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Parecer do Comité das Regiões sobre «A cooperação local e regional para proteger as crianças dos maus tratos e abandono na União Europeia»

Jornal Oficial nº C 057 de 29/02/2000 p. 0046 - 0055


Parecer do Comité das Regiões sobre "A cooperação local e regional para proteger as crianças dos maus tratos e abandono na União Europeia"

(2000/C 57/07)

O COMITÉ DAS REGIÕES,

Tendo em conta a decisão da Mesa de 2 de Junho de 1999 de, nos termos do § 5 do artigo 265.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, emitir parecer sobre "A cooperação local e regional para proteger as crianças dos maus tratos e abandono na União Europeia" e incumbir da sua preparação a Comissão 7 "Educação, Formação Profissional, Cultura, Juventude e Direitos dos Cidadãos";

Tendo em conta o parecer do Comité sobre "A cooperação transfronteiriça e transnacional entre autarquias locais" (CdR 145/98 fin)(1);

Tendo em conta o parecer do Comité sobre a "Comunicação da Comissão sobre medidas relativas à violência exercida contra as crianças, os jovens e as mulheres incluindo uma proposta de decisão do Conselho relativa a um programa de ajuda comunitária a médio prazo sobre medidas destinadas a apoiar à escala comunitária a acção dos Estados-Membros no domínio da violência exercida contra as crianças, os jovens e as mulheres" (programa Dafne) (2000-2004) (CdR 300/98 fin)(2);

Tendo em conta o projecto de parecer aprovado em 1 de Outubro de 1999 (CdR 225/99 rev. 2) pela Comissão 7, sendo relatora Ruth Henig (RU-PSE),

adoptou, na 31.a reunião plenária de 17 e 18 de Novembro de 1999 (sessão de 18 de Novembro) o presente parecer por unanimidade.

1. Introdução

1.1. A União Europeia incentiva uma maior mobilidade dos cidadãos no espaço europeu mas, até recentemente, pouco tinha feito para coordenar práticas, promover o bem-estar e os direitos das crianças e para ponderar vias para melhor as proteger contra sevícias.

1.2. O Comité das Regiões, como afirmou no seu parecer sobre a matéria, congratula-se com a "Proposta de decisão do Conselho relativa a um programa de ajuda comunitária a médio prazo sobre medidas destinadas a apoiar à escala comunitária a acção dos Estados-Membros no domínio da violência exercida contra as crianças, os jovens e as mulheres" (programa Dafne) (2000-2004). A proposta representa um significativo avanço na prevenção da violência e sevícias. O programa produzirá um valor acrescentado europeu ao empreender e consolidar acções de cooperação, de coordenação e de intercâmbio de informações com base nas várias experiências no terreno.

1.3. O programa Dafne já contribuiu para o desenvolvimento de práticas e de intercâmbio de informação na União Europeia em matéria de protecção do bem-estar e dos direitos das crianças. Em consequência da iniciativa Dafne, o Comité das Regiões trabalhou com organizações não governamentais no campo da cooperação regional para proteger as crianças contra sevícias.

1.4. Na União Europeia há mais de 120 milhões de crianças e jovens que têm o direito a viver uma infância livre de crueldade ou negligência. A realização do mercado único, a crescente liberdade de circulação através das fronteiras nacionais, bem como a criação de uma cidadania europeia comum que inclui o direito a viver e trabalhar em qualquer Estado-Membro, sublinham a necessidade urgente de uma estratégia à escala comunitária em matéria de prevenção das sevícias e abandono de crianças.

1.5. Embora o programa Dafne venha dar um contributo importante, o parecer do CR lamentou o orçamento limitado (25 milhões de ecus para 2000-2004 na proposta original; 20 milhões de ecus para 2000-2003 na posição comum do Conselho de 26 de Julho de 1999), bem como a base jurídica proposta (artigo 129.o - Saúde pública), devido à falta de uma base jurídica adequada para medidas no âmbito da protecção dos direitos humanos. Como é frisado no parecer, impõe-se que a Comissão Europeia garanta que a definição de saúde pública seja objecto de uma interpretação lata, de modo que as acções de prevenção de todas as formas de violência sejam abrangidas pelo programa.

