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Parecer do Comité Económico e Social sobre "Governança Europeia — Um Livro Branco" (COM(2001) 428 final)

Jornal Oficial nº C 125 de 27/05/2002 p. 0061 - 0068


Parecer do Comité Económico e Social sobre "Governança Europeia - Um Livro Branco"

(COM(2001) 428 final)

(2002/C 125/13)

Em 30 de Julho de 2001, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que estabelece a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social sobre "Governança Europeia - Um Livro Branco".

Na reunião plenária de 12 e 13 de Setembro de 2001, o Comité decidiu, nos termos dos artigos 11.o, n.o4, e 19.o, n.o1, do Regimento, criar um Subcomité para elaborar o correspondente parecer.

O Subcomité adoptou o projecto de parecer em 12 de Março de 2002, sendo relatora U. Engelen-Kefer e co-relatora I. Pari.

Na 389.a reunião plenária de 20 e 21 de Março de 2002 (sessão de 20 de Março), o Comité adoptou, por 75 votos a favor, com 4 abstenções, o presente parecer.

1. Modelar o futuro da Europa, melhorando as formas de governação: dois processos de reforma, um objectivo

1.1. A Comissão Europeia apresentou o Livro Branco sobre "Governança Europeia" em 25 de Julho de 2001, no quadro de um debate amplo e estruturado. Deu assim começo a um dos grandes processos de reforma anunciados pelo seu presidente Romano Prodi no início de 2000. São objectivos desta reforma - a conduzir com base no Tratado vigente - a revisão global da estrutura da UE e a simplificação e o aperfeiçoamento da definição de políticas e dos métodos de trabalho das instituições comunitárias, tendo em vista tornar a União Europeia mais eficaz, compreensível e próxima dos seus cidadãos, de um modo mais aberto, coerente, transparente e responsável.

1.2. Decorrem em paralelo os dois actuais processos de reforma: o debate sobre o futuro da União Europeia e o debate sobre a governação. A Cimeira Europeia realizada em Laeken, em 14 e 15 de Dezembro de 2001, fixou a composição e a agenda da Convenção que irá preparar a próxima Conferência Intergovernamental. Com a convocação desta Convenção, os chefes de Estado e de governo deram um impulso decisivo ao futuro desenvolvimento da democracia na Europa, já que, pela primeira vez, os cidadãos e os seus representantes participarão nas decisões sobre o futuro sistema de governo da Europa, na perspectiva de uma governação mais aberta e participativa. O Comité Económico e Social Europeu, os parceiros sociais e o Comité das Regiões estão presentes na Convenção com o estatuto de observador. Esta presença corresponde ao papel do Comité como representante institucionalizado da sociedade civil organizada.

1.3. O Comité Económico e Social Europeu acolhe favoravelmente o Livro Branco. Insta a Comissão a pôr em execução as necessárias reformas de boa governação identificadas no documento e mostrar assim à opinião pública que está a agir com celeridade para corrigir deficiências no desenvolvimento e aplicação das políticas e assegurar uma maior participação dos cidadãos.

1.4. Por outro lado, também o próximo alargamento - de uma magnitude sem precedentes na história da UE - e o aprofundamento da União Europeia são razões que justificam a urgência das reformas. Ter-se-á perdido um tempo precioso se a Comissão e as restantes instituições não melhorarem as suas estruturas e métodos de trabalho antes da Conferência Intergovernamental de 2004.

1.5. O Comité Económico e Social Europeu ocupa-se activamente das questões da governação europeia, de acordo com o Tratado de Nice, enquanto representante institucionalizado(1) da sociedade civil organizada. Neste processo, age com o duplo objectivo de estabelecer novas sinergias entre as instituições da União Europeia e desenvolver a sua função de intermediário fundamental entre as instituições da UE e a sociedade civil organizada. O CES congratula-se, neste contexto, com o protocolo entre o Comité e a Comissão em 24 de Setembro, celebrado no espírito de uma melhor governação europeia.

1.6. Nos três últimos anos, o Comité organizou debates (2) e emitiu alguns pareceres(3) que examinavam mais especificamente como garantir uma participação efectiva da sociedade civil organizada. Em anteriores pareceres, o Comité formulara já algumas propostas concretas neste domínio. Lamenta-se que várias destas propostas não hajam sido acolhidas pela Comissão na elaboração do Livro Branco.

