25.11.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 294/14


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social»

(COM(2005) 33 final)

(2005/C 294/04)

Em 9 de Fevereiro de 2005, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, solicitar parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão relativa à Agenda Social».

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 21 de Junho de 2005 (relatora: U. ENGELEN-KEFER).

Na 419.a reunião plenária de 13 e 14 de Julho de 2005 (sessão de 13 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 60 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Introdução

1.1

São grandes as expectativas centradas na nova Agenda Social para o período de 2006 a 2010. No momento em que se faz a revisão intercalar da Estratégia de Lisboa, trata-se de trazer para o primeiro plano a importância da política social na realização dos objectivos de Lisboa. É imprescindível concretizar a pretensão da Estratégia de Lisboa de associar a melhoria da competitividade e o aumento do crescimento económico à criação de mais e melhores empregos e o reforço da coesão social. Para tanto, é necessária uma política europeia que vise, de igual forma, a consecução destes objectivos, assegurando, deste modo, o equilíbrio da Estratégia de Lisboa. As políticas económica, social, de emprego e ambiental devem interagir de forma equilibrada para assegurar a realização sustentável do modelo social europeu.

1.2

Na Cimeira de 22 e 23 de Março de 2005, o Conselho Europeu afirmou, relativamente ao relançamento da Estratégia de Lisboa, que deveria ser dada prioridade à promoção do crescimento e do emprego e salientou a importância da macropolítica para esse fim (1). Perante a persistência de uma conjuntura fraca e da elevada taxa de desemprego, esta definição dos eixos fundamentais afigura-se crucial e urgente. O Conselho adopta, pois, uma abordagem de mútuo reforço das políticas económica, social e de emprego, quando afirma: «Para atingir estes objectivos, a União deve mobilizar ainda mais todos os meios nacionais e comunitários adequados. nas três dimensões — económica, social e ambiental — da Estratégia, a fim de explorar melhor as sinergias num contexto geral de desenvolvimento sustentável (2).» Contudo, do ponto de vista do CESE, a orientação prioritária para o crescimento e o emprego não resulta automaticamente numa melhoria da situação social, ainda que um maior crescimento seja uma condição essencial para o combate ao desemprego e a melhoria da situação social. A política social deve, antes, ser encarada como um factor produtivo, com um impacto positivo sobre o crescimento e o emprego. A Agenda Social dá um contributo «para a concretização dos objectivos da Estratégia de Lisboa, através do reforço do modelo social europeu baseado na procura do pleno emprego e numa maior coesão social.» (3)

1.3

«O modelo social europeu assenta num bom desempenho económico, num alto nível de protecção social e de educação e no diálogo social.» (4) Baseia-se ainda nos valores fundamentais de democracia, liberdade e justiça social partilhados por todos os Estados-Membros. A adesão aos princípios de uma economia de mercado social e a estes valores fundamentais é consagrada, pela primeira vez ao nível da União, na futura Constituição Europeia, em especial na Carta dos Direitos Fundamentais da UE. Todos os Estados-Membros da União apresentam — assumindo embora, no pormenor, formas diferentes — características comuns de Estado social que, no seu conjunto, constituem o modelo social europeu. Estas características comuns incluem

sistemas de segurança social sustentáveis assentes no princípio da solidariedade, que asseguram protecção face aos grandes riscos da vida;

condições de trabalho regidas por legislação ou por acordos colectivos, para protecção dos trabalhadores e promoção do emprego;

direito de participação e de envolvimento dos trabalhadores e dos representantes dos seus interesses;

sistemas de relações laborais ou de diálogo social autónomo entre os parceiros sociais;

serviços de interesse geral, orientados para o bem comum.

Cabe à política social europeia preservar e desenvolver este modelo social europeu através de instrumentos eficazes. O contributo especial da política social consiste na Estratégia Europeia de Emprego, nas acções de coordenação para a integração social e a reforma dos sistemas de protecção social, bem como na aproximação das condições de trabalho e de vida, assegurando a sua melhoria através de normas mínimas no domínio social.

