52002AE1027

Parecer do Comité Económico e Social sobre a "Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às condições de trabalho dos trabalhadores temporários" (COM(2002) 149 final — 2002/0072 (COD))

Jornal Oficial nº C 061 de 14/03/2003 p. 0124 - 0130


Parecer do Comité Económico e Social sobre a "Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às condições de trabalho dos trabalhadores temporários"

(COM(2002) 149 final - 2002/0072 (COD))

(2003/C 61/21)

Em 22 de Abril de 2002, o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 137.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, a Secção de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania adoptou o presente parecer em 4 de Setembro de 2002, sendo relatora A. Le Nouail-Marlière.

Na 393.a reunião plenária de 18 e 19 de Setembro de 2002 (sessão de 19 de Setembro), o Comité Económico e Social adoptou, por 83 votos a favor, 75 votos contra e 12 abstenções, o presente parecer.

1. Introdução

1.1. A partir do início dos anos oitenta, o trabalho temporário tornou-se uma componente cada vez mais importante do mercado de trabalho na Europa. Perante este fenómeno, o Conselho e o Parlamento aprovaram algumas resoluções(1), nas quais sublinhavam a necessidade de adoptar uma acção comunitária com vista, nomeadamente, a enquadrar a prática do trabalho temporário e a assegurar a protecção dos trabalhadores em causa. Em 1982, a Comissão apresentava a estas duas instituições uma proposta de Directiva neste sentido, que foi alterada em 1984 e não chegou a ser aprovada.

1.2. Em 1990, a Comissão tinha proposto "um conjunto de disposições fundamentais destinadas a assegurar um mínimo de coerência entre estas diferentes formas de contratos de trabalho atípico: trabalho a tempo parcial, contratos a termo e trabalho temporário(2)".

1.3. Esta iniciativa inscrevia-se no âmbito do programa de acção associado à Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, que alvitrava que estas novas condições de vida e trabalho fossem objecto de uma "aproximação no progresso".

1.4. Apenas esta última proposta, que se referia aos trabalhadores temporários e pretendia garantir-lhes as mesmas condições de higiene e de segurança que eram dadas aos trabalhadores da empresa utilizadora, conduziu à aprovação da Directiva 91/383/CEE do Conselho, de 25 de Junho de 1991.

1.5. Perante a ausência de progressos a nível do Conselho relativamente às iniciativas descritas, a Comissão decidiu dar início ao procedimento previsto no artigo 3.o do acordo relativo à política social apenso ao Protocolo n.o 14 em matéria de política social, anexo ao Tratado que institui a Comunidade Europeia (novos artigos 137.o e 138.o do Tratado da União Europeia - Diálogo Social). Dois acordos sobre o trabalho parcial e o trabalho a tempo certo, concluídos por três organizações representativas - a UNICE, o CEEP e a CES(3) -, foram aplicados pelas Directivas do Conselho 97/81/CE, de 15 de Dezembro de 1997, e 1999/70/CE, de 28 de Junho de 1999, respectivamente. Esta última valorizava o princípio de não discriminação dos trabalhadores em função do contrato de trabalho.

1.6. Em Maio de 2000, os parceiros sociais decidiram encetar uma nova negociação sobre o terceiro vector da iniciativa lançada pela Comissão, que incidia no trabalho "atípico", na flexibilidade do tempo de trabalho e na segurança dos trabalhadores, em relação, desta vez, ao trabalho temporário. Porém, em 21 de Maio de 2001, reconheceram a inviabilidade de um acordo.

1.7. O ponto de ruptura deu-se no momento de definir os elementos de comparação de uma possível igualdade de tratamento entre um trabalhador temporário e um trabalhador assalariado efectivo da empresa utilizadora de referência, incluindo condições de trabalho e de remuneração, ou de uma igualdade de tratamento entre os assalariados temporários numa mesma agência de trabalho temporário.

1.8. Após 10 meses, a Comissão voltou a exercer o direito de iniciativa apresentando o projecto de Directiva em apreço(4). O Comité precisa que, para esclarecimento dos aspectos particulares das condições de trabalho e de emprego e da saúde e segurança no trabalho, se podem consultar dois relatórios(5).