1.6. As sevícias contra crianças ocorrem em todos os meios: na família, em instituições de apoio diário e residenciais e em ambientes de lazer. Os abusos podem ser exercidos por adultos ou jovens, por empregados da família ou outros profissionais em contacto com crianças. A violência contra crianças é prevalente em todos os países europeus. Importa considerar em particular os casos de maus tratos infligidos a crianças no contexto do ingresso prematuro no mundo do trabalho, da incitação à mendicidade ou prostituição e da exploração exercida quer pela família quer por terceiros. Em muitos países europeus, tal fenómeno está associado à existência de refugiados económicos, de minorias e, em geral, de grupos que vivem em condições de exclusão social e de pobreza. Estas condições de vida dão lugar à exploração dos menores desde a infância, expõem as crianças em idade escolar e pré-escolar a múltiplos perigos, privam-nas do direito elementar a um desenvolvimento normal e provocam a sua marginalização quando adultos.

2. Observações na generalidade

2.1. Sevícias contra crianças

2.1.1. O CR já tinha reconhecido (parecer do CR sobre o programa Dafne o facto de a violência exercida contra crianças e jovens ser um problema social real em toda a Europa, presente em todas as classes sociais, independentemente do seu grau de desenvolvimento socioeconómico e cultural.

2.1.2. As crianças tornam-se vulneráveis em virtude da sua dependência, ficando assim expostas a uma série de riscos e de perigos. Mas as crianças têm poucas possibilidades e oportunidades de exprimir a forma como entendem, enfrentam e agem diariamente - e sem ajuda dos adultos - no atinente a tais experiências.

2.1.3. A violência contra crianças não é um conceito absoluto. Com excepção de determinadas violências sexuais também deveria ficar claro que os maus tratos raramente são um evento, um único incidente que impõe acções para proteger a crianças. Os tipos de abuso sobrepõem-se, de modo que uma criança que tenha vindo a ser maltratada fisicamente quase certamente sofrerá emocionalmente e os abusos sexuais podem envolver força física, ameaças ou castigos.

2.1.4. Há muitos comportamentos que devem ser apreciados no seu contexto, antes de poderem ser considerados como maus tratos. Contudo, as decisões sobre os limites a partir dos quais há lugar para uma intervenção são tomadas sem consultar as crianças ou sem as envolver no processo de decisão. A violência familiar continuada, em que por exemplo as crianças vêem regularmente a própria mãe a ser espancada, pode afectá-las tanto como se fossem elas a serem dura e frequentemente atingidas, mas raramente essa violência será considerada um comportamento abusivo.

2.1.5. No entanto, a violência é dos principais factores que levam os jovens a fugir de casa, com os perigos que isso implica. Opressões, maus tratos e violência contra crianças que são acompanhadas longe das suas próprias casas também provoca fugas.

2.2. Cidadania

2.2.1. Até recentemente não existiam disposições nos Tratados da União Europeia que permitissem abordar as questões relativas às crianças, apesar de a realização do mercado único e da crescente liberdade através das fronteiras nacionais terem afectado crianças e jovens e terem gerado novos problemas para os organismos de protecção à infância. As crianças europeias não foram mencionadas nos Tratados Europeus, nem ouvidas pelas instituições europeias. Era como se 120 milhões de crianças e jovens da União Europeia fossem invisíveis e ignorados.

2.2.2. O Tratado incumbiu a União de prestar particular atenção à política de formação em áreas como igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, terceira idade, minorias étnicas, deficientes, mas não incluía disposições sobre as crianças. Assim, embora existisse um consenso generalizado de que as crianças e jovens estavam abrangidos pelo Tratado da União Europeia, a sua posição como cidadãos europeus estava longe de ser clara.

2.2.3. Esta ausência de referências tornou difícil a possibilidade de legislar directamente em favor dos interesses das crianças e dos jovens, bem como de afectar verbas dos fundos estruturais europeus à promoção da igualdade de oportunidades para eles.

2.2.4. O Tratado de Amsterdão, de Outubro de 1997, introduz uma nova cláusula de não discriminação; no artigo 13.o, inclui-se a discriminação com base na idade, implicando que as crianças deveriam constar das disposições do Tratado. Embora se possa considerar este um progresso limitado, é um marco importante para o reconhecimento de que as crianças também são cidadãos europeus e como tal devem ser consideradas, devem poder desenvolver o seu potencial e ser protegidas da crueldade.