1.4

Para a realização dos objectivos de Lisboa, a política social tem de fortalecer a sua posição enquanto domínio de intervenção específico, ao nível europeu, através de uma política activa

de prevenção do desemprego e de reinserção de grupos de pessoas particularmente desfavorecidas;

de combate à pobreza e exclusão social, tendo em especial atenção os novos riscos de pobreza, (por exemplo, o fenómeno dos «working poor», trabalhadores que não ganham o suficiente);

de combate a todo o tipo de discriminações e de instauração da igualdade de oportunidades para as mulheres;

de aprofundamento do intercâmbio de experiências em matéria de estratégias de reforma da protecção social, com o objectivo de conciliar a manutenção da sua função social com a consolidação sustentável das suas bases de financiamento;

de aplicação de normas sociais mínimas de protecção dos trabalhadores e de defesa dos direitos de participação e de envolvimento destes e das entidades representantes dos seus interesses.

O CESE concorda expressamente com o novo procedimento adoptado pela Comissão Europeia, segundo o qual cada proposta legislativa deve ser avaliada em termos do impacto no crescimento e emprego e da sua compatibilidade com a Carta dos Direitos Fundamentais da UE.

1.5

Um contributo importante para a preparação da nova Agenda Social deve-se ao Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, que apresentou o seu relatório em Maio de 2004. Na opinião do CESE, os resultados e propostas deste Grupo deveriam ter maior presença na nova Agenda Social (5).

2.   A proposta da Comissão

2.1

Na sua comunicação, a Comissão sublinha que está plenamente empenhada na modernização e no desenvolvimento do modelo social europeu, bem como na promoção da coesão social, enquanto parte integrante da Estratégia de Lisboa. A Agenda Social identifica as prioridades pelas quais deverá pautar-se a acção da União Europeia. A execução destas deve ter por base os seguintes princípios:

interacção positiva das acções das políticas económica, social e de emprego;

promoção da qualidade do emprego, da política social e das relações laborais, para desenvolver o capital humano e social;

modernização dos sistemas de protecção social, adaptando-os em resposta às actuais exigências das sociedades, com base na solidariedade e reforçando o seu papel de factor produtivo;

consideração dos custos da ausência de política social (6).

2.2

Com base nestes princípios, é proposta uma abordagem estratégica que abrange dois elementos:

reforço da confiança dos cidadãos na mudança da sociedade, através de uma abordagem intergeracional, de parcerias para a mudança e de aproveitamento das oportunidades proporcionadas pela globalização;

identificação das prioridades com base nos objectivos estratégicos da Comissão Europeia para 2005-2009 nas seguintes áreas políticas: promoção do emprego e gestão da reestruturação, sociedade solidária e igualdade de oportunidades.

3.   Criar confiança — Condições para o sucesso

3.1

No contexto do reforço da confiança na mudança da sociedade são anunciadas três acções concretas:

Livro Verde sobre a evolução demográfica e contributo para a Iniciativa Europeia para a Juventude;

parceria para a mudança através da organização de um fórum anual para avaliação da execução da Agenda Social;

introdução do modelo social europeu nas relações laborais internacionais e expansão a nível mundial do conceito de ambiente de trabalho digno.

3.2

O CESE também considera necessário aumentar a confiança dos cidadãos na unidade europeia e no desenvolvimento social. Contudo, isso só se verificará se a política europeia produzir uma melhoria efectiva da situação social das pessoas. O CESE considera ainda necessário efectuar uma análise fundamentada das consequências sociais da evolução demográfica e congratula-se com a apresentação do anunciado Livro Verde (7), que permitirá um vasto debate europeu. No espírito de uma abordagem intergeracional, deve ser dada especial atenção às consequências para os jovens. A proposta da Comissão Europeia não esclarece, porém, que forma se pretende dar ao contributo para a Iniciativa Europeia para a Juventude e qual considera ser o seu papel. Os Governos da Alemanha, Espanha, França e Suécia apresentaram recentemente ao Conselho Europeu um documento conjunto sobre um Pacto Europeu para a Juventude, que inclui propostas de medidas nos domínios do emprego e da inclusão social, educação e formação profissional, mobilidade e intercâmbio de jovens e foi aprovado no Conselho Europeu da Primavera (8).