1.9. O trabalho temporário, para além da diversidade de situações jurídicas nos Estados-Membros, de que os parceiros sociais e a Comissão estão conscientes, é afectado, sobretudo, por uma diversidade estrutural e social. Com efeito, em países cujas economias nacionais assentam preponderantemente nos serviços, os trabalhadores temporários são, sobretudo, empregados ou quadros nesse sector, constituindo, em alguns casos, a maioria do pessoal temporário. Em outros países, pelo contrário, em que o desenvolvimento industrial ou agrícola depende principalmente de sectores que empregam mão-de-obra "de apoio", a utilização e as condições para recurso ao trabalho temporário são estruturadas de modo diferente. É evidente que, em todos os casos, o trabalho temporário é utilizado para substituir trabalhadores ausentes (doença, maternidade, férias), mas essa já não é a circunstância mais comum em que a ele se recorre. As razões para a sua utilização têm variado, desde o final dos anos oitenta: desde ser a solução para a sazonalidade em alguns sectores agrícolas, agroalimentares ou da grande distribuição até constituir o esquema utilizado para aumentar a "flexibilização" das condições de trabalho de diferentes indústrias, passando pela generalização da produção em função da procura (produção just in time). As recomendações do Comité têm particularmente em conta estas diversas condições, não descurando, porém, os objectivos de "pleno emprego" fixados pelo Conselho de Lisboa.

1.10. O Comité chama ainda a atenção para o facto de as grandes empresas de trabalho temporário que operam no "mercado" europeu serem holdings suíças ou americanas, seguidas de grupos neerlandeses, britânicos, belgas ou franceses(6).

1.11. O trabalho temporário atinge, consoante os países e as fontes, 2 a 10 % da população assalariada e 30 a 50 % dos que acedem pela primeira vez ao mercado de trabalho (jovens de menos de 25 anos).

2. Síntese da proposta de directiva - Preâmbulo e três capítulos sobre as disposições gerais, condições de trabalho e de emprego e disposições finais

2.1. O âmbito de aplicação da proposta de Directiva abrange o "contrato de trabalho ou a relação de trabalho entre uma empresa de trabalho temporário", identificada como o empregador, e um "trabalhador disponibilizado a fim de trabalhar para uma empresa utilizadora, a quem caberá o controlo", bem como "as empresas públicas ou privadas que exercem uma actividade económica". Podem ser excluídos os "contratos concluídos no âmbito de um programa de formação, de inserção e de reconversão profissionais público específico ou apoiado pelos poderes públicos".

2.2. O artigo 2.o do Capítulo I fixa o objecto da directiva: melhorar a qualidade do trabalho temporário garantindo o cumprimento do princípio de não discriminação relativamente aos trabalhadores temporários e estabelecer um quadro de utilização do trabalho temporário de modo a contribuir para o bom funcionamento do mercado de trabalho. O artigo 3.o estabelece as definições, ao passo que no artigo 4.o são introduzidas cláusulas de reexame das proibições ou restrições nos Estados-Membros.

2.3. No Capítulo II, o artigo 5.o consagra o princípio de não discriminação e de igualdade de tratamento, estabelece quatro derrogações e define as respectivas condições de aplicação.

2.4. O artigo 6.o estipula o acesso dos trabalhadores temporários a lugares vagos efectivos na empresa utilizadora e proíbe que sejam cobrados honorários aos trabalhadores. Determina também que os serviços sociais da empresa utilizadora beneficiem os trabalhadores temporários e que o acesso destes às oportunidades de formação seja definido pelos Estados-Membros ou pelos parceiros sociais.

2.5. O artigo 7.o prevê a representação dos trabalhadores temporários na empresa de trabalho temporário e que eles sejam tidos em conta para o cálculo dos limiares na empresa utilizadora; o artigo 8.o prevê que seja fornecida aos representantes dos trabalhadores nas instâncias representativas da empresa utilizadora informação sobre o recurso ao trabalho temporário na sua empresa.

2.6. O Capítulo III inclui as disposições finais, nomeadamente os requisitos mínimos (artigo 9.o), que estabelecem que não haverá prejuízo para as disposições mais favoráveis em vigor nos Estados-Membros, as melhorias e modificações ao abrigo de convenções colectivas ou acordos e o respeito do nível geral de protecção dos trabalhadores nos domínios abrangidos pela proposta.

