52001IR0038

Parecer do Comité das Regiões sobre o "Livro Verde da Comissão Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético"

Jornal Oficial nº C 107 de 03/05/2002 p. 0013 - 0016


Parecer do Comité das Regiões sobre o "Livro Verde da Comissão 'Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético'"

(2002/C 107/05)

O COMITÉ DAS REGIÕES,

Tendo em conta o Livro Verde da Comissão - Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético;

Tendo em conta a decisão da Mesa de 13 de Junho de 2000, em conformidade com o 5.o parágrafo do artigo 265.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, de elaborar um parecer sobre o Livro Verde "Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético" e de incumbir a Comissão 4 - Ordenamento do Território, Política Urbana, Energia e Ambiente - dos respectivos trabalhos;

Tendo em conta o parecer do Comité sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a "A preparação para a implementação do Protocolo de Quioto" (CdR 295/1999 fin)(1);

Tendo em conta o parecer do Comité sobre a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção da electricidade produzida a partir de fontes renováveis de energia no mercado interno da electricidade (CdR 191/2000 fin)(2);

Tendo em conta o parecer do Comité sobre a comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões - Plano de acção para melhorar a eficiência energética na Comunidade Europeia (CdR 270/2000 fin)(3);

Tendo em conta a comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a realização do mercado interno da energia, a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera as Directivas 96/92/CE e 98/30/CE relativas às regras comuns para os mercados internos da electricidade e do gás natural e a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiras de electricidade (COM(2001) 125 final);

Considerando a importância para a União de garantir a segurança do aprovisionamento energético a longo prazo, dentro do respeito pelas normas em matéria de ambiente e pelos compromissos de diminuição das emissões de gases responsáveis pelo efeito de estufa fixados em Quioto;

Considerando o interesse em associar o maior número possível de actores, entre os quais os órgãos locais e regionais, a uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento, nomeadamente no que respeita à gestão da procura e ao desenvolvimento das energias renováveis e descentralizadas;

Considerando o projecto de parecer (CdR 38/2001 rev. 2) adoptado pela Comissão 4 em 8 de Outubro de 2001 (relator: Roelants du Vivier (Senador, Vice-Presidente do Parlamento de Bruxelas, BE/ELDR),

adoptou por unanimidade o seguinte parecer, na 41.a reunião plenária de 14 e 15 de Novembro de 2001 (sessão de 15 de Novembro).

Pontos de vista

O Comité das Regiões

1. Acolhe favoravelmente o Livro Verde da Comissão intitulado "Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético". A questão da segurança energética requer uma atenção particular sobretudo num momento em que a liberalização dos mercados da energia pode implicar o risco de uma abordagem a curto prazo das questões energéticas.

2. Congratula-se pelo facto de as questões de competitividade económica, ambiente e segurança do aprovisionamento, que são os três pilares da política energética da União Europeia, serem levadas em consideração simultaneamente e com relativa igualdade de tratamento, pese embora a abertura à concorrência das energias em rede tivesse tido fundamentalmente em conta a questão da competitividade.

3. Regozija-se com o facto de o Livro Verde abordar as principais preocupações do Comité das Regiões, sistematicamente desenvolvidas nos seus supramencionados pareceres anteriores, e que exprimem a vontade de que essas políticas "tivessem sido apresentados no mesmo documento, o que tornaria mais coerente a política energética da União(4)".

4. Saúda o facto de o documento considerar a Europa a 30 e, portanto, os países candidatos à adesão, cuja maioria sofre de problemas de eficiência energética insuficiente que urge paliar.

5. Congratula-se pelo facto de o Livro Verde fixar como primeira prioridade o controlo da procura de energia e, em seguida, a valorização das fontes de energia renováveis, duas orientações relativamente às quais o Comité das Regiões já por diversas vezes manifestara o seu interesse. Aprova, em especial, a referência feita no Livro Verde, segundo a qual "A União deve reequilibrar a política de oferta através de acções claras a favor de uma política da procura" e ainda que "Só uma política orientada para o controlo da procura poderá lançar as bases de uma verdadeira política de segurança do aprovisionamento sustentável de energia" (questão 1).

