52002XC1231(01)

Projecto de comunicação da Comissão relativa à apreciação das concentrações horizontais nos termos do regulamento do Conselho relativo ao controlo das concentrações de empresas (Texto relevante para efeitos do EEE)

Jornal Oficial nº C 331 de 31/12/2002 p. 0018 - 0031


Projecto de comunicação da Comissão

relativa à apreciação das concentrações horizontais nos termos do regulamento do Conselho relativo ao controlo das concentrações de empresas

(2002/C 331/03)

(Texto relevante para efeitos do EEE)

I. INTRODUÇÃO

1. O artigo 2.o do Regulamento (CEE) n.o 4064/89 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas(1) (seguidamente designado "regulamento das concentrações") estabelece que a Comissão deve apreciar as concentrações abrangidas pelo âmbito de aplicação do regulamento das concentrações com vista a estabelecer se são ou não compatíveis com o mercado comum.

2. A presente comunicação tem por objectivo fornecer orientações sobre a forma como a Comissão realiza a apreciação das concentrações, quando as empresas em causa são vendedores activos no mesmo mercado relevante ou concorrentes potenciais nesse mercado. No presente texto, tais concentrações serão designadas "concentrações horizontais"(2). As orientações apresentadas na presente comunicação centrar-se-ão sobre o efeito que a supressão de um concorrente efectivo ou potencial pode ter sobre a concorrência no mercado relevante(3).

3. As orientações estabelecidas na presente comunicação reflectem e precisam a evolução da experiência obtida pela Comissão na apreciação das concentrações horizontais nos termos do regulamento das concentrações, desde a sua entrada em vigor em 21 de Setembro de 1990, bem como a jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias. Os conceitos incluídos na presente comunicação serão aplicados, desenvolvidos e aperfeiçoados pela Comissão nos processos individuais.

4. A apreciação das "concentrações horizontais" por parte da Comissão não prejudica a interpretação que possa ser dada pelo Tribunal de Justiça ou pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias.

II. ANÁLISE GERAL

5. O artigo 2.o do regulamento das concentrações estabelece que uma concentração deve ser declarada incompatível com o mercado comum no caso, e apenas no caso, de criar ou reforçar uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste.

6. A apreciação, por parte da Comissão, das concentrações notificadas nos termos do regulamento das concentrações contém, no essencial, duas partes principais inter-relacionadas:

i) definição dos mercados do produto e geográfico relevantes,

ii) apreciação da concentração em termos de concorrência.

O principal objectivo da definição de mercado consiste em identificar de forma sistemática as limitações concorrenciais que enfrentam as partes na concentração. O objectivo da definição de um mercado, tanto na sua dimensão relativa ao produto como na sua dimensão geográfica, consiste em identificar os concorrentes efectivos das empresas envolvidas capazes de restringirem o seu comportamento e de as impedirem de se comportarem de forma independente face a uma pressão concorrencial efectiva. As orientações relativas a esta questão constam da comunicação da Comissão relativa à definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência(4). Muitas das considerações que levam à delimitação dos mercados relevantes podem também revelar-se importantes para a apreciação da concentração em termos de concorrência.

7. A presente comunicação articula-se em torno dos seguintes elementos:

a) A probabilidade de a concentração ter efeitos anticoncorrenciais nos mercados relevantes, na ausência de factores de compensação;

b) A probabilidade de o poder de comprador actuar como uma força de compensação face a um aumento do poder económico resultante da concentração;

c) A probabilidade de a entrada de novas empresas preservar a concorrência efectiva nos mercados relevantes;

d) A probabilidade de ganhos de eficiência proporcionados pela concentração;

e) Condições de aplicação do conceito de empresa insolvente.

8. Tendo em conta estes elementos, a Comissão determinará se uma concentração cria ou reforça uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste. Contudo, nem todos os elementos são relevantes para todas as concentrações horizontais. Em especial, os ganhos de eficiência e o conceito de empresa insolvente são normalmente apenas analisados se as partes notificantes estabelecerem que estão preenchidas as condições necessárias para que tais alegações sejam relevantes (confrontar secções VI e VII da presente comunicação). Por outro lado, poderá não ser necessário analisar todos os elementos com o mesmo grau de pormenor. Por exemplo, o facto de determinar que a entrada será fácil, realizada em tempo útil e efectiva poderá revelar-se suficiente para concluir que não surgirão quaisquer problemas de concorrência, sem ser necessária uma análise circunstanciada de outros factores.

III. POSSÍVEIS EFEITOS ANTICONCORRENCIAIS DAS CONCENTRAÇÕES HORIZONTAIS

9. A concorrência efectiva traduz-se em benefícios para os consumidores, tais como preços baixos, produtos de melhor qualidade, uma ampla selecção de bens e serviços e inovação tecnológica. Através do controlo das concentrações, a Comissão impede as concentrações que privam os consumidores destes benefícios, mas autoriza as que contribuem para os promover, assegurando a manutenção de uma concorrência efectiva.

10. Ao apreciar os efeitos de uma concentração sobre a concorrência, a Comissão compara as condições da concorrência após a concentração com as condições que se verificariam se a concentração não fosse realizada. Na maior parte dos casos, as condições de concorrência existentes constituem o elemento de comparação mais relevante para apreciar os efeitos de uma concentração. Contudo, a Comissão tomará, por exemplo, em consideração a probabilidade de entrada ou saída de empresas ao determinar aquilo que constitui uma comparação relevante(5).

11. As concentrações horizontais podem restringir significativamente a concorrência efectiva de três formas principais, na sequência da criação ou reforço de uma posição dominante:

a) Uma concentração pode criar ou reforçar uma posição de supremacia no mercado. Uma empresa nesta posição poderá normalmente aumentar os preços(6), sem ser restringida por acções dos seus clientes e dos seus concorrentes efectivos ou potenciais;

b) Uma concentração pode diminuir o nível da concorrência num mercado oligopolístico ao eliminar pressões concorrenciais importantes sobre um ou mais vendedores que, consequentemente, poderão aumentar os seus preços;

c) Uma concentração pode alterar a natureza da concorrência num mercado oligopolístico de tal forma que os vendedores, que anteriormente não coordenavam o seu comportamento, podem doravante fazê-lo e, por conseguinte, aumentar os preços. Uma concentração poderá também facilitar a coordenação dos vendedores que já coordenavam o seu comportamento antes da concentração.

12. A Comissão apreciará se as alterações provocadas pela concentração terão alguns destes efeitos. Em mercados oligopolísticos(7), uma concentração poderá impedir a concorrência de duas formas, b) e c). Ambas poderão ser relevantes ao apreciar uma operação específica. Em ambos os cenários, os consumidores serão prejudicados devido ao aumento dos preços.

Características e concentração do mercado

13. Ao considerar os eventuais efeitos anticoncorrenciais de uma concentração, devem ser tomados em conta diversos factos de base acerca dos mercados. Trata-se, por exemplo, de elementos como as quotas de mercado, os níveis de concentração e a importância da inovação.

14. As quotas de mercado fornecem muitas vezes uma primeira indicação útil da importância concorrencial tanto das partes na concentração como dos seus concorrentes(8). Contudo, as quotas de mercado num determinado momento podem ser menos importantes se existem indícios de que as condições da concorrência são susceptíveis de mudar num futuro próximo, por exemplo à luz da probabilidade de uma saída, entrada ou expansão. Tal poderá acontecer se for provável que as empresas objecto da concentração sofram uma diminuição da procura por parte dos clientes que seguem uma estratégia de fontes de abastecimento múltiplas. Nos mercados sujeitos à realização de concursos, as quotas de mercado podem não fornecer informações sobre o efeito provável de uma concentração em termos de concorrência(9). Nestes casos, é preferível obter informações directas acerca do papel dos intervenientes no mercado nos processos de concurso, por exemplo através de uma análise dos concursos ganhos e perdidos(10). Quanto mais precisas forem as informações acerca das preferências dos clientes, menos peso deverá ser dado às quotas de mercado enquanto indicadores dos eventuais efeitos de uma determinada concentração sobre a concorrência.

15. As alterações nas quotas de mercado tradicionais fornecem frequentemente informações úteis acerca do processo concorrencial e da eventual importância futura dos diversos concorrentes, por exemplo, indicando quais as empresas que têm vindo a conquistar ou a perder quotas de mercado.

16. A concentração global do mercado fornece igualmente informações úteis acerca da situação concorrencial no mesmo. A Comissão aplicará o índice Herfindahl-Hirschman ("HHI") enquanto primeiro indicador da pressão concorrencial existente no mercado após a concentração. O HHI é calculado adicionando os quadrados das quotas de mercado individuais de todos os participantes no mercado(11). O HHI dá, proporcionalmente, maior peso às quotas de mercado das maiores empresas, em conformidade com a sua importância relativa no processo concorrencial. É improvável que a Comissão investigue casos em que o HHI agregado após a concentração continue a ser inferior a [1000](12).