2.7. Por fim, os artigos 10.o, 11.o, 12.o e 13.o constituem as habituais disposições.

3. Observações na generalidade

3.1. No plano internacional, a Convenção n.o 181 de 1997 da OIT sobre as agências de emprego privadas foi adoptada em 9 de Junho de 1997 e, desde 23 de Março de 2002, ratificada pela Espanha, Finlândia, Itália, Países Baixos e Portugal. Entre os países candidatos à adesão, a República Checa também já procedeu à sua ratificação. A Convenção, ao levantar a interdição de exercício de actividade que se aplica às agências de emprego privadas, visa proteger os trabalhadores que recorram aos seus serviços e precisa o tipo de medidas que os Estados deverão tomar a fim de garantir uma protecção adequada dos trabalhadores temporários. O Comité encoraja os Estados-Membros que ainda o não fizeram a ratificar a referida convenção.

3.2. A nível europeu, convém recordar o princípio de igualdade de tratamento entre os trabalhadores, nomeadamente, as diferentes directivas e decisões que dizem respeito à não discriminação em razão do sexo, nacionalidade, origem étnica, filiação em grupos, convicções políticas e religiosas, deficiência, idade ou orientação sexual(7) e que são sinal da importante harmonização realizada pela União Europeia neste domínio.

3.3. Convém também lembrar que a Carta Social (revista) do Conselho da Europa, a Carta dos Direitos Fundamentais da OIT e a Convenção Europeia de Protecção dos Direitos do Homem, bem como as Convenções da OIT ratificadas por todos os Estados-Membros(8) garantem a liberdade sindical e a igualdade no trabalho e no emprego para todos os trabalhadores.

4. Disposições gerais

4.1. Título da directiva

Por uma questão de coerência com o resto do texto da proposta, o Comité sugere que o título inclua "condições de trabalho e de emprego dos trabalhadores temporários".

4.2. Âmbito de aplicação

4.2.1. N.o 1 do artigo 1.o

O Comité faz notar que a proposta se aplica apenas ao contrato de trabalho, não havendo qualquer referência no âmbito de aplicação ao contrato comercial entre empresas de trabalho temporário e empresas utilizadoras. O Comité considera, no entanto, que as disposições desses contratos respeitantes às condições de disponibilização de trabalhadores temporários não deverão entrar em conflito com as disposições da Directiva em apreço. Importa que isso fique bem claro, quer como excepção ao âmbito de aplicação, quer nas disposições finais, para evitar qualquer incoerência jurídica no direito interno dos Estados-Membros quando da transposição.

4.2.2. N.o 2 do artigo 1.o

O Comité recorda que é vedado a algumas administrações públicas, em conformidade com as respectivas legislações nacionais, recrutarem trabalhadores com contratos temporários, e propõe que as "empresas" públicas sejam diferenciadas das "administrações" públicas, em função da situação em cada país.

4.2.3. N.o 3 do artigo 1.o

O Comité propõe que a redacção deste ponto seja alterada, substituindo "Os Estados-Membros, após consulta dos parceiros sociais, podem prever ..." por "Existindo acordos com os parceiros sociais, os Estados-Membros podem prever ...".

4.3. Objecto (artigo 2.o)

Atendendo a que o ponto 1 do artigo 2.o implica consequências humanas e que o ponto 2, pelo contrário, se prende com o aspecto económico do mercado de trabalho, o Comité aprova os princípios de igualdade de tratamento, ou seja, de "não discriminação" de trabalhadores em relação a outros trabalhadores, evocados no preâmbulo e tratados no artigo 5.o da proposta de directiva. Acrescentaria, no entanto, um outro objectivo, que consistiria em elevar o nível das normas e protecções sociais, a fim de reforçar a coesão económica e social.