6. No entanto, interroga-se a respeito da capacidade dos meios propostos para evitar as dificuldades "se nada se fizer", tendo em conta:

- a ausência de objectivos estabelecidos para a poupança de energia, cujo potencial é muito importante (enquanto que no Livro Branco e no projecto de directiva haviam sido fixados objectivos para as energias renováveis, como sucede frequentemente nas políticas da oferta);

- a ausência de cenários energéticos prospectivos à escala da União Europeia sobre os efeitos de uma política vigorosa de controlo do consumo de energia;

- a insuficiência das propostas em termos de "políticas horizontais", que parecem limitar-se a medidas tecnológicas e fiscais, considerando-se o instrumento fiscal como único meio de acção citado no domínio da procura de energia (à parte certas operações-piloto que também têm o seu interesse e que se devem ser promovidas, mas que têm um impacto limitado) (questão 9).

7. Regozija-se com a prioridade dada ao desenvolvimento das energias renováveis apresentadas como a "chave da mudança", e com a referência feita à necessidade de ajudas financeiras (ajudas de Estado, deduções fiscais, apoio financeiro) para o desenvolvimento das energias renováveis (questão 7).

8. Considera, consequentemente, que o co-financiamento das ajudas ao desenvolvimento das energias renováveis (energias de fluxo) pela indústria da energia fóssil e físsil (energia de stock) é uma resposta económica que se justifica atendendo às verdadeiras distorções de concorrência de que são vítimas as energias renováveis (questão 7).

9. Sublinha que uma política mais centrada no controlo da procura e nas energias renováveis e descentralizadas implica reorientar a atenção e a acção para novos tipos de actores de todos os níveis e domínios: dos investigadores aos consumidores, passando pelas empresas, as classes profissionais ligadas ao sector da construção civil, os arquitectos, as empresas de transporte, os projectistas, as associações da sociedade civil, etc., pois as suas decisões influenciam os consumos de energia finais (questões 9 e 13). A aplicação do princípio da subsidiariedade no domínio do aprovisionamento energético é uma questão crucial se se pretender efectivamente levar em conta o conjunto dos potenciais locais e regionais de poupança de energia e de recursos locais.

10. Insiste em que os órgãos locais e regionais desempenham um papel central na concepção e aplicação de uma política deste cariz que constitui um forte incentivo de acção para os actores locais. Ao lado da cultura da oferta deverá desenvolver-se uma cultura da procura: grosso modo, cada actor, cidadão, industrial ou presidente de câmara, deverá conhecer o potencial de poupança de energia que é da sua responsabilidade e ser incentivado a estabelecer "planos de acção" para explorar esse potencial. É, pois, nesta direcção que conviria actualmente operar uma reafectação de meios financeiros e humanos da União e dos Estados-Membros (questão 13).

11. Considera que a maioria das medidas necessárias para aplicar uma política de gestão da procura e de promoção das energias descentralizadas são conhecidas. A verdadeira questão a resolver é a da sua tradução no plano real. Trata-se de uma questão de decisão política conjunta da UE e dos Estados-Membros, que deve levar em conta todos os actores implicados, entre os quais, os órgãos locais e regionais. Isto passa, nomeadamente, por:

- objectivos quantificados e, se necessário, obrigatórios, susceptíveis de serem impostos aos actores no terreno, incluindo aos órgãos regionais e locais;

- uma série de meios jurídicos, fiscais, normativos, organizacionais, tecnológicos, de incentivo, pensados para serem integrados nos sistemas de decisão do maior número possível de actores;

- uma obrigação de elaborar planos de acção para a eficiência energética e a promoção de energias descentralizadas nos diversos níveis territoriais (UE, Estados-Membros, regiões, cidades, etc.) e nos vários sectores (transporte, construção, indústria, agricultura);

- uma política de promoção da cogeração, incluindo a de média e de pequena dimensão;

- uma divulgação de informação a grande escala susceptível de contrabalançar a publicidade da oferta destinada ao aumento do consumo de energia, e eventualmente a regulamentação desta publicidade;

- um apoio ao reforço dos meios humanos no terreno por forma a estabelecer um melhor equilíbrio entre os meios de promoção da oferta de energia, por um lado, e os meios de controlo da procura e das energias descentralizadas, por outro, equilíbrio de que o mercado necessita (questão 9).