1.7. No presente parecer sobre o Livro Branco, o Comité abordará principalmente as questões que mais directamente lhe respeitam e para as quais poderá contribuir com valor acrescido. O parecer centra-se em três temas: razões e princípios de uma melhor governação; propostas tendentes a uma maior participação da sociedade civil e a uma melhor regulamentação; e, finalmente,o papel do CES.

2. Porquê uma reforma da governação europeia?

2.1. É incontestável que a União Europeia tem feito enormes progressos; contudo, muitos cidadãos europeus sentem-se distantes da sua acção por todos os motivos correctamente apontados no Livro Branco - erros de percepção, má comunicação, participação insuficiente, escasso conhecimento.

2.2. Para o cepticismo da população têm também contribuído as deficiências nos objectivos políticos e nas acções da UE. A UE deve evitar suscitar expectativas demasiado altas e impossíveis de concretizar; tal conduta gera desconfiança e prejudica a credibilidade da União. Só haverá uma identidade europeia quando os valores comuns partilhados pelos cidadãos se traduzirem em políticas comunitárias efectivas e em benefícios concretos para todos. O euro ilustra claramente esta asserção. É interessante notar o entusiasmo com que os cidadãos adoptaram a nova moeda e participaram com êxito na sua implantação.

2.3. Os europeus pretendem uma Europa segura, estável, de perfil social e com uma economia florescente que respeite o ambiente, assegure boas condições de vida e de trabalho e garanta a todos os cidadãos bens e serviços básicos por um preço justo. Estes objectivos abrangentes, que incluem também o respeito pelas culturas dos Estados-Membros, devem ser reconhecidos como valores comuns, definidos - se necessário, ampliados - e defendidos como tal. Só então se tornará possível que os cidadãos europeus reconheçam os benefícios de uma identidade europeia comum e lhe testemunhem o seu apoio. O Comité intensificará os seus esforços - á luz, em especial, do alargamento e da globalização - para dar à população em geral uma maior consciência da importância da União Europeia como comunidade de valores.

2.4. Por outro lado, a linguagem utilizada pela UE não contribui para a compreensão do trabalho da União. O Comité sugere que as futuras publicações da Comissão e a legislação comunitária sejam redigidas numa linguagem mais compreensível.

3. Princípios de governação na União Europeia

3.1. O Comité apoia plenamente os cinco "princípios da boa governança" propostos pela Comissão - abertura, participação, responsabilização, eficácia e coerência - e a análise feita. Importa que estes princípios sejam aplicados de forma eficaz e responsável. O Comité salienta, todavia, que a definição do Livro Branco não é completa. A responsabilização significa, não apenas tornar claros os papéis e as responsabilidades, mas igualmente clarificar perante quem e de que modo uma pessoa ou um órgão é responsável.

3.2. Além dos cinco princípios mencionados, o Comité gostaria de destacar a subsidiariedade como o princípio básico mais importante da boa governação. A subsidiariedade não é um mero princípio de técnica administrativa e de distribuição de competências, mas sim a expressão de uma dada concepção do indivíduo, da sua liberdade, das suas responsabilidades e da sociedade em que vive. A sociedade funcionaria melhor se os cidadãos sentissem que as decisões que lhes dizem respeito eram tomadas ao nível mais adequado. O nível adequado é determinado, não apenas por critérios territoriais (nível europeu, nacional, regional e local), mas também por critérios funcionais segundo competências específicas (autoridades públicas, comunidade económica, parceiros sociais e outras organizações da sociedade civil). Ao determinar-se quem deve intervir no processo de decisão, haverá que ter em conta a "subsidiariedade funcional (horizontal)" a par da "subsidiariedade territorial (vertical)": cada uma delas é garante de uma maior receptividade às preocupações dos cidadãos e de maior eficácia. Os dois níveis de subsidiariedade devem funcionar em articulação, complementando-se mutuamente. O Comité Económico e Social constitui uma interface entre a subsidiariedade territorial e a funcional, contribuindo assim para uma melhor governação europeia.

4. Propostas de mudança

4.1. Transparência e comunicação

4.1.1. O Comité concorda com a proposta do Livro Branco de que há que introduzir nos métodos de trabalho das instituições europeias maior transparência e melhor comunicação. Quanto mais aberta for a definição de políticas ao nível da UE, mais fácil será para a população em geral e para os intervenientes no processo político nos Estados-Membros contribuir para a definição e a realização dos objectivos da Comunidade, compreendendo-os plenamente e avaliando-os justamente. O Comité apoia naturalmente quaisquer esforços da Comissão e das outras instituições comunitárias para tornar claros e compreensíveis todos os estádios do processo de definição de políticas.

