31.1.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 24/95


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Pobreza entre as mulheres na Europa»

(2006/C 24/18)

Em 28 de Abril de 2005, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a «Pobreza entre as mulheres na Europa».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 5 de Setembro de 2005, sendo relatora Brenda KING.

Na 420.a reunião plenária, de 28 e 29 de Setembro de 2005 (sessão de 29 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 79 votos a favor, sem votos contra e com 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Historial

1.1   Dia Internacional da Erradicação da Pobreza

A Assembleia Geral das Nações Unidas designou o dia 17 de Outubro como Dia Internacional da Erradicação da Pobreza a fim de sensibilizar para a necessidade de eliminar a pobreza e a miséria em todos os países.

1.2   As mulheres e a pobreza na UE

O Comité das Regiões, o CESE e o Parlamento Europeu estão a elaborar, cada um, um documento sobre As mulheres e a pobreza na UE para coincidir com esta data e contribuir para o debate geral sobre a pobreza na UE hoje em dia. Tem havido uma excelente coordenação entre estas instituições, embora cada documento seja escrito de um ponto de vista distinto.

1.3   Definição de pessoas em risco de pobreza

As pessoas em risco de pobreza são as que têm rendimentos inferiores a 60 % da média nacional. Esses rendimentos são definidos como os rendimentos totais disponíveis a cada agregado divididos por cada membro desse agregado.

1.4   Quadro para o combate à pobreza e à exclusão social na UE

Em 2000, os Estados-Membros concordaram em adoptar uma estratégia europeia de combate à exclusão social e à pobreza (2000) com base no método aberto de coordenação. Esta estratégia inclui objectivos comuns e a obrigação de cada Estado-Membro apresentar um Plano de Acção Nacional bianual em conformidade com esses objectivos. Os indicadores prevêem quatro dimensões da integração social — pobreza financeira, emprego, saúde e educação. A igualdade entre homens e mulheres não é um dos objectivos globais desta estratégia da UE.

Em 1999, o Conselho adoptou uma estratégia coordenada de modernização da protecção social. A protecção social é uma das formas mais importantes de combate à pobreza e à exclusão social nos Estados-Membros. A estratégia centra-se em três temas: políticas de inclusão social, reforma dos sistemas de pensões e reforma dos sistemas de cuidados de saúde. A igualdade entre os géneros não foi incluída.

Em vista dos resultados dos recentes referendos sobre a Constituição da UE, a presidência do Reino Unido anunciou uma comunicação sobre os sistemas de protecção social, a apresentar em Outubro de 2005.

1.5   Quadro jurídico

A maior parte das políticas de combate à pobreza e à exclusão social continua a ser da competência de cada Estado-Membro. Contudo, ao abrigo dos artigos 136.o e 137.o do Tratado, a UE pode apoiar e complementar activamente as intervenções dos Estados-Membros para combater a exclusão social.

O artigo 13.o do Tratado autoriza a UE a tomar medidas, mesmo legislativas, de combate à discriminação com base no sexo, na origem étnica ou racial, na religião ou fé, na deficiência, na idade ou na orientação sexual.

1.6   Nível de pobreza na UE

Em 2001, o número de pessoas afectadas por um baixo nível de rendimentos relativos era muito significativo, estando mais de 55 milhões de pessoas (15 % da população da UE) em risco de pobreza (1). Mais de metade dessas pessoas vivia de rendimentos relativos constantemente baixos. Esta proporção varia consideravelmente entre os Estados-Membros, indo de 9 % na Suécia até 21 % na Irlanda. Em geral, são realmente as mulheres quem mais se ressente desta situação.

1.7   Nível de exclusão social

Quanto mais tempo um indivíduo tiver de viver de baixos rendimentos, maior o risco de privações, de exclusão da vida social, cultural e económica. Em todos os Estados-Membros metade ou mais das pessoas em risco de pobreza em 2001 viviam de baixos rendimentos há um período prolongado, isto é, dispunham de rendimentos igualizados inferiores a 60 % da média no ano em questão e em pelo menos dois dos três anos anteriores (1998-2000). Em média, a população da UE contava em 2001 9 % de pobres de longa duração. Também aqui são as mulheres as mais afectadas.

1.8   Contexto demográfico e social na UE

A situação demográfica na UE está a mudar rapidamente e a população activa, que não cessou de aumentar durante um século, será em breve uma minoria. A faixa etária de 65 anos ou mais representa já 16 % da população total, ao passo que os menos de 15 anos são apenas 17 %, e a esperança média de vida continua a aumentar. Nos próximos 15 anos, o número de pessoas com mais de 80 anos aumentará quase 50 % (2).