12. Regista a afirmação segundo a qual "a contribuição a médio prazo da energia nuclear deve, por sua vez, ser objecto de análise" a partir dos elementos de debate seguintes: decisão da maioria dos Estados-Membros de abandonar este recurso, luta contra o aquecimento global, segurança dos aprovisionamentos, desenvolvimento sustentável (questão 8).

13. Chama a atenção para o facto de as redes de transporte de energia - nomeadamente de electricidade - deverem também obedecer aos imperativos ambientais. Neste sentido, os efeitos negativos não devem ser subestimados e as regiões interessadas devem ser associadas aos eventuais projectos tão a montante quanto possível (questão 6).

14. Concorda com o ponto de vista da Comissão segundo o qual a segurança física do aprovisionamento passa por acordos com os países produtores, mas sublinha que a questão da segurança do aprovisionamento da UE está ligada à questão segurança dos consumidores de todo o mundo e, em especial, dos países emergentes e em desenvolvimento. Consequentemente, a divulgação das tecnologias e métodos de eficiência energética e das energias renováveis nesses países, tanto no plano da cooperação internacional como no plano da cooperação descentralizada, deveria ser considerada como parte integrante da nossa própria política de segurança (questões 1 e 4).

15. Considera que, numa perspectiva de desenvolvimento sustentável, a partilha das riquezas energéticas fósseis do planeta, consumidas até agora quase exclusivamente pelos países industrializados do Norte, é um dever moral, mas também um acto de sabedoria política em prol da paz mundial, e recomenda à UE que proponha cooperações internacionais, nomeadamente com países em desenvolvimento e países da Europa Central e Oriental, na perspectiva de um desenvolvimento sustentável "para todos" (questões 1 e 4).

Recomendações

O Comité das Regiões

16. Considera que existem, pelo menos, quatro elementos que conduzem à integração da energia num capítulo do Tratado da UE:

- a integração das políticas energéticas, sobretudo em consequência da realização do mercado interno da energia;

- a observância dos compromissos internacionais conjuntos da UE e dos Estados-Membros, em especial no tocante à protecção do clima;

- o impulso que deve ser dado às políticas de controlo da energia e à promoção das energias renováveis;

- o verdadeiro poder de que a União Europeia dispõe, enquanto primeira potência económica mundial e desde que assuma posições a uma só voz, para inflectir as políticas internacionais na direcção de uma política energética sustentável. (questão 2).

17. Solicita à Comissão que, ao invés do cenário "se nada se fizer" várias vezes invocado no Livro Verde, apresente outros cenários "se for aplicada uma política activa" para o controlo da procura, promoção das energias renováveis e decentralizadas, abandono da energia nuclear, etc., juntamente com uma integração tão sistemática quanto possível dos órgãos regionais e locais nesses cenários de intervenção (questões 9 e 13).

18. Considera que a consciencialização de que a primeira política a pôr em prática é a do controlo da procura exige, para ganhar credibilidade, um claro reforço do conteúdo efectivo desta política, que o Plano de Acção para o aumento da eficiência energética, deve ser mais ambicioso, integrar-se mais nas políticas sectoriais e territoriais, e que os programas comunitários que lhe servem de base, nomeadamente o SAVE, sejam adaptados a essas novas ambições (questão 9).

19. Sugere que, tal como foi feito para a electricidade produzida a partir de energias renováveis, se analise a possibilidade de elaborar uma directiva-quadro para a eficiência energética, - e subsequentes directivas para os edifícios, transportes, equipamentos, etc. - que aborde os pontos supramencionados e leve os Estados-Membros a assumirem compromissos em relação a objectivos quantificados em matéria de eficiência energética, bem como os planos de acção e conjuntos de medidas correspondentes, no quadro de uma política concertada com os órgãos locais e regionais e com a participação destes para efeitos da sua aplicação. Este tipo de planos territoriais de poupança de energia, realizados à escala nacional, regional e local, teriam a vantagem de sensibilizar e mobilizar uma série de actores indispensáveis para a aplicação de uma política activa de gestão da procura e de valorização dos recursos renováveis e descentralizados, os quais têm necessidade de ser estimulados por uma "procura" de tecnologia por parte dos donos de obra públicos e privados (questões 9 e 13).