17. Uma parte importante da análise em termos de concorrência consiste em estabelecer os principais parâmetros da concorrência no mercado específico. Normalmente, estabelece uma distinção entre dois grandes tipos de concorrência. Em primeiro lugar, a concorrência principalmente a nível da produção ou da capacidade ocorre, na prática, nas situações em que as empresas escolhem qual a sua produção ou capacidade e subsequentemente, atendendo ao nível da procura, ajustam os preços para venderem essa produção. Por exemplo, nalguns sectores de produtos de base, os níveis de preços são determinados pelo nível global de produção no mercado. Em segundo lugar, a concorrência principalmente a nível dos preços ocorre quando as empresas estabelecem preços e ajustam o seu nível de produção em função da procura.

18. Contudo, nalguns mercados a inovação constitui a principal força concorrencial. Nestes casos, a Comissão examina de que forma a concentração afectará a pressão concorrencial para inovar no mercado.

Empresa com uma posição de supremacia no mercado

19. Algumas concentrações projectadas poderiam, caso fossem autorizadas, colocar uma empresa numa posição de supremacia no mercado. Tal aconteceria se, na sequência da concentração, a empresa dela resultante(13) não fosse restringida de forma significativa pelas acções de concorrentes efectivos no mercado relevante. Uma posição de supremacia no mercado é determinada por referência a vários critérios diferentes.

20. Segundo a jurisprudência constante, grandes quotas de mercado - superiores a 50 % - podem por si só, excepto em circunstâncias excepcionais, indiciar a existência de uma posição de mercado dominante(14), em especial quando os outros concorrentes no mercado detêm quotas de mercado muito inferiores. Com efeito, as empresas de menor dimensão podem não exercer uma influência restritiva se, por exemplo, não tiverem incentivos nem possibilidades de aumentar a sua produção ou não tiverem uma presença global suficiente no mercado. Uma empresa cujas quotas de mercado sejam inferiores a 50 % após a concentração, poderá também deter uma posição de supremacia no mercado tendo em conta outros factores, tais como a força e o número dos concorrentes(15).

21. Podem também ser tomados em consideração diversos factores para determinar qual o poder económico da entidade resultante da concentração:

- economias de escala e de gama: sempre que a produção ou distribuição em grande escala proporcionar à empresa em posição de supremacia uma vantagem estratégica relativamente aos concorrentes de menor dimensão(16),

- acesso privilegiado aos fornecimentos: a empresa em posição de supremacia poderá estar integrada verticalmente ou ter um controlo suficiente sobre o fornecimento de produtos a montante(17), de tal forma que a expansão de pequenas empresas rivais será difícil ou onerosa,

- uma rede de distribuição e de venda extremamente desenvolvida: a empresa em posição de supremacia poderá possuir a sua própria rede densa de estabelecimentos(18), uma logística de distribuição estabelecida(19) ou uma ampla cobertura geográfica(20), que os rivais teriam dificuldade em reproduzir,

- acesso a instalações importantes ou a tecnologias de ponta que podem proporcionar às empresas resultantes da concentração uma vantagem estratégica relativamente aos seus concorrentes(21),

- acesso privilegiado a factores específicos, tais como capital físico ou financeiro. Na grande maioria dos casos, o poder financeiro não constitui normalmente um elemento a considerar. Contudo, nalguns casos, poderá ser um dos factores que contribui para que uma concentração dê lugar a preocupações em matéria de concorrência(22), em especial nos casos em que: i) o aspecto financeiro é relevante para o sector em causa, ii) existem assimetrias significativas entre concorrentes em termos das suas capacidades financeiras internas, e iii) o sector apresenta características específicas que dificultam para as empresas a obtenção de financiamento externo,

- outras vantagens estratégicas, tal como a propriedade das marcas mais importantes(23), uma reputação bem consagrada, ou um conhecimento aprofundado das preferências específicas do cliente.

22. Alguns dos factores acima enumerados poderão beneficiar os clientes da empresa com uma posição de supremacia (ver secção VI). Contudo, poderão tornar mais difícil que os concorrentes, quer individualmente quer em conjunto, restrinjam efectiva e suficientemente o comportamento da empresa em posição de supremacia. Por exemplo, poderão dificultar a expansão de empresas mais pequenas ou a entrada de novos concorrentes. Desta forma, a Comissão apreciará se as empresas objecto da concentração continuarão a enfrentar uma concorrência residual suficiente, que elimine o seu interesse em aumentar os preços ou diminuir a produção.

23. Uma concentração pode quer criar uma empresa com uma posição de supremacia, quer reforçar ainda mais a sua posição, eliminando algumas das limitações concorrenciais remanescentes. Por forma a determinar os efeitos específicos de uma concentração sobre a concorrência, será nomeadamente adequado considerar as restrições concorrenciais que as empresas objecto da concentração exercem entre si antes da concentração e determinar se a eliminação dessas restrições permitirá que a empresa resultante da concentração aumente significativamente os preços. Desta forma, a eliminação da rivalidade intermarcas(24) ou de uma forma mais geral, o facto de a rivalidade entre as partes ter sido a principal fonte de concorrência no mercado(25), poderá constituir um importante factor de análise. O facto de uma das partes na concentração, embora de pequena dimensão, desempenhar uma função importante em termos de concorrência, poderá também ser relevante, em especial quando o mercado apresenta já um certo grau de concentração(26). Esta análise será semelhante à descrita mais circunstanciadamente na secção que se segue relativa aos oligopólios não colusórios.

24. Ao decidir se uma concentração cria ou reforça uma posição dominante tal que a concorrência efectiva é susceptível de ser significativamente entravada, a Comissão tomará igualmente em consideração se a análise das barreiras à entrada, do poder de comprador ou dos ganhos de eficiência (ver secções IV a VI) aponta para uma conclusão negativa.

Oligopólios não colusórios

25. Muitos mercados oligopolísticos apresentam um nível saudável de concorrência. Contudo, em certas circunstâncias, as concentrações podem diminuir o nível de concorrência, suprimindo importantes pressões concorrenciais exercidas sobre um ou mais vendedores que, consequentemente, consideram rentável aumentar os preços ou reduzir a produção após a concentração. O efeito mais directo será a eliminação da pressão concorrencial que as empresas objecto da concentração exerciam mutuamente. Antes da concentração, as partes na concentração poderão ter exercido uma pressão concorrencial entre si. Se uma delas aumentasse os preços ou reduzisse a produção perderia clientes a favor da outra parte, o que tornaria a iniciativa não rentável. A concentração suprimiria, assim, esta pressão específica(27). As empresas que não participam na concentração podem também beneficiar da redução da pressão concorrencial que resulta da concentração, uma vez que o aumento de preços ou a redução da produção das partes na concentração poderá provocar a transferência de uma parte da procura para as empresas rivais que, por seu turno, poderão considerar ser o momento ideal para aumentar os preços. A eliminação destas pressões concorrenciais poderá provocar significativos aumentos de preços ou reduções da produção no mercado relevante.

Limiares de quota de mercado e de concentração

26. Ao avaliar as concentrações horizontais em oligopólios não colusórios, a Comissão considerará diversos níveis de concentração. Um elevado nível de concentração poderá indicar a ausência de pressão concorrencial no mercado. A Comissão irá utilizar critérios de avaliação diferentes, em função de os produtos serem relativamente homogéneos(28) ou diferenciados(29).

27. No contexto de produtos relativamente homogéneos, o índice HHI fornece um indicador particularmente adequado da situação concorrencial no mercado. Uma concentração poderá suscitar sérias dúvidas, na acepção do n.o 1, alínea c), do artigo 6.o do regulamento das concentrações se conduzir a um HHI agregado de [2000] ou mais, e a um aumento do HHI de [150] ou mais(30).

28. Num mercado de produtos diferenciados, a pressão concorrencial é determinada pelo grau de substituibilidade entre os diversos produtos. Quando estão disponíveis dados, o grau de substituibilidade pode ser avaliado através de inquéritos de preferência dos clientes, da análise dos padrões de compra, da estimativa das elasticidades cruzadas de preços dos produtos envolvidos(31), ou dos rácios de transferência(32).

29. Embora as quotas de mercado forneçam uma indicação imperfeita da intensidade da concorrência num mercado de produtos diferenciados, poderão de qualquer forma proporcionar informações sobre a possível pressão concorrencial nesse mercado. Será pouco provável que as concentrações que conduzem a uma quota de mercado conjunta limitada resultem num nível de poder económico que seja susceptível de restringir a concorrência efectiva de forma significativa. É o que se passa quando a quota de mercado das empresas em causa não excede 25 %, quer no mercado comum, quer numa parte substancial deste, desde que os produtos dos concorrentes remanescentes sejam substitutos suficientemente próximos.