Ao mesmo tempo, as estruturas familiares estão em mutação. Os casamentos são menos numerosos e dão-se mais tarde, há mais divórcios e cada vez menos casais com filhos. Daí resulta a tendência para menores agregados familiares em todas as faixas etárias. O prémio Nobel da economia, Gary BECKER, e o seu colega, o juiz Richard POSNER, consideram que esta evolução se deve em grande parte a causas económicas (3). Em seu entender, a crescente independência financeira das mulheres graças a melhores oportunidades profissionais fora do lar assinala uma transição do «casamento patriarcal» — em que o marido trabalha e a esposa é sua dependente — para um «casamento de parceria». Do mesmo modo, os custos indirectos da maternidade também têm aumentado: quanto mais elevados os rendimentos de uma mulher e o seu estatuto profissional, mais corre o risco de perder em termos de progressão na carreira e de rendimentos se abandonar a vida activa, temporária ou permanentemente, para ser mãe.

Uma outra alteração é o aumento fenomenal do número de crianças que vivem com um só adulto. Em 2000, 10 % das crianças menores de 14 anos viviam com um só adulto, contra apenas 6 % em 1990. Isso deve-se ao número cada vez maior de casamentos ou relações dissolvidos e de gravidezes inesperadas.

2.   Observações Na Generalidade

2.1

O CESE congratula-se por esta oportunidade de expor os seus pontos de vista sobre este tema mas entende que a ênfase deveria ser colocada em «Género e pobreza» e não em «Mulheres e pobreza», uma vez que isso chamaria a atenção para a relação e as diferenças entre os géneros no que toca às causas da pobreza.

O Comité recomenda que a Comissão reveja a sua definição de pobreza, dado que esta só destaca as causas aparentes da pobreza e subestima o nível de pobreza das mulheres e o impacto dessa pobreza. A definição parte do princípio de que os recursos de um agregado familiar são partilhados equitativamente entre os seus membros, mas na realidade a pobreza é sentida a nível individual e é a esse nível que ela deve ser analisada se se pretende compreender a dimensão de género.

2.2

O CESE aplaude a decisão da presidência britânica de relançar o debate sobre os sistemas de protecção social e recomenda que se realize uma análise do impacto sobre os géneros para garantir que esses sistemas reflectem as necessidades distintas de homens e mulheres. Parte-se muitas vezes do princípio de que as mulheres contam sempre com os rendimentos de um homem em caso de necessidade. Esta presunção, desfasada da realidade das sociedades actuais, é uma das principais razões do risco mais elevado de pobreza das mulheres.

3.   Observações Na Generalidade

3.1   A incidência do risco de pobreza

As mulheres estão, em geral, mais expostas ao risco de viver num agregado pobre: em 2001, 16 % das mulheres adultas (com mais de 16 anos) tinham um rendimento inferior ao limiar de pobreza, contra 14 % dos homens da mesma faixa etária (4). Este padrão é semelhante em todos os Estados-Membros. O risco de pobreza é mais elevado nos agregados compostos por pais solteiros (35 % da média da UE), 85 % dos quais são mulheres. As mulheres chefes de família com 18 anos ou menos estão particularmente expostas ao risco de pobreza.

As pessoas de mais de 65 anos correm um risco relativamente elevado de pobreza. Dois terços dessas pessoas são mulheres. As mulheres reformadas e sós, sobretudo as de mais de 80 anos ou sem uma reforma profissional, acusam níveis de pobreza muito mais elevados. Uma das principais razões desta situação é que à medida que os reformados envelhecem, tendem a aumentar as suas despesas com a saúde devido a deficiência ou imobilidade.

Estudos revelam que as mulheres sujeitas à discriminação de várias formas — p. ex., as idosas, as mulheres de grupos minoritários ou migrantes, as mulheres com deficiência ou as lésbicas — estão ainda mais em risco de exclusão social e de pobreza.

