23.12.2006 |
PT |
Jornal Oficial da União Europeia |
C 318/42 |
Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao exercício do direito de voto pelos accionistas de sociedades com sede social num Estado-Membro e cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação num mercado regulamentado e que altera a Directiva 2004/109/CE»
COM(2005) 685 final — 2005/0265 (COD)
(2006/C 318/06)
Em 31 de Janeiro de 2006, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 95.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.
Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 20 de Julho de 2006, sendo relator Bryan CASSIDY.
Na 429.a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 83 votos a favor, 9 votos contra e 18 abstenções, o seguinte parecer.
1. Conclusões e recomendações
1.1 |
O CESE congratula-se com a proposta, uma vez que os obstáculos à votação transfronteiras provocam distorções do mercado único. |
1.2 |
A cativação de acções, ou seja, a obrigação de depositar ou manter cativas as acções durante alguns dias antes de uma assembleia geral para poder exercer o direito de voto, ainda se mantém em vigor em diversos Estados-Membros da UE, sendo inclusivamente obrigatória em alguns. Trata-se de uma prática dispendiosa que impede os accionistas de negociarem as suas acções antes da assembleia geral, sendo considerada pela maioria dos investidores institucionais um dos principais obstáculos à votação. O artigo 7.o da Directiva proposta proíbe qualquer condição que exija a «cativação» das acções mediante depósito antes da assembleia geral. O CESE acolhe de forma particularmente favorável esta proibição, embora ciente de que é reduzido o número de Estados-Membros onde a referida prática ainda se mantém em vigor. |
1.3 |
O CESE considera que a Directiva deveria reflectir a procura de melhor regulamentação e chama a atenção, em particular, para o número 34 do Acordo Interinstitucional «Legislar melhor», de Dezembro de 2003, que encoraja os Estados-Membros a «elaborarem, para si próprios e no interesse da Comunidade, os seus próprios quadros, que ilustrem, na medida do possível, a concordância entre as directivas e as medidas de transposição, e a publicá-los». |
1.4 |
O CESE veria com agrado uma utilização mais ampla da votação electrónica, de modo a aumentar a transparência e encorajar a participação dos accionistas. No entanto, considera que este aspecto deverá ser deixado à discrição das sociedades em causa e deseja que os Estados-Membros evitem a criação de obstáculos a uma utilização mais ampla da participação electrónica nas assembleias gerais. |
1.5 |
Na sequência do número anterior, o CESE espera um aumento da utilização de votação segura através da Internet, incluindo possivelmente o recurso a SMS. Esse aumento deve ser encorajado, mas não imposto através de directiva comunitária. |
1.6 |
O CESE congratula-se especialmente com a proposta relativa à votação por procuração estabelecida no artigo 10.o. O Comité acolhe de forma particularmente favorável a eliminação das limitações à votação por procuração, uma vez que, em alguns Estados-Membros, apenas podem ser nomeados representantes familiares dos accionistas. |
1.7 |
O CESE apoia a possibilidade de os Estados-Membros definirem uma data única, considerando um número específico de dias antes da assembleia geral e determinando que a sociedade não deva ser obrigada a responder a interpelações apresentadas após essa data. |
1.8 |
O CESE gostaria de ver reforçado o artigo 5.o, relativamente a informações aos accionistas antes da assembleia geral. |
2. A proposta da Comissão
Está relacionada com os obstáculos à votação transfronteiras pelos accionistas.