Esta proposta faz referência ao anunciado Livro Verde sobre a evolução demográfica. O CESE lamenta que a Comissão Europeia não a tenha tratado em pormenor na sua comunicação (9).

3.3

O CESE considera útil a criação de um fórum anual para avaliação da execução da Agenda Social e entende que esse fórum deve abordar as perspectivas do modelo social europeu, envolver todos os grupos relevantes da sociedade e ser planeado de modo a possibilitar a discussão entre os participantes.

3.4

O CESE apoia firmemente a intenção da Comissão Europeia de introduzir activamente as vantagens do modelo social europeu nas relações laborais internacionais e de defender a nível mundial condições de trabalho dignas em conformidade com as Normas da OIT. Neste caso, a União só terá credibilidade se salvaguardar e desenvolver as conquistas do modelo social europeu também em condições económicas diferentes e defender convincentemente que o progresso económico e o progresso social andam a par. Do mesmo modo, a Carta Social Europeia Revista e a Carta de Direitos Fundamentais da UE devem ser expressamente referidas.

4.   Emprego e qualidade do trabalho, gestão da reestruturação

4.1   Estratégia Europeia de Emprego

4.1.1

No que se refere à Estratégia Europeia de Emprego, a Comissão Europeia anuncia uma nova orientação para 2005, que deverá seguir as prioridades do relatório do grupo de missão Kok sobre o emprego, de 2003: reforço da adaptabilidade, melhor integração no mercado de trabalho, maior investimento no capital humano e controlo mais eficiente da execução, o qual deve ser associado aos principais elementos político-económicos. O CESE chama a atenção para o facto de o Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia ter apresentado propostas concretas para a definição das linhas principais das novas orientações para o emprego. Assim, estas devem concentrar-se numa integração melhor e mais precoce dos jovens no mercado de trabalho e na criação de pontes entre a formação e o emprego, bem como na integração das mulheres e dos trabalhadores mais idosos. A proposta do grupo de peritos defende ainda a promoção da qualidade do trabalho através de medidas no âmbito da organização e da saúde e segurança, o que também facilita a integração dos mais idosos. No domínio da aprendizagem ao longo da vida, o grupo apresenta diversas medidas que deverão igualmente ser integradas nas orientações para o emprego. Da mesma forma, o apoio e a gestão das consequências sociais da reestruturação devem ocupar, em especial nos novos Estados-Membros, um lugar de destaque nas orientações da UE sobre o emprego. Estas propostas só em parte são retomadas nas orientações integradas para o crescimento e emprego, entretanto apresentadas (10).

O CESE considera necessário que a nova orientação para as directrizes relativas ao emprego privilegie mais a qualidade do emprego, evitando assim a pobreza no trabalho.

4.1.2

O papel do Fundo Social Europeu (FSE) no apoio à Estratégia Europeia de Emprego é abordado apenas no contexto da melhoria dos mecanismos de controlo da execução, e é anunciada uma campanha de comunicação. O CESE critica o facto de a Comissão Europeia nunca referir a função do FSE enquanto instrumento relevante para o desenvolvimento dos recursos humanos através das acções de formação e reciclagem no âmbito do mercado de trabalho. Do ponto de vista do CESE, não fica claro este importante papel do FSE no apoio da aprendizagem ao longo da vida, muito embora a competência e qualificação sejam uma importante vantagem competitiva da União (11).

4.1.3

O CESE considera geralmente positivos os aspectos da Agenda Social que se referem ao acompanhamento da mudança estrutural económica, claramente inspiradas pelo Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social europeia. Estranho é que a Comissão Europeia não se debruce sobre as consequências sociais da reestruturação das empresas. Estão aqui em causa, claramente, conceitos de gestão das consequências sociais que possibilitam o equilíbrio justo entre os interesses económicos e os interesses dos trabalhadores. A Comissão Europeia apresenta, essencialmente, sugestões de processos e instrumentos — por exemplo, a criação de um fórum de alto nível reunindo todos os agentes e partes interessadas para acompanhar as reestruturações das empresas –, mas não especifica a composição desse fórum, nem os seus objectivos e temas. Tão-pouco se refere à importância dos direitos dos trabalhadores e da legislação social europeia na gestão das consequências sociais da reestruturação. O CESE entende, porém, que as directivas relativas aos despedimentos colectivos e à transferência de empresas, bem como as disposições relativas à informação e consulta dos trabalhadores e ainda a directiva relativa ao conselho de empresa europeu constituem instrumentos importantes para a gestão das consequências sociais da reestruturação com a participação dos trabalhadores e suas entidades representativas.

