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Parecer do Comité Económico e Social sobre "A integração das pessoas com deficiência na sociedade"

Jornal Oficial nº C 241 de 07/10/2002 p. 0089 - 0097


Parecer do Comité Económico e Social sobre "A integração das pessoas com deficiência na sociedade"

(2002/C 241/17)

Em 15 de Janeiro de 2002, o Comité Económico e Social decidiu, nos termos do n.o 3 do artigo 23.o do Regimento, elaborar um parecer sobre: "A integração das pessoas com deficiência na sociedade".

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 20 de Junho de 2002, sendo relator Miguel Cabra de Luna.

Na 392.a reunião plenária de 17 e 18 de Julho de 2002 (sessão de 17 de Julho de 2002), o Comité Económico e Social adoptou, por 124 votos a favor, nenhum voto contra e 2 abstenções, o seguinte parecer.

1. Introdução

1.1. É consensualmente aceite que as pessoas com deficiência constituem cerca de 10 % da população. Isto significa que há 37 milhões de pessoas com deficiência na União Europeia e que passará a haver cerca de 50 milhões após a adesão dos países candidatos. Se somarmos a este número as famílias das pessoas com deficiência torna-se óbvio que estamos a falar de um grupo muito vasto de cidadãos da UE.

1.2. Em 3 de Dezembro de 2001, o Conselho da União Europeia aprovou a decisão que declara 2003 como Ano Europeu das Pessoas com Deficiência. Entre os objectivos fixados na decisão do Conselho estão uma maior sensibilização para os direitos das pessoas com deficiência e a busca de medidas para a sua promoção. Outros objectivos são estabelecer parcerias entre os vários interessados e prestar especial atenção ao papel do sistema educativo.

1.3. A conferência sobre deficiência realizada em Madrid em Março de 2002 aprovou a chamada Declaração de Madrid, que define um quadro de princípios para o Ano Europeu, um plano para alcançar os objectivos principais e sugestões concretas de acção para todos os interessados pertinentes. Para a inclusão social das pessoas com deficiência, é proposta uma abordagem sintética, baseada nas políticas anti-discriminatórias, e medidas de acção positiva.

1.4. Tal abordagem está de acordo com as referências às pessoas com deficiência da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que no artigo 21.o proíbe, nomeadamente, a discriminação em razão de deficiência e no artigo 26.o reconhece explicitamente os direitos das pessoas com deficiência e a necessidade de lhes assegurar independência, integração social e no trabalho e participação na vida da comunidade.

1.5. Se lhes for dado o devido apoio, as pessoas com deficiência podem dar o seu contributo à sociedade como os demais cidadãos. Por isso, é judicioso que a sociedade invista mais em políticas activas do mercado de trabalho, em especial prestando apoio a empregadores que contratem ou tencionem contratar pessoas com deficiência, o que permitirá poupanças nas políticas passivas e, assim, um sistema de segurança social mais sustentável.

1.6. As pessoas com deficiência têm os mesmos direitos que os outros cidadãos mas, na prática, as nossas sociedades estão organizadas de tal forma que frequentemente impossibilitam essas pessoas de exercerem plenamente os seus direitos civis, políticos, sociais e culturais. É por isso que a deficiência é uma questão de direitos humanos, o que deveria servir de base a todas políticas para a deficiência. As pessoas com deficiência merecem igualdade de oportunidades. Como todos os outros cidadãos, querem ter o direito a uma vida independente, o direito de optar.

1.7. As pessoas com deficiência enfrentam diversos tipos de obstáculos que dificultam a sua plena participação na sociedade, sejam eles ambientais, comportamentais, sociais, jurídicos, de comunicação ou financeiros. Os obstáculos variam significativamente de um grupo de pessoas com deficiência para outro. Para os surdos, que utilizam a linguagem gestual como a sua primeira língua, o não ser reconhecida como língua oficial cria sérios entraves à comunicação.