4.1.2. O Comité releva que tanto a Comissão Europeia como o Parlamento Europeu adoptaram em grande medida este princípio. Ambas as instituições estão plenamente empenhadas numa cooperação transparente e construtiva. A falta de transparência do Conselho é, contudo, motivo de preocupação.

4.1.3. Pelo seu lado, o Comité tomou medidas para tornar o seu processo de trabalho mais transparente e irá desenvolver ainda mais a sua actividade de comunicação, não só ao nível europeu, mas também ao nível dos Estados-Membros e dos países candidatos. Fá-lo-á em colaboração com a Comissão, como previsto no protocolo de cooperação entre ambas as instituições.

4.1.4. Informação rigorosa, abertura e comunicação adequada das políticas comunitárias não devem ser exclusivo das instituições europeias. Devem também incumbir aos actores da vida política e da sociedade civil dos Estados-Membros. O Comité expressa, assim, o seu apoio firme à recomendação formulada no Livro Branco para que os Estados-Membros se esforcem por promover o intercâmbio de informação e pontos de vista entre as instâncias europeias, as autoridades nacionais, regionais e locais e as organizações da sociedade civil. Também os membros do CES podem contribuir para promover, nos respectivos países e a diversos níveis, a compreensão de questões da UE em que estejam envolvidos.

4.1.5. Este objectivo requer a utilização de todos os modernos meios de comunicação e o desenvolvimento de canais de comunicação no âmbito de um diálogo interactivo com a sociedade civil e as suas organizações. Quanto aos meios de comunicação, importa ter em conta que a utilização das novas tecnologias da informação difere de um Estado-Membro para outro. O Livro Branco contém um conjunto de propostas sobre esta matéria que merecem o apoio do Comité e devem ser levadas à prática com urgência.

4.1.6. Relativamente à informação dos cidadãos, o Comité sublinha a importância da educação, que não foi considerada no Livro Branco. Quer as instituições de educação formais (ou seja, as escolas, as universidades e os centros de formação profissional) quer as informais (as organizações da sociedade civil, os locais de trabalho ou os sindicatos) têm tarefas especialmente importantes a desempenhar neste domínio. De especial valia são os métodos participativos de educação e as organizações educativas informais. É necessário educar os cidadãos, desde a infância à idade adulta, sobre os factos básicos e elementares da UE - porque existe, quem são os membros, como toma decisões, que matérias são da sua competência, de que modo os Estados-Membros participam nas decisões. Deste modo se ajudará os cidadãos europeus a melhor compreender e julgar a informação que recebem.

4.2. Participação da sociedade civil

4.2.1. A participação da população em todas as fases da definição de políticas é um dos principais temas do Livro Branco. De acordo com o documento, essa influência deve ser exercida através das organizações da sociedade civil e no quadro dos processos de consulta estruturada. O Comité dá todo o apoio a este plano.

4.2.2. O Livro Branco enumera um conjunto de organizações que ocupam um lugar especial na sociedade civil. Salienta o importante papel que as ONG desempenham a nível mundial na política de desenvolvimento, mas não menciona organizações activas nos campos da protecção ambiental, social e dos consumidores, dos direitos humanos e da cultura no seu sentido mais amplo. Na opinião do Comité, esta lista arbitrária e incompleta de organizações da sociedade civil não reflecte a realidade. É de grande urgência definir o diálogo civil e os critérios qualitativos e quantitativos de representatividade e fazer uma distinção clara entre "diálogo civil" e "diálogo social". O Comité deplora o facto de o Livro Branco não ter tomado em conta a sua proposta anterior nesta matéria.

4.2.3. No que se refere aos critérios de representatividade para a selecção de organizações que participem no diálogo civil, eles devem ser definidos para assegurar a transparência e um processo de selecção democrático. No Livro Branco, a Comissão decidiu não propor critérios, ao contrário do que o Comité sugerira no parecer de 25 de Abril de 2001.

4.2.4. No parecer referido, o Comité identificava oito critérios, aos quais gostaria agora de aditar o da transparência. Para ser elegível, a organização europeia deverá:

- estar organizada de modo estável a nível comunitário;

- facultar acesso directo ao saber pericial dos seu membros e garantir assim consultas rápidas e construtivas;

- representar interesses gerais que correspondam aos interesses da sociedade europeia;

- integrar organizações que sejam reconhecidas a nível dos respectivos Estados-Membros como representativas dos interesses que defendem;

- dispor de organizações filiadas na grande maioria dos Estados-Membros da UE;

- prever a obrigação de prestação de contas aos seus membros;

- dispor de um mandato de representação e de actuação a nível europeu;

- ser independente e não sujeita a instruções de instâncias exteriores;

- ser transparente, sobretudo no domínio financeiro e nas suas estruturas de decisão.