4.4. Definições (artigo 3.o)

4.4.1. "Trabalhador comparável"

A antiguidade aqui referida significa a antiguidade na empresa utilizadora. Para evitar qualquer discriminação, para além das qualificações e competências, deveria ser também contabilizada a antiguidade do trabalhador temporário na profissão, pois, ao recrutar pessoas para um trabalho temporário, é também baseando-se nos certificados de trabalho emitidos que a agência faz a sua escolha. Alguns Estados-Membros estabelecem, por via da respectiva legislação nacional ou de convenções, disposições que mencionam uma "qualificação equivalente, após um período experimental, de um assalariado que ocupe o mesmo posto de trabalho". No entanto, estas disposições não têm em conta a antiguidade dos trabalhadores temporários na profissão ou sector de actividade, o que constitui uma desigualdade de tratamento fundamental decorrente do seu estatuto, que poderia ser corrigida pelos parceiros sociais e ao nível dos Estados-Membros, se a isso a proposta de Directiva os encorajasse.

4.4.2. "Condições fundamentais de trabalho e de emprego"

O Comité verifica que as condições fundamentais de trabalho e de emprego incluem a remuneração (n.o 1, alínea d), ii), do artigo 3.o). Se bem que o artigo 137.o do Tratado CE mantenha as atribuições dos Estados-Membros em matéria de protecção social de base e de direitos à aposentação, o Comité salienta que, em relação aos trabalhadores temporários, esses direitos revelam ser condições fundamentais de trabalho e de emprego tanto no que respeita à aquisição dos direitos e à duração de trabalho necessária para a sua obtenção como à reconstituição dos percursos profissionais que contam para o efeito(9). Os Estados-Membros deveriam ser encorajados a, tal como ocorreu em relação à Directiva sobre os contratos a termo, tomarem as medidas complementares para adaptar os regimes de segurança social a esta forma de trabalho, de modo a garantir a igualdade de tratamento, pois a maior parte das discriminações joga com estes elementos (limiares e condições de acesso ao subsídio de desemprego, pagamento das prestações sociais).

4.5. Reexame das proibições ou restrições (artigo 4.o)

4.5.1. As disposições do Tratado CE (n.o 6 do artigo 137.o) não permitem que a Directiva proponha uma proibição formal do recurso ao trabalho temporário para substituir trabalhadores que participem num conflito colectivo de trabalho (em particular, greves). O Comité realça, no entanto, que há por parte das empresas o compromisso voluntário de não destacarem trabalhadores temporários em substituição dos trabalhadores envolvidos numa acção colectiva(10) e que alguns Estados-Membros incluíram esta proibição na legislação nacional. Este compromisso deveria tornar-se regra tanto para as agências de trabalho temporário como para as empresas utilizadoras.

A Directiva deveria, pois, prever pelo menos disposições que assegurem que o direito à greve não seja negativamente afectado, nomeadamente prevendo a possibilidade de os próprios Estados-Membros e/ou os parceiros sociais adoptarem normas que excluam o destacamento de trabalhadores temporários em empresas cujos trabalhadores estão em greve.

4.5.2. O Comité nota que a proposta de Directiva é vaga a respeito das actuais restrições, cujo reexame está previsto nos termos do artigo 4.o Deveria ser possível não só suprimir, mas também impô-las, se assim o exigirem as condições específicas em alguns sectores da actividade económica. A evolução das novas tecnologias, a saúde e a segurança pública(11), bem como o estado actual dos conhecimentos no domínio das biotecnologias não permitem excluir a eventual necessidade de introduzir novas restrições que se revelem indispensáveis entre as revisões. O Comité está a pensar, por exemplo, no tratamento dos resíduos hospitalares e nas ameaças de poluição bacteriológica. Recorda que tanto as disposições que impõem como as que prevêem a supressão de restrições devem também respeitar a Directiva 91/383/CEE do Conselho(12), em particular, no atinente às radiações ionizantes.

5. Condições de trabalho e de emprego

5.1. Princípio de não discriminação (artigo 5.o)

5.1.1. O Comité aprova o princípio de não discriminação, que é conforme às normas relativas aos direitos humanos fundamentais.

Reconhece ser importante para a consecução do objectivo de uma melhor protecção dos trabalhadores temporários consagrar este princípio geral. Lamenta, no entanto, que as derrogações previstas nesse mesmo artigo 5.o neutralizem o princípio de não discriminação.

