52001AR0214

Parecer do Comité das Regiões sobre a "Proposta de directiva do Conselho que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros"

Jornal Oficial nº C 107 de 03/05/2002 p. 0085 - 0088


Parecer do Comité das Regiões sobre a "Proposta de directiva do Conselho que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros"

(2002/C 107/26)

O COMITÉ DAS REGIÕES,

Tendo em conta a "Proposta de directiva do Conselho que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros" [COM(2001) 181 final - 2001/0091 (CNS)];

Tendo em conta a decisão do Conselho, de 6 de Junho de 2001, de consultar o Comité das Regiões sobre esta matéria, em conformidade com o n.o 1 do artigo 265.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia;

Tendo em conta a decisão da Mesa do Comité das Regiões, de 12 de Junho de 2001, de incumbir a Comissão 7 - Educação, Formação Profissional, Cultura, Juventude, Desporto e Direitos dos Cidadãos - da elaboração do respectivo parecer;

Tendo em conta o projecto de parecer adoptado pela Comissão 7 em 1 de Outubro de 2001 (CdR 214/2001 rev. 2 - relator: Theódoros Georgakis);

Tendo em conta os artigos 61.o-63.o do Tratado de Amesterdão;

Tendo em conta as conclusões do Conselho Europeu de Tampere, de Outubro de 1999;

Tendo em conta a "Proposta de directiva do Conselho relativa a normas mínimas aplicáveis ao procedimento de concessão e retirada do estatuto de refugiado nos Estados-Membros" (COM(2000) 578 final);

Tendo em conta a "Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu: Em direcção a um procedimento comum de asilo e a um estatuto uniforme, válido na União, para os beneficiários de asilo" (COM(2000) 755 final);

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões, de 11 de Março de 1999, sobre o "Plano de acção contra o racismo" (COM(98) 183 final) - CdR 369/98 fin(1);

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões, de 18 de Novembro de 1999, sobre o tema "Fluxos migratórios na Europa" - CdR 227/1999 fin(2);

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões, de 18 de Novembro de 1999, sobre a "Proposta de Decisão do Conselho que estabelece um programa de acção comunitária em prol da integração dos refugiados" (COM(98) 731 final) - CdR 347/1999 fin(3);

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões, de 14 de Junho de 2000, sobre a "Proposta de decisão do Conselho que cria o Fundo Europeu para os Refugiados" (COM(1999) 686 final) - CdR 80/2000 fin(4);

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões, de 20 de Setembro de 2001, sobre a "Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu - Em direcção a um procedimento comum de asilo e a um estatuto uniforme, válido na União, para os beneficiários de asilo" (COM(2000) 755 final) e a "Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativa a uma política comunitária em matéria de imigração" (COM(2000) 757 final) - CdR 90/2001 fin(5);

Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Social, de 12 de Julho de 2001, sobre a comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu "Em direcção a um procedimento comum de asilo e a um estatuto uniforme, válido na União, para os beneficiários de asilo" (COM(2000) 755 final) e sobre a "Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativa a uma política comunitária em matéria de imigração" (COM(2000) 757 final) (CES 938/2001 e CES 939/2001);

Tendo em conta as observações do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) sobre a "Proposta de directiva do Conselho relativa às normas mínimas para acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros" (ACNUR, Genebra, Julho de 2001),

adoptou por unanimidade, na 41.a reunião plenária de 14 e 15 de Novembro de 2001 (sessão de 15 de Novembro), o seguinte parecer.

1. Considerações do Comité das Regiões sobre a proposta de directiva

1.1. O Comité considera positiva a proposta de directiva da Comissão Europeia que se propõe harmonizar a situação jurídica e as condições de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros da União Europeia, garantindo-lhes um nível de vida digno e o respeito dos direitos humanos durante todo o tempo em que os requerentes mantiverem o referido estatuto. Embora, na generalidade, a proposta de directiva mereça ser apoiada, necessita todavia de uma maior precisão, a fim de garantir a aplicabilidade da directiva, em conformidade com o princípio da subsidiariedade.