Mercados em que as empresas concorrem principalmente a nível da produção/capacidade

30. Nos mercados em que os níveis de produção ou capacidade constituem as decisões estratégicas mais importantes tomadas pelos oligopolistas, a principal preocupação das empresas é a forma como as suas decisões em matéria de produção ou capacidade influenciam os preços no mercado. Quando os produtos são relativamente homogéneos, as empresas objecto da concentração poderão ter um incentivo para reduzir a produção ou a capacidade abaixo dos níveis conjuntos realizados antes da concentração, aumentando assim os preços no mercado. Antes da concentração, o aumento dos preços no mercado resultante da limitação da produção efectuada por uma das partes na concentração, apenas beneficia esta parte específica através de margens de vendas mais elevadas. Após a concentração, verificar-se-ão estas margens mais elevadas igualmente nas vendas efectuadas pela outra parte na concentração. Contudo, o aumento dos preços após a concentração dependerá da possibilidade e do incentivo das empresas rivais para aumentarem a produção

31. Quando empresas rivais dispõem de capacidade suficiente, os compradores podem facilmente encontrar fontes alternativas de fornecimento, desde que continue a ser rentável para as empresas concorrentes expandir a produção. Neste caso, o aumento dos preços após a concentração pode ser limitado, e a Comissão pode considerar que não existem razões de preocupação. Contudo, poderá acontecer que os concorrentes não tenham condições ou não desejem expandir suficientemente a produção por forma a compensar a redução de produção das partes na concentração. Esta expansão da produção é, em especial, pouco provável quando os concorrentes enfrentam limitações de capacidade incontornáveis ou se os custos necessários para activar a capacidade excedentária forem significativamente superiores aos relativos à capacidade utilizada(33).

32. Também nos mercados em que as empresas oferecem produtos diferenciados, as opções em matéria de produção e de capacidade poderão determinar os preços. Embora o preço específico de cada produto possa variar em função das suas características, o nível global de preços neste tipo de mercado está estreitamente relacionado com as decisões das empresas em matéria de produção e com o nível global da procura. Neste contexto, uma redução da produção dos produtos de uma das empresas partes na concentração é susceptível de conduzir a um aumento da procura junto de produtores concorrentes. O incentivo para que as empresas partes na concentração reduzam a produção será tanto mais forte quanto maior for o grau de substituibilidade entre os produtos da entidade resultante da concentração. As reacções das empresas rivais são menos significativas quando enfrentam limitações de capacidade e quando os seus produtos não são bons substitutos dos produtos das empresas na concentração.

33. Para determinar o impacto da concentração, a Comissão analisará a possibilidade e o incentivo para que as empresas na concentração reduzam a produção, tal como acima descrito. A Comissão analisará igualmente as barreiras à entrada, o poder de comprador e os ganhos de eficiência (ver secções IV a VI).

Mercados em que as empresas concorrem principalmente a nível dos preços

34. Nalguns mercados, a fixação dos preços é a decisão estratégica mais importante dos oligopolistas. A diferenciação do produto, por exemplo, pode proporcionar às empresas alguma flexibilidade ao nível dos preços. Poderão surgir efeitos negativos sobre a concorrência quando, na sequência da concentração, a nova entidade considera rentável aumentar os preços devido à eliminação da concorrência entre as empresas objecto da concentração. Antes da concentração, as empresas partes na concentração podem ter exercido uma pressão concorrencial mútua de tal forma que se uma empresa aumentasse os preços perderia clientes a favor da outra. A concentração suprimiria esta limitação específica.

35. O incentivo para aumentar os preços está estreitamente relacionado com a proporção das vendas perdidas que se considera que cada empresa na concentração irá reconquistar nas vendas acrescidas do produto da outra parte na concentração. Em primeiro lugar, a Comissão centrar-se-á sobre o grau de substituição entre os produtos das empresas objecto da concentração. Quanto mais elevado for o nível de substituição entre os produtos das empresas objecto da concentração, mais forte seria o incentivo para estas empresas aumentarem os preços e mais elevado será o provável aumento de preços após a concentração.

36. A Comissão analisará, em segundo lugar, o nível de diferenciação dos produtos entre os produtos das empresas objecto da concentração e os produtos dos seus concorrentes. O incentivo das empresas objecto da concentração para aumentarem os preços é mais limitado quando as empresas rivais produzem substitutos próximos do que quando oferecem substitutos distantes. A Comissão terá menos preocupações quando existe um elevado nível de substituição entre os produtos das empresas objecto da concentração e os produtos fornecidos por produtores rivais. Por exemplo, uma concentração entre dois produtores que oferecem produtos que os consumidores consideram substitutos particularmente próximos poderá provocar um significativo aumento de preços. Contudo, se as empresas rivais oferecerem produtos que são substitutos próximos dos das partes na concentração, o aumento de preços após a concentração poderá ser limitado.

37. Nalguns mercados, poderá ser relativamente fácil e não demasiado oneroso que as empresas que neles desenvolvem actividades reposicionem os seus produtos ou alarguem a sua carteira de produtos. A Comissão analisará se a possibilidade de reposicionamento do produto ou o aumento da linha de produtos por parte das empresas na concentração ou por parte dos concorrentes pode influenciar o incentivo para a entidade resultante da concentração aumentar os preços. Um reposicionamento do produto ou um alargamento da linha de produtos é menos provável quando implica elevados custos não recuperáveis.

38. Por forma a determinar os efeitos de uma concentração, a Comissão analisará a possibilidade e o incentivo das empresas objecto da concentração para aumentar os preços, tal como acima descrito. A Comissão analisará igualmente as barreiras à entrada, o poder de comprador ou os ganhos de eficiência (ver secções IV a VI).

Mercados sujeitos à realização de concursos

39. Nas situações em que os vendedores concorrem apresentando uma proposta específica a cada comprador individual, a análise do efeito de uma concentração sobre a concorrência poderá ser diferente da acima apresentada. Em especial, no caso dos mercados sujeitos à realização de concursos, o principal elemento da concorrência é assegurado pela presença de diversas propostas em concurso. A Comissão examinará se existem concursos em que as empresas objecto da concentração possam ser os concorrentes mais prováveis uma da outra. Tal pode acontecer quando as empresas objecto da concentração são os dois concorrentes com os custos mais baixos e nos casos em que nenhum outro concorrente apresente um custo suficientemente baixo para exercer uma pressão concorrencial sobre a empresa que ganhou o concurso.

Maior risco de coordenação

40. Uma concentração pode alterar a natureza da concorrência num mercado oligopolístico de forma a que os vendedores, que anteriormente não coordenavam o seu comportamento, o podem doravante fazer e assim aumentar os seus preços, sem terem de concluir um acordo ou de recorrer a uma prática concertada, na acepção do artigo 81.o do Tratado CE(34). A alteração da estrutura do mercado poderá ser de tal ordem que considerem ser possível, razoável em termos económicos e por conseguinte preferível, adoptar de forma duradoura um comportamento no mercado com o objectivo de venderem acima dos preços concorrenciais.

41. Uma concentração poderá igualmente facilitar a coordenação dos vendedores que já coordenavam o seu comportamento antes da concentração, quer ao reforçar a coordenação, quer por se desviar ainda mais do resultado numa situação de concorrência normal. É pouco provável que a Comissão aprove uma concentração se existir coordenação antes da operação, a menos que conclua que a concentração é susceptível de perturbar a coordenação.

42. A coordenação pode assumir diversas formas. Nalguns mercados, a coordenação mais provável poderá consistir em manter ou aumentar os preços acima do nível concorrencial. Noutros mercados, a coordenação pode ter por objectivo limitar a produção ou o volume de nova capacidade introduzida no mercado. As empresas podem também coordenar o seu comportamento no que se refere à repartição do mercado, por exemplo por área geográfica(35), em função de outras características dos clientes ou acordando entre si quem ganha os contratos nos mercados sujeitos à realização de concursos.

43. É mais provável que surja coordenação nos mercados onde seja bastante simples estabelecer as condições de tal coordenação, ou seja, o tipo de coordenação e as regras implícitas que a regem. As partes deverão, assim, ter uma percepção comum das acções consideradas agressivas ("batota"), o que justificaria uma reacção ("castigos") dos outros membros do oligopólio.

44. Deverão estar preenchidas três condições de base para que a coordenação seja sustentável. Em primeiro lugar, as empresas que participam na coordenação deverão poder controlar, de forma suficiente, se as condições da coordenação estão a ser cumpridas, ou seja, detectar se qualquer empresa do grupo se está a desviar das condições de coordenação. Em segundo lugar, deverão existir mecanismos de dissuasão credíveis que sejam activados caso seja detectado um desvio. Estes mecanismos de dissuasão deverão ser suficientemente severos para convencer as empresas participantes na coordenação de que têm todo o interesse em cumprir as condições da coordenação. Em terceiro lugar, as acções das empresas terceiras, como os concorrentes actuais e futuros, e também os clientes, não deverão prejudicar os resultados esperados da coordenação(36).

45. Um mercado em que é relativamente fácil estabelecer as condições de coordenação e em que os três critérios acima referidos estão preenchidos a um nível suficiente, presta-se a um comportamento coordenado. Tal não significa que ocorrerá necessariamente uma coordenação significativa. Contudo, quanto menor for o número de empresas no oligopólio, mais provável é que as empresas possam tirar partido das condições favoráveis do mercado e estabelecer ou melhorar uma situação de coordenação mútua. Na maior parte dos casos, uma concentração que se realize neste contexto, viria assim quer reforçar a coordenação existente, quer aumentar as probabilidades da coordenação se vir a verificar.