2.2.5. O artigo 3.o da Convenção das Nações Unidas sublinha que em todas as medidas relativas às crianças, quer tomadas por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou organismos legislativos, os interesses da criança devem ser a preocupação principal. Este princípio constitui um teste para os adultos avaliarem as suas decisões e acções no atinente às crianças.

2.2.6. As crianças devem participar nas decisões que afectam as suas vidas. Escutar as crianças e ouvir o que têm para dizer é a base para elaborar direitos humanos concretos para as crianças. Este procedimento valoriza as perspectivas das crianças, mas não é fácil de cumprir nem é universalmente aceite.

2.2.7. Um contributo para a prevenção consiste em dar poder e voz às crianças, de modo a que saibam onde e como procurar ajuda. As forças políticas locais podem contribuir eficazmente para dar poder às crianças, encorajando a sua participação no planeamento e no desenvolvimento de serviços locais e dando resposta às preocupações das crianças sobre certos temas ou questões. Tanto as crianças como os jovens deveriam estar conscientes dos seus direitos, poder apresentar denúncias e contar com advocacia independente. As autoridades locais e regionais podem defender os direitos das crianças e dos jovens de diversas maneiras dependendo do modo como a ajuda e o apoio a elas destinados forem organizados nos respectivos Estados-Membros mediante a nomeação de um provedor ou comissário para as crianças, independente.

2.2.8. Os governos locais e regionais deveriam elaborar planos integrados e globais para as crianças e jovens, reunindo e articulando todas as acções dirigidas à promoção dos direitos e à prevenção dos problemas, assegurando a sua coordenação e supervisão. A incorporação do princípio de subsidiariedade nos Tratados europeus conferiu responsabilidades adicionais às autoridades locais e regionais. A Europa dos Cidadãos será alcançada mediante a descentralização administrativa, o que dará uma nova dimensão à cooperação transfronteiriça e transnacional e indica uma importante abordagem da base para o topo em matéria de integração europeia. Os regimes cada vez mais descentralizados aproximarão os governos dos cidadãos e criarão maiores responsabilidades democráticas. As crianças e os jovens não deveriam ficar à margem deste processo e a UE deveria encorajar o poder local e regional a promover os direitos das crianças e dos jovens de forma adequada aos Estados-Membros, o que pode incluir a designação de provedores das crianças a nível local, que partilhariam conhecimentos e práticas sobre as questões que envolvem e afectam as crianças e jovens de toda a Europa.

2.3. Papel da administração local e regional

2.3.1. A administração local e regional na Europa, devido à sua proximidade e à sua representação das comunidades locais, está numa posição única para empreender acções positivas em nome das crianças, para apoiar os princípios fundamentais da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, bem como para aprovar decisões que garantam a protecção das crianças contra sevícias e negligência.

2.3.2. A administração local e regional proporciona às crianças e jovens uma ampla gama de serviços, nomeadamente assistência social, instrução e actividades de lazer, e tem de assegurar que as crianças e jovens que utilizam tais serviços não corram perigos. Além disso, também tem a responsabilidade de garantir que as crianças e jovens na sua jurisdição, alvo de sevícias ou negligência, obtenham resposta e ajuda de forma atenta e sensível.

2.3.3. As recomendações para uma acção local e regional para combater a violência exercida contra crianças na UE (em anexo), apresentadas pelo Comité das Regiões no seminário sobre "Cooperação local e regional para a protecção das crianças contra os maus tratos", efectuado em 4 de Dezembro de 1998, são a expressão do empenho das autoridades na cooperação transfronteiriça e de intercâmbio de práticas numa Europa em que o princípio de subsidiariedade inscrito nos Tratados deu às autoridades locais e regionais maiores responsabilidades. As referidas recomendações deveriam ser tidas em conta tanto a nível local como europeu.

2.3.4. A coordenação e a comunicação eficazes entre as autoridades é de importância vital sempre que existam diversos sistemas e organismos diferentes com responsabilidades relativamente às crianças. A cooperação em defesa do bem estar das crianças implica o intercâmbio de experiências e, sempre que possível, a adopção das "melhores práticas".