4.1.4

O CESE congratula-se com o início da segunda fase de consulta dos parceiros sociais sobre a questão das reestruturações e a revisão da directiva relativa aos conselhos de empresa europeus. É, no entanto, de opinião que, embora os conselhos de empresa europeus tenham um papel preponderante nas reestruturações, os dois temas devem ser tratados separadamente. Porém, e independentemente disso, a directiva relativa aos conselhos de empresa europeus já devia ter sido revista há muito tempo. O CESE já abordou esta questão e chegou à conclusão de que «este novo instrumento (…) contribuiu bastante para o desenvolvimento da dimensão europeia das relações sociais.» (12)

4.1.5

O CESE apoia a intenção de desenvolver uma sinergia reforçada entre as políticas e os respectivos instrumentos financeiros, em especial o FSE. No entanto, não fica claro o que a Comissão Europeia quer dizer com isto, concretamente. Pouco claro continua também o que a Comissão Europeia considera uma ligação mais intensa entre a Estratégia Europeia de Emprego e a evolução dos quadros regulamentares e dos acordos dos parceiros sociais.

4.2   Uma nova dinâmica para as relações laborais

4.2.1

A Comissão Europeia pretende imprimir uma nova dinâmica às relações laborais desenvolvendo a legislação social, fortalecendo o diálogo social e promovendo a responsabilidade social das empresas. Neste contexto, a Comissão tenciona apresentar um livro verde sobre a evolução do Direito do trabalho, onde procederá à análise das actuais tendências nos novos modelos laborais e do papel daquele Direito na criação de um ambiente mais seguro e na adaptação a novos desenvolvimentos. Segundo a Comissão, o debate lançado por este livro verde poderá levar à modernização e à simplificação das disposições actuais. O CESE considera muito útil a elaboração deste livro verde. Contudo, entende que é precoce antecipar, ainda que apenas com sugestões, as possíveis conclusões de um debate deste tipo. O CESE sustenta, em princípio, o ponto de vista de que na revisão da legislação laboral, na qual há que incluir os parceiros sociais, o Tratado deve ter uma função orientadora, devendo conduzir ao estabelecimento de normas mínimas para a harmonização e a melhoria das condições de vida e de trabalho (v. artigo 136.o TCE).

4.2.2

Além disso, a Comissão anuncia que, em 2005, irá propor uma iniciativa relativa à protecção dos dados pessoais dos trabalhadores, rever as directivas relativas à transferência de empresas e aos despedimentos colectivos e codificar as diversas disposições relativas à informação e consulta dos trabalhadores. O CESE faz notar que urge agora concretizar todas essas intenções. Em conformidade com o Tratado, a revisão destas directivas terá «por objectivos a promoção do emprego, a melhoria das condições de vida e de trabalho, de modo a permitir a sua harmonização …» (artigo 136.o do TCE).

Quanto à codificação das diversas disposições sobre informação e consulta dos trabalhadores, o CESE considera que o nível dos direitos de participação presente na directiva relativa à sociedade europeia deve ser a referência utilizada.

4.2.3

O CESE concorda com as propostas apresentadas pela Comissão no tocante à saúde e segurança no trabalho, em especial a ênfase dada ao conceito de prevenção nas iniciativas anunciadas. A proposta de nova estratégia em matéria de saúde e segurança no trabalho para o período 2007-2012 deverá analisar sobretudo os novos riscos para a saúde, incluir a protecção dos grupos de trabalhadores até agora não cobertos e abordar as formas de melhorar e apoiar a aplicação das disposições em vigor em matéria de saúde e segurança no trabalho, em especial nos novos Estados-Membros.