3.2   Dimensão laboral da pobreza e da exclusão social entre as mulheres

O emprego é um factor essencial da inclusão social e pode ser visto como a via mais eficaz para escapar à pobreza, não só porque gera rendimentos mas também porque promove a participação social e o desenvolvimento pessoal. Isso mesmo se infere dos objectivos da estratégia de Lisboa, segundo os quais em 2010 a economia europeia deverá ser a mais competitiva e dinâmica economia mundial baseada no conhecimento, com uma capacidade de crescimento económico sustentável, mais e melhor emprego e maior coesão social, para o que será essencial a participação das mulheres no mercado de trabalho (a estratégia de Lisboa prevê a este respeito um objectivo concreto: uma taxa de emprego feminino de 60 % em 2010). Embora os níveis de participação das mulheres no mercado de trabalho estejam a aproximar-se dos homens, as mulheres assalariadas não estão isentas do risco de pobreza. Isso porque a participação das mulheres na mercado laboral está pejada de enormes entraves, como o elevado nível de desemprego feminino na UE-25 (5), a dificuldade de conciliar vida doméstica e vida profissional, a tendência para a segregação e sectorização do emprego feminino, a disseminação de modalidades de emprego precárias com menos garantias legais e sociais e o fosso entre os salários percebidos por homens e mulheres em todos os países da Europa.

3.2.1   Disparidade salarial

Trinta anos após a Directiva de 1975 relativa à igualdade dos vencimentos, se tomarmos a média europeia, as mulheres ainda só ganham 85 % dos salários dos homens pelo mesmo tempo de serviço (6). Em grande parte dos países este diferencial é muito mais elevado atingindo mesmo os 33 %. O CESE ecoa a indignação da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros do Parlamento Europeu quanto à persistência desta disparidade e concorda com o seu apelo a que o Conselho e a Comissão Europeia tomem as medidas necessárias «para pôr cobro a esta iniquidade».

3.2.1.1   Custos indirectos da maternidade

Muitos estudos imputam estes custos ao facto de as mulheres passarem muito mais tempo do que os homens a tratar das crianças. A maior parte das mulheres deixará o mercado do trabalho durante pelo menos uma parte da sua vida. Já o comportamento típico dos trabalhadores masculinos é o de uma vinculação plena ao mercado de trabalho desde a saída da escola/universidade até à reforma. O abandono do mercado de trabalho pode repercutir-se negativamente nos rendimentos. A licença de maternidade pode significar contratos mais curtos, menos experiência acumulada e menor acesso à formação. Também os aumentos salariais são muitas vezes reservados aos trabalhadores que permanecem continuamente empregados durante muitos anos. Com efeito, quanto maior a licença, maior a perda de dinheiro.

3.2.2   Nível educativo das mães

Uma ausência prolongada do mercado de trabalho para cuidar de crianças jovens é mais típica das mães com poucas qualificações. Ao passo que as mães com formação universitária têm vindo a reduzir o tempo de ausência do mercado de trabalho, o comportamento das mulheres não qualificadas não tem mudado. As mães sem qualificações têm mais tendência a deixar o mercado de trabalho até a criança atingir a idade escolar, ao passo que as mães com formação universitária tendem a gozar apenas a licença de maternidade e a entregar subsequentemente as crianças ao cuidado de terceiros.

Assim, as mulheres com menos qualificações, que tendem a deixar a vida laboral por períodos mais longos (e que normalmente ganhariam menos antes de serem mães), são as mais penalizadas financeiramente.

3.2.3   Mães solteiras

Como referido no ponto 1.8, os pais solteiros, particularmente expostos ao risco de pobreza, são cada vez mais numerosos. Dado que 85 % dos pais solteiros são mulheres, este risco de pobreza é-lhes específico. Uma boa parte desse risco deve-se à fraca participação na vida activa: só 50 % das mães solteiras trabalham, comparado com 68 % das mulheres casadas (7). Ao contrário dos níveis de emprego das mulheres em geral, que têm vindo a aumentar, os das mães solteiras quase não têm evoluído.

Estudos revelam que a oferta insuficiente de infantários a preços módicos não é a única razão que leva os pais solteiros a deixar o mercado de trabalho. Outras razões são:

Os pais solteiros desempregados carecem geralmente das qualificações requeridas pelo mercado de trabalho (8). Quanto menores as suas qualificações, menor a oportunidade de se manterem no mercado de trabalho. Esta depende decididamente das possibilidades de formação disponíveis e acessíveis durante o período de licença parental.

Os pais solteiros tendem a concentrar-se nas zonas geográficas em que o desemprego é já de si mais elevado.

Os pais solteiros desempregados têm mais tendência a adoecer ou a ter a seu cargo uma criança ou outro indivíduo cuja enfermidade ou deficiência limite as suas oportunidade de trabalho (situação que afecta 1 em cada 10 pais solteiros desempregados).