1.8. Muitos desses obstáculos existem porque as pessoas com deficiência são as mais das vezes esquecidas quando um novo serviço é projectado. É por isso que elas são frequentemente apelidadas de cidadãos invisíveis. Obviamente, para que a integração da deficiência se torne realidade é preciso que as pessoas com deficiência sejam visíveis, de modo que os decisores em todas as esferas da sociedade as tenham em conta quando da instalação de novos serviços. A Resolução do Conselho de 1996 sobre a igualdade de oportunidades para as pessoas deficientes afirma que é preciso integrar a deficiência em todas as áreas pertinentes da política da União Europeia. A integração da deficiência pode ser definida como a integração sistemática das prioridades e necessidades das pessoas com deficiência em todas as políticas e medidas de carácter geral com vista a promover a igualdade de oportunidades mediante uma activa e aberta ponderação, na fase de planeamento, dos seus efeitos nessas pessoas quando da sua aplicação, monitorização e avaliação. Este é essencialmente um objectivo a perseguir e não ainda uma realidade.

1.9. A Comissão Europeia publicou recentemente um estudo do Eurobarómetro (Abril de 2001)(1), que revela que em dez europeus seis conhecem alguém portador de deficiência e que 97 % dos inquiridos pensam que se deveria fazer algo mais para assegurar uma maior integração das pessoas com deficiência na sociedade.

1.10. Alguns exemplos de obstáculos que as pessoas com deficiência normalmente enfrentam são: edifícios, espaços públicos e sistemas de transporte inacessíveis, escolas que não estão preparadas para receber crianças com deficiência por falta de estruturas de apoio, inacessibilidade de informação, de serviços públicos e de sítios na Internet públicos e privados.

1.11. As pessoas com deficiência não têm apenas direitos, mas também deveres e obrigações. Os obstáculos na sociedade também dificultam muito às pessoas com deficiência o cumprimento dos seus deveres e obrigações, o que tem um custo económico para a sociedade raramente considerado. A promoção da participação das pessoas com deficiência na sociedade será também positiva do ponto de vista económico, como diversos estudos sobre os custos da exclusão e da discriminação mostraram.

1.12. O artigo 13.o do Tratado CE permite que a UE promova medidas para combater a discriminação enfrentada, entre outras, pelas pessoas com deficiência. Com base neste artigo, em Novembro de 2000, o Conselho aprovou a directiva sobre a igualdade de tratamento no local de trabalho, que inclui a deficiência entre as razões de discriminação. Este artigo foi a base da decisão do Conselho que declarou 2003 como o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência. Em Julho de 2000, o Conselho da União Europeia aprovou uma directiva comunitária sobre a igualdade de tratamento independentemente da origem racial ou étnica. O objectivo desta directiva, baseada no artigo 13.o, inclui a educação, benefícios sociais e acesso a bens e serviços.

1.13. Diversos países no mundo têm uma abrangente legislação anti-discriminação, que logrou grande êxito no combate aos obstáculos, incluindo os comportamentais, que as pessoas com deficiência encontram na sociedade. O primeiro e mais bem conhecido destes quadros jurídicos é o Americans with Disabilities Act (1990). Desde 1995, existe no Reino Unido legislação semelhante contra a discriminação, e outras legislações menos abrangentes foram adoptadas na Irlanda e na Suécia. Em outros países, tais como os Países Baixos, a Alemanha e a Espanha, estão a ser dados passos no sentido de promover legislação não discriminatória.

1.14. A comunicação da Comissão Europeia "Rumo a uma Europa sem barreiras para as pessoas com deficiência"(2) propõe compromissos para desenvolver e apoiar uma estratégia abrangente e integrada para enfrentar os obstáculos sociais, arquitecturais e de concepção que restringem o acesso de pessoas com deficiência às oportunidades sociais e económicas. A Resolução do Parlamento Europeu(3) sobre esta Comunicação da Comissão advoga um reforço urgente destes compromissos para com as pessoas portadoras de deficiência em domínios como a livre circulação, o acesso aos edifícios e espaços envolventes e aos bens e serviços. O Ano Europeu das Pessoas com Deficiência constituirá um excelente meio para materializar os compromissos assumidos pela Comissão Europeia na sua comunicação.

1.15. Os números constantes de recente publicação do Eurostat(4) mostram que as pessoas com deficiência estão confrontadas com níveis muito baixos de emprego e educação. Assim, enquanto 62 % de pessoas sem deficiência em idade activa têm emprego, apenas 24 % de pessoas com deficiência o têm. 18 % das pessoas sem deficiência alcançaram o terceiro nível de ensino contra apenas 9 % das pessoas com deficiência.

