é procurar soluções individuais e adaptadas às necessidades, normalmente acordadas pelos parceiros sociais. O CESE frisa que o debate sobre a flexigurança deverá incidir mais no facto de que os homens e as mulheres são afectados de forma diferente (6).

4.9

O sucesso da conciliação da vida profissional, familiar e privada é tanto maior quanto mais os instrumentos se mostrarem adaptados à realidade da empresa. Por isso, deve dar-se a maior importância à aplicação ao nível nacional.

4.10

O CESE considera que os concursos de empresas, que devem contar com o envolvimento dos parceiros sociais, podem ser um instrumento adequado para publicitar junto do público exemplos de práticas favoráveis à família e às mulheres e aconselhar a que sejam seguidos. Assim, novos instrumentos inovadores como sejam a:

criação nas empresas de espaços de recreação para os filhos dos seus trabalhadores;

abertura de creches nas empresas; e

criação de uma rede geracional nas empresas, cuja função consistiria em coordenar a prestação de serviços a trabalhadores mais jovens por trabalhadores reformados, a título voluntário, como ir às compras e tratar de assuntos junto de serviços públicos,

são dados a conhecer a um vasto público.

4.11

Obviamente que muitas das pequenas e médias empresas, que constituem a maioria das empresas implantadas na UE, não dispõem de meios para financiarem este tipo de ofertas atractivas, pelo que deveria ser considerada a possibilidade de criação de incentivos fiscais específicos. Nestas empresas, o facto de os contactos sociais serem mais estreitos é garantia de que as partes envolvidas chegarão a acordo quanto a soluções adequadas às circunstâncias e necessidades de cada um. Por outro lado, há a possibilidade de, dentro de uma região, várias empresas de pequena dimensão se concertarem com os órgãos de poder local, associações de cidadãos e organizações não governamentais para promoverem uma oferta conjunta, procurando assim valorizar-se a si próprias e potencializar a sua localização na região.

5.   Iniciativas práticas aos níveis regional e local

5.1

Para melhorar de forma prática e realista as condições para uma melhor conciliação da vida profissional, familiar e privada, seria da maior utilidade que os diversos actores locais coordenassem as suas actividades. Assim, o CESE encoraja os parceiros sociais a tomarem iniciativas aos níveis regional e local, integrando actores empenhados (empresas, conselhos de empresa, associações de pais, associações religiosas, clubes desportivos, representantes municipais, etc.) nas cidades e nos municípios, com o objectivo de coadunar da melhor forma os interesses empresariais, familiares e individuais. Alterações a nível local resultam em medidas práticas de apoio para todos os envolvidos. A intervenção dos mais diversos actores é extremamente diversificada e está aberta a todo o tipo de ideias criativas. Seguem-se alguns exemplos concretos, embora as possibilidades sejam muitas:

Criação para cada cidade de um sítio na Internet com informação sobre ofertas especialmente destinadas às famílias;

Criação de bases de dados para pesquisa de lugares disponíveis em creches;

Bolsas de contacto «Avós prontos a ajudar!», que fazem a ligação entre famílias jovens que não podem contar com o apoio dos seus avós e pessoas mais idosas sem família;

Acompanhamento das crianças no caminho para a escola;

Apoio prestado por organizações de voluntários e voluntários, que cuidam de crianças nos tempos livres;

Workshops sobre desenvolvimento urbano favorável à família, tendo em vista travar o êxodo das famílias jovens dos centros das cidades;

Programas de mentoria para pais de família que trabalham em regime de tempo parcial;

Reestruturação dos horários das carrinhas da escola, de forma a permitir aos pais coordenarem melhor os horários de trabalho com os ritmos escolares;

Maior flexibilidade nos horários de abertura das creches;

Realização de eventos dedicados ao tema da conjugação da vida familiar com a vida profissional, em que as empresas divulgam as políticas de pessoal que vão nesse sentido;

Análise das decisões dos órgãos municipais para averiguar em que medida são, ou não, favoráveis à família.

6.   Serviços de guarda de crianças e prestação de cuidados a familiares idosos

6.1

O CESE chama a atenção para o problema, apontado no segundo relatório de progresso da Comissão Europeia sobre a realização da Estratégia de Lisboa, apresentado em meados de Dezembro de 2006 (7), da insuficiência de serviços de guarda de crianças a preços acessíveis em vários Estados-Membros. Os Estados-Membros são, portanto, instados a promoverem, consoante os objectivos que perseguem, serviços de guarda de crianças de melhor qualidade e acessíveis para todos.

6.2

Por outro lado, o Conselho Europeu, reunido em Barcelona em 2002 (8), decidiu que os Estados-Membros deverão garantir a disponibilidade de estruturas de acolhimento, até 2010, para pelo menos 90 % das crianças com idades compreendidas entre os 3 anos e a idade da escolaridade obrigatória e pelo menos 33 % das crianças com menos de 3 anos.