1.2. O Comité considera, ademais, que um dos objectivos da harmonização das normas mínimas para o acolhimento dos requerentes de asilo é o de limitar os movimentos secundários devidos à diversidade entre as normas aplicáveis nos Estados-Membros em matéria de condições de acolhimento. A directiva em apreço deixa uma ampla margem de manobra aos Estados-Membros quanto à definição das normas mínimas e não obsta a que se adoptem disposições ulteriores, mais favoráveis até, sobre as condições de acolhimento. Existe pois o risco de não se conseguir evitar movimentos secundários, sempre que não seja garantido o respeito das normas mínimas em todos os Estados-Membros e não sejam rigorosamente observadas as medidas destinadas a tornar o sistema de acolhimento mais eficaz previstas na proposta de directiva.

1.3. No que respeita à definição do conceito de requerente de asilo, que se inscreve no âmbito de aplicação da proposta de directiva e que tem direito às condições de acolhimento previstas, o Comité aprova a interpretação do conceito em sentido lato, de acordo com a Convenção de Genebra relativa ao estatuto dos refugiados, conforme foi por outro lado especificado na proposta de directiva sobre os procedimentos aplicáveis em matéria de reconhecimento e retirada do estatuto de refugiado. Por outras palavras, os requerentes de asilo deveriam beneficiar das condições de acolhimento a partir do momento em que o pedido de asilo é apresentado em qualquer lugar do país de acolhimento (inclusivamente nas fronteiras ou nas zonas internacionais dos aeroportos) até à decisão definitiva da avaliação do pedido.

1.4. O Comité entende que é razoável e evidente conceder um bilhete de identidade especial aos requerentes de asilo, que indique o respectivo estatuto e lhes reconheça o direito de se deslocarem legalmente no país de acolhimento.

1.5. O Comité concorda com a proibição de detenção dos requerentes de asilo e com a possibilidade de derrogar a tal proibição apenas em circunstâncias excepcionais e em condições muito limitadas, mas aprova, em princípio, o direito à livre circulação para os requerentes de asilo que residam legalmente no território de cada um dos Estados-Membros. Cabe, no entanto, reconsiderar a questão da plena liberdade de escolha do local de residência. Já se verificou que o rápido tratamento dos pedidos de asilo é substancialmente facilitado quando o requerente de asilo se encontra num local próximo dos serviços da autoridade competente em matéria de decisão.

1.6. No respeitante ao período de tempo em que os Estados-Membros devem garantir as condições materiais de acolhimento (ou seja, alojamento, alimentação, vestuário e subsídio financeiro) aos requerentes de asilo e aos membros da sua família acompanhante, o Comité entende que seria necessário abranger o período total compreendido entre o momento do reconhecimento como requerente de asilo e a decisão definitiva sobre o pedido apresentado. A proposta de directiva permite aos Estados-Membros escolherem entre fornecer essas condições em espécie ou sob a forma de subsídios financeiros ou de cupões. A aplicação uniforme da regulamentação em todos os Estados-Membros permitiria que se evitasse a desigualdade de tratamento dos requerentes de asilo na União Europeia, e também constituiria, ao mesmo tempo, um instrumento de "pressão" sobre os governos nacionais, para que o exame dos pedidos de asilo seja efectuado em prazos razoáveis, também em conformidade com as disposições da proposta de directiva sobre este assunto. Nos casos em que possa ser exigida uma contribuição financeira nos termos do artigo 19.o, o montante correspondente não deverá ser cobrado a posteriori. Afigura-se mais indicado conceder logo à partida as prestações apenas a título complementar e subsidiário, em função da situação financeira do requerente de asilo.

1.7. O Comité considera que as condições materiais de acolhimento não devem ser retiradas depois da concessão do acesso ao mercado de trabalho. O reconhecimento do direito ao trabalho não implica automaticamente que o requerente de asilo encontre um trabalho susceptível de lhe garantir condições de vida dignas a si e aos seus familiares. Por isso, o Comité considera que, numa primeira fase, deveria estar prevista apenas uma redução das condições materiais de acolhimento, mas estas apenas poderão ser retiradas depois de uma avaliação das condições de vida do requerente de asilo e, em todo o caso, não antes que tenham transcorrido seis meses a partir da apresentação do pedido. Recomenda que, segundo a proposta de directiva em apreço, os Estados-Membros não possam proibir o acesso ao mercado de trabalho e a formação profissional aos requerentes de asilo por um período superior a seis meses a partir da apresentação do pedido de asilo. Visto que a problemática do acesso ao trabalho é muito diversificada nos vários Estados-Membros, o Comité solicita que a sua aplicação seja o mais uniforme possível.