2.1 |
Dada a recente onda de escândalos relacionados com o mau governo das sociedades na UE e nos EUA, é necessário encorajar os accionistas a desempenharem um papel mais activo através da votação nas assembleias gerais. A proposta em apreço tem por objectivo proteger não só os direitos dos accionistas da UE, mas também os direitos dos accionistas de todos os restantes países. |
2.2 |
A proposta em apreço tem por objectivo melhorar o governo das sociedades cotadas da UE através da melhoria dos direitos dos accionistas no âmbito das assembleias gerais. Pretende-se atingir esse objectivo assegurando que os accionistas que possuem acções de sociedades com sede e cotadas noutro Estado-Membro possam votar sem dificuldades nas assembleias gerais dessas sociedades. |
2.3 |
A proposta de Directiva aborda quatro questões dignas de nota:
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2.4 |
A presente proposta é uma das medidas de curto prazo apresentadas na Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, de 21 de Maio de 2003 (1) intitulada «Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia — Uma estratégia para o futuro». |
2.5 |
A Comissão assinala que o processo de votação em assembleias gerais de sociedades varia consideravelmente entre os Estados-Membros, sendo frequentemente um procedimento complexo. O procedimento torna-se ainda mais complexo quando as acções são detidas por accionistas estrangeiros. |
2.6 |
A Comissão considera que a actual legislação comunitária é insuficiente para resolver o problema da votação transfronteiras. O artigo 17.o da «Directiva Transparência» (Directiva 2004/109/CE) exige que os emitentes disponibilizem certas informações e documentos que são pertinentes para as assembleias gerais. No entanto, a Directiva Transparência não resolve o problema do processo de votação pelos accionistas. |
2.7 |
A votação pode ser um processo complexo. Muitas vezes, os investidores detêm as suas acções através de intermediários de valores mobiliários. Quando tal acontece, a votação pode implicar uma sequência de acontecimentos em que participam sociedades, conservatórias, bancos depositários, gestores de investimentos, depositários centrais de valores mobiliários e agências de votação por procuração. |
3. Opções
3.1 |
Não é de modo algum garantido que o mercado reaja de forma suficientemente rápida para melhorar os direitos dos accionistas, nem que em todos os Estados-Membros sejam efectuadas as alterações legislativas necessárias para resolver o problema da complexidade do processo de votação. |
3.2 |
Uma recomendação da Comissão não tem força jurídica, mas proporcionaria flexibilidade suficiente para que os Estados-Membros a introduzam na respectiva legislação nacional com base nas directrizes da Comissão. Uma recomendação não poderia garantir a introdução de normas mínimas em áreas fundamentais que estão na base dos problemas da votação transfronteiras e do agravamento de custos, como a cativação de acções, um requisito que, quando está presente a nível nacional, desincentiva os accionistas de exercerem o direito de voto. |
3.3 |
Um regulamento introduziria um tratamento uniforme, independentemente da legislação nacional de cada Estado-Membro. Poderia igualmente garantir a introdução de um quadro comum rigoroso para as questões transfronteiras. Teria ainda a vantagem de impedir a «sobre-regulamentação» (gold-plating, a introdução de procedimentos que não são automaticamente exigidos por uma directiva). A Comissão considera que os custos de um regulamento poderiam ser significativos, uma vez que não teria flexibilidade suficiente para que fossem respeitadas as diferenças de tradições jurídicas dos Estados-Membros. |
3.4 |
Uma directiva permitiria a existência de diferenças da prática em vigor nos Estados-Membros, mas preveniria o desequilíbrio entre diferentes classes de acções e accionistas e favoreceria a existência de normas mínimas básicas. |
4. Custos e benefícios
4.1 Benefícios
4.1.1 |
A curto prazo, os principais beneficiários da proposta serão os investidores institucionais actualmente titulares de acções de sociedades de outros Estados-Membros. A existência de custos e de obstáculos à votação transfronteiras impede que os accionistas se envolvam tão activamente quanto gostariam no governo das sociedades. |
4.1.2 |
A longo prazo, a proposta poderá encorajar os pequenos investidores — actualmente dissuadidos de deter acções desse tipo pelos elevados custos associados ao exercício do direito de voto — a aumentar o número de acções de sociedades de outros Estados-Membros nas suas carteiras de títulos. Poderão, assim, aumentar a diversificação das carteiras de títulos, reduzindo o risco. De uma forma geral, a longo prazo, a proposta deverá contribuir para maior liquidez nos mercados de capitais europeus. |
4.1.3 |
Actualmente, há obstáculos à votação transfronteiras. A cativação de acções continua a ser um problema em diversos países, sendo considerada por muitos investidores como um importante obstáculo à votação. Neste aspecto, representa um obstáculo ao funcionamento eficaz dos mercados de capitais transnacionais. Além disso, existe alguma confusão entre os investidores no que diz respeito à verdadeira natureza das disposições de cativação de acções em vigor nos diferentes Estados-Membros. Este facto também representa um custo significativo para os investidores, que a directiva proposta permitiria reduzir. |