4.2.4

O CESE congratula-se igualmente com a intenção da Comissão de continuar a promover o diálogo social interprofissional, mas também sectorial, e apoia em particular a intenção de reforçar o apoio logístico e técnico aos parceiros sociais europeus. Na perspectiva do CESE, isto é particularmente necessário nos novos Estados-Membros, dado que as estruturas do diálogo social nesses países se encontram muitas vezes ainda pouco desenvolvidas ou em processo de criação. O diálogo social bilateral entre os parceiros sociais europeus é um elemento fundamental do modelo social europeu. A especificidade do diálogo social reside na legitimidade e representatividade desses parceiros e também na sua capacidade para celebrar acordos vinculativos a nível europeu, tal como foi salientado pelos parceiros sociais na declaração conjunta para o Conselho Europeu de Laeken (13). Igualmente importante é o diálogo com a sociedade civil, que se exprime, sobretudo, através da consulta do CESE na sua qualidade de fórum da sociedade civil organizada (14). Nos novos Estados-Membros o diálogo civil e o desenvolvimento de relações laborais estáveis entre os parceiros sociais carecem de apoio da Comissão Europeia.

4.2.5

A Comissão pretende continuar a promover iniciativas no âmbito da responsabilidade social das empresas, com o objectivo de fomentar o desenvolvimento de princípios de responsabilidade social das empresas. O CESE é da opinião que os vários bons exemplos de códigos de conduta e outras medidas voluntárias das empresas no sentido de assumirem responsabilidade social apresentados no fórum europeu das partes interessadas (stakeholders) constituem uma boa base, que deveria incluir também iniciativas de aprendizagem ao longo da vida., Apoia, por isso, os esforços da Comissão para tomar iniciativas que promovam o desenvolvimento e a transparência dos princípios da responsabilidade social das empresas a nível europeu.

4.3   Mercado de trabalho europeu

4.3.1

A Comissão tenciona levar a efeito diversas iniciativas com vista à supressão dos entraves que ainda subsistem à mobilidade transfronteiras e à construção de um verdadeiro mercado de trabalho europeu. Uma das iniciativas é a proposta de directiva relativa à portabilidade dos direitos de pensões profissionais. O CESE considera necessário que esta proposta seja apresentada muito em breve, uma vez que, em resultado de divergências quanto ao âmbito das disposições, as negociações dos parceiros sociais não lograram chegar a um acordo nesta matéria.

4.3.2

Outra proposta da Comissão refere-se à definição de um enquadramento opcional para a negociação colectiva transnacional a nível de empresa ou de sector. Na perspectiva da Comissão, esse enquadramento poderia regular, no plano transnacional, questões como a organização do trabalho, o emprego, as condições laborais e a formação, no contexto de uma parceria para a mudança. O carácter opcional significa que cabe aos parceiros sociais decidir se querem ou não utilizar esse quadro.

Como demonstra a prática dos conselhos de empresa europeus, estes não só têm exercido frequentemente o seu direito à informação e consulta, mas também estabelecem acordos voluntários com incidência em alguns dos temas abordados. Também ao nível sectorial se verificam exemplos semelhantes de acordos no quadro do diálogo social.

O CESE apoia o objectivo, manifestado nesta iniciativa, de promover o diálogo social a nível da empresa ou do sector, tendo em conta, mais do que até aqui, o facto de as empresas desenvolverem actividades transfronteiras, pelo que os acordos voluntários também têm de ter um alcance transnacional. O CESE recomenda à Comissão Europeia que examine, o mais rapidamente possível, com os parceiros sociais, esta proposta de legislação-quadro, recolha e tenha em consideração o seu parecer na matéria.

4.3.3

Como a Comissão afirma, a livre circulação de pessoas é uma das liberdades fundamentais na Europa. Em consequência, os instrumentos existentes, como a rede de serviços de emprego europeus e a coordenação dos regimes de segurança social dos trabalhadores migrantes, necessitam, na opinião do CESE, de ser constantemente melhorados. O CESE considera, pois, útil a proposta de estabelecer, ainda em 2005, um grupo de alto nível para avaliar o impacto do alargamento na mobilidade, bem como o funcionamento dos períodos transitórios acordados no quadro do último alargamento, com apresentação de um relatório sobre a matéria em 2006. O CESE chama a atenção para o facto de os parceiros sociais e as organizações não governamentais possuírem uma vasta experiência neste domínio. Por esse motivo, solicita à Comissão que considere incluir representantes dos parceiros sociais e das organizações não governamentais na composição dos grupos de peritos.