1.8. A proposta de directiva reconhece aos Estados-Membros a possibilidade de escolherem entre várias alternativas quanto à forma sob a qual devem ser fornecidas as condições materiais de acolhimento. Assim, a oferta de habitação, por exemplo, pode consistir no alojamento em locais especificamente destinados para tal fim, ou em centros de acolhimento, ou em casas, apartamentos ou pensões privadas, ou ser garantida através da concessão de um subsídio financeiro. O mesmo vale para a regulamentação proposta no que diz respeito à alimentação, ao vestuário e ao subsídio para as despesas diárias. Ao mesmo tempo, é necessário ter em conta as possibilidades das regiões e das autarquias locais em cujas colectividades se integram e vivem os requerentes de asilo.

1.9. O Comité aprova as propostas da Comissão relativas à prestação de assistência de base sanitária e psicológica durante o procedimento ordinário e de recurso, bem como para enfrentar as emergências sanitárias e psicológicas na pendência dos procedimentos de admissibilidade ou dos procedimentos acelerados. Do mesmo modo, aprova o acesso obrigatório dos menores à instrução pública, para que não se apliquem medidas de expulsão contra estes últimos.

1.10. O artigo 22.o da proposta de directiva prevê a possibilidade de reduzir ou retirar as condições de acolhimento em determinados casos na sequência de comportamentos negativos por parte do requerente de asilo. O Comité gostaria de sublinhar a necessidade de uma aplicação séria e rigorosa desta disposição específica, em conformidade com o espírito da Convenção de Genebra, da Carta Social Europeia e de outros documentos internacionais conexos, que salvaguardam os direitos fundamentais, proíbem as discriminações raciais e têm como alvo as minorias e os grupos vulneráveis.

1.11. No que diz respeito às disposições a favor das pessoas portadoras de exigências particulares, o Comité aprova a avaliação individual da situação de cada requerente de asilo, para verificar a respectiva pertença a esta categoria (não nos podemos limitar ao registo dos menores não acompanhados, dos idosos, das grávidas, etc.), enquanto que a reabilitação e a reinserção das pessoas que sofreram torturas e maus-tratos, que foram sujeitas a comportamentos desumanos, que foram vítimas de violência, etc., devem ser confiadas a centros especiais com pessoal especializado.

1.12. Revestem-se de particular importância as disposições sobre as medidas destinadas a tornar o sistema de acolhimento mais eficaz (artigos 27.o-31.o da proposta de directiva). O Comité dá um relevo especial ao papel central das regiões e das autarquias locais que, tendo em conta a competência e experiência do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados e das organizações não governamentais, deveriam assumir a responsabilidade de garantir relações harmoniosas entre as comunidades nacionais e os centros de acolhimento dos requerentes de asilo, de modo a evitar actos de racismo e xenofobia e a desenvolver um procedimento ordinário de apreciação dos pedidos.

2. Recomendações do Comité das Regiões sobre o acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros

2.1. O Comité concorda com o princípio de que é necessário garantir aos requerentes de asilo condições de vida dignas, e aprova a iniciativa da Comissão que se propõe estabelecer medidas para evitar os movimentos secundários dos requerentes de asilo que, em grande parte, se devem à disparidade existente nos vários Estados-Membros no respeitante às condições de acolhimento.

2.2. O Comité solicita que se estabeleça uma colaboração estreita com a Comissão Europeia no âmbito da aplicação da proposta de directiva (por exemplo, troca de opiniões e de experiências entre as comunidades locais nos vários países e elaboração de relatórios com base nos problemas e nos dados registados nas regiões dos Estados-Membros em que existem centros de acolhimento para os requerentes de asilo).

2.3. No que respeita ao estatuto de refugiado, o Comité das Regiões é partidário de um procedimento unificado que fique concluído rapidamente ou, pelo menos, num prazo razoável. Considera de primordial importância a questão das condições de acolhimento dos requerentes de asilo e defende o acompanhamento sistemático e continuado do processo por parte das regiões, tanto ao nível nacional como ao nível europeu.