1.16. Os parceiros sociais (a CES, o CEEP e a UNICE/UAFME) adoptaram em Maio de 1999, em Colónia, a Declaração dos Parceiros Sociais Europeus sobre o emprego de pessoas com deficiência. Esta declaração afirma, nomeadamente, que "A CES, o CEEP e a UNICE/UAFEME consideram que uma abordagem da igualdade de oportunidades é o caminho certo para melhorar as oportunidades de emprego das pessoas com deficiência no mercado de trabalho aberto. A discriminação baseada em factores não pertinentes para o trabalho em questão é socialmente inaceitável e economicamente inadequada". Além disso, diz a declaração que "mediante a promoção activa do emprego das pessoas com deficiência, as empresas podem desenvolver recursos antes inexplorados e aumentar o seu potencial de inovação" e termina com um apelo dos parceiros sociais aos poderes públicos no sentido de "terem em conta as necessidades das pessoas com deficiência de forma integrada para criar uma cultura de inclusão e não de separação.".

1.17. A falta de apoio adequado em serviços e financiamento para as pessoas com deficiência tem como consequência que a responsabilidade frequentemente recai sobre a família da pessoa com deficiência. É especialmente o caso das pessoas muito dependentes, em que a falta de apoio conduz ou ao internamento em instituições ou a situações familiares muito difíceis, incluindo em casos extremos a necessidade de um dos membros da família ter de abandonar o trabalho para se devotar ao cuidado do membro da família com deficiência. O que está em causa é dispor de recursos e serviços adequados e permitir às famílias conciliar a vida familiar com o trabalho(5). Se as despesas suplementares decorrentes da deficiência não forem garantidas pelas entidades públicas, terão de ser suportadas pelos próprios deficientes e suas famílias, levando, na maior parte das vezes, a situações de pobreza.

1.18. A imagem das pessoas com deficiência na sociedade nem sempre é a adequada, tendo como consequência fracas expectativas em relação a essas pessoas mas também a estigmatização de alguns grupos de deficientes, tais como as pessoas com problemas mentais. Na estratégia para melhorar esta imagem os meios de comunicação social têm um importante papel. As pessoas com deficiência devem também estar presentes em todos os níveis da sociedade: como políticos a nível local, nacional e europeu, como empregadores e gestores e à frente de sindicatos.

1.19. Estes vários factores conduzem com frequência à exclusão social e à pobreza. É por isso que as pessoas com deficiência foram consideradas na estratégia da UE contra a exclusão social e a pobreza como um dos grupos mais vulneráveis em risco de exclusão social e pobreza. Um relatório recente(6) produzido sob a égide do Fórum Europeu da Deficiência e levado a cabo pela Universidade de Atenas em cooperação com diversas organizações europeias de deficientes analisa os diversos factores que levam à exclusão das pessoas com deficiência. Os principais factores destacados no estudo são: nenhum ou pouco acesso ao ambiente social e aos serviços, a falta de emprego e de adequada educação, a estigmatização com que se deparam as pessoas com deficiência e a insuficiente compensação dos custos extra relacionados com a deficiência. O relatório mostra também como a discriminação das pessoas com deficiência conduz à exclusão social e à pobreza.

1.20. As pessoas com deficiência constituem um grupo muito diversificado, e a política para a deficiência precisa de ter em conta esta diversidade. Precisa de ser prestada especial atenção às pessoas com grande dependência, incapazes de assegurar a sua própria representação, as quais requerem serviços adequados projectados em cooperação e consulta com os seus pais ou acompanhantes.

1.21. Seguindo uma proposta do governo do México, o Terceiro Comité das Nações Unidas aprovou na sua reunião de Novembro de 2001 a criação de um comité eventual para estudar a viabilidade de promover uma convenção das Nações Unidas sobre os direitos das pessoas com deficiência. A primeira reunião do comité eventual terá lugar antes do Outono de 2002.

1.22. O Comité Económico e Social Europeu, no seu parecer sobre o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, adoptado em 10 de Outubro de 2001, solicitava à Comissão Europeia que apresentasse uma proposta de directiva da UE para promover a igualdade de tratamento e combater a discriminação em razão de deficiência na linha da directiva da UE sobre a igualdade de tratamento independentemente da origem étnica. Propunha-se também no parecer a aprovação de um programa de acção específico sobre a deficiência, que financiaria um método aberto de coordenação das políticas para a deficiência. O parecer incluía a proposta de elaboração de um parecer de iniciativa em 2002 como contributo para o planeamento do Ano Europeu em 2003.