4.2.5. O Comité propõe uma vez mais a discussão destes critérios com as instituições e as organizações da sociedade civil, como base para cooperação futura.

4.2.6. O Comité atribui grande importância a uma clarificação do papel especial dos parceiros sociais no âmbito da sociedade civil organizada. Acolhe, assim, como positiva a referência expressa do Livro Branco a este papel especial e à influência especial dos parceiros sociais. A missão dos parceiros sociais no quadro do diálogo social é um exemplo excelente da realização do princípio da governança ao nível europeu. O diálogo social europeu é um mecanismo com poderes quase legislativos, de acordo com os artigos 137.o e 138.o do Tratado. Está claramente definido em termos de participantes, poderes e processos e tem um estatuto quase constitucional(4). Deriva a sua especificidade dos poderes e responsabilidades especiais dos seus participantes, que exercem a sua função de modo autónomo. O seu papel e as suas responsabilidades não podem ser transferidos para outros domínios de política ou outros actores. É isto que justifica a opinião reiterada(5) do Comité de que é vital fazer uma distinção clara entre "diálogo social" e "diálogo civil".

4.2.7. Neste contexto, o Comité considera fundamental esclarecer que o CES não é o fórum do diálogo social. A função do Comité não é, de modo nenhum, proporcionar uma alternativa aos parceiros sociais. O Comité, enquanto representante institucionalizado da sociedade civil organizada, recolhe toda a legitimidade do facto de todos os seus membros, em virtude dos seus conhecimentos, terem recebido instruções, por parte de organizações representativas dos Estados-Membros, no sentido de desempenharem um papel construtivo no processo geral de formação de opiniões europeu. O valor acrescentado do Comité reside no facto de que a formação de opiniões dentro das suas quatro paredes envolve todos os agentes da sociedade civil, incluindo as organizações que não são parceiros sociais.

4.2.8. Todavia, devido à sua composição e ao papel representativo que, ao abrigo do Tratado de Nice, lhe é atribuído, o Comité está destinado a desempenhar um papel fulcral na definição e estruturação do diálogo civil. Há já muitos anos que o Comité tem vindo a defender um discurso democrático público ao nível europeu entre os representantes da sociedade civil organizada e - enquanto contributo inicial para a discussão - descreveu as características essenciais do referido diálogo civil(6). O Comité considera a introdução de um tal diálogo civil um instrumento essencial na aplicação dos princípios de governação (abertura, participação, responsabilização, eficácia, coerência). Além disso, o diálogo civil, como resultado do próprio princípio de proporcionar um fórum público, daria um contributo vital para o reforço da transparência e a criação de um fórum público europeu como condição sine qua non para uma identidade europeia.

4.2.9. O Comité chama ainda a atenção para o facto de o Livro Branco presumir que a sociedade civil europeia é homogénea, apesar de isso não ser o caso, nem dentro dos diferentes Estados-Membros. A situação complicar-se-á ainda mais com o futuro alargamento. O papel dos Estados-Membros na designação dos membros do CES é, portanto, crucial para garantir que os seus interesses particulares e modelos de sociedade estão representados adequadamente, por forma a ter, na Europa, um órgão representante e equilibrado dos elementos económicos e sociais da sociedade civil organizada.

4.2.10. O Comité apoia a proposta da Comissão de criar uma base de dados em linha com informações sobre as organizações da sociedade civil, de modo a incrementar a abertura e estruturar o diálogo com as instituições.

4.2.11. Embora a sociedade civil venha a ter, no futuro, muito mais influência nas políticas comunitárias, é inequívoco que a responsabilidade de elaborar a legislação tem de permanecer das instituições oficiais, no âmbito da democracia representativa. Compete às autoridades legislativas e reguladoras a responsabilidade final de reconciliar o interesse geral com os interesses específicos das várias organizações da sociedade civil e garantir a preservação deste equilíbrio.

4.2.12. No contexto do aumento dos mecanismos e fóruns de consulta, são necessários normas e princípios claros para garantir a coordenação adequada e aumentar a coerência da política consultiva comunitária. No contexto do futuro alargamento, tal assumirá ainda mais importância. Com este objectivo, o Comité, em nome da transparência, eficácia e responsabilização, insiste em que a Comissão concretize a promessa de publicar a lista dos 700 órgãos consultivos ad hoc e apoia plenamente a intenção da Comissão de racionalizar o sistema consultivo existente baseado nos órgãos acima referidos.