Os pais solteiros com problemas financeiros tenderão mais a sofrer de desencorajamento e depressão, o que pode converter-se num obstáculo à procura de emprego.

Além disso, muitos pais solteiros têm de cuidar eles próprios dos seus filhos e procuram apenas empregos com horários que lhes permitam passar o máximo de tempo possível com as crianças mas sem prejudicar a sua vida profissional. Por este motivo, muitos deles vêem-se obrigados a aceitar empregos precários, pouco seguros e mal pagos.

3.2.3.1   Gravidez entre as adolescentes

As mulheres chefes de família com 18 anos ou menos estão particularmente expostas ao risco de pobreza. Na UE, 6 % das mulheres foram mães antes dos 18 anos, embora essa percentagem varie entre 3 % na Itália, nos Países Baixos, na Espanha e na Suécia, 12 % na Hungria e na Eslováquia e 13 % no Reino Unido (9).

Os pais adolescentes têm maiores probabilidades do que os pais adultos de serem afectados pela pobreza e pelo desemprego e escapam dificilmente a essa situação devido à sua falta de formação e às outras razões acima referidas. A título de exemplo, 45 % das mulheres na UE-15 que foram mães adolescentes vivem em agregados cujos rendimentos se contam entre os 20 % mais baixos, ao passo que só 21 % das mulheres que tiveram o primeiro filho na casa dos 20 se encontram nesse grupo. 90 % dos pais adolescentes beneficiam de contribuições sociais, e as mães adolescentes tendem mais do que as outras a viver apenas dessas contribuições e a delas depender durante períodos mais longos.

Os Estados-Membros têm como prioritária a redução dos índices de maternidade adolescente, que contribuirá para reduzir o risco de pobreza e sua perpetuação de uma geração para outra. Para a consecução desse objectivo são propostas soluções muito variadas, desde mais educação sexual a menos educação sexual; desde a promoção da abstinência à distribuição de contraceptivos nas escolas; desde a distribuição de pílulas do dia seguinte à revisão das ajudas sociais para encorajar a coabitação e o casamento entre pais adolescentes.

Os quatro Estados-Membros da UE com os mais baixos índices de maternidade adolescente poderiam servir de modelo a outros países que se debatem com este problema.

3.2.4   Pobreza no trabalho

O aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho resulta da proliferação de formas alternativas de trabalho, como o trabalho a tempo parcial, os horários flexíveis e o trabalho a prazo. O emprego a tempo parcial entre as mulheres é em média de 27 %, contra apenas 4 % entre os homens (10). De facto, o fosso salarial entre os géneros é maior no trabalho a tempo parcial do que no trabalho a tempo inteiro: o salário médio de uma mulher para um trabalho a tempo parcial é cerca de 60 % o de um homem, comparado a 82 % para o trabalho a tempo inteiro.

Os trabalhadores menos qualificados, não declarados, oriundos de minorias ou migrantes com pouco ou nenhum estatuto independente legal estão particularmente expostos ao risco de pobreza, dado que os seus empregos são em geral mal pagos, de baixo nível e precários. Os dados revelam que em casos extremos as mulheres deste grupo correm o risco de tráfico, prostituição e violência.

3.2.5   Trabalho não remunerado

As mulheres continuam a não ser pagas pelo trabalho prestado em casa. Mesmo as mulheres assalariadas têm de efectuar tarefas ainda tidas como «suas», como fazer compras e tratar das crianças e dos idosos, uma vez que os homens realizam menos de 40 % das tarefas domésticas e só cerca de 25 % a 35 % do trabalho de cuidar das crianças (11). Este trabalho não remunerado é sistematicamente ignorado pelas estatísticas nacionais, o que vale dizer que é invisível aos responsáveis políticos.

Deve salientar-se que a conciliação da vida familiar e da vida profissional é um verdadeiro desafio para homens e mulheres. As mulheres com filhos menores de 12 anos acusam índices de emprego 15 % inferiores aos das mulheres sem filhos — 60 % contra 75 %. Para os homens com filhos menores de 12 anos, porém, a taxa de emprego é de 91 %, 5 % superior à dos homens sem filhos.

3.2.6   Desemprego de longa duração

Esta condição é geralmente motivadora de problemas sociais, dado que os afectados tendem a perder as qualificações e a auto-estima necessárias para regressarem ao mercado de trabalho, salvo quando beneficiam de apoio adequado e atempado. Na UE no seu todo, os índices de desemprego de longa duração são mais elevados para as mulheres (4,5 %) do que para os homens (3,6 %) (12). Não obstante, os programas destinados a favorecer o regresso destas pessoas à vida activa tendem a beneficiar mais os homens, dado que às mulheres são reservados ofertas de formação muito mais limitadas e empregos estereotipados e pior remunerados.