2. Observações na generalidade

2.1. O Ano Europeu das Pessoas com Deficiência em 2003 constitui uma oportunidade única para fazer avançar o programa de trabalho respeitante à deficiência na União Europeia. Deve ser visto como o arranque de um processo que continuará para além dele.

2.2. O poder público a todos os níveis, das instituições da UE ao poder local, deve dar o exemplo neste processo.

2.3. O êxito do Ano Europeu assenta na participação activa de todos os interessados a todos os níveis, os quais devem criar parcerias duradouras.

2.4. A política em matéria de deficiência é essencialmente da competência nacional. Medidas da UE, por via de directivas ou do uso do método de coordenação aberto referente especificamente a pessoas com deficiência, estão a influenciar cada vez mais as políticas nacionais. Por isso, a futura política em matéria de deficiência precisa de ter em conta a adequada complementaridade das políticas da UE e nacionais, obviamente complementada pela crescente competência dos poderes públicos regionais e locais.

2.5. As acções que melhorem as condições das pessoas com deficiência conduzirão a uma sociedade melhor. Se os serviços forem projectados de modo a serem acessíveis às pessoas com deficiência, sê-lo-ão também para todos os cidadãos e, em especial, para os idosos.

2.6. A grande maioria das pessoas com deficiência são membros ou integram associações que foram criadas para proteger os seus direitos. Estas associações estão presentes a todos os níveis, local, regional, nacional e internacional. Todas as acções a realizar no Ano Europeu das Pessoas com Deficiência 2003 devem incluir como um dos parceiros organizações de deficientes. Já lá vai o tempo em que eram tomadas iniciativas em representação de pessoas com deficiência sem a sua participação activa.

2.7. As medidas para melhorar a inserção dessas pessoas na sociedade são variadas, devendo combinar iniciativas jurídicas com aspectos de educação pública.

3. Objectivos a desenvolver no Ano Europeu

3.1. O Ano Europeu das Pessoas com Deficiência deve iniciar o processo de eliminação progressiva dos obstáculos que as pessoas com deficiência encontram em todos os aspectos da vida, em especial na educação e no acesso aos bens e serviços. Deve também proporcionar o apoio de que essas pessoas e suas famílias precisam para usufruírem de efectiva igualdade de oportunidades.

3.2. Alguns destes obstáculos (ambientais, comunicacionais) podem ser ultrapassados por meio de medidas jurídicas, outros (comportamentais) requerem campanhas de sensibilização. Umas e outras exigem o empenho e a cooperação de todos os interessados.

3.3. A grande maioria das pessoas com deficiência em idade activa pode e tem vontade de trabalhar. O aumento da sua empregabilidade traduzir-se-á em níveis de emprego mais elevados desse grupo de pessoas, um dos meios para assegurar a sua participação social. A recente directiva da UE sobre a igualdade de tratamento no local de trabalho é uma contribuição útil para melhorar os níveis de emprego de pessoas com deficiência. Contudo, precisa de ser complementado com uma acção positiva adequada, especialmente proporcionando apoio apropriado aos empregadores que as contratarem.

3.4. Em 2002, o estudo da UE sobre a força de trabalho incluirá um módulo específico sobre deficiência, que fornecerá pela primeira vez estatísticas comparáveis sobre o emprego dessas pessoas.

3.5. O papel dos parceiros sociais é vital. Há muitos exemplos de boas práticas entre os empregadores, quer ao contratarem pessoas com deficiência, quer concebendo os seus bens e serviços de forma a torná-los acessíveis. Contudo, muito mais poderia ser feito para dar a conhecer estes exemplos a outros empregadores. O exemplo do Fórum de Empregadores do Reino Unido sobre Deficiência é um modelo interessante, que ainda não foi seguido noutros Estados-Membros. Os empregadores devem encarar isto como parte do envolvimento geral das empresas na comunidade na linha do Livro Verde sobre a Responsabilidade Social das Empresas.

O papel da cooperação social pode ser determinante como instrumento de luta contra a exclusão social das pessoas com deficiência. Estas, através da criação de cooperativas e de outras formas de inserção laboral, adquirem dignidade e autonomia, realizando-se, assim, a plena integração no tecido social.

3.6. Essencial nesta matéria é também o papel dos sindicatos, particularmente para assegurar que as pessoas com deficiência, uma vez empregadas, beneficiem da igualdade de oportunidades, incluindo a sua promoção interna. Desempenham também um papel essencial na divulgação da directiva da União Europeia sobre a igualdade de tratamento no local de trabalho. Têm também um importante papel as associações e fundações que prestam serviços sociais e oportunidades de emprego àquelas pessoas.