5.1.2. Quanto à questão dos trabalhadores destacados por empresas de trabalho temporário num Estado-Membro que não aquele por cuja legislação se rege o contrato, o direito aplicável às condições de trabalho e de emprego deverá ser o do território do Estado-Membro onde é efectuada a missão, salvo se for menos favorável que o direito contratual do país de origem.

5.1.3. Relativamente aos trabalhadores assalariados nacionais de um país terceiro destacados no âmbito de uma prestação de serviços transfronteiriços para trabalharem num Estado-Membro diferente daquele em que a empresa que os disponibiliza tem a sua sede social, aplica-se a Directiva "destacamento"(13).

5.1.4. O Comité lamenta que o estudo do impacto anexo à proposta de Directiva não aprofunde os efeitos do trabalho temporário e transfronteiriço nos mercados de emprego nacionais (por exemplo, St-Nazaire, em França, Berlim, na Alemanha, e Trieste na Itália) ou regionais (regiões fronteiriças).

5.1.5. É importante assinalar que a dispersão dos trabalhadores temporários não deve ser motivo para considerar a sua representação no diálogo social totalmente independente da dos outros trabalhadores.

5.1.5.1. O Comité sugere que deve ser esclarecido que a derrogação (n.o 2 do artigo 5.o) respeitante aos trabalhadores temporários ligados à empresa de trabalho temporário por um contrato sem termo incide apenas sobre a remuneração e desde que os trabalhadores em causa recebam um nível de pagamento entre as missões estabelecido por convenção colectiva e/ou definido por legislação.

5.1.5.2. O Comité gostaria que as práticas nacionais mais favoráveis definidas pela legislação ou pelas convenções colectivas continuem a ser aplicadas de um modo mais taxativo do que parece transparecer do n.o 3 do artigo 5.o Considera que não está devidamente definido o que se entende por "um nível de protecção adequado" e sugere que tal só pode ser feito, em última instância, ou pelo TJCE ou pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o que submeteria os trabalhadores temporários e os empregadores a incertezas processuais que poderiam durar anos. O Comité convida a Comissão a esclarecer o modo como este ponto deve ser interpretado, atento o artigo 9.o da proposta ora em apreço. Por exemplo, um "nível de protecção adequado" aceite por organizações minoritárias seria considerado como "motivo suficiente para justificar uma redução do nível geral de protecção dos trabalhadores nos domínios abrangidos pela proposta em apreço".

5.1.5.3. O Comité não é favorável à derrogação definida no n.o 4 do artigo 5.o do projecto de directiva, que exclui efectivamente uma maioria de trabalhadores temporários da aplicação do princípio de não discriminação e institui uma característica de duração discriminatória por natureza e contraditória com aquele princípio.

5.1.6. A derrogação definida no n.o 2 do artigo 5.o - "trabalhadores temporários, ligados à empresa de trabalho temporário por um contrato sem termo, continuam a ser remunerados (...) entre a execução de duas missões" - e a derrogação definida no n.o 4 do artigo 5.o - "série de missões (...) por um período que não ultrapasse as seis semanas" - poderão, se incluídas no direito comunitário, ser introduzidas nos Estados-Membros através de uma revisão da legislação ou das convenções colectivas negociadas pelos parceiros sociais se estes considerarem que tais disposições comunitárias menos favoráveis representam um "nível de protecção adequado" (n.o 3 do artigo 5.o).

5.1.7. A existência de estatuto ou de convenção especificamente aplicável aos trabalhadores temporários ligados à empresa de trabalho temporário por um contrato sem termo não deve impedir que eles beneficiem da aplicação de disposições mais favoráveis em vigor nas empresas utilizadoras.

5.1.8. A liberdade de escolha dos meios leva a que seja confiada aos Estados-Membros a responsabilidade pelo estabelecimento das modalidades de aplicação do princípio de não discriminação, tal como previsto no n.o 6 do artigo 5.o O Comité aprova estas disposições.

5.2. Acesso a emprego efectivo e de qualidade (artigo 6.o)

5.2.1. O Comité realça a importância que deve ser dada à integração dos trabalhadores temporários no quadro de pessoal da empresa e aprova o teor do n.o 1 do artigo 6.o como factor de igualdade de oportunidades e de tratamento entre os trabalhadores.