46. A Comissão analisa em que medida é possível estabelecer as condições da coordenação e quais as possibilidades de as três condições necessárias serem suficientemente preenchidas após a concentração, analisando também as alterações provocadas pela concentração neste domínio. Desta forma, a Comissão poderá determinar se uma concentração provocaria um maior risco de coordenação ou se a coordenação passa a ser mais fácil ou a ter maiores probabilidades de êxito.

47. A Comissão toma em consideração tanto as características estruturais dos mercados em causa como o comportamento anterior das empresas nesses mercados. Muitas características estruturais assumem importância relativamente a mais do que uma das condições.

48. A análise da possibilidade de coordenação num mercado relevante específico implica normalmente o exame de um grande volume de informações, que por vezes não apontam para a mesma conclusão. Assim, elementos de prova relativos a uma coordenação anterior em mercados do produto ou em mercados geográficos semelhantes, poderão constituir informações úteis no sentido de ser provável que as condições necessárias acima referidas se encontram também preenchidas nos mercados relevantes para a concentração. É também possível que as empresas apresentem um nível de concorrência de tal forma elevado antes da concentração que seja improvável o aparecimento de coordenação.

Definição das condições de coordenação

49. É mais provável que ocorra coordenação se for fácil, para os membros do oligopólio, ter uma percepção comum do funcionamento do mecanismo de coordenação. Os membros deverão ter opiniões semelhantes relativamente ao comportamento que consideram em conformidade com o comportamento alinhado e sobre quais as acções que poderão dar origem a um castigo por parte dos outros membros do oligopólio.

50. Na generalidade, quanto mais simples e estável for o contexto económico, mais facilmente as empresas definem as condições da coordenação. É mais fácil coordenar os preços em relação a um produto único e homogéneo, do que coordenar centenas de preços num mercado com muitos preços diferenciados. Da mesma forma, a coordenação de preços é mais fácil quando as condições da procura e da oferta são relativamente estáveis do que quando estão em constante alteração. Neste contexto, um crescimento orgânico significativo de algumas empresas no mercado poderá indicar que a situação não é suficientemente estável para que a coordenação seja provável. A coordenação através da repartição do mercado será mais fácil se os clientes apresentarem características simples, o que permite que as empresas que participam na coordenação os distribuam entre si facilmente. Estas características podem ser baseadas na localização geográfica, no tipo de cliente ou simplesmente na existência de clientes que normalmente fazem as suas aquisições junto de uma empresa específica que participa na coordenação.

51. As empresas que participam na coordenação podem, contudo, encontrar formas de ultrapassar os problemas decorrentes de contextos económicos complexos. Podem, por exemplo, estabelecer regras simples em matéria de preços que reduzam a complexidade de uma coordenação sobre um grande número de preços. Um exemplo de uma destas regras consiste em estabelecer um reduzido número de preços de referência, reduzindo assim drasticamente o problema da coordenação. Um outro exemplo consiste em estabelecer uma relação fixa entre determinados preços de base e certos outros preços de tal forma que, basicamente, todos os preços são alterados em paralelo.

52. Um conhecimento aprofundado das outras empresas pode também contribuir para ultrapassar alguns dos problemas encontrados ao estabelecer as condições da coordenação. A transparência no que se refere à estrutura de custos poderá, em especial, revelar-se importante. Vínculos estruturais, tais como participações cruzadas ou a participação em empresas comuns poderão contribuir para alinhar os incentivos entre os oligopolistas. Uma outra forma de estabelecer as condições comuns de coordenação seria a troca pública de informações estratégicas através da imprensa. Um exemplo desta situação seria o caso de as empresas pretenderem coordenar o volume de capacidade adicional a introduzir no mercado de um ano para o outro. Declarar publicamente quais as previsões de aumento da procura, poderá ser uma forma de ultrapassar esta dificuldade. Quanto mais complexa for a situação do mercado, maior é a necessidade de transparência ou de comunicação para estabelecer as condições da coordenação.

53. Quanto mais simétricas forem as empresas, mais facilidade terão em estabelecer as condições da coordenação(37). A simetria entre as empresas aumenta a probabilidade de as empresas terem incentivos compatíveis para coordenarem o seu comportamento e, em especial, de chegarem a acordo sobre quais são as condições desejáveis da coordenação. Por exemplo, é provável que empresas com estruturas de custos e quotas de mercado semelhantes, com níveis de capacidade semelhantes e com o mesmo grau de integração vertical, concluam ser relativamente fácil coordenarem os preços que consideram desejáveis.

54. A Comissão consagrará particular atenção às alterações que a concentração pode provocar no que se refere à facilidade com que as empresas estabelecem as condições de coordenação. Por exemplo, uma concentração poderá aumentar a simetria de um grupo de empresas tornando mais semelhantes as quotas de mercado, os níveis de utilização da capacidade, o grau de integração vertical ou as estruturas de custos dessas empresas. Uma concentração poderá também implicar uma empresa que tenha demonstrado constantemente no passado preferir preços mais baixos do que os dos seus concorrentes. Estas empresas são por vezes designadas "dissidentes". Caso a empresa resultante da concentração siga estratégias de preços semelhantes às dos outros concorrentes, será mais fácil para as restantes empresas coordenarem os preços que consideram desejáveis, e a concentração aumentará a probabilidade de coordenação.

Controlo

55. As empresas que participam numa coordenação são sempre tentadas a aumentar as suas quotas de mercado, desviando-se das condições de coordenação, por exemplo diminuindo os preços, aumentando a sua capacidade ou tentando obter mais contratos do que o planeado. Apenas a ameaça de um "castigo" atempado impede que as empresas se desviem. Por forma a saber quando devem ser activados estes mecanismos de dissuasão, as empresas que participam na coordenação têm de poder controlar suficientemente estes desvios. Assim, os mercados deverão ser suficientemente transparentes para que as empresas que participam na coordenação detectem de forma atempada quais as escolhas feitas pelas outras empresas.

56. O nível de transparência depende nomeadamente da forma como se realizam as transacções num mercado específico. Existe uma maior transparência num mercado em que as transacções se efectuam numa bolsa pública, onde se verifica uma confrontação entre a oferta e a procura, do que em mercados em que as transacções são negociadas de forma confidencial e numa base bilateral entre os vendedores e os compradores. As listas de preços divulgadas publicamente podem proporcionar essa transparência na medida em que normalmente reflectem os preços da transacção. A transparência poderá ser reduzida se os preços incluírem igualmente descontos não aparentes.

57. Em especial nos mercados sujeitos à realização de concursos, o nível de transparência depende do tipo de mecanismo que é aplicado. Em concursos com propostas confidenciais, os proponentes não tem acesso às informações relativas às propostas apresentadas pelos outros proponentes. Numa licitação, o comportamento de um dos proponentes pode ser facilmente observado pelos restantes. Da mesma forma, noutros mercados, para avaliar o grau de transparência, é importante investigar que tipo de informação acerca de cada transacção está disponível publicamente. Nalguns mercados, os preços são do conhecimento público.

58. Ao avaliar o nível de transparência do mercado, é fundamental identificar as informações acerca do comportamento dos outros oligopolistas que podem ser inferidas a partir da informação disponível. As empresas que participam numa coordenação deverão poder interpretar, de forma bastante segura, em que medida um comportamento imprevisível resulta, na realidade, de um desvio relativamente às condições da coordenação. Por exemplo, em contextos instáveis, uma empresa pode ter dificuldades em saber se a sua perda de vendas se deve a um baixo nível global da procura ou a uma perda de quota de mercado a favor de um concorrente que esteja a oferecer preços particularmente baixos. Da mesma forma, numa situação em que as condições gerais da procura ou de custos oscilam, poderá ser difícil interpretar em que medida um concorrente reduz os seus preços porque espera uma descida dos preços coordenados ou porque está a comportar-se de forma agressiva.

59. Nalguns mercados em que as condições gerais parecem dificultar o controlo do comportamento das outras empresas, as empresas podem contudo optar por práticas que facilitam a tarefa de controlo, mesmo que não tenham, necessariamente, sido iniciadas para o efeito. Estas práticas, tal como a publicação voluntária de informações ou de anúncios, podem aumentar a transparência ou ajudar os concorrentes a interpretarem as opções efectuadas. A gestão cruzada, a participação em empresas comuns e em acordos semelhantes podem também facilitar o controlo.

60. A Comissão tomará particularmente em atenção em que medida a concentração provoca alterações na possibilidade de as empresas que participam numa coordenação controlarem mutuamente o respectivo comportamento. Por exemplo, alterações na integração vertical poderão permitir um melhor controlo dos preços. Uma concentração poderá igualmente implicar uma empresa que anteriormente não tenha seguido uma determinada prática do sector que facilite o controlo.