3.7. Uma vertente importante das políticas de emprego para as pessoas com deficiência é a manutenção do emprego, tal como sublinhado num recente estudo da OECD(7) e bem assim nas últimas iniciativas da Agência Europeia para a Saúde e a Segurança no Trabalho. Muitas das pessoas com deficiência adquirem-na em idade activa, contudo poucos esforços são feitos para os manter no mercado de trabalho. Há diferentes modelos interessantes de preservar o emprego. Por exemplo, um conceito interessante de modelo de licença por deficiência foi proposto no Reino Unido por uma organização de deficientes(8) e está actualmente em fase de desenvolvimento. O conceito, semelhante ao da licença de maternidade, permite que, em caso de deficiência adquirida, a pessoa possa abandonar o seu emprego durante algum tempo para a necessária reabilitação e retomar o trabalho na mesma empresa. Deve ser garantido o pleno acesso dos deficientes à aprendizagem ao longo da vida.

3.8. A educação é para as pessoas com deficiência como para todos os demais cidadãos um elemento fundamental para o emprego e a participação social em geral. As crianças com deficiência devem, em regra geral, seguir uma educação inclusiva, útil não só para elas, mas também indispensável para que as crianças sem deficiência conheçam melhor o direito das pessoas com deficiência a ocuparem um lugar em pé de igualdade numa sociedade diversificada. Para que a educação inclusiva tenha bons resultados, as crianças e os jovens com deficiência devem beneficiar do apoio adequado exigido pela sua incapacidade específica.

3.9. A educação especial apenas pode ser considerada como opção para crianças com deficiência quando essa decisão for tomada com os pais da criança em questão. As escolas especiais devem assegurar uma educação de qualidade equivalente à dos estabelecimentos do sistema de ensino regular, que será sujeita a uma avaliação periódica.

3.10. O Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - 2003 deve significar, em especial, progresso para as pessoas com deficiência, em maior risco de exclusão e para aquelas que enfrentam duplas e múltiplas discriminações: mulheres com deficiência e pessoas com deficiência pertencentes a minorias étnicas. Deverá ser dada especial atenção às pessoas muito dependentes e às suas famílias e acompanhantes, a fim de criar estruturas de apoio que lhes garantam o acesso ao conjunto dos direitos humanos.

3.11. Recentemente têm-se feito alguns progressos em áreas de política social, transportes e sociedade da informação, onde a maior parte das últimas iniciativas levam em conta as pessoas com deficiência. Não é esta a situação em muitas outras áreas, o que demonstra que é necessário reforçar a necessidade de integração.

3.12. É preciso realizar esforços especiais para integrar a deficiência em todas as áreas pertinentes da política da UE. Tais esforços podem ser levados a cabo durante o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - 2003, mas devem prosseguir depois. Embora as pessoas com deficiência não estejam formalmente excluídas de qualquer destas áreas, a falta de visibilidade conduz, na prática, à sua exclusão. Por isso, são necessárias referências específicas às pessoas com deficiência em todas as medidas pertinentes, devendo, quando apropriado, ser introduzidas alterações que lhes permitam beneficiar plenamente destas iniciativas e para elas contribuírem.

3.13. Entre as iniciativas da UE que requerem referências específicas às pessoas com deficiência estão as políticas comunitárias de defesa do consumidor, as iniciativas em matéria de direitos humanos, o programa de acção comunitário para a juventude, programas e iniciativas em matéria de educação (Socrates, Comenius, Leonardo da Vinci), programas nos domínios da cultura e da comunicação social, acções no âmbito dos desportos, em particular relacionadas com o previsto Ano Europeu da Educação pelo Desporto em 2004.

3.14. As pessoas com deficiência e os seus pais devem participar nos trabalhos dos vários processos da UE que aplicam o método de coordenação aberto, tais como em matéria de educação, juventude e pensões. Tal apenas pode ser alcançado se as instituições da UE e os Estados-Membros se empenharem activamente em assegurar a inclusão das questões da deficiência nestes trabalhos e a participação neles das organizações que representam as pessoas com deficiência. Os indicadores estatísticos que vierem a ser definidos para apoiar este processo deverão fornecer informação sobre a situação das pessoas com deficiência.