20. Sugere à Comissão que promova, no mais breve espaço de tempo, um estudo de peritos em eficiência energética, originários dos vários países da União, com vista à determinação pormenorizada dos elementos da política de procura que o Livro Verde define como eixo central da estratégia energética da União: meios legislativos e regulamentares, institucionais e humanos, programas de incentivos financeiros e fiscais, de informação e de formação, de investigação, etc., necessários ao nível comunitário e aos países membros (incluindo os países candidatos à adesão) (questões 9 e 13).

21. Renova o seu ponto de vista segundo o qual, sempre defendeu o interesse de uma dimensão fiscal - baseada nos consumos de energia e nas emissões de gases responsáveis pelo efeito de estufa - para conduzir uma política centrada no controlo da procura ao nível europeu, mas sabe, por experiência, que é necessário um vasto conjunto de medidas e de auxílios para a aplicação desta política. Em especial, as medidas de apoio financeiro recomendadas no Livro Verde para as energias renováveis deveriam sê-lo também para as poupanças de energia (questão 3).

22. Propõe que a prioridade concedida ao controlo da procura esteja mais presente na futura Directiva que altera as Directivas 96/92/CE e 98/30/CE relativas às regras comuns para os mercados internos da electricidade e do gás natural, como uma das componentes das obrigações de serviço público para um desenvolvimento sustentável (eficiência energética, produção combinada de electricidade e calor, energias renováveis, tributação energética, facilidade de acesso das redes locais de distribuição às redes de transporte) (questão 9).

23. Sugere que a política de promoção das energias renováveis - que foi objecto da recente Posição Comum (COD 2000/00116) do Parlamento e do Conselho relativa à promoção da electricidade produzida a partir de fontes renováveis de energia - seja completada no Livro Verde através de disposições relativas à contribuição das energias renováveis para a produção de calor (biomassa, energia geotérmica, solar-térmica, etc.), que têm um impacto importante aos níveis local e regional, urbano e rural e oferecem potenciais importantes, e não se limite à produção de electricidade, como sucede frequentemente. Propõe ainda que seja amplamente integrada uma componente "renovável" nas construções novas e nas que são objecto de profundas reformas e, de um modo geral, para a construção civil e os transportes, e que os programas comunitários destinados a apoiar este tipo de acções, nomeadamente o ALTENER, sejam adaptados a estes objectivos (questão 7).

24. Recomenda que o conceito de segurança do aprovisionamento dos consumidores da União esteja igualmente presente nos próximos documentos comunitários relativos às directivas da electricidade e do gás, nomeadamente no quadro de um serviço público que deve ser oferecido a todos os cidadãos e que poderia tornar-se, lato sensu, um quarto pilar da política energética comunitária.

25. Entende que, tendo em conta as preocupações ambientais sublinhadas no Livro Verde, os riscos de acidente e a poluição ligados às actividades nucleares devem ser integrados na análise, tal como a luta contra o aquecimento global. e que a utilização do carvão, certamente desfavorável do ponto de vista do efeito de estufa, mas que apresenta inegáveis vantagens em termos de segurança dos aprovisionamentos, da longevidade dos recursos e do desenvolvimento de fileiras europeias "limpas" nos mercados internacionais, não devia ser afastada aprioristicamente (questão 8).

26. Propõe a realização de um "plano de urgência para a redução da intensidade energética" orientado para os PECO, como componente integral da estratégia de segurança de aprovisionamento da UE, associando os órgãos locais e regionais desses países e promovendo a cooperação descentralizada entre o poder local e regional, instrumento de grande importância na transferência de tecnologia e na transposição do acesso comunitário.

27. Insiste em que as redes de pessoas colectivas territoriais locais especializadas no domínio da energia e que pretendem uma política energética sustentável sejam plenamente associadas à reflexão, ao desenvolvimento das acções e à divulgação da informação correspondentes (questão 13).

Bruxelas, 15 de Novembro de 2001.

O Presidente

do Comité das Regiões

Jos Chabert

(1) JO C 57 de 29.2.2000, p. 81.

(2) JO C 22 de 24.1.2001, p. 27.

(3) JO C 144 de 16.5.2001, p. 17.

(4) JO C 144 de 16.5.2001, p. 17.