5.2.2. Aprova ainda as disposições contidas no n.o 2, que visam anular os entraves à contratação de um trabalhador temporário pela empresa utilizadora após o termo da sua disponibilização, como forma de evitar que os trabalhadores se mantenham em situação de precariedade(14).

5.2.3. Reconhece que a formação contínua dos trabalhadores temporários deve ser uma responsabilidade partilhada entre a empresa utilizadora e a agência de trabalho temporário em conformidade com as práticas nacionais e que estas podem ser melhoradas pelos Estados-Membros (responsabilidade pública) e pelos parceiros sociais (responsabilidade partilhada)(15).

5.3. Representação dos trabalhadores temporários (artigo 7.o)

O Comité realça que deve ser garantida e encorajada a representação dos trabalhadores temporários em conformidade com o princípio universal de respeito da liberdade sindical, pelo que aprova o artigo 7.o

6. Disposições finais

6.1. Requisitos mínimos (artigo 9.o)

6.1.1. É importante que não haja redução no nível de protecção dos trabalhadores temporários nos países onde eles são protegidos de um modo ajustado às normas que prevalecem nos Estados-Membros e naqueles que, à data da transposição, aplicam já sistemas concertados e equilibrados.

6.2. Aplicação (artigo 11.o)

O Comité propõe um novo número 2 no artigo 11.o com a seguinte redacção: "Os Estados-Membros consultarão os parceiros sociais antes de adoptarem qualquer iniciativa legislativa, regulamentar ou administrativa para dar cumprimento à presente directiva".

7. Observações finais

7.1. O Comité considera, por um lado, que o princípio de não discriminação em relação ao trabalhador comparável da empresa utilizadora, que constitui um princípio essencial, corre o risco de erosão devido às derrogações autorizadas pela própria proposta, nomeadamente no n.o 4 do artigo 5.o, em relação aos trabalhadores temporários que efectuem missões na empresa utilizadora por um período que não ultrapasse as seis semanas. Teme que esta derrogação venha, em alguns países, a privá-los da protecção do princípio de não discriminação em relação ao trabalhador comparável da empresa utilizadora. Esta protecção é, em seu entender, essencial não só para garantir a segurança jurídica do trabalhador temporário, mas também para não prejudicar os sistemas convencionais que fixam as condições de trabalho e de remuneração na empresa utilizadora.

7.2. Por outro lado, entende que não pode ser posto em causa o princípio de não discriminação, princípio fundamental dos tratados europeus. Isso será garantido pela formulação do artigo 5.o da proposta de directiva, que afirma "deverão beneficiar de um tratamento pelo menos equivalente ao de um trabalhador comparável da empresa utilizadora, no que se refere às condições essenciais de trabalho e de emprego". Sugere, porém, que, para ser validamente posto em prática pelos Estados-Membros, tendo em conta a diversidade das situações legais e sociais em vigor e o carácter triangular do trabalho temporário, que constitui uma das suas especificidades, seja dada aos Estados-Membros a possibilidade de optarem por aplicá-lo, evitando um sistema de referência de interpretação restritiva ou derrogatória e respeitando as legislações, convenções e práticas nacionais.

7.3. Estas duas recomendações tomam em consideração o objectivo da simplificação das legislações comunitárias proposta pelas instituições europeias(16) e que o Comité já antecipou em três dos seus pareceres(17).

Bruxelas, 19 de Setembro de 2002.

O Presidente

do Comité Económico e Social

Göke Frerichs

(1) JO C 2 de 4.1.1980, p. 1 e JO C 260 de 12.10.1981, p. 54.

(2) Três propostas de Directiva do Conselho sobre o trabalho atípico, COM(90) 228 final, de 29.6.1990 e JO C 224 de 8.9.1990, p. 8.

(3) União das Confederações da Indústria Europeia (UNICE). Centro Europeu da Empresa Pública (CEEP). Confederação Europeia dos Sindicatos (CES).

(4) Exposição de motivos, terceira parte, ponto 1.B.

(5) "O trabalho temporário na União Europeia", Donald Storrie, Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (2002) e "As novas formas de relações contratuais e suas implicações para a segurança e a saúde no trabalho", Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho.