3.15. A política em matéria de deficiência continua a ser, em geral, matéria da competência nacional. Embora a deficiência esteja incluída na Estratégia Europeia de Emprego e na estratégia comunitária contra a exclusão social e a pobreza, o foco nas pessoas com deficiência varia significativamente de um para outro Estado-Membro, o que não favorece a existência de uma situação global e comparável entre os diversos Estados-Membros. Esta é uma oportunidade perdida, já que os Estados-Membros não podem tirar suficiente partido do intercâmbio das suas políticas e exemplos de boas práticas. Há uma falta generalizada de indicadores e dados sobre a situação das pessoas com deficiência, o que torna quase impossível comparar a eficácia das políticas nacionais.

3.16. O Ano Europeu das Pessoas com Deficiência deve representar um avanço no intercâmbio entre os Estados-Membros e os países candidatos à adesão sobre as políticas nacionais em matéria de deficiência.

3.17. As pessoas com deficiência devem ter acesso aos mesmos serviços que os demais cidadãos. Tal significa que as suas necessidades devem ser atendidas nas primeiras fases do processo de planeamento, o que inclui decisões de planeamento de espaços públicos como restaurantes, cinemas, teatros, centros comerciais, museus, parques, estádios. Não garantir o acesso dessas pessoas a estes serviços constitui o desrespeito pelos direitos humanos fundamentais, mas significa também, de um ponto de vista económico, que os empresários estão a negligenciar uma parte importante dos seus potenciais consumidores. As organizações de consumidores têm uma importante contribuição a dar em apoio deste trabalho para que ele se possa tornar realidade. Um bom exemplo é o do recente estudo de uma organização de consumidores espanhola, que revela que 50 % das instalações não são acessíveis às pessoas com deficiência.

3.18. Como todos os outros cidadãos, as pessoas com deficiência devem ser membros activos da sociedade e ter a possibilidade de participar em diversas organizações: partidos políticos, organizações religiosas, clubes desportivos, grupos e associações ecologistas. Todas estas organizações precisam de se organizar de forma a que as pessoas com deficiência nelas possam participar.

3.19. A imagem que os meios de comunicação social dão das pessoas com deficiência precisa de ser melhorada. A informação e os programas devem basear-se numa abordagem que reconheça os direitos das pessoas com deficiência e chamem a atenção para as barreiras que essas pessoas enfrentam para participar plenamente na sociedade.

3.20. O Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - 2003 não se deve limitar às pessoas com deficiência residentes na União Europeia, mas beneficiar também as dos países candidatos à adesão onde a situação dessas pessoas é, muitas vezes, ainda pior do que na UE. Além disso, as pessoas com deficiência em países em desenvolvimento devem também beneficiar dos resultados do Ano Europeu através do aumento da visibilidade nas políticas de cooperação para o desenvolvimento da UE.

3.21. O direito dos deficientes a participarem no processo de decisão através das suas organizações representativas deve ser reforçado no Ano Europeu no âmbito da iniciativa global para promover um diálogo civil estruturado a nível da UE. Isto também beneficia directamente os decisores, que nem sempre se preocupam com a forma de definir políticas de modo a elas abrangerem adequadamente as pessoas com deficiência. O processo de chegar ao presente parecer pode ser dado como exemplo de boa prática, pois foi organizada uma audição pública com representantes do movimento das pessoas deficientes no sentido de auscultar as suas opiniões, o que permitiu compreender melhor a situação e as principais reivindicações do movimento, bem como realçar a sua diversidade.

4. Propostas concretas

4.1. Tendo em vista os objectivos definidos na secção anterior, o Comité Económico e Social Europeu considera que as propostas que se seguem seriam úteis para os alcançar.

4.2. Deve ser definido a nível da UE um programa de acção específico em matéria de deficiência, cujas principais finalidades seriam:

a) apoiar a integração da deficiência em todas as políticas pertinentes da UE, reforçar os actuais mecanismos de consulta e monitorização e promover a sensibilização dos principais decisores para a deficiência;

b) apoiar o estabelecimento de um método de coordenação aberto em matéria de deficiência, baseado em indicadores de resultados comuns que permitam acompanhar a evolução dos níveis de integração social das pessoas com deficiência. Este método abrangeria todas as áreas pertinentes da política em matéria de deficiência, tais como educação, formação, aprendizagem ao longo da vida, emprego, transportes, sociedade da informação, sistemas de benefícios, serviços para pessoas com grau elevado de dependência e suas famílias. Devem ser dados exemplos de boas práticas em cada uma destas áreas, o que será útil para todos os Estados-Membros e, em particular, também para os países que adiram à União Europeia num futuro próximo;

c) assegurar e reforçar a participação de organizações de pessoas com deficiência no diálogo civil a nível da UE, incluindo a disponibilidade de adequados financiamentos e mecanismos de consulta;

d) incluir as fundações e associações de solidariedade que prestem serviços sociais a pessoas com deficiências.