Mecanismos de dissuasão

61. A coordenação não pode ter lugar sem mecanismos de dissuasão que sejam suficientemente severos para convencer todas as empresas participantes que têm todo o interesse em cumprir as condições da coordenação. É, por conseguinte, a ameaça de uma futura retaliação que mantém a coordenação sustentável. Contudo, tal ameaça é apenas credível se, ao verificar que uma das empresas se desvia das condições, os mecanismos de dissuasão forem efectivamente accionados. Embora os mecanismos de dissuasão sejam frequentemente também designados por mecanismos de "castigo", este termo não deve ser entendido em sentido estrito, ou seja, que tal mecanismo castiga necessariamente de forma individual uma empresa que se tenha desviado. Por exemplo, o facto de as empresas considerarem que a coordenação será destruída por um período suficiente se uma delas se desviar, voltando a uma situação de não coordenação, poderá constituir em si próprio um mecanismo de dissuasão suficiente. Todavia, este mecanismo poderá revelar-se insuficiente para disciplinar uma coordenação tácita, podendo neste caso ser necessária a intervenção de outros mecanismos.

62. Uma empresa apenas optará por se desviar das práticas coordenadas se considerar que esse seu comportamento lhe trará compensações superiores ao custo actualizado do castigo. Em comparação com a alternativa de manter a prática coordenada, o desvio poderá inicialmente proporcionar lucros mais elevados, mas posteriormente implicará uma redução dos lucros quando os restantes membros do oligopólio aplicarem o castigo. Os desvios são impedidos quando o valor actual líquido da perda de lucros futuros durante o castigo é superior ao valor actual líquido do aumento do lucro de que a empresa beneficia durante o período do desvio. Quanto mais rapidamente o castigo for aplicado, menor é o ganho decorrente do desvio, e maior é a perda incorrida durante o castigo.

63. É pouco provável que os castigos que só são aplicados após um determinado período, ou que não venham mesmo a ser accionados, sejam suficientemente severos. Por exemplo, se um mercado se caracterizar por encomendas não frequentes e pontuais, uma empresa poderá ser tentada a desviar-se para obter um contrato importante. Pode ser difícil criar um mecanismo de dissuasão suficientemente severo num mercado desta natureza, uma vez que os ganhos decorrentes do desvio são elevados, certos e imediatos e as perdas decorrentes do castigo podem ser incertas, e concretizar-se apenas após algum tempo. A rapidez de aplicação dos mecanismos de dissuasão está relacionada com a questão da transparência. Se as empresas apenas podem observar as acções dos seus concorrentes após um período significativo, o castigo também será atrasado, o que poderá determinar se será suficiente para impedir o desvio.

64. Não é necessário que a dissuasão seja aplicada no mesmo mercado que o desvio. Se os membros do oligopólio mantêm relações comerciais noutros mercados, estes poderão oferecer diversos métodos de dissuasão(38). A dissuasão pode assumir diversas formas, incluindo a anulação de empresas comuns ou de outras formas de cooperação ou a venda de participações em empresas que sejam de propriedade conjunta.

65. Os membros de um oligopólio só podem basear a coordenação num mecanismo de dissuasão se cada membro considerar que se justifica aplicar tal mecanismo quando ocorre um desvio hipotético. O facto de um membro de um oligopólio aplicar efectivamente o mecanismo de dissuasão, depende de uma ponderação das consequências a curto e longo prazo semelhante à efectuada pelo autor do desvio potencial. Se um desvio não for castigado, a coordenação será destruída e é provável que os níveis dos lucros futuros sejam reduzidos. Por outro lado, se o castigo for executado, a coordenação pode ser restabelecida o que permitirá lucros superiores no futuro. Assim, pode justificar-se a aplicação do mecanismo de castigo mesmo que provoque alguns custos a curto prazo para os membros do oligopólio, desde que tais custos sejam compensados pelo aumento dos lucros a longo prazo decorrentes do restabelecimento da coordenação.

66. Nalguns casos, determinados mecanismos de castigo poderão não ser credíveis porque impedem, pelas suas próprias características, o restabelecimento da coordenação. Pode ser dado como exemplo um mercado em estagnação em que a capacidade apenas pode ser aumentada através de acções de grande envergadura (por exemplo, a construção de uma nova fábrica) e em que a capacidade não tem valor a não ser que seja utilizada neste mercado específico. Neste cenário, a coordenação destinada a manter a capacidade total abaixo do nível concorrencial será improvável porque não existe qualquer mecanismo de dissuasão credível no caso de um membro do oligopólio se desviar, aumentando a capacidade para um nível tal que um novo aumento de capacidade conduziria a um excesso de oferta permanente.

67. Nalguns casos, o desvio poderá por si próprio, proporcionar uma vantagem concorrencial durável que nenhum castigo de que os outros oligopolistas dispõem pode anular. Num mercado com grandes efeitos de rede, ou seja, mercados em que cada consumidor prefere ser fornecido pelo mesmo fornecedor que os restantes consumidores(39), o desvio pode provocar uma alteração definitiva do equilíbrio concorrencial do mercado, que deixaria permanentemente os outros concorrentes numa posição secundária.

68. A concentração poderá provocar alterações no que se refere à severidade dos castigos num determinado mercado, resultantes, por exemplo, de alterações na distribuição das quotas de mercado ou na capacidade excedentária. A Comissão terá particularmente em atenção tais alterações na análise dos efeitos de uma concentração sobre a concorrência.

Reacções de empresas terceiras

69. Para que a coordenação seja coroada de êxito, o comportamento dos concorrentes efectivos e futuros, bem como dos clientes, não deverá prejudicar os resultados previstos da coordenação. Se, por exemplo, a coordenação se destinar a reduzir a capacidade global do mercado, apenas afectará os consumidores, caso não exista nenhuma empresa fora do oligopólio que reaja a esta diminuição aumentando a sua própria capacidade de forma correspondente. A análise destes elementos é semelhante à realizada quando são examinados outros tipos de entraves à concorrência resultantes das concentrações. Os efeitos da entrada de novos participantes e do poder de comprador dos clientes serão abordados nas secções que se seguem. Contudo, deverá ser dada especial atenção ao possível impacto destes elementos sobre a estabilidade da coordenação. Por exemplo, ao alterar a sua prática comercial e ao concentrar um grande volume das suas necessidades no mesmo fornecedor ou ao oferecer contratos a longo prazo, um grande comprador poderá tentar uma das empresas que participam na coordenação a desviar-se, por forma a expandir significativamente as suas actividades.

Casos específicos

Inovação

70. Em mercados oligopolistas não colusórios ou em mercados caracterizados por uma empresa com uma posição de supremacia no mercado, em que a inovação é a principal força concorrencial, a Comissão analisa de que forma a concentração afecta a pressão concorrencial no sentido de inovar no mercado. A pressão concorrencial nestes mercados poderá ser reduzida se a concentração se realizar entre os dois únicos concorrentes que anteriormente asseguravam as inovações mais importantes. Por exemplo, pode tratar-se de uma concentração entre duas empresas farmacêuticas que sejam as únicas com produtos prontos a ser comercializados no mercado do produto específico. Em alternativa, se a concentração aumentar a capacidade de as empresas introduzirem inovações adicionais no mercado, poderá aumentar a pressão concorrencial no sentido de inovar. Nos mercados em que a coordenação é mais provável, a inovação torna essa coordenação mais difícil, porque as inovações, particularmente as mais importantes, permitem que uma empresa ganhe uma vantagem significativa face aos seus rivais. Assim, esta situação poderá reduzir tanto o valor de uma coordenação futura como o nível dos prejuízos que os rivais poderiam provocar.

Entrada potencial

71. As concentrações em que uma empresa que já desenvolve actividades no mercado relevante realiza uma fusão com um concorrente potencial no mesmo mercado podem ter efeitos anticoncorrenciais semelhantes aos das concentrações entre duas empresas que desenvolvem já actividades no mesmo mercado relevante. Desta forma, a Comissão aplicará métodos de análise semelhantes a estes dois tipos de concentrações.

72. Uma concentração com um concorrente potencial poderá gerar efeitos anticoncorrenciais horizontais se o concorrente potencial restringir de forma significativa o comportamento das empresas que desenvolvem actividades no mercado. É o que se passa se o concorrente potencial possuir activos que possam facilmente ser utilizados para entrar no mercado sem incorrer em custos irrecuperáveis significativos. É o que acontece também se for muito provável que o concorrente potencial incorra nos custos irrecuperáveis necessários para entrar no mercado num período relativamente curto, após o qual passaria a restringir o comportamento das empresas activas no mercado.

73. Para que uma concentração com um concorrente potencial tenha efeitos anticoncorrenciais significativos, devem estar preenchidas duas condições de base. Em primeiro lugar, o participante potencial deverá já exercer uma influência restritiva significativa ou deve existir uma probabilidade considerável de se vir a transformar numa força concorrencial efectiva. Os indícios de que um concorrente potencial projecta entrar num mercado de uma forma significativa poderão auxiliar a Comissão a chegar a esta conclusão(40). Em segundo lugar, não deverá existir um número suficiente de concorrentes potenciais que possam exercer a mesma pressão concorrencial que aquele que participa na concentração.