4.1.4 |
Verifica-se uma discriminação injusta entre os accionistas nacionais e os de outros Estados-Membros no que diz respeito à informação relativa às assembleias gerais que lhes é prestada. A proposta da Comissão, que assegura o acesso oportuno a informação adequada em todos os mercados, contribuiria para a redução da dimensão deste problema. |
4.1.5 |
A jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) chama a atenção para a necessidade de os Estados-Membros evitarem atitudes abusivas de algumas classes de accionistas relativamente a outras classes. |
4.1.6 |
A votação por procuração e os requisitos de novo registo têm frequentemente custos elevados e há indicações, baseadas na avaliação de impacto da Comissão, que sugerem que esses custos desencorajam efectivamente o exercício do direito de voto dos pequenos fundos de investimento. A proposta da Comissão deverá simplificar o processo de nomeação de representantes e clarificar quem poderá ser nomeado representante. Deverá igualmente melhorar os direitos dos representantes em alguns Estados-Membros. |
4.1.7 |
Quando o presidente da mesa da assembleia geral for representante de accionistas, deverá ser obrigado a votar rigorosamente de acordo com as intenções expressas por esses accionistas. |
4.2 Custos
4.2.1 |
A uniformização proposta do prazo de convocatória introduziria um elemento de inflexibilidade nos Estados-Membros onde se exige um prazo de apenas 14 dias para a convocação de uma assembleia geral extraordinária. |
4.2.2 |
O requisito de apresentação de respostas sob forma escrita às interpelações dos accionistas apresentadas sob a mesma forma é essencial. |
4.2.3 |
Os artigos 5.o e 7.o da proposta de Directiva estabelecem um período não inferior a 30 dias de calendário entre a data de registo e a data da assembleia geral, de modo a facilitar o exercício do direito de voto pelos accionistas. |
5. Observações na especialidade
5.1 |
O CESE congratula-se com a proposta da Comissão, na medida em que os obstáculos à votação transfronteiras provocam distorções do mercado único. |
5.2 |
Dado que o sector financeiro exerce influência importante na economia e no crescimento do emprego, qualquer factor que iniba a participação dos accionistas deverá ser desencorajado. A proposta da Comissão aponta nesse sentido. |
5.3 |
Actualmente, a votação transfronteiras é, a priori, mais dispendiosa para os accionistas não residentes do que para os residentes no Estado-Membro onde a sociedade em causa está cotada, o que é um exemplo de distorção do mercado. |
5.4 |
A Comissão considera haver actualmente demasiados condicionalismos que tornam a votação por procuração em alguns Estados-Membros desnecessariamente complicada. |
5.5 |
A cativação de acções, ou seja, a obrigação de depositar ou manter cativas as acções durante alguns dias antes de uma assembleia geral para exercer o direito de voto ainda persiste em diversos Estados-Membros da UE, sendo mesmo obrigatória em alguns. Trata-se de uma prática dispendiosa, que impede os accionistas de negociarem as suas acções por um período de até duas semanas antes da assembleia geral, o que é considerado pela maioria dos investidores institucionais um dos principais obstáculos ao exercício do direito de voto. |
5.6 |
O CESE partilha o ponto de vista da Comissão em como a disponibilização tardia de informações pertinentes para as assembleias gerais ou o facto de essas informações estarem incompletas, bem como as deliberações em formato resumido e os prazos reduzidos de convocatória constituem alguns dos principais obstáculos que os cidadãos residentes noutro Estado-Membro enfrentam quando pretendem exercer os seus direitos como accionistas. Todos os documentos pertinentes, incluindo relatórios de auditoria, respostas às interpelações apresentadas pelos accionistas e notificações de realização de assembleias gerais, bem como as moções a apresentar nas assembleias gerais devem ser disponibilizados em suporte electrónico e físico. |
5.7 |
O artigo 8.o diz respeito à participação em assembleias gerais por meios electrónicos. Segundo a proposta da Comissão, que invoca a rápida evolução da tecnologia, os «Estados-Membros não proibirão a participação de accionistas em assembleias gerais por meios electrónicos». |
5.8 |
A proposta da Comissão não aborda especificamente o problema das acções ao portador. A comunicação com esses accionistas é efectuada principalmente através de anúncios em jornais. O CESE considera que a comunicação electrónica é mais moderna, mais rápida e seguramente mais barata. |
5.9 |
O artigo 10.o clarifica as disposições referentes ao voto por procuração, abolindo as restrições impostas por algumas empresas relativamente às pessoas que podem ser representantes. |
5.10 |
A opção de não tomar qualquer iniciativa, ou seja, manter a situação actual, não é considerada recomendável pelo CESE. Os obstáculos tornam a votação transfronteiras muitíssimo dispendiosa para os pequenos accionistas e resultam em custos elevados para os investidores institucionais. |
Bruxelas, 13 de Setembro de 2006
A Presidente
do Comité Económico e Social Europeu
Anne-Marie SIGMUND
(1) COM(2003) 284 final, Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia — Uma estratégia para o futuro.