4.3. Para contribuir para a eliminação das actuais e prevenção de novas barreiras e como importante contribuição do Ano Europeu para o progresso do programa de trabalho em matéria de deficiência, deverá ser aprovada uma directiva da UE baseada no artigo 13.o que proíba a discriminação de pessoas com deficiência em todos os aspectos da vida, incluindo a educação e o acesso a bens e serviços. A directiva deve fixar prazos razoáveis para que as actuais infra-estruturas inacessíveis se tornem gradualmente acessíveis e prever adequados mecanismos de aplicação, incluindo um organismo de monitorização independente em cada Estado-Membro incumbido de acompanhar a aplicação da directiva a nível nacional.

4.4. Para aumentar os níveis de emprego de pessoas com deficiência, o Comité Económico e Social Europeu gostaria de fazer as seguintes sugestões:

a) Os Estados-Membros devem assegurar a rápida e adequada aplicação da directiva da UE sobre a igualdade de tratamento no local de trabalho.

b) A Comissão Europeia deve propor, e os Estados-Membros aceitar, o reforço da actual orientação 7 das Orientações para as Políticas de Emprego, que se refere às pessoas com deficiência, obrigando os Estados-Membros a definir urgentemente objectivos concretos para o emprego dessas pessoas e a prever incentivos para os empregadores que as contratem.

c) Os parceiros sociais a nível da UE devem ponderar a utilização da estrutura de mecanismos de diálogo social da UE para propor novas iniciativas para o emprego de pessoas com deficiência, incluindo a manutenção dos postos de trabalho.

d) Na linha da recente decisão do Parlamento Europeu em primeira leitura, alterar as directivas sobre contratos públicos de modo a permitir aos poderes públicos incluir o emprego de pessoas com deficiência como critério de adjudicação e requerer, quando pertinente, que os produtos e serviços sejam concebidos e produzidos de forma a que as pessoas com deficiência a eles possam ter acesso.

e) Devem ser criadas redes nacionais e comunitárias de empregadores e de sindicatos envolvidos no emprego de pessoas com deficiência.

f) A fim de acompanhar os resultados destas diferentes medidas, o Inquérito à Força de Trabalho da UE deverá incluir permanentemente informação sobre a situação dos deficientes no mercado de trabalho.

4.5. O novo método de coordenação aberto em matéria de educação deve incluir as crianças e jovens com deficiência como um dos principais grupos-alvo, e todas as acções e indicadores os devem considerar. O Dia Europeu das Pessoas com Deficiência em 2002 será dedicado ao tema "Educação para todos", o que deveria ser aproveitado para preparar a participação activa de todo o sistema escolar no Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - 2003.

4.6. Quando adequadamente desenvolvidas, as novas tecnologias, tanto as tradicionais como as auxiliares, podem desempenhar um papel essencial para suplantar os obstáculos com que os deficientes se confrontam. Por conseguinte, o próximo sexto programa-quadro em matéria de investigação e desenvolvimento, o pacote legislativo sobre prestação de serviços no domínio das telecomunicações e o novo plano de acção eEurope 2005 deverão prever que a deficiência seja considerada uma questão horizontal e comportar iniciativas de apoio destinadas especificamente a deficientes. Deverão também ser envidados esforços suplementares para eliminar todos os entraves, jurídicos e outros, que impedem actualmente o estabelecimento de um verdadeiro mercado europeu de tecnologias de assistência, e prever, a nível nacional, o apoio financeiro adequado às pessoas com deficiência que têm necessidade de utilizar essas tecnologias.

4.7. Para assegurar a plena visibilidade das pessoas com deficiência na estratégia da UE contra a exclusão social e a pobreza, os indicadores que servirão para medir a eficácia das políticas nacionais neste campo deveriam incluir uma repartição por deficiência. As organizações representantes de pessoas com deficiência devem participar na concepção, aplicação e avaliação dos planos de acção nacionais contra a exclusão social e a pobreza.