4.2.13. Além disso, o Comité acolhe favoravelmente a proposta da Comissão de aprovar um código de conduta com padrões mínimos de consulta. O princípio da transparência também deveria estender-se ao processo consultivo: o resultado das consultas deveria ser tornado público. Apoia igualmente a intenção da Comissão de pôr à disposição do público os pareceres dos peritos.

4.2.14. No que diz respeito à consulta em linha, o problema da representatividade e do peso das opiniões expressas no processo da tomada de decisão é ainda mais acentuado. O Comité crê que também se devem aplicar os critérios de uma organização representativa, bem como respeitar as condições de transparência.

4.3. Melhores políticas, melhor regulamentação e melhores resultados

4.3.1. O Comité defende as propostas do Livro Branco de simplificar e acelerar o processo legislativo europeu; de facto, as normas comunitárias são cada vez mais complexas e, por vezes, tendem a adicionar-se à regulamentação nacional existente em lugar de simplificá-la e harmonizá-la.

4.3.2. Por outro lado, o Livro Branco ignorou a contradição entre o maior envolvimento dos agentes a todos os níveis, incluindo a sociedade civil, e o desejo de tornar a definição de políticas mais célere e eficaz. Mais democracia requer mais tempo. Uma legislação mais rápida poderia implicar riscos. Deveria encontrar-se o equilíbrio entre a consulta adequada e a eficácia legislativa.

4.3.3. O Comité está desiludido com a pouca atenção que o Livro Branco dedicou aos pareceres emitidos, em diversas fases desde Outubro de 2000, relativos à simplificação da regulamentação do Mercado Único(7). A pedido da Comissão, o Comité preparou, também, um parecer exploratório(8) nessa matéria como forma de contribuir para a preparação do "Plano de Acção para uma Melhor Regulamentação" mencionado no Livro Branco. O Comité defende um programa de simplificação bem estruturado, com prioridades claras, calendários concretos e meios de supervisão e controlo, que deveria basear-se num código de conduta para as instituições europeias. Até à data, apenas o Comité Económico e Social Europeu adoptou um tal código de conduta de simplificação.

4.3.4. No que se refere aos meios de aperfeiçoar a regulamentação e de combinar os diferentes instrumentos políticos, o Comité considera que a necessidade da legislação comunitária deveria ser avaliada caso a caso, baseada nos princípios da proporcionalidade e subsidiariedade. Apenas deveria recorrer-se à regulamentação no caso de não existir uma alternativa melhor. Deveria consultar-se as partes principais afectadas pela medida quando se proceder à avaliação do modelo adequado.

4.3.5. Um impacto sistemático e independente e uma análise custo/benefício devem necessariamente preceder quaisquer propostas legislativas. Ao longo dos últimos quinze anos, a Comissão tem levado a cabo estudos de impacto; contudo, a sua eficácia permanece limitada, pois não existem quaisquer garantias de serem realizados de forma independente, não englobam alternativas possíveis à aprovação de actos legislativos e, com frequência, permanecem internos, em lugar de serem, sistematicamente, tornados públicos em conjunto com os projectos legislativos relevantes.

4.3.6. Para além da análise prévia a qualquer nova medida legislativa e quando se altera uma já existente, deveria proceder-se a uma análise de impacto sobre o acto legislativo final alterado. É frequente a versão final, decidida pelos legisladores, ser muito diferente da proposta inicial da Comissão, resultando por vezes numa legislação complexa, excessivamente rígida e dispendiosa.

4.3.7. O Comité acolhe positivamente as sugestões do Livro Branco relativas ao aumento da utilização de instrumentos reguladores alternativos à legislação. Todavia, o Livro Branco centra, sobretudo, a sua atenção na co-regulamentação como uma das abordagens principais para a regulamentação futura. O Comité defende que todas as alternativas à acção legislativa sejam avaliadas em pé de igualdade e baseadas em critérios objectivos das respectivas vantagens e desvantagens. Não deve dar-se especial destaque a um determinado modelo a menos que ele seja a resposta mais adequada ao problema político em questão, aos conhecimentos e fóruns disponíveis e às partes interessadas representadas.