2.4. O acolhimento dos requerentes de asilo está directamente relacionado com as colectividades locais e os centros de acolhimento que existem no seu território. Por este motivo, a Comissão, o Parlamento Europeu e os parlamentos nacionais devem concentrar as suas atenções nas boas práticas das políticas de integração locais e regionais. Para o efeito, também poderia contribuir o lançamento, pela Comissão Europeia, de programas transnacionais de cooperação entre organismos locais e regionais sobre o tema das boas práticas relativas às condições e aos procedimentos de acolhimento dos requerentes de asilo.

2.5. O Comité considera que as questões individuais relacionadas com o asilo, objecto de numerosas propostas de directiva, dada a unidade do tema, designadamente as sobreposições e as integrações entre os diversos aspectos, devem ser examinadas de modo geral e global no futuro próximo.

2.6. O Comité gostaria de formular as seguintes observações na especialidade sobre a proposta de directiva:

2.6.1. Em vários pontos, a proposta prevê a possibilidade de os requerentes de asilo apresentarem recurso perante uma autoridade judiciária [por exemplo, quando forem impostas restrições à livre circulação (artigo 7.o); sempre que seja solicitado o pagamento de uma contribuição financeira por parte dos requerentes de asilo (artigo 19.o); nos casos em que não é prestada assistência sanitária e psicológica gratuita (artigo 20.o); etc.]. O Comité entende que é fundamentalmente justa a proposta de garantir protecção judiciária aos requerentes de asilo relativamente a decisões individuais da administração, as quais deverão, sem dúvida, ser plenamente fundamentadas. Todavia, o Comité tem algumas reservas no que toca à rapidez de apreciação dos casos por parte dos tribunais ordinários dos Estados-Membros. Por este motivo, propõe que a proposta preveja explicitamente que os tribunais ajuízem dos recursos nesta matéria num período de tempo razoável e caso a caso. Tal regulamentação contribuiria para evitar a apresentação não fundamentada de recursos judiciários devido à divulgação tardia das decisões (dada a validade cronologicamente limitada das condições materiais de acolhimento), bem como o prolongamento da incerteza para os requerentes de asilo, com tudo o que tal comporta.

2.6.2. A entidade independente prevista no artigo 18.o da proposta é competente para apreciar as reclamações e decidir sobre os litígios relativos às condições materiais de acolhimento. Os temas em que se baseia a proposta em apreço inserem-se, em grande parte, no âmbito das competências das regiões e das autarquias locais. O Comité propõe que se preveja especificamente confiar essas competências a uma entidade independente de que também possam fazer parte as administrações locais. Os litígios relacionados com as condições concretas de acolhimento devem ser tratados, em cada Estado-Membro, com base no respectivo sistema nacional. A entidade em causa apreciará as reclamações de modo imparcial e objectivo, respeitando o direito à diversidade e a proibição de discriminar, conforme está previsto, aliás, no artigo 32.o da proposta de directiva.

2.6.3. O Comité apoia a necessidade de impor ao Estado a obrigação de fornecer os recursos necessários às regiões e aos órgãos das autarquias locais envolvidos no processo, dado que estes são, em grande medida, por natureza e funcionamento, os organismos competentes nesta matéria, com o intuito de viabilizar a aplicação das disposições nacionais da proposta de directiva em apreço (artigo 31.o da proposta).

2.7. O Comité das Regiões é favorável a que os requerentes de asilo possam ter acesso a serviços de assistência adaptados à sua situação, que poderão incluir programas de formação, o que contribuirá para melhorar as condições de acolhimento e, ao mesmo tempo, para facilitar a sua inserção na sociedade do país em questão após aceitação do pedido de asilo.

Bruxelas, 15 de Novembro de 2001.

O Presidente

do Comité das Regiões

Jos Chabert

(1) JO C 198 de 14.7.1999, p. 48.

(2) JO C 57 de 29.2.2000, p. 67.

(3) JO C 57 de 29.2.2000, p. 71.

(4) JO C 317 de 6.11.2000, p. 4.

(5) JO C 19 de 22.1.2002, p. 20.