5.   Uma sociedade solidária: igualdade de oportunidades para todos

5.1

Neste segundo eixo de acção, a Comissão trata do aprofundamento do intercâmbio de experiências através da reforma dos regimes de protecção social, das políticas de combate à pobreza, à exclusão social e à discriminação, bem como do papel dos serviços sociais.

5.2

A Comissão renova a sua proposta de racionalização e simplificação da coordenação nos domínios da inclusão social, pensões e saúde. O CESE já se debruçou sobre esta questão num parecer anterior (15). Chama a atenção para o facto de, na sua perspectiva, a aplicação do método aberto de coordenação dever ter em conta as particularidades de cada domínio. Em particular a aplicação, já muito desenvolvida, do método aberto de coordenação no domínio da inclusão social deveria, na sua opinião, ser complementada com planos de acção nacionais e relatórios bianuais. Isto é tanto mais importante quanto, apesar dos esforços conjuntos, não se conseguiu reduzir significativamente a dimensão da pobreza. A pobreza atinge cerca de 15 % da população total da União, percentagem essa que em muitos países excede os 20 %. Uma das principais razões para esta situação é a elevada taxa de desemprego, que afecta especialmente as famílias muito numerosas e as famílias monoparentais (16). Nem mesmo o emprego protege da pobreza, como mostra o número crescente de «working poor» (17). Por isso, são necessários mais esforços para lutar contra a pobreza e a exclusão social.

5.3

Neste contexto, a Comissão pretende prosseguir o debate sobre os sistemas nacionais de rendimento mínimo e, em 2005, iniciar uma consulta sobre esta matéria. O CESE pergunta onde se realizou este debate e quem participou nele. Na opinião do CESE, compete aos Estados-Membros assegurar apoio social aos cidadãos em estado de pobreza, sob a forma de um regime de rendimento mínimo que permita uma vida condigna. Do exposto pela Comissão não resulta claro com que objectivo deve ser realizado este debate, a nível europeu, sobre o rendimento mínimo nacional. O CESE levanta igualmente a questão da possibilidade de antecipar o Ano Europeu de Combate à Pobreza e à Exclusão Social, dada a urgência do problema, para uma data anterior a 2010.

5.4

O CESE apoia as políticas da Comissão no domínio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres e da luta contra a discriminação em geral. A Comissão anuncia para 2005 uma nova comunicação em que apresentará a sua abordagem política neste domínio e se debruçará sobre a questão de novas iniciativas susceptíveis de completar o quadro jurídico vigente.

O CESE chama a atenção para o facto de as directivas relativas à não discriminação já terem sido transpostas, ou estarem em vias de o ser, para o direito nacional em muitos Estados-Membros. Assim, é da opinião que seria conveniente apresentar um relatório sobre a situação da transposição destas directivas e, com base nele, propor outras medidas políticas.

As medidas anunciadas no domínio da igualdade entre mulheres e homens, especialmente a criação de um Instituto Europeu do Género e as novas edições do seu plano de acção no domínio da igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência recebem o apoio do CESE.

5.5

A Comissão tenciona ainda apresentar em 2005 uma comunicação sobre a importância dos serviços sociais. O CESE acolhe favoravelmente este propósito, em especial porque espera que a referida comunicação tenha repercussões no debate controverso sobre a directiva relativa aos serviços no mercado interno e contribua para o esclarecimento. No seu Livro Branco sobre serviços de interesse geral, a Comissão já salientou as particularidades dos serviços sociais, que consistem, sobretudo, na missão de serviço público e no relacionamento pessoal. Os serviços sociais, sejam eles privados ou públicos, distinguem-se fundamentalmente dos outros serviços do mercado interno pelo facto de assentarem no princípio da solidariedade, serem adaptados às necessidades individuais e contribuírem a coesão social de uma sociedade ao asseguraram o direito fundamental à protecção social. Por esta razão, o CESE defende que os serviços sociais, em especial os serviços de saúde, não devem fundamentalmente ser tratados como meros serviços de mercado.