3.2.7   Pensões

3.2.7.1

As desvantagens que as mulheres enfrentam no mercado de trabalho e o fosso salarial daí resultante mantêm-se durante a reforma. Isso porque o regime de pensões de muitos Estados-Membros foi concebido de um ponto de vista masculino, discriminando as mulheres que interrompem a carreira, têm empregos não convencionais ou conhecem períodos de trabalho não remunerado. Por conseguinte, muitas mulheres estão em desvantagem para acumular os direitos e as anuidades necessários para beneficiarem de uma pensão adequada na velhice. Dois terços dos reformados são mulheres, e o seu rendimento médio é 53 % o de um homem, o que pode afectar a sua saúde, o seu tipo de habitação e a qualidade de vida. 75 % dos reformados que recebem ajudas sociais por terem rendimentos demasiado baixos são mulheres. Em resultado disso, as mulheres idosas, incluindo viúvas e divorciadas, constituem o grupo mais pobre entre os reformados, e face às consequências sociais a longo prazo do envelhecimento da população da UE esta tendência continuará a aumentar se nada for feito.

Em parecer anterior (13), o CESE recomendou a reforma dos sistemas de pensões para garantir a igualdade entre os géneros, com a individualização das pensões como meta a longo prazo. O CESE considerou ainda que as experiências dos Estados-Membros deveriam ser partilhadas de forma a que algumas mulheres, sobretudo as que interrompem a carreira, não tivessem de se contentar com pensões insuficientes.

Este parecer anterior também fez notar que alguns Estados-Membros, para além da pensão, concedem aos seus idosos outros tipos de apoio. Trata-se de mecanismos variados, nomeadamente benefícios fiscais, energia gratuita, transportes públicos grátis ou a tarifas reduzidas, subsídio de renda. Estas vantagens adicionais são muito importantes, dado que as mulheres, por terem uma esperança média de vida superior, terão mais probabilidades de vir a viver sozinhas do que os homens e, logo, de enfrentar os problemas que se colocam aos reformados mais idosos. Em geral, os reformados mais idosos auferem rendimentos menores de poupanças e investimentos, ao mesmo tempo que as suas despesas correm o risco de aumentar devido a deficiência, mobilidade reduzida e depreciação dos bens.

3.2.7.2

As mulheres, incluindo as de minorias e as imigrantes legalmente residentes ou sem documentos, que ocupem postos de trabalho não convencionais têm ainda mais desvantagens porque só dificilmente poderão beneficiar de um regime de pensões profissionais. Dado que os homens têm salários mais elevados do que as mulheres, a sua pensão final será também mais elevada do que a das mulheres. Além disso, os activos de pensões eram antigamente associados ao detentor do salário mais elevado do agregado, responsável pelo aumento dos activos, que era geralmente o homem. O aumento do número de divórcios chamou a atenção para a injustiça desta prática, dado que a mulher ficava geralmente em desvantagem em caso de dissolução da relação. Entretanto, vários Estados-Membros adoptaram legislação nos termos da qual os tribunais podem agora dividir os activos em caso de divórcio da forma que lhes parecer mais apropriada.

3.3   Dimensão educativa da pobreza e da exclusão social entre as mulheres

3.3.1

A procura de emprego e a entrada na vida activa são determinadas pelo nível de qualificações, especialmente no caso das mulheres. As mulheres mais qualificadas (com um nível educativo ISCED (14) 5 ou 6) têm mais frequentemente um emprego do que as menos qualificadas (nível ISCED inferior a 2) (15). Na UE-25, só 49 % das mulheres entre 20 e 49 anos com um baixo nível de qualificações, para 84 % das com um alto nível de qualificações. Note-se que esta diferença de 30 % no caso das mulheres é de apenas 10 % (83 % contra 93 %) no caso dos homens. As mulheres com mais qualificações que tenham filhos mantêm-se geralmente empregadas. Na UE-25, a proporção entre estes dois grupos é a seguinte: sem filhos (88 % contra 57 %); com um ou dois filhos (80 % contra 43 %); com três ou mais filhos (63 % contra 22 %).