4.3.8. O Comité gostaria de realçar a utilidade de instrumentos como a auto-regulamentação ou os acordos voluntários, que deram provas de ser mecanismos eficazes no processo de avaliação, decisão e aplicação. Contudo, a auto-regulamentação não deveria nunca entrar em contradição com os direitos fundamentais nem com os princípios básicos subjacentes à construção da União Europeia.

4.3.9. O Comité Económico e Social Europeu acolhe com satisfação um maior uso do método aberto de coordenação. Contudo, este método não deve ser confundido com o procedimento legislativo e deve ficar bem claro que é utilizado nas áreas cuja responsabilidade principal cabe aos Estados-Membros. Os Estados-Membros basear-se-ão em políticas acordadas em comum, aplicadas através de planos de acção nacionais, exames pelos pares, intercâmbio de melhores práticas, aferimento do desempenho competitivo, etc. Já se utiliza este método nas áreas da exclusão social, do emprego, da política de imigração e de asilo, bem como da segurança social. O método, respeitando plenamente a subsidiariedade, traduz-se num novo equilíbrio entre as medidas legislativas e não-legislativas. Contudo, o Comité adverte para qualquer uso abusivo e para o risco de originar multiplicação de procedimentos e excesso de burocracia.

4.3.10. O Comité refere ainda que o método aberto de coordenação se deveria utilizar caso a caso e os instrumentos - orientações comuns, planos de acção nacionais, intercâmbio de melhores práticas - deveriam variar de acordo com as particularidades do assunto em causa e os objectivos estabelecidos. Todavia, o Comité crê que, para a utilização bem sucedida do referido instrumento, a avaliação pública e sistemática do progresso feito nos Estados-Membros é essencial.

4.3.11. O Comité também tem de adaptar os seus métodos de trabalho a este novo desenvolvimento institucional, desempenhando, assim, um papel mais importante. Há que aperfeiçoar o trabalho a fazer em relação ao Conselho de Ministros e ao Conselho Europeu. O Comité tem de ter mais oportunidades de ser ouvido sobre documentos apresentados ao Conselho Europeu e devia ser convidado para reuniões informais do Conselho, no âmbito das suas competências.

4.3.12. O Comité aconselha alguma prudência no que se refere à proliferação de agências europeias de regulamentação autónomas. Antes de se criar uma nova agência, deveria provar-se que trará um valor acrescentado inequívoco e que não aumentará a burocracia nem custos injustificados. Tais agências não deveriam sobrecarregar as estruturas administrativas existentes, devendo, antes, integrar-se em redes de competência, explorando as sinergias entre as organizações regionais, nacionais e europeias. Além disso, há que supervisionar minuciosamente a organização e as actividades destas agências, pois corre-se o risco de conceberem políticas importantes sem estarem sujeitas ao controlo democrático e, por conseguinte, contribuírem para o "défice democrático".

5. O papel do Comité Económico e Social Europeu numa maior participação dos cidadãos

5.1. Cada instituição tem a função de garantir que os cidadãos europeus estão, de facto, envolvidos na construção da Europa. O Comité Económico e Social Europeu, como o Tratado de Nice veio confirmar, é o órgão consultivo formal composto por representantes dos elementos económicos e sociais da sociedade civil organizada. Como tal, desempenha um papel chave na elaboração da legislação comunitária, formando um elo essencial entre a Europa e a sociedade civil organizada dos Estados-Membros, na medida em que constitui um fórum permanente e estruturado de diálogo e consulta.

5.2. O Comité gostaria de realçar três elementos que podem ser definidos como um valor acrescentado concreto para uma melhor governação europeia:

- Em primeiro lugar, o Comité está habituado a trabalhar num processo que promove o consenso e visa encontrar o interesse comum dentro dos diferentes interesses das organizações da sociedade civil nele representadas, ainda que, por vezes, entrem inicialmente em conflito. É um facto que cada organização envolvida no processo consultivo tende a referir-se aos seus interesses particulares como se se tratasse do interesse geral. Os pareceres do Comité, baseados num método de trabalho "de baixo para cima", reflectem uma síntese de pontos de vista e um consenso que, eventualmente, ajudam a Comissão, o Parlamento Europeu e o Conselho na sua missão de garantir o interesse geral na elaboração e aprovação dos actos legislativos.

- Em segundo lugar, a designação de membros do CES, pelos Estados-Membros, com base na sua experiência e conhecimentos numa ampla variedade de áreas relevantes, garante que não só possuem a competência adequada, como também um amplo conhecimento da actualidade do seu país. Tal significa que estão aptos a emitir pareceres bem fundamentados, práticos e equilibrados e a julgar se as medidas da Comunidade são aceitáveis nos respectivos países.