2.3.5. Há que reforçar a cooperação local e regional na UE para combater os casos de sevícias a crianças. Tal cooperação deverá incluir os países candidatos à adesão, particularmente os países associados da Europa Central e Oriental, a quem traria vantagens particulares no âmbito dos respectivos esforços para melhorar a protecção dos direitos humanos no quadro da estratégia de pré-adesão.

2.3.6. A UE deveria apoiar a cooperação entre as autoridades locais e regionais, em toda a União e nos países candidatos, trabalhando em parceria com as ONG, de modo a combater as sevícias a crianças mediante a divulgação das melhores práticas, o intercâmbio de informação e a promoção de campanhas de sensibilização do público, em particular no âmbito do proposto programa Dafne.

2.3.7. Face à constatação (ponto 1.6 do presente parecer) de que existe um número significativo de crianças que são vítimas da exploração económica e sexual exercida pelos adultos, sofrem sevícias e vivem na mais absoluta miséria, considera o Comité necessário fazer tudo o que seja possível tanto no âmbito do programa Daphne como na legislação sobre a matéria. O poder regional e local é a instância mais adequada e deve ser apoiado por forma a tomar a iniciativa de criar mecanismos de identificação, acompanhamento e apoio das crianças que continuam excluídas das estruturas de educação e assistência social.

3. Observações na especialidade

3.1. Necessidade de informação - a escala do problema

3.1.1. As sevícias infligidas a crianças são um problema significativo na União Europeia. Trata-se de um fenómeno que não conhece fronteiras, sendo, pois, necessário um esforço concertado a todos os níveis e em toda a UE - incluindo os órgãos de poder local e regional - para o combater eficazmente.

3.1.2. Não existem dados sobre a extensão deste tipo de sevícias na União Europeia; impõe-se, pois, a sua recolha e tratamento. As definições e registos de sevícias são diferentes de Estado-Membro para Estado-Membro. A UE deveria promover, nesta matéria, a criação de bases de dados para se identificar o tipo de informação que é relevante para a compreensão do fenómeno das sevícias infligidas a crianças, à escala europeia. O Eurostat poderia apoiar este processo, em colaboração com o poder local e regional.

3.1.3. As sevícias infligidas a crianças podem levá-las a fugir de quem cuida delas e, para garantir que tais crianças não serão ignoradas e para auxiliar as autoridades competentes dos diversos países a encontrá-las, deveria ser criado um registo europeu de crianças desaparecidas. Também seria útil explorar a possibilidade de as forças policiais de toda a Europa utilizarem a Internet para aí disponibilizarem fotografias e outros dados referentes a crianças desaparecidas.

3.1.4. O governo do Reino Unido criou um sistema de registo de pessoas condenadas por crimes sexuais. Esta abordagem implica o reconhecimento do elevado risco de que quem comete crimes sexuais possa reincidir após a condenação ou ser libertado de prisão e tem sido eficaz em seguir os movimentos de tais pessoas e no estabelecimento do seu paradeiro. Para ser verdadeiramente eficaz, este sistema deveria ser alargado a toda a UE. Os Estados-Membros deverão examinar se e até que ponto este sistema, eventualmente modificado, deverá ser introduzido a nível europeu.

3.1.5. Actualmente, as forças policiais registam informações acerca de pessoas condenadas por pedofilia, pornografia infantil, prostituição infantil e tráfico de mulheres e crianças. No entanto, não existe um sistema a nível pan-europeu e a protecção das crianças seria acrescida com um protocolo para intercâmbio de informação entre forças policiais na UE (um acordo formal sobre informações a registar e partilhar). A Europol poderá encabeçar a elaboração desse protocolo, devendo ser criada na Europol uma unidade especial para a protecção das crianças.

3.1.6. É sabido que actualmente as bases de dados das autoridades locais não traduzem a incidência ou prevalência de sevícias infligidas a crianças, visto que utilizam definições muito diferentes e podem referir-se tanto a casos alegados como a casos confirmados. Todavia, tornar-se-ão cada vez mais úteis a partir do momento em que as definições forem homogéneas e só forem registados os casos confirmados.