3.3.2

Os programas pedagógicos encorajam opções curriculares fortemente orientadas em função do sexo, levando as adolescentes a optar por formações e carreiras mal remuneradas, e os professores e os orientadores curriculares geralmente não têm formação para ter em conta ou reconhecer as questões de género. Os indivíduos mais expostos a este tipo de segregação são as adolescentes de agregados já sujeitos ao risco de pobreza: estudos (16) demonstram que as jovens deste grupo estão sobrerrepresentadas nos empregos de baixo nível devido ao seu baixo nível de formação. O trabalho manual a tempo parcial constitui a categoria de emprego em que as mulheres estão mais em desvantagem, mais ainda do que noutros tipos de emprego a tempo parcial ou manual a tempo inteiro, devido aos baixos níveis de formação dessas mulheres. Estas vêem as suas opções profissionais limitadas pela combinação da pobreza e do género ao longo dos seus percursos educativos, o que não só afectará a sua vida profissional e a reforma como poderá desencadear um ciclo de pobreza intergeracional.

3.3.3

O CESE louva a ênfase colocada no emprego, e em particular no emprego feminino, pelos objectivos da estratégia de Lisboa, mas observa que isso é insuficiente para as mulheres em risco de pobreza. Os Estados-Membros têm a oportunidade de trabalhar em conjunto com a sociedade civil e com ONG (sobretudo as ONG activas nos domínios da igualdade entre os géneros e da erradicação da pobreza) para pôr termo a esta pobreza vitalícia e intergeracional combatendo a estereotipação nas instituições educativas no que se refere às opções de rapazes e raparigas e criando cursos profissionais eficazes e acessíveis que desenvolvam a empregabilidade e venham ao encontro das necessidades destas mulheres.

3.4   Dimensão penal da pobreza e da exclusão social entre as mulheres

3.4.1

As mulheres são apenas uma minoria dos acusados ou condenados por crimes, representando cerca de um quinto dos criminosos condenados e apenas 6 % da população prisional. Os últimos dez anos assistiram, porém, a um aumento brusco do número de mulheres nas prisões, embora sem um aumento equivalente das condenações (17). A maior parte das mulheres é encarcerada por crimes não violentos e passa menos de um ano na prisão. Quase 25 % das presidiárias estão em prisão preventiva, sem terem sido condenadas por qualquer crime.

3.4.2

O mesmo estudo indica que uma elevada proporção das presidiárias não tinha qualquer segurança financeira antes do encarceramento, nunca tinha trabalhado ou tivera apenas empregos mal remunerados e precários, não tinha domicílio fixo, tinha um nível de formação muito baixo e fora vítima de maus tratos físicos ou sexuais por parte de familiares ou outros homens. Desta forma, a prisão das mulheres exclui ainda mais as que já sofriam de exclusão social.

3.4.3

O grande aumento do número de presidiárias pode dever-se ao tipo de sentenças nos países abrangidos pelo estudo, o qual sugere que as mulheres são frequentemente presas devido à exclusão social (por não terem domicílio fixo, por estarem desempregadas, por consumirem drogas); e ao facto de juizes e magistrados considerarem que essa exclusão social aumenta a probabilidade de essas mulheres virem no futuro a cometer crimes e que o encarceramento é susceptível, graças aos programas de reabilitação, de reduzir a probabilidade de as mulheres marginalizadas regressarem ao crime (ou às drogas) uma vez libertas.

3.4.4

A investigação comprova a impossibilidade de reabilitar e reintegrar as ex-presidiárias, dados os seus maus antecedentes profissionais e educativos, à elevada proporção de perturbações mentais entre elas (50 % em Inglaterra e Gales) (18) e ao facto de a maior parte delas cumprir penas demasiado curtas. Pode questionar-se se as prisões são instituições de reabilitação, mas mesmo se fosse esse o caso, o estudo demonstra que as prisões por si sós muito dificilmente poderiam dar à maior parte das presidiárias uma formação eficaz, uma reabilitação sustentável da toxicodependência, apoio emocional ou qualificações úteis após a libertação.

3.4.5

A principal função das prisões é punir os criminosos. O estudo demonstra que as prisões marginalizam as mulheres que não estavam marginalizadas antes da condenação e piora a situação das que já estavam marginalizadas. O encarceramento é ainda mais prejudicial no caso das mulheres devido aos traumas para as crianças. Por exemplo, no Reino Unido 25 % das presidiárias declararam que o pai das crianças, o seu marido ou o seu companheiro se encarregava das crianças. Já para os homens, esta proporção é de 92 %. Esta situação anula completamente quaisquer benefícios que possam ter sido obtidos sob a forma de justiça penal, dissuasão do crime ou diminuição dos riscos de criminalidade.