(6) "Trabalho temporário, diagnóstico e previsões 2002", Institut Xerfi (França).

(7) Directiva 2000/78/CE do Conselho que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional - JO L 303 de 2.12.2000, p. 16-22. Directiva 2000/43/CE do Conselho que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica - JO L 180 de 19.7.2000, p. 22-26. Decisão 2000/750/CE do Conselho que estabelece um programa de acção comunitário de luta contra a discriminação (2001-2006) - JO L 303 de 2.12.2000, p. 23-28.

(8) Em particular as Convenções n.os 87, 98, 111 e 135.

(9) CES 686/2002, de 29 de Maio de 2002, "Opções possíveis para a reforma do regime de pensões".

(10) CIETT - Confederação Internacional das Empresas de Trabalho Temporário, Código de conduta.

(11) CES 843/2002 de 17 de Julho de 2002, "Controlo das fontes radioactivas seladas de actividade elevada". CES 1495/2001 de 29 de Novembro de 2001, "Acesso ao mercado dos serviços portuários".

(12) Directiva 91/383/CE do Conselho, JO L 206 de 29.7.1991, p. 19-21.

(13) Directiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 16 de Dezembro de 1996 relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (JO C L 18 de 21.1.1997, p. 1-6).

(14) Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um programa comunitário de acção de incentivo à cooperação entre os Estados-Membros em matéria de luta contra a exclusão social [COM(2000) 368 final - 2000/0157 (COD)].

(15) Parecer do CESE sobre o "Memorando sobre Aprendizagem ao Longo da Vida" - JO C 311 de 7.11.2001.

(16) Comunicação da Comissão sobre o plano de acção "Simplificar e melhorar o ambiente regulador" (COM(2002) 278 final).

(17) Parecer sobre a "Simplificação da Legislação do Mercado Único (OMU)", JO C 14 de 16.1.2001. Parecer sobre a "Simplificação", JO C 48, de 21.2.2002. Parecer sobre a Comunicação da Comissão - "Simplificar e melhorar o ambiente regulador", JO C 125 de 27.5.2002.

ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social

No decurso do debate, foi rejeitada a seguinte proposta de alteração, que recolheu, mais de um quarto dos votos expressos:

(CONTRA PARECER)

O parecer da secção passa a ter a seguinte redacção

"O Comité subscreve o princípio de uma Directiva sobre o trabalho temporário que vise a segurança jurídica do trabalhador temporário e a valorização do potencial de emprego deste sector. Crê, no entanto, que a proposta da Comissão é um mau compromisso.

Quer o Comité sublinhar que o princípio-chave da não-discriminação do trabalhador temporário não está em causa. Considera, não obstante, que o mesmo só pode ser aplicado mediante responsabilização dos Estados-Membros, podendo eles optar por realizar o princípio por referência a um trabalhador comparável da empresa utilizadora ou da agência de trabalho temporário. O mecanismo preconizado no projecto da Comissão traduz-se em considerar, como único sistema de referência, a comparação com o trabalhador da empresa utilizadora. Qualquer outra fórmula é derrogatória e, assim, interpretada restritivamente.

A solução preconizada pelo Comité é ditada pela diversidade de situações jurídicas nos Estados-Membros. A especificidade do trabalho temporário reside no seu carácter triangular. Contrariamente aos contratos a prazo certo, que são relações paritárias, o trabalho temporário põe em presença três parceiros: o trabalhador temporário, a agência de trabalho temporário e a empresa utilizadora. Ora, os Estados-Membros responderam a esta especificidade por diversas opções jurídicas. Daí resulta, no entender do Comité, que se deve deixar uma certa autonomia aos Estados-Membros na aplicação do princípio da não-discriminação, de resto, de modo nenhum constatado. Esta posição do Comité quadra-se, aliás, com o princípio da subsidiariedade.

Enfim, receia o Comité que soluções dirigistas contrariam a promoção do emprego que a Comissão invoca, aliás, como argumento a favor da sua posição. O Comité sublinha, ainda, que o carácter excessivamente minucioso da proposta será fonte de novos ónus administrativos, de que serão as primeiras vítimas as PME do sector."

Resultado da votação

Votos a favor: 82, votos contra: 90, abstenções: 6.