3.1.7. Nas presentes circunstâncias, uma via para obter dados correctos, pertinentes e válidos sobre a incidência de sevícias, seria um estudo à escala europeia, com base numa amostra significativa do conjunto da população.

3.2. Auxiliar as crianças a relatarem as sevícias

3.2.1. Em 1996, foi publicado no Reino Unido o relatório da Comissão Nacional de Inquérito para a Prevenção de Maus Tratos. Mais de 10000 pessoas, algumas das quais tinham sofrido sevícias quando eram crianças, deram a conhecer os seus pontos de vista, por carta, por declaração escrita ou pessoalmente. A Comissão Nacional concluiu que qualquer exame equilibrado de sevícias a crianças deverá encarar algumas verdades incómodas. Nomeadamente, há que aceitar o facto de mais de metade das sevícias ocorridas, por vezes durante longos períodos da vida da criança, não serem conhecidas no momento em que sucedem e, além disso, as crianças que falam sobre isso continuarem a ser uma minoria.

3.2.2. A Comissão concluiu que as vantagens de falar deveriam ser sublinhadas e afirmou que em cerca de um quarto dos casos tinha sido informada de que o facto de a vítima falar tinha travado a continuação das sevícias. O facto de a vítima falar é visto como o primeiro passo do processo e pode ser útil para pôr termo às sevícias. A Comissão considerou que apesar da maioria dos que falaram ser jovem, o medo, a ignorância e a falta de conhecimentos confluíram no contributo para impedir a vítima de falar.

3.2.3. A solução para o desafio que se coloca em toda a Europa em matéria de sistemas de protecção das crianças reside na criação de sistemas que ajudem as crianças a falar sobre as sevícias sofridas e a estarem confiantes no auxílio que receberão, sistemas em que a opinião pública confie em que todos os casos suspeitos sejam denunciados. Um caminho a seguir será analisar as actuais práticas em toda a Europa e falar com as crianças e jovens sobre a sua eficácia, de modo a definir as melhores práticas. As autoridades locais e regionais estão bem colocadas para efectuar esse trabalho e a UE deveria encorajá-las a informarem os casos ocorridos. Essa actividade poderia ser coordenada pelo Comité das Regiões.

3.3. As crianças a denunciarem as sevícias e a obterem ajuda

3.3.1. Crianças de idades diferentes têm necessidades diferentes. Por exemplo, as crianças com mais de 12 anos e a frequentarem o ensino secundário têm mais mobilidade, independência e mais capacidade para aceder e utilizar a gama de serviços que as autoridades locais, por intermédio dos departamentos para a juventude e a comunidade e outras organizações, colocam à sua disposição.

3.3.2. As crianças do ensino primário, dos 4 a 5 anos de idade para diante, até ao ensino secundário, têm oportunidades de independência mais restritas e merecem atenção particular. O papel da escola, onde passam grande parte do tempo, bem como o do professor são muito importantes para este grupo etário. Os professores podem ajudar a identificar as crianças que estão a ser vítimas de sevícias e a criar a atmosfera necessária para que a criança possa dar conta das suas preocupações, numa fase inicial. Outro meio eficaz para ajudar os menores a denunciarem a sua situação consiste nos meios de comunicação a que têm facilmente acesso, como a televisão, que permite chegar aos menores em dificuldade directamente dentro das paredes de casa. As estruturas para as quais devem ser orientados serão as que já conhecem, isto é, a escola.

3.3.3. Nos relatórios de investigação, as crianças disseram quais as atitudes que pretendem dos "profissionais": escuta atenta, disponibilidade e uma atitude isenta em termos de apreciação e de orientação. Tal tem implicações a nível de formação de professores, que deve assegurar que sejam desenvolvidas as capacidades de escuta. Há oportunidade para desenvolver e adoptar abordagens de "melhores práticas" nos institutos de formação de professores, em toda a Europa.

3.3.4. A escola também tem um papel importante no aumento do conhecimento dos jovens acerca do mundo dos adultos, das relações humanas, da decisão de ter filhos e na compreensão dos direitos, de relações abusivas e de responsabilidade, bem como onde se dirigir em caso de problemas ou preocupações. Deve-se respeitar a diversidade de tipos de família e de culturas na Europa, mas a compreensão das diferenças pode ajudar a aprender algo sobre a vida dos adultos e a tomada de decisões.