Concentrações que criam ou reforçam o poder de comprador

74. A Comissão poderá também analisar em que medida a entidade resultante de uma concentração aumentará o seu poder económico enquanto comprador nos mercados a montante. Por um lado, uma concentração que cria ou reforça o poder económico de um comprador pode impedir uma concorrência efectiva. Em especial, a empresa resultante da concentração poderá encontrar-se em condições de reduzir as suas compras de matérias-primas por forma a obter preços mais reduzidos. Esta situação poderá, por seu turno, levá-la a baixar o nível de produção no mercado do produto final, prejudicando assim os consumidores. Por outro lado, o aumento do poder de comprador poderá, frequentemente, revelar-se benéfico para os consumidores. Se o aumento do poder de comprador provocar uma redução nos custos das matérias-primas sem restringir a concorrência a jusante ou a produção total, uma parte destas reduções de custos será provavelmente repercutida nos consumidores sob a forma de preços mais baixos. A concorrência nos mercados a jusante poderá também negativamente ser afectada se, em especial, a entidade resultante da concentração puder utilizar o seu poder de comprador para impor restrições verticais aos fornecedores, não permitindo assim o acesso aos seus rivais.

IV. PODER DE COMPRADOR DE COMPENSAÇÃO

75. A pressão concorrencial sobre uma empresa não é apenas exercida pelos concorrentes mas pode também provir dos seus clientes. A Comissão considerará, sempre que necessário, em que medida os clientes estão em condições de contrariar o aumento de poder de mercado susceptível de resultar de uma concentração.

76. Mesmo as empresas com quotas de mercado muito elevadas poderão não conseguir adoptar um comportamento independente dos seus clientes, caso estes últimos possuam poder de comprador(41). O poder de comprador deverá neste contexto ser entendido como a capacidade que grandes clientes têm de recorrer, num prazo razoável, a alternativas credíveis caso o fornecedor decida aumentar os preços ou deteriorar as condições de entrega(42). Poderão citar-se como exemplos, os casos em que o comprador possa mudar imediatamente para outros fornecedores, possa ameaçar, de forma credível, com uma integração vertical no mercado a montante ou apoiar uma entrada no mercado a montante(43), por exemplo, convencendo um participante potencial a entrar e comprometendo-se a fazer-lhe grandes encomendas. É mais provável que este tipo de poder de comprador seja detido pelos grandes clientes sofisticados do que pelas pequenas empresas num sector fragmentado. Contudo, é importante considerar quais são os incentivos que os compradores têm para utilizar o seu poder de comprador desta forma. Por exemplo, uma empresa a jusante pode não pretender efectuar um investimento para apoiar uma nova entrada se os benefícios dessa entrada em termos de redução dos custos das matérias-primas puderem também ser aproveitados pelos seus concorrentes.

77. A Comissão pode concluir que o poder de comprador é suficiente para impedir a criação ou reforço de uma posição dominante susceptível de restringir significativamente a concorrência, se os pequenos clientes sem poder de comprador não forem confrontados de forma considerável com preços mais elevados ou com uma deterioração das condições após a concentração(44). Além disso, não é suficiente que exista poder de comprador antes da concentração, é também necessário que exista e permaneça efectivo depois da concentração, uma vez que uma concentração entre dois fornecedores pode reduzir o poder de comprador se suprimir uma alternativa credível.

V. ENTRADA NO MERCADO

78. Num contexto concorrencial dinâmico, o número e a identidade das empresas num determinado sector podem variar ao longo do tempo, em resposta à alteração das condições de mercado. Se o nível de lucro num sector for elevado devido à falta de pressão concorrencial sobre os operadores estabelecidos, será de esperar o aparecimento de empresários que tentam obter uma parte desse lucro entrando no sector. Quando a entrada no mercado é particularmente fácil, a mera ameaça de uma entrada potencial pode ser suficiente para impedir as partes numa concentração de exercerem poder de mercado. Com efeito, neste caso, qualquer aumento de preços poderá constituir um incentivo para uma nova entrada no mercado.

79. Ao apreciar se uma nova entrada no mercado pode ser considerada como uma pressão concorrencial suficiente sobre as partes na concentração, deverá demonstrar-se que a entrada é provável, será realizada em tempo útil e será suficiente em termos de dimensão e âmbito para evitar os efeitos anticoncorrenciais potenciais da concentração. É pouco provável que a Comissão tenha preocupações em matéria de concorrência quando existem fortes elementos de prova de que tais condições estão preenchidas.

80. No que se refere à probabilidade de uma nova entrada no mercado, a Comissão examinará se existe uma elevada probabilidade de se registarem novas entradas após a concentração. Neste contexto, a Comissão tomará particularmente em atenção a existência de barreiras à entrada no mercado relevante, ou seja, as características específicas do mercado que podem proporcionar às empresas estabelecidas uma vantagem decisiva sobre os seus concorrentes potenciais. Quando as barreiras à entrada são reduzidas, haverá uma maior possibilidade de as empresas na concentração sofrerem maiores restrições devido à nova entrada. Em contrapartida, quando as barreiras à entrada são elevadas, pode presumir-se que as empresas na concentração exercerão o seu poder de mercado e aumentarão os seus preços, sem serem limitadas pelas novas empresas que entram no mercado.

81. As barreiras à entrada podem assumir a forma de vantagens legais, técnicas ou estratégicas:

- as vantagens legais abrangem as situações em que as barreiras regulamentares criadas pela legislação limitam o número de participantes no mercado, ao restringir, por exemplo, o número de licenças,

- as empresas estabelecidas poderão também beneficiar de vantagens técnicas, como o acesso preferencial a instalações essenciais, recursos naturais, inovação e I & D, ou direitos de propriedade intelectual, que poderão dificultar a concorrência por parte de qualquer outra empresa. Por exemplo, nalgumas indústrias, poderá ser difícil obter as matérias-primas necessárias e os produtos ou processos poderão estar protegidos por patentes. Outros factores, como as economias de escala e de gama, as redes de distribuição e venda e o acesso a tecnologias importantes poderão também constituir barreiras à entrada,

- além disso, poderão existir barreiras estratégicas à entrada devido à firme posição das empresas estabelecidas no mercado. Em especial, poderá revelar-se difícil entrar num determinado sector devido ao facto de ser necessária experiência ou reputação para concorrer de forma efectiva, e poderá ser difícil para um novo participante obter estas condições. Factores como a lealdade dos consumidores a uma marca específica, a proximidade das relações entre os fornecedores e os clientes, a importância da promoção ou da publicidade ou outras vantagens a nível da reputação serão tomados em consideração. As barreiras estratégicas à entrada englobam igualmente situações em que as empresas estabelecidas detêm já capacidade excedentária instalada, ou em que os custos que os clientes incorrem ao mudar para um novo fornecedor são também susceptíveis de inibir a entrada.

82. Para que a entrada seja provável, deverá apresentar-se como suficientemente rentável tendo em conta as potenciais reacções das empresas estabelecidas. Desta forma, a entrada é mais difícil se as empresas estabelecidas puderem controlar de perto quais os clientes que o novo participante está a tentar conquistar, e proteger as suas quotas de mercado, oferecendo reduções de preços especialmente dirigidas a esses clientes.

83. A evolução provável do mercado deverá ser tomada em consideração ao apreciar se uma entrada será ou não rentável. É mais provável que uma entrada seja rentável num mercado que se prevê irá registar um elevado crescimento no futuro do que num mercado que se espera irá entrar em declínio. As economias de escala ou os efeitos de rede podem inviabilizar uma entrada, nos casos em que o novo participante não possa conquistar uma quota de mercado suficientemente importante.

84. A entrada é particularmente provável se os fornecedores noutros mercados possuem já instalações de produção que possam ser utilizadas para penetrar no mercado em questão. Esta reafectação das instalações de produção é mais provável se as duas alternativas registarem um nível de rendibilidade equivalente antes da concentração.

85. A Comissão analisará atentamente os antecedentes do sector ao apreciar as barreiras à entrada. É pouco provável que a Comissão considere que existem barreiras à entrada num sector que tenha registado entradas frequentes e coroadas de êxito. Por outro lado, se as anteriores tentativas de entrada no mercado tiverem sido mal sucedidas, talvez devido ao comportamento dissuasor das empresas estabelecidas, a entrada afigurar-se-ia menos provável no futuro.

86. Uma nova entrada não deverá ser apenas provável, mas deverá também ser realizada em tempo útil e ser suficiente em termos de âmbito e dimensão. Ao apreciar se uma entrada é realizada em tempo útil, a Comissão determinará se esse novo participante potencial é suficientemente rápido e persistente para impedir o exercício de poder de mercado. O período de tempo adequado dependerá das características e dinâmica do mercado, bem como das capacidades específicas dos candidatos potenciais(45). Uma entrada que não apresente um âmbito e dimensão suficientes não é susceptível de constituir uma restrição para as empresas estabelecidas e não poderá impedir os efeitos anticoncorrenciais da concentração. Por exemplo, a entrada num determinado "nicho" de mercado poderá não constituir uma restrição credível. A ameaça de entrada deverá também ter uma intensidade suficiente para dissuadir as partes na concentração de aumentarem os preços.

VI. GANHOS DE EFICIÊNCIA

87. A Comissão acolhe favoravelmente as reorganizações de empresas que assumem a forma de concentrações, uma vez que correspondem às exigências de uma concorrência dinâmica e que podem contribuir para aumentar a competitividade da indústria europeia, para melhorar as condições do crescimento e para elevar o nível de vida na Comunidade(46). Desta forma, a Comissão toma em consideração, na sua apreciação das concentrações horizontais, a evolução do progresso técnico e económico desde que tal evolução seja vantajosa para os consumidores e não constitua um obstáculo à concorrência(47).