- Em terceiro lugar, os membros do CES estão igualmente aptos a promover a compreensão destas medidas nos seus países e, através de um diálogo interactivo, explicar aos membros das organizações que representam a importância da UE nas suas vidas quotidianas, facilitando, por conseguinte, a aceitação necessária.

5.3. O Comité é o fórum onde o diálogo civil adquire carácter institucional. Está disposto a desenvolver, com a cooperação da Comissão(9), a sua função de fórum de diálogo e consulta, pois trata-se de um modo eficiente de envolver no seu trabalho os elementos da sociedade civil organizada que, actualmente, não são representados pelos seus membros. O Comité já o faz, organizando manifestações e audiências de carácter público, como mencionado no parecer anterior.

5.4. O CES, como contributo prático para a governação europeia, perseguirá melhores sinergias entre as Instituições Europeias. Irá:

- aumentar os esforços no sentido de pôr em prática o disposto no Protocolo de Cooperação com a Comissão Europeia;

- procurar ciar mecanismos similares para uma cooperação mais estreita com o Conselho, como referiu o Ministro Espanhol dos Assuntos Europeus na sua intervenção durante a reunião plenária do Comité realizada em 17 de Janeiro de 2002;

- empenhar-se activamente no desenvolvimento das relações com o Parlamento Europeu em conformidade com o Plano de Acção para as relações CES-PE aprovado pela Mesa do Comité em Outubro de 2001(10) e a resolução do Parlamento Europeu sobre a governação europeia de 29 de Novembro de 2001(11).

6. Síntese

6.1. O Comité Económico e Social Europeu acolhe positivamente o Livro Branco sobre a Governança Europeia. Apela à Comissão que ponha em prática, na devida altura, as reformas da boa governação necessárias ao reforço da confiança dos cidadãos europeus no projecto europeu, bem como à preparação dos futuros alargamento e aprofundamento da União Europeia.

6.2. O CES, enquanto representante institucionalizado da sociedade civil organizada, persegue activamente as questões da governação europeia. Ao longo dos últimos três anos, organizou debates e emitiu diversos pareceres em que apresentava várias propostas concretas nesta matéria. Lamentavelmente, grande parte delas não foi tomada em consideração no Livro Branco da Comissão.

6.3. O CES é totalmente a favor dos cinco princípios da boa governação propostos pela Comissão. A estes princípios o Comité gostaria de acrescentar a subsidiariedade - tanto funcional (horizontal) como territorial (vertical) - como o princípio fundamental e mais importante da boa governação. O Comité constitui a ponte entre a subsidiariedade territorial e funcional, acrescentando, portanto, valor a uma melhor governação europeia.

6.4. O Comité sublinha a importância de tornar mais transparentes os métodos de trabalho das instituições europeias, em particular os do Conselho. As instituições, juntamente com os elementos da sociedade política e civil dos Estados-Membros, deveriam fornecer informação precisa e exaustiva sobre as políticas europeias. Neste contexto, o CES tem um papel de destaque; para ser bem sucedido, é necessário recorrer a meios de comunicação modernos e ao diálogo interactivo.

6.5. O Comité gostaria de sublinhar a importância de os cidadãos europeus obterem, por parte de institutos educacionais formais e não-formais, formação ampla sobre os aos elementos essenciais da construção europeia.

6.6. O Comité apoia energicamente o plano da Comissão de envolver as organizações da sociedade civil em todas as fases da definição de políticas no âmbito de "procedimentos estruturados de consulta" e congratula-se com a proposta de adoptar um código de conduta para consulta. Todavia, urge diferenciar claramente "diálogo civil" de "diálogo social" e estabelecer critérios de representatividade para a selecção das organizações da sociedade civil que possam participar no diálogo civil. Com esse propósito, o Comité reitera a proposta de critérios de organização representativa.

6.7. No que se refere ao aperfeiçoamento da regulamentação, o CES aprova a proposta do Livro Branco de simplificar a legislação europeia. Contudo, o Livro Branco não apresenta quaisquer propostas concretas nesta área nem toma em consideração os diferentes pareceres emitidos pelo Comité relativos à simplificação da legislação do Mercado Único. O Comité defende, para além da referida simplificação, um mecanismo de análise de impacto sistemático e independente e uma avaliação concreta de métodos legislativos alternativos. É a favor de um mais amplo uso do método aberto de coordenação nas áreas cuja responsabilidade principal cabe aos Estados-Membros. O Comité tem de adaptar os seus métodos de trabalho a este recente desenvolvimento institucional, desempenhando, simultaneamente, um papel importante.