5.6.

O CESE lamenta que a Comissão não se debruce sobre a importância dos serviços sociais de interesse geral para o emprego e a inserção social. O CESE já abordou esta questão num parecer anterior sobre a revisão intercalar da Agenda Social: «O contributo dos serviços sociais sem fim lucrativo, em termos de emprego e incidência social, é alvo de crescente reconhecimento e valorização, com excelentes resultados em matéria de protecção dos direitos das pessoas desfavorecidas, no atinente às necessidades de educação, assistência social e sanitária, bem assim às políticas de apoio à inclusão e de redução das desigualdades sociais. […] As organizações sem fim lucrativo contribuem para identificar e articular a procura de serviços sociais, sobretudo nos grupos mais desfavorecidos da população; investem para reparar o tecido social danificado e que requer uma regeneração de laços positivos; fomentam a solidariedade civil e a participação social, que são condições necessárias para a vida democrática, mesmo nas zonas mais deprimidas.» (18).

6.   Conclusões

6.1

O CESE congratula-se com a comunicação da Comissão relativa à Agenda Social, vendo nela um contributo para realçar a importância da política social na realização dos objectivos de Lisboa. Contudo, apesar da sua abordagem estratégica, em sua opinião, ela não corresponde, em todos os seus aspectos, às expectativas especiais relacionadas com a revisão intercalar da Estratégia de Lisboa. Muito embora na Agenda Social precedente a Comissão ainda tenha sido motivada pelo papel da política social enquanto factor produtivo, o mesmo já não se verifica expressamente na nova proposta. O CESE entende, pelo contrário, que a política social não deve estar subordinada à política económica, mas que ambas são igualmente importantes. A promoção da coesão social e a criação de um Estado de bem-estar activo integram os objectivos da Estratégia de Lisboa aprovada na Cimeira Europeia de Março de 2000, tal como a melhoria da competitividade e do crescimento económico sustentável. Um dos elementos centrais do modelo social europeu é um elevado nível de protecção social, o que contribui de forma decisiva para a coesão social.

6.2

Contrariamente à opinião, muitas vezes defendida, segundo a qual uma despesa social elevada é contrária aos objectivos económicos, os dados empíricos de vários países europeus revelam o inverso. Isto mesmo foi salientado pelo Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social europeia no seu relatório. Segundo um estudo do Centro de Política Europeia, de 2004, a Suécia, a Dinamarca, a Áustria, o Luxemburgo e os Países Baixos acusam não só um rendimento económico relativamente elevado mas também um elevado nível de protecção social. E os países que, no ranking internacional de competitividade do Fórum Económico Mundial, ocupam posições de destaque, apresentam investimentos elevados na política social e nos sistemas de protecção social, demonstrando ao mesmo tempo níveis elevados de emprego e níveis reduzidos de pobreza após as transferências sociais (19).

6.3

O CESE lamenta que a nova Agenda Social contenha menos medidas concretas do que as suas predecessoras, o que torna difícil a apreciação, pois nem sempre se consegue identificar em que direcção política apontam as propostas. Isto aplica-se especialmente à legislação social, domínio em que a Comissão se limita à revisão das directivas em vigor, praticamente não apresentando propostas novas. O CESE espera, pois, que o quadro estratégico seja acompanhado de medidas concretas. Entende que a nova Agenda Social deve ser articulada com um programa de acção para os próximos cinco anos. A orientação a seguir deve ser a dos direitos sociais fundamentais consagrados na futura Constituição Europeia. Com esta base, o programa de acção social deverá incluir propostas para a revisão das directivas existentes, bem como propostas de novas directivas, abrangendo ao mesmo tempo os debates e medidas de coordenação já previstos para o desenvolvimento da política social europeia. Do ponto de vista do CESE, o importante, no quadro da revisão intercalar da Estratégia de Lisboa, é dar visibilidade à política social europeia e ao seu papel produtivo na promoção do crescimento e do emprego.