4.8. O Comité compromete-se a agir no sentido de que, internacional e nacionalmente, sejam promovidas e apoiadas as empresas que visam a inserção das pessoas com deficiências no tecido social. Em especial, o Comité apoia e incentiva as empresas cooperativas e outras organizações sociais.

4.9. Para apoiar os direitos humanos das pessoas com deficiência também a nível mundial, o Comité Económico e Social Europeu defende a necessidade de assegurar que essas pessoas sejam adequadamente contempladas nas políticas de cooperação para o desenvolvimento da UE e dos Estados-Membros.

4.10. O Comité Económico e Social Europeu compromete-se a apoiar a Declaração de Madrid e a contribuir para a consecução dos seus objectivos e sua ampla divulgação.

4.11. Recomenda a todos os intervenientes, públicos e privados, locais, nacionais e comunitários, que abordem as acções do Ano Europeu tendo presente a recente Declaração de Madrid, que traça o quadro de princípios para o Ano Europeu e sugere acções concretas a empreender pelas várias partes interessadas. Em particular, os meios de comunicação social, as organizações de consumidores, de juventude e religiosas, os clubes desportivos, as associações e outros interessados devem aproveitar o Ano Europeu para melhorar os seus serviços e trabalhar no sentido de assegurar que as pessoas com deficiência possam beneficiar deles e para eles contribuir.

4.12. O Comité Económico e Social Europeu compromete-se a incluir a deficiência no seu trabalho e a considerar os interesses, direitos e deveres das pessoas com deficiência em todos os pareceres, incluindo, se pertinente, referências específicas a essas pessoas. Convirá preparar um documento que chame a atenção dos relatores para esta questão e lhes dê orientações sobre o modo de ter em conta a deficiência e os deficientes, recomendando-lhes explicitamente a consulta às organizações representativas das pessoas com deficiência. Deverá ser feita uma avaliação regular sobre o modo como a deficiência é tida em conta nos diferentes pareceres do Comité Económico e Social Europeu.

4.13. O Comité Económico e Social Europeu participará activamente na avaliação do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência - 2003 a fim de continuar a formular propostas que favoreçam a inserção social das pessoas com deficiência e procederá a uma avaliação periódica dos progressos nas políticas comunitárias a elas destinadas.

4.14. O CESE congratula-se com a proposta apresentada pelo relator especial das Nações Unidas sobre deficiência e aprovada pela Comissão das Nações Unidas para o Desenvolvimento Social de reforçar o conteúdo das normas das Nações Unidas e manter a actual estrutura de acompanhamento. Além disso, o Comité Económico e Social Europeu apoia a iniciativa aprovada pelas Nações Unidas de iniciar o processo de preparação de uma convenção das Nações Unidas sobre os direitos das pessoas com deficiência, garantindo-lhes o pleno benefício das actuais convenções internacionais.

4.15. O Comité Económico e Social Europeu terá em conta o conteúdo do presente parecer nos seus trabalhos no âmbito da Convenção sobre o futuro da Europa.

4.16. O Comité Económico e Social Europeu transmitirá o presente parecer às organizações europeias e nacionais interessadas na questão da deficiência.

Bruxelas, 17 de Julho de 2002.

O Presidente

do Comité Económico e Social

Göke Frerichs

(1) Relatório 54.2 do Eurobarómetro (Abril de 2001).

(2) COM(2000) 284.

(3) Resolução sobre "Rumo a uma Europa sem barreiras para as pessoas com deficiência" A5-0084/2001.

(4) "Deficiência e participação social na Europa" Eurostat, 2001.

(5) "Ressources, services, temps: trois éléments inséparables d'une politique familiale" ("Recursos, Serviços, Tempo: três elementos inseparáveis de uma política familiar") Cofaxe Handicap, Abril de 2001.

(6) "Deficiência e exclusão social na União Europeia: tempo de mudança, instrumentos de mudança", relatório produzido por 8 organizações de deficientes sob a égide do Fórum Europeu da Deficiência e levado a cabo pela Universidade de Atenas.

(7) "Projecto de estudo internacional sobre estratégias para a manutenção e a inserção no emprego das pessoas com deficiência" de Patricia Thornton, Unidade de Investigação de Política Social da Universidade de Iorque.

(8) The Royal National Institute for the Blind (RNIB) (O Real Instituto Nacional do Cego).