3.3.5. Em muitos Estados-Membros há serviços de assistência social a famílias com crianças em idade pré-escolar. Em particular, os colaboradores do serviço de protecção à infância, as enfermeiras locais ou os visitadores do sistema de saúde especialmente formados têm um papel importante no apoio às famílias com problemas, identificando circunstâncias potencialmente susceptíveis de gerarem abusos e identificando e tratando problemas de desenvolvimento e de doenças mentais. O valor de tais serviços para a prevenção de maus tratos não pode ser subestimado.

3.3.6. As crianças também têm acesso a computadores, frequentemente sem vigilância. A Internet é uma fonte de informação cada vez mais acessível e importante, mas impõe-se aumentar a sensibilização para o facto de a Internet poder ser usada ilicitamente para divulgação de matéria ilegal.

3.3.7. As crianças podem ser exploradas pela captação de imagens de actos de sevícias, particularmente de natureza sexual, de que sejam vítimas. As crianças podem deparar casualmente com material "para adultos", podem receber mensagens electrónicas convidando-as a visitar sítios pornográficos e não perceberem que há adultos que se fazem passar por crianças nos espaços de conversa para crianças. A fim de proteger as crianças e os jovens deste género de abusos, haveria que elaborar um quadro jurídico à escala comunitária que permitisse a incriminação dos produtores e prestadores de serviços que consentem o armazenamento e a consulta de pornografia infantil através dos meios de comunicação que comercializam.

3.3.8. As autoridades locais e regionais têm um papel importante na sensibilização, particularmente devido à sua responsabilidade nos serviços de educação. Há que agir em matéria de familiarização dos professores com as novas tecnologias da informação, com a utilização adequada do acesso à Internet tanto em casa como na escola, bem como com as formas de ensinar as crianças e jovens no sentido da utilização responsável.

3.4. O papel de adultos responsáveis

3.4.1. Impõe-se a existência de uma rede eficaz de serviços locais bem coordenados, para dar resposta às preocupações acerca de sevícias, para assegurar que tais preocupações sejam devidamente investigadas e que, caso seja necessário agir para proteger as crianças, tal acção seja levada a cabo.

3.4.2. Sempre que crianças ou adultos manifestem preocupações deverão ser tomados a sério. As preocupações podem ser manifestadas a professores, profissionais da saúde, assistentes sociais, trabalhadores em serviços de lazer ou da polícia. As crianças aproximar-se-ão daqueles em que pensam poder confiar. Não deverão ser desiludidas.

3.4.3. Os referidos profissionais necessitam de formação para compreender as sevícias infligidas a crianças, para perceber que as preocupações devem ser tidas em consideração de forma séria e para saber como responder. Protocolos locais ou procedimentos para dar respostas a preocupações ajudam os profissionais a saber o que fazer. A formação dos profissionais é importante.

3.4.4. Quem lida com crianças, nas escolas, nos infantários, em instituições residenciais e em instalações de saúde, deve ser formado para reconhecer os casos de sevícias e ser capaz de lhes dar resposta e de assegurar que as preocupações manifestadas suscitem actuação. Deveria haver intercâmbio das actuais práticas das autoridades locais e regionais nesta matéria e as melhores práticas deveriam ser identificadas e adoptadas.

3.4.5. Os departamentos de pessoal e de formação dos órgãos do poder local e regional podem promover uma formação polivalente do pessoal em diferentes departamentos e organizações, com vista a tornar todo o pessoal competente para reconhecer práticas de sevícias.

3.5. Melhores práticas para ajudar as crianças e as famílias

3.5.1. São necessários serviços não estigmatizantes para as crianças e para as famílias em que se verificaram casos de sevícias. Deveria ser feita uma avaliação das necessidades da criança e planeada a acção adequada. A segurança da criança é primordial, mas a maioria das famílias pode ser auxiliada e apoiada na base de voluntariado. Importa apoiar o trabalho com as famílias para prevenir futuros casos de maus tratos. De facto, só em casos extremos os menores são retirados à família. No entanto, não se devem subestimar os casos menos graves em que, para proteger o menor, há, frequentemente, que resolver problemas a montante e intervir para remediar a falta de comunicação dentro da família, que, em muitos casos, a longo prazo, conduz a manifestações de violência física e psíquica.