6.3

Precisamente no contexto das mudanças dos papéis sociais das mulheres e dos homens é importante que os parceiros sociais tornem claro que o desenvolvimento da criança não é afectado nem pelo facto de a mãe exercer uma actividade profissional, nem por uma participação activa do pai na vida familiar.

6.4

Tendo em conta que a oferta de lugares disponíveis em creches para crianças com idade inferior a 3 anos varia fortemente de Estado-Membro para Estado-Membro, o CESE recomenda vivamente a todos os Estados-Membros que estabeleçam objectivos concretos e mensuráveis para as infra-estruturas de guarda de crianças deste nível etário. A fim de assegurar a conciliação entre vida familiar e vida profissional, é necessário que, até 2010, no mínimo 33 % das crianças com idade inferior a 3 anos sejam admitidas numa creche ou confiadas aos cuidados de uma ama qualificada.

6.5

O CESE considera necessário valorizar mais o desenvolvimento das estruturas de acolhimento de crianças nos Estados-Membros da UE, assegurando-se o seu incentivo e apoio através de medidas políticas.

6.6

No seu parecer intitulado «A família e a evolução demográfica» (9), o CESE analisou em detalhe a evolução da estrutura demográfica na União Europeia, bem como a sua repercussão nas famílias. Para muitos, o aumento da esperança de vida pode significar uma melhoria da qualidade de vida. Mas o aumento crescente da esperança de vida também obriga um número cada vez mais maior de pessoas a cuidar dos seus familiares idosos paralelamente à actividade profissional. O desenvolvimento dos serviços na área da prestação de cuidados deveria estar mais no centro das atenções, a fim de aliviar dessa responsabilidade quem cuida de familiares dependentes.

6.7

Aqui, a tarefa dos parceiros sociais poderia consistir em informar sobre instrumentos que se tenham revelado úteis na prática. Por exemplo: adaptação do horário de trabalho para fazer face a situações imprevisíveis em que se torna necessário cuidar de um familiar dependente; postos de trabalho equipados de modo a facilitar a prestação de cuidados, ou seja, o(a) trabalhador(a) deve estar contactável pelo telefone e ter acesso a computadores e à Internet, o que lhe permitirá encontrar possibilidades de prestação de cuidados; e disponibilização de material informativo sobre a organização, o financiamento e os aspectos jurídicos da situação de dependência.

7.   Perspectivas de futuro

7.1

O CESE considera que a conciliação da vida profissional e familiar está intimamente ligada à criação de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres e que os resultados pretendidos pelos parceiros sociais neste domínio, quando bem sucedidos, reforçam a conciliação. Para que se possa tornar normalidade, os programas de educação das crianças deveriam transmitir a ideia de que a conciliação da vida profissional e familiar é normal e necessária.

7.2

O CESE insta o Conselho, o Parlamento Europeu e a Comissão a tomarem em conta e a apoiarem, nas suas acções futuras, as propostas apresentadas no presente parecer com vista a melhorar a conciliação da vida profissional, familiar e privada.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  COM(2006) 92.

(2)  BUSINESSEUROPE (a antiga UNICE) é a União das Confederações da Indústria e dos Empregadores da Europa; a UEAPME é a União Europeia do Artesanato e das Pequenas e Médias Empresas, o CEEP é o Centro Europeu das Empresas de Participação Pública e das Empresas de Interesse Económico Geral; a CES é a Confederação Europeia dos Sindicatos.

(3)  http://ec.europa.eu/employment_social/news/2005/mar/gender_equality_en.pdf.

(4)  Ver o parecer exploratório do CESE, de 14.3.2007, sobre «O impacto económico e orçamental do envelhecimento», relatora S. FLORIO JO C 161 de 13.7.2007.

(5)  Ver, a este propósito, o parecer exploratório do CESE, de 14.3.2007, sobre «A família e a evolução demográfica», relator Stéphane BUFFETAUT JO C 161 de 13.7.2007.

(6)  Ver, neste contexto, o parecer exploratório do CESE, de 12.7.2007, sobre o tema «Flexigurança (dimensão da flexibilidade interna — a negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho)», relator Thomas Janson JO C 97 de 28.4.2007.

(7)  COM(2006) 816 Comunicação da Comissão ao Conselho Europeu da Primavera — Execução da Estratégia de Lisboa renovada para o crescimento e o emprego «Um ano de realizações».

(8)  Conclusões da Presidência: Conselho Europeu de Barcelona, 15 e 16 de Março de 2002.

(9)  Ver, a este propósito, o parecer exploratório do CESE, de 14.3.2007, sobre «A família e a evolução demográfica», relator Stéphane BUFFETAUT JO C 161 de 13.7.2007.