3.4.6

As estrangeiras e as mulheres de grupos minoritários são duplamente discriminadas, pelo que representam uma percentagem desproporcional das presidiárias.

3.4.7

O CESE faz sua a conclusão do relatório de que são urgentes medidas para reduzir drasticamente o número de presidiárias, especialmente dado que muitas estão detidas preventivamente e não foram condenadas por qualquer crime e muitas outras estão presas por crimes não violentos. Alguns Estados-Membros criaram alternativas menos nocivas ao encarceramento, e muitas criminosas com problemas graves, quando correctamente apoiadas, conseguem reabilitar-se e reintegrar-se nas suas comunidades.

3.5   O combate ao tráfico de mulheres e crianças

O tráfico de mulheres e crianças é uma consequência da desigualdade entre géneros estruturada e constitui uma forma de violência. Os traficantes servem-se da pobreza e as vítimas sofrem de múltiplas formas de pobreza que conduzem, nomeadamente, ao trabalho forçado, à escravatura sexual, aos problemas de saúde física e mental ou à exclusão social. As estratégias preventivas dos países de origem devem concretizar-se em estratégias que tenham em vista a redução da pobreza e o desenvolvimento social, com uma tónica especial nas oportunidades económicas para as mulheres. As estratégias de prevenção a longo prazo devem combater as principais causas do tráfico, isto é a pobreza, a discriminação, o racismo, as estruturas patriarcais, a violência específica contra as mulheres, os fundamentalismos, a desigualdade entre géneros, a ausência de redes de protecção social, o branqueamento de capitais, a corrupção, a instabilidade política, os conflitos e zonas fora de controlo, as barreiras e as disparidades entre países. Todos os governos devem prever medidas que partem do pressuposto de que há desigualdades nas relações de poder entre homens e mulheres e prever medidas positivas para promover a emancipação das mulheres em todas as áreas da vida.

4.   Recomendações

4.1

O CESE saúda o Relatório conjunto da Comissão e do Conselho sobre a inclusão social, de 5 de Março de 2004, e endossa as seis prioridades políticas nele recomendadas para inclusão nos Planos de Acção Nacionais dos Estados-Membros (ver Anexo). O CESE entende, porém, que há uma omissão flagrante no relatório, a saber, o facto de não ter sido recomendada a adopção e a monitorização de indicadores relativos aos géneros. O CESE apela enfaticamente à introdução destes indicadores, dado que há importantes diferenças entre homens e mulheres no que toca à pobreza e que muitas políticas de combate à pobreza só terão um êxito limitado se não atenderem a essas diferenças nem avaliarem o impacto das medidas sobre ambos os sexos. Reconhecer a perspectiva de género na problemática da pobreza contribuirá para o objectivo de erradicação da pobreza adoptado na Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social, realizada em Copenhaga em 1995, a qual concordou que deveria ser dada especial prioridade aos direitos e às necessidades de mulheres e crianças, que são muitas vezes as maiores vítimas da pobreza.

4.2

Muitos Estados-Membros têm tomado disposições para incluir as questões da pobreza e da integração social na formulação das suas políticas nacionais. Contudo, poderia ser feito mais ainda mediante o envolvimento dos parceiros sociais (incluindo ONG) a nível nacional, regional e local na formulação e na aplicação das políticas, sobretudo nos domínios da educação, do emprego e das pensões.

4.3

O CESE recomenda muito em particular que os objectivos da estratégia de Lisboa relativos a um maior índice de emprego feminino sejam acompanhados por estratégias de desenvolvimento da empregabilidade das mulheres em risco de pobreza, contribuindo para aumentar a sua independência financeira. Além disso, são necessárias mais iniciativas e mais medidas que garantam a subsistência das mulheres em todas as fases da sua vida e tenham por objectivo aumentar a qualidade dos empregos e colmatar a disparidade salarial. Neste mesmo contexto, o CESE manifestou num seu parecer sobre as orientações integradas para o crescimento e o emprego a sua surpresa perante a omissão no actual elenco de orientações para a política de emprego de qualquer orientação específica dedicada à situação de emprego das mulheres.

4.4

O Comité considera que o intercâmbio de experiências entre os Estados-Membros nos domínios que afectem as mulheres e a pobreza — regimes de pensões, protecção social, gravidez entre adolescentes, combate à violência contra as mulheres, o tráfico incluído, mulheres na prisão — pode ser particularmente útil.