6.8. Em relação ao valor acrescentado que o CES representa para a governação europeia, o Comité gostaria de referir os seguintes pontos: o Comité oferece uma síntese dos pontos-de-vista da sociedade europeia, por forma a ajudar as instituições nas suas decisões; os membros do CES, nomeados pelos Estados-Membros, representam um somatório de competências das respectivas áreas e do país de origem; os membros do CES promovem a compreensão das políticas europeias num diálogo bidireccional interactivo, tanto ao nível europeu como nacional.

6.9. Em cooperação com a Comissão, o Comité visa desenvolver a sua função de fórum de diálogo e consulta. O CES aumentará os esforços no sentido de pôr em prática o disposto no Protocolo de Cooperação assinado com a Comissão e procurará também criar mecanismos semelhantes de cooperação mais estreita com o Conselho e o Parlamento Europeu.

Bruxelas, 20 de Março de 2002.

O Presidente

do Comité Económico e Social

Göke Frerichs

(1) Artigo 257.o do Tratado CE: "O Comité é composto por representantes das diferentes componentes de carácter económico e social da sociedade civil organizada, designadamente dos produtores, agricultores, transportadores, trabalhadores, comerciantes e artífices, das profissões liberais, dos consumidores e do interesse geral".

(2) Exemplos:

- A economia social e o mercado único - 12 de Outubro de 1999;

- Primeira Convenção da Sociedade Civil Organizada ao nível europeu - 15 e 16 de Outubro de 1999;

- Escolher o nosso futuro: a elaboração do 6.o Programa de Acção da EU para o Ambiente - Os pontos de vista da sociedade civil - 7 de Março de 2001;

- O Euro: podemos prever todas as reacções? - 14 de Maio de 2001;

- A elaboração da estratégia para uma União Europeia sustentável: os pontos de vista da sociedade civil e das autoridades públicas - 26 e 27 de Abril de 2001;

- Conferência sobre o papel da sociedade civil organizada na governação europeia - 8 e 9 de Novembro de 2001.

(3) V. por exemplo:

- O papel e o contributo das organizações da sociedade civil para a construção da Europa - JO C 329 de 17.11.1999;

- A Conferência Intergovernamental de 2000 - O papel do Comité Económico e Social Europeu - JO C 117 de 26.4.2000;

- A Comissão e as organizações não governamentais: reforçar a parceria - JO C 268 de 19.9.2000;

- Objectivos estratégicos 2000-2005 - JO C 14 de 16.1.2001;

- A sociedade civil organizada e a governança europeia: contributo do Comité para o Livro Branco - JO C 193 de 10.7.2001.

(4) Artigos 137.o e 138.o do TCE.

(5) V. por exemplo:

- O papel e o contributo das organizações da sociedade civil para a construção da Europa - JO C 329 de 17.11.1999;

- A Conferência Intergovernamental de 2000 - O papel do Comité Económico e Social Europeu - JO C 117 de 26.4.2000;

- A Comissão e as organizações não governamentais: reforçar a parceria - JO C 268 de 19.9.2000;

- Objectivos estratégicos 2000-2005 - JO C 14 de 16.1.2001;

- A sociedade civil organizada e a governança europeia: contributo do Comité para o Livro Branco - JO C 193 de 10.7.2001.

(6) JO C 268 de 19.9.2000, ponto 5.13.

(7) Parecer de iniciativa do Comité Económico e Social sobre a simplificação da regulamentação no Mercado Único, Bruxelas, 19 de Outubro de 2000 (JO C 14 de 16.1.2001) e parecer do Comité Económico e Social sobre a simplificação (parecer adicional) - Observatório do Mercado Único, Bruxelas, 29 de Novembro de 2001 (JO C 48 de 21.2.2002).

(8) Parecer sobre a "Comunicação da Comissão - Simplificar e melhorar o ambiente regulador" (COM(2001) 726 final), de 21 de Março de 2002.

(9) Conforme consta do Protocolo.

(10) DI 149/2001.

(11) O ponto 12 da Resolução do Parlamento Europeu "propõe, retomando ideias avançadas pela Comissão e pelo Comité Económico e Social, que seja celebrado um acordo interinstitucional sobre consulta democrática, vinculando as três Instituições a níveis e práticas de consulta decididos em comum a nível da União".