6.4

Neste contexto, o Comité gostaria de focar igualmente a questão do financiamento da política social: se bem que, logo por ocasião da apresentação das perspectivas financeiras, a Comissão tenha chamado a atenção para o facto de que a estrutura e a dotação do futuro orçamento da UE deveriam reflectir e promover a Estratégia de Lisboa, é de recear que a proposta não corresponda a esta aspiração.

6.5

É certo que se verifica um aumento da dotação da correspondente subrubrica das perspectivas financeiras «Competitividade para o Crescimento e o Emprego» (20). Todavia, esse aumento diz sobretudo respeito a medidas relativas à competitividade e a iniciativas para promover o espírito empresarial. A comparação com as actuais despesas nos domínios social e do emprego mostra que, ao invés, não está previsto qualquer aumento real no que se refere à futura política social. Neste âmbito, a Comissão propõe, em substância, um orçamento inalterado.

6.6

A este propósito, o Comité já salientou claramente, em particular no seu parecer sobre o programa-quadro PROGRESS (21), que não compreende o objectivo de «neutralidade orçamental», sobretudo à luz da decepcionante revisão intercalar da Estratégia de Lisboa. O CESE insta, pois, a que os recursos previstos para a política social sejam objecto de um aumento análogo ao dos recursos destinados às demais medidas constantes da rubrica «Crescimento e Emprego.».

Bruxelas, 13 de Julho de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  «A fim de apoiar os esforços no sentido do crescimento e do emprego, é essencial dispor de condições macroeconómicas sólidas.» (Conclusões da Presidência, p. 2).

(2)  Idem, p. 2.

(3)  Conclusões da Presidência, p. 9.

(4)  Conclusões da Presidência – Conselho Europeu de Barcelona de 15 e 16 de Março de 2002.

(5)  Relatório do Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, de Maio de 2004.

(6)  COM(2005) 33 final, de 9 de Fevereiro de 2005, p. 2.

(7)  COM(2005) 94 final, de 16 de Março de 2005.

(8)  Conclusões da Presidência – Conselho Europeu de Bruxelas de 22 e 23 de Março de 2005.

(9)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que adopta o programa “Juventude em Acção” para o período de 2007–2013» (CESE 253/2005, de 10 de Março de 2005 – relator J. I. RODRÍGUEZ GARCÍA-CARO).

(10)  COM(2005) 141 final, de 12 de Abril de 2005.

(11)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao Fundo Social Europeu» (CESE 250/2005, de 9 de Março de 2005 – relatora U. ENGELEN-KEFER).

(12)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A aplicação concreta da directiva relativa aos conselhos de empresa europeus (94/45/CE) e aos aspectos que eventualmente necessitem de revisão» (JO C 10 de 14 de Janeiro de 2004 – relator J. PIETTE).

(13)  Contribuição comum da CES/UNICE/CEEP de 7 de Dezembro de 2001.

(14)  Parecer do CESE sobre «Governança Europeia — Um Livro Branco» (JO C 125, de 27 de Fevereiro de 2002, p. 61 – relatora U. ENGELEN-KEFER, co-relatora I. Pari).

(15)  Parecer do CESE sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, Parlamento Europeu, Comité Económico e Social Europeu e Comité das Regiões «Reforçar a dimensão social da Estratégia de Lisboa: racionalizar a coordenação aberta no domínio da protecção social» (JO C 32 de 5 de Fevereiro de 2004 – W. BEIRNAERT).

(16)  Relatório Conjunto sobre a Inclusão Social de 2004, Maio de 2004.

(17)  Relatório do Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, Maio de 2004.

(18)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Revisão Intercalar da Agenda de Política Social», (JO C 80, de 30 de Março de 2004 – relator L. Jahier) (pontos 3.3.6 e 3.3.7).

(19)  Relatório do Grupo de Alto Nível sobre o futuro da política social na União Europeia alargada, Maio de 2004, p. 61.

(20)  COM(2004) 101 final/2 de 26/2/2004.

(21)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um programa comunitário para o emprego e a solidariedade social (PROGRESS)» – COM(2004) 488 final, de 6 de Abril de 2005, CESE 386/2005.