4.5

Muitos Estados-Membros são signatários da Plataforma de Acção de Pequim (Setembro de 1995), que apelou a que os governos nacionais avaliassem a importância do trabalho não remunerado para a economia. No entanto, transcorridos dez anos os Estados-Membros ainda não criaram os sistemas de avaliação e acompanhamento necessários para esse efeito. Há que encorajá-los a fazê-lo e a registar os resultados nas suas estatísticas nacionais.

4.6

O Instituto Europeu da Igualdade entre os Géneros será inaugurado em 2007. Como a perspectiva de género tende a ser negligenciada nas políticas de combate à pobreza na UE, a relação entre género e pobreza tem sido relegada para segundo plano na investigação e nas estatísticas. Para alterar a situação, haverá que atribuir a este Instituto os meios orçamentais necessários. O CESE já exprimiu num seu parecer sobre o Instituto Europeu da Igualdade entre os Géneros a sua preocupação de que esta possibilidade não parece ser plenamente garantida pelo projecto de regulamento.

4.7

O CESE propõe, pois, alguns domínios prioritários para trabalhos futuros. O novo instituto deveria fazer uma análise aprofundada dos dados existentes numa perspectiva de género.

4.8

Um outro domínio que merece especial atenção é o das consequências da pobreza para a saúde física e mental das mulheres.

4.9

Em terceiro lugar, há relativamente poucos estudos sobre a forma como as mulheres reagem à pobreza e sobre se a sentem de forma diferente dos homens.

Bruxelas, 29 de Setembro de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu,

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Os indicadores do risco de pobreza baseiam-se no Estudo sobre os Agregados Familiares da União Europeia.

(2)  Relatório conjunto da Comissão e do Conselho sobre a inclusão social, 5 de Março de 2004.

(3)  «A revolução sexual», por Gary BECKER e Richard POSNER, 10 de Abril de 2005. Disponível em http://www.becker-posner-blog.com/archives/2005/04/index.html.

(4)  Eurostat 2001; à excepção dos agregados com um só indivíduo, as disparidades entre os géneros no que se refere ao risco de pobreza devem ser interpretadas com precaução, porque dependem da assunção de que os rendimentos de cada agregado são equitativamente partilhados entre os seus membros.

(5)  Eurostat 2004.

(6)  Eurostat 2003.

(7)  Eurostat 2003.

(8)  Finch et al.,(1999): New Deal for Lone Parents: Learning From the Prototype Areas. Relatório de investigação DSS n.o 92. Leeds: CDS; Lewis et al., (2000): Lone Parents and Personal Advisers: Roles and Relationships. Relatório de investigação DSS n.o 122. Leeds: CDS; Dawson et al., (2000): New Deal for Lone Parents: Report on Qualitative Interviews with Individuals. Relatório de investigação e desenvolvimento ESR55. Sheffield: Serviço de Emprego; Holtermann et al., (1999): Lone Parents and the Labour Market. Results from the 1997 Labour Force Survey and Review of Research. Relatório do Serviço de Emprego n.o 23. Londres: The Stationary Office.

(9)  Innocenti Report Card, n.o 3, Julho de 2001: «A League Table of Teenage Births in Rich Nations» (UNICEF).

(10)  Estudo do Eurostat sobre a população activa europeia, 2003.

(11)  Como os europeus empregam o seu tempo, Eurostat 1998-2002.

(12)  Estudo do Eurostat sobre a população activa europeia, 2003.

(13)  Parecer do CESE de 29 de Novembro de 2001 sobre «Crescimento económico, fiscalidade e sustentabilidade dos regimes de pensão na UE» (JO C 48, de 21 de Fevereiro de 2002). Relator: H. BYRNE; Co-relator: J. J. Van DIJK.

(14)  International Standard Classification of Education (Classificação Internacional do Nível de Educação) (N. do T.).

(15)  Estatísticas da CE – População e condições sociais, 4/2005.

(16)  Warren, T.:«Divergent Female Part-time Employment in Britain and Denmark and the Implications for Gender Equality», in Sociological Review, 2001, 49(4), 548-567.

(17)  Relatório comparativo baseado nas conclusões dos relatórios nacionais e elaborado por uma equipa da Universidade Central Europeia. Os dados provêm de seis Estados-Membros: Espanha, Alemanha, Reino Unido (apenas Inglaterra e País de Gales), Itália, França e Hungria.

(18)  Comissão Nacional das Mulheres do Reino Unido, Março de 2005.