88. A Comissão tomará em consideração qualquer alegação justificada de ganhos de eficiência na apreciação global da concentração. Poderá decidir que, devido aos ganhos de eficiência decorrentes da concentração, esta não cria nem reforça uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva. É o que acontece quando a Comissão pode concluir, com base em elementos suficientes, que os ganhos de eficiência gerados pela concentração são susceptíveis de reforçar o incentivo para que a entidade resultante da concentração se comporte de uma forma pró-concorrencial em benefício dos consumidores, anulando os efeitos que, de outro modo, a concentração teria sobre a concorrência. No interesse dos consumidores, é necessário garantir que a empresa resultante da concentração terá incentivos suficientes não só para realizar os ganhos de eficiência directamente decorrentes da concentração, mas também para prosseguir os seus esforços no sentido de melhorar a eficiência. Tal pressupõe uma pressão concorrencial suficiente por parte das restantes empresas e por parte dos novos participantes potenciais.

89. Os ganhos de eficiência terão um maior impacto se forem substanciais e se os efeitos anticoncorrenciais prováveis, que podem de outra forma verificar-se, forem reduzidos. Quanto maiores forem estes efeitos negativos sobre a concorrência, mais a Comissão terá de assegurar-se de que os alegados ganhos de eficiência são substanciais, susceptíveis de serem realizados, e que beneficiam directamente os consumidores. É pouco provável que uma posição dominante próxima do monopólio possa ser declarada compatível com o mercado comum devido aos ganhos de eficiência.

90. Para que a Comissão chegue à conclusão de que, devido aos ganhos de eficiência, uma concentração não cria nem reforça uma posição dominante de que resultem restrições significativas para a concorrência, tais ganhos de eficiência devem beneficiar directamente os consumidores e ser específicos a uma concentração, ser substanciais, realizados em tempo útil e verificáveis.

91. Os ganhos de eficiência devem beneficiar directamente os consumidores nos mercados relevantes em que, de outra forma, seria provável a criação ou reforço de uma posição dominante de que resultariam restrições significativas para a concorrência. Em conformidade com a necessidade de apreciar se os ganhos de eficiência são repercutidos nos consumidores, as eficiências em termos de custos que levam a uma redução nos custos variáveis ou marginais serão provavelmente mais relevantes para a apreciação dos ganhos de eficiência do que as reduções nos custos fixos, uma vez que é mais provável que as primeiras provoquem preços mais baixos para os consumidores.

92. Os ganhos de eficiência de que resultam produtos ou serviços novos ou melhorados podem também beneficiar directamente os consumidores. Por exemplo, uma empresa comum criada para desenvolver um novo produto poderá proporcionar o tipo de ganhos de eficiência que a Comissão pode tomar em consideração.

93. Os ganhos de eficiência são específicos a uma concentração quando dela decorrem directamente. Neste contexto, a Comissão centrar-se-á em alternativas realistas e viáveis e não em hipóteses meramente teóricas. Em especial, a Comissão tomará em consideração as práticas estabelecidas no sector, bem como as capacidades respectivas das partes objecto da concentração. A Comissão não tomará por conseguinte em consideração as reduções de custos que resultam de reduções anticoncorrenciais na produção.

94. Os ganhos de eficiência devem poder ser verificáveis, de modo a que a Comissão possa estar razoavelmente segura de que se virão a concretizar. Quanto mais os ganhos de eficiência se projectarem no futuro, menos importância lhes pode a Comissão atribuir(48). A Comissão deverá também estar em condições de apreciar em que medida os ganhos de eficiência são suficientemente substanciais para anular os efeitos negativos potenciais da concentração para os consumidores. Assim, sempre que tal for razoavelmente possível, os ganhos de eficiência deverão ser quantificados. Tal como acima referido, por forma a verificar em que medida as eficiências de custos beneficiarão directamente os consumidores, é provável que as reduções nos custos variáveis ou marginais sejam mais relevantes para a análise do que as reduções nos custos fixos. Da mesma forma, os ganhos de eficiência que, comprovadamente, conduzirem a produtos novos ou melhorados que beneficiam directamente os consumidores, terão mais hipóteses de ser considerados pela Comissão do que meras declarações nesse sentido.

95. A maior parte das informações relevantes, necessárias para a Comissão apreciar em que medida a concentração induzirá ganhos de eficiência que permitem a sua autorização, está exclusivamente na posse das partes na concentração. Cabe assim às partes notificantes fornecer atempadamente todas as informações relevantes para demonstrar que os ganhos de eficiência são específicos à concentração, substanciais, realizados em tempo útil e verificáveis. Da mesma forma, compete às partes notificantes apresentar os elementos necessários para demonstrar que os ganhos de eficiência anularão quaisquer efeitos negativos para a concorrência que poderiam de outra forma resultar da concentração, beneficiando assim directamente os consumidores.

VII. CONCEITO DE EMPRESA INSOLVENTE

96. A Comissão pode decidir que uma concentração que cria ou reforça uma posição dominante é todavia compatível com o mercado comum se uma das empresas for uma empresa insolvente em vias de ser adquirida por outra empresa. O requisito básico neste caso é não se poder considerar que a deterioração da estrutura concorrencial após a concentração é causada pela concentração(49).

97. A Comissão considera que os três critérios que se seguem são relevantes para a aplicação do "conceito da empresa insolvente". Em primeiro lugar, a empresa adquirida será num futuro próximo excluída do mercado devido a dificuldades financeiras se não for adquirida por outra empresa. Em segundo lugar, não existe qualquer aquisição alternativa menos anticoncorrencial do que a concentração notificada. Em terceiro lugar, na ausência de uma concentração, os activos da empresa insolvente abandonariam inevitavelmente o mercado. Nestas circunstâncias, poderá considerar-se que a concentração não cria nem reforça uma posição dominante de que resulte uma restrição significativa para a concorrência efectiva no mercado comum se o desaparecimento da empresa insolvente(50) ou a sua aquisição por qualquer outro adquirente potencial previsível(51) levassem igualmente à criação ou reforço de uma posição dominante.

98. Compete às partes notificantes demonstrar que os três critérios acima descritos estão preenchidos e que a deterioração da estrutura concorrencial após a concentração não é causada pela concentração.

VIII. CONVITE PARA A APRESENTAÇÃO DE OBSERVAÇÕES

99. A presente consulta pública faz parte de um processo mais amplo de análise, reforma e clarificação das condições e aplicação do regulamento das concentrações. As partes interessadas podem apresentar as suas observações sobre o presente projecto de comunicação. Tais observações deverão ser recebidas pela Comissão até 31 de Março de 2003, devendo ser enviadas,

Por correio: Comissão Europeia Direcção-Geral da Concorrência Orientações Horizontais B - 1049 Bruxelas;

Ou por correio electrónico:

Comp-MTF-horizontal-guidelines@cec.eu.int

(1) JO L 395 de 30.12.1989, p. 1; versão rectificada no JO L 257 de 21.9.1990, p. 13. Regulamento com a última redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.o 1310/97 do Conselho de 30 de Junho de 1997 (JO L 180 de 9.7.1997, p. 1); versão rectificada no JO L 40 de 13.2.1998, p. 17 e JO L 199 de 26.7.1997, p. 69.

(2) O termo concentração utilizado no regulamento das concentrações abrange diversos tipos de operações como fusões, aquisições, tomadas de controlo e determinados tipos de empresas comuns. No texto da presente Comunicação, salvo nos casos em que seja especificado o contrário, a expressão "fusão" será utilizada como sinónimo de concentração, abrangendo assim todos os tipos de operações acima referidos.

(3) A presente comunicação não abrange a apreciação dos efeitos sobre a concorrência que uma concentração produz noutros mercados, incluindo efeitos verticais e de conglomerado. Não abrange também a apreciação dos efeitos de uma empresa comum tal como referida no n.o 4 do artigo 2.o do regulamento das concentrações.

(4) JO L 372 de 9.12.1997, p. 5.

(5) Ver secções sobre concentrações com um participante potencial, concentrações que aumentam o poder de comprador das partes na concentração e sobre o conceito de empresa insolvente.

(6) Na presente comunicação, a expressão "aumento de preços" é frequentemente utilizada como abrangendo o aumento de preços, a redução da escolha e da qualidade dos bens e serviços, a redução da inovação tecnológica e outras consequências possíveis da falta de uma concorrência efectiva. Deverá considerar-se que esta expressão abrange também situações em que, por exemplo, os preços descem menos, ou são menos susceptíveis de descer, do que aconteceria na ausência da concentração.

(7) Entende-se por mercado oligopolístico uma estrutura de mercado com um número limitado de empresas de dimensão considerável. Visto que o comportamento de uma empresa tem efeitos apreciáveis sobre as condições gerais do mercado e, por conseguinte, indirectamente sobre a situação das restantes empresas, as empresas oligopolísticas são interdependentes.

(8) No que se refere ao cálculo dos dados relativos às quotas de mercado, ver comunicação da Comissão relativa à definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência (JO C 372 de 9.12.1997, p. 3, pontos 54 e 55).

(9) Em muitos casos, a força das pressões concorrenciais que existem entre os diversos intervenientes no mercado dependerá mais das características precisas desses intervenientes e dos clientes em causa do que da quota das vendas totais que detêm os intervenientes no mercado. As quotas de mercado podem, nestas circunstâncias, quer subestimar quer sobrestimar os efeitos sobre a concorrência.

(10) Uma análise dos concursos ganhos e perdidos identifica quais os vendedores que têm participado em concursos em relação a determinados grupos de clientes e o seu êxito em termos de adjudicação do contrato ou de obtenção de uma posição elevada na classificação das propostas efectuada pelos clientes.

(11) Por exemplo, um mercado que inclua cinco empresas com quotas de mercado de, respectivamente, 40 %, 20 %, 15 %, 15 %, e 10 %, tem um HHI de 2550 (402 + 202 + 152 + 152 + 102 = 2550). O HHI varia entre 10000 (no caso de um monopólio puro) e um número perto de zero (no caso de um mercado atomístico). Embora seja desejável incluir todas as empresas no cálculo, a ausência de informações acerca das pequenas empresas não é grave, uma vez que tais empresas não afectam o HHI de forma significativa.

(12) O HHI agregado é o HHI após a concentração, calculado partindo do pressuposto de que as duas partes objecto da concentração mantêm as respectivas quotas de mercado.

(13) Em certas circunstâncias excepcionais, uma concentração pode também permitir que uma empresa que não é parte na operação notificada tenha ou reforce uma posição de supremacia no mercado (ver decisão da Comissão de 29 de Setembro de 1999, IV/M.1383, Exxon/Mobil, considerandos 225-229).

(14) Processo T-221/95, Endemol/Comissão, Col. 1999, p. II-1299, ponto 134 e processo T-102/96, Gencor/Comissão, Col. 1999, p. II-753, ponto 205; processo IV/M.890, Blokker/Toys "R" Us (JO L 316 de 25.11.1998, p. 1, ponto 74).

(15) Ver, por exemplo, processo IV/M.1221, Rewe/Meinl (JO L 274 de 23.10.1999, p. 1, ponto 28). Ver igualmente processo C-250/92, Gottrup-Klim, Col. 1994, p. I-5641, ponto 48.

(16) As economias de escala e de gama resultam da repartição dos custos fixos por uma produção superior ou por uma gama mais ampla de produtos.

(17) Ver, por exemplo, processo T-102/96, Endemol/Comissão, Col. 1999, p. II-753, ponto 167.

(18) Ver, por exemplo, processo T-22/97, Kesko/Comissão, Col. 1999, p. II-3775, pontos 141 e seguintes.

(19) Ver, por exemplo, processo COMP/M.2097, SCA/Metsa Tissue (JO L 57 de 27.2.2001, p. 1, ponto 147).

(20) Processo COMP/M.2033 Metso/Svedala, 2001, ainda não publicado, ponto 195.

(21) Processo IV/M.603, Crown Cork & Seal/Carnaud/MetalBox (JO L 75 de 23.3.1996, p. 38, pontos 66 e seguintes).

(22) Processo T-156/98, RJB Mining/Comissão, Col. 2001, p. II-337.

(23) Ver, por exemplo, processo IV/M.623, Kimberly-Clark/Scott (JO L 183 de 23.7.1996, p. 1).

(24) Ver, por exemplo, processo M.430, Procter & Gamble/VP Schickedanz II (JO L 354 de 31.12.1994, p. 32) e processo T-290/94, Kaysersberg/Comissão, Col.1997, p. II-2137, ponto 153.

(25) Processo T-310/01, Schneider/Comissão, Col. 2002, p. II-0000, ponto 418; processo IV/M.1628, TotalFina/Elf Aquitaine (JO L 143 de 29.5.2001, p. 1); processo COMP/M.2097, SCA/Metsä Tissue (JO L 57 de 27.2.2001, p. 1, pontos 94-108).

(26) Processo IV/M.877, Boeing/McDonnell Douglas (JO L 336 de 8.12.1997, p. 16, pontos 58 e seguintes).

(27) Ver, por exemplo, processo COMP/M.2817, Barilla/BPS/Kamps, ponto 34; processo COMP/M.1672, Volvo/Scania (JO L 143 de 29.5.2001, ponto 148).

(28) Embora a maior parte dos mercados apresente alguns elementos de diferenciação do produto, existem mercados em que os produtos são relativamente homogéneos. Os produtos são relativamente homogéneos se os clientes consideram que os produtos de um produtor são um substituto suficientemente adequado para os produtos de qualquer outro produtor.

(29) Os produtos podem ser diferenciados de diversas formas. Poderão existir diferenciações em termos de localização geográfica, com base na situação das sucursais ou dos estabelecimentos. Por exemplo, a localização é relevante no que se refere à distribuição retalhista, aos bancos, às agências de viagens ou às estações de serviço. A diferenciação pode também basear-se na imagem de marca, nas especificações técnicas, na qualidade ou no nível do serviço. O nível de publicidade no mercado poderá constituir um indicador do esforço da empresa para diferenciar os seus produtos. No que se refere a outros produtos, os compradores poderão ter de suportar custos de mudança para utilizar o produto de um concorrente.

(30) O aumento da concentração, avaliado através do HHI, pode ser calculado independentemente da concentração geral do mercado, duplicando o produto das quotas de mercado das empresas objecto da concentração. Por exemplo, a concentração de duas empresas com quotas de mercado de 30 % e 15 % cada iria aumentar o HHI em 900 (30 × 15 × 2 = 900). A explicação desta técnica é a seguinte: ao calcular o HHI antes da concentração, as quotas de mercado das empresas objecto da concentração contribuem com quadrados individuais: (a)2 + (b)2. Após a concentração, a contribuição corresponderá ao quadrado desta soma: (a + b)2, o que é igual a a2 + b2 + 2ab. O aumento do HHI é, por conseguinte, representado pela expressão 2ab.

(31) A elasticidade cruzada dos preços da procura avalia a alteração no volume da procura de um produto, em resposta a uma alteração do preço de um outro produto, mantendo-se todas as outras condições inalteradas. A elasticidade dos preços determina a alteração da procura de um produto em resposta à alteração do preço do próprio produto.

(32) O rácio de transferência avalia a proporção das vendas de um produto que é perdida a favor de outro produto em caso de um aumento de preços.

(33) Processo COMP/M.1693, Alcoa/Reynolds.

(34) Processo T-102/96, Gencor/Comissão, Col. 1999, p. II-753, ponto 277; processo T-342/99, Airtours/Comissão, Col. 2002, p. II-000, ponto 61.

(35) Esta situação poderá ocorrer se os oligopolistas concentrarem as suas vendas em áreas diferentes por razões históricas.

(36) Processo T-342/99, Airtours/Comissão, Col. 2002, p. II-000, ponto 62.

(37) Processo T-102/96, Gencor/Comissão, Col. 1999, p. II-753, ponto 222.

(38) Ver Processo T-102/96, Gencor/Comissão, Col. 1999, p. II-753, ponto 281.

(39) Por exemplo, o mercado das consolas de jogos caracteriza-se por um forte efeito de rede. O consumidor individual pretenderá adquirir a consola de jogos que é mais popular entre os outros utilizadores, porque o número de jogos criados para essa consola específica é mais elevado e porque o número de outros utilizadores para trocar os jogos será maior.

(40) Ver, por exemplo, processo IV/M.1681, Akzo Nobel/Hoechst Roussel Vet, ponto 64.

(41) Ver, por exemplo, processo IV/M.1882, Pirelli/BICC, pontos 77-80.

(42) Processo IV/M.1313, Danish Crown/Vestjyske Slagterier (JO L 20 de 25.1.2000, p. 1, pontos 171-173).

(43) Processo IV/M.1225, Enso/Stora (JO L 254 de 29.9.1999, p. 9, ponto 89).

(44) Processo IV/M.1225, Enso/Stora (JO L 254 de 29.9.1999, p. 9, pontos 95-96).

(45) Ver, por exemplo, o processo COMP/M.1693, Alcoa/Reynolds (JO L 58 de 28.2.2002, p. 25, pontos 31-32 e 38).

(46) Ver considerando 4 do regulamento das concentrações.

(47) Ver n.o 1, alínea b), do artigo 2.o do regulamento das concentrações.

(48) Os benefícios dos ganhos de eficiência projectados no futuro sofrerão uma redução ao longo do tempo. Tal acontece, em parte, porque na maioria dos casos, quanto mais os ganhos de eficiência se projectarem no futuro, menor será o grau de probabilidade que a Comissão lhes atribuirá.

(49) Processo C-68/94, França/Comissão, Col. 1998, p. I-1375, ponto 110.

(50) Processo C-68/94, França/Comissão, Col. 1998, p. I-1375, pontos 117-120.

(51) Processos M.2810, Deloitte & Touche/Andersen UK, M.2816, Ernst & Young France/Andersen France e M.2824 Ernst & Young/Andersen Germany.