3.5.2. Deveria ser encorajada e desenvolvida a elaboração de manuais de boas práticas profissionais, tirando partido e fazendo intercâmbio de práticas nos e entre Estados-Membros, o que seria vantajoso para os que trabalham neste domínio. Também é importante a aprendizagem acerca de "más práticas", isto é, aprender com que o que aconteceu em circunstâncias em que as crianças foram mortas. Essa informação poderia levar à elaboração e instituição de padrões reconhecidos e de programas de garantia de qualidade.

3.5.3. Há exemplos de provedores da criança que têm um papel na recolha e na divulgação de informações sobre práticas - "melhores práticas" e "más práticas" - o que constitui mais um argumento para se considerar a possibilidade de criar esta função a nível europeu, nacional, regional e local.

3.6. Seleccionar com cuidado - recrutamento e selecção de pessoal

3.6.1. São as autoridades locais ou regionais, bem como outras organizações e prestadores de serviços, quem tem o dever de ter cuidado no recrutamento e fornecimento de pessoal para prestar serviços nas instituições residenciais, de dia ou comunitárias, de forma a garantir a segurança das crianças. É útil pensar em termos de barreiras. Quanto mais barreiras houver, mais dificuldade terão os pedófilos em as ultrapassar e maior será a protecção das crianças e dos jovens.

3.6.2. Um requisito essencial é assegurar, tanto quanto possível, mediante boas práticas de recrutamento, rigorosas e eficientes, a escolha das pessoas adequadas para lidar com crianças e o afastamento ou rejeição as que mereçam objecções.

3.6.3. O processo formal de selecção deve incluir uma combinação de métodos de avaliação, nomeadamente provas escritas, exposições orais, exercícios de grupo, testes psicométricos, entrevistas individuais ou outros métodos adequados às circunstâncias. As abordagens com base na competência identificam as qualificações, capacidades, conhecimentos, comportamentos e valores indispensáveis para exercer com êxito uma tarefa e tais competências podem ser descritas e avaliadas mediante um processo de selecção.

3.6.4. Dado que quem abusa sexualmente tem como alvo as crianças mais vulneráveis, também procura as oportunidades de emprego que lhe possibilitem contactos regulares e fáceis com crianças e construir relações que possam explorar.

3.6.5. Para a salvaguarda das crianças, é importante garantir que quem tenha sofrido condenações significativas não trabalhe com crianças em nenhuma instalação comunitária local residencial ou de dia. É uma responsabilidade pesada para as autoridades locais e regionais e de difícil aplicação correcta, porque os crimes cometidos noutros países dificilmente são descobertos. Se um indivíduo viveu e trabalhou algures na Europa, pode apresentar "certificados de boa conduta", devendo a EUROPOL ter uma função de verificação dos mesmos.

3.6.6. Deve-se reconhecer que estes procedimentos têm limitações. Muitos adultos que trabalham com crianças e que lhes infligem maus tratos nunca são denunciados aos empregadores. Mesmo que o sejam, pode acontecer que não haja denúncias à polícia. Nestas circunstâncias, impõe-se que as autoridades assegurem a existência de bons sistemas de vigilância, de modo que quaisquer preocupações acerca das práticas ou comportamentos de elementos do pessoal possam ser identificadas. Há oportunidades para as autoridades locais e regionais trocarem informações sobre "melhores práticas" e as promoverem no seu território.

3.7. Fazer campanha para aumentar a sensibilização acerca das sevícias infligidas a crianças

3.7.1. Devido à sua proximidade e representação das comunidades locais, as autoridades locais e regionais estão numa posição única para levar a cabo acções positivas em favor das crianças e, em particular, para promover campanhas de sensibilização acerca das sevícias infligidas a crianças nas suas autarquias e dos perigos para as crianças, assim como para se ocuparem do tabu da interferência nas famílias. O público precisa de informação e de ser incentivado a denunciar as sevícias. É preciso que saiba onde deve efectuar a denúncia e que esta será levada a sério.

3.7.2. As autoridades locais e regionais podem lançar campanhas de combate aos maus tratos, defendendo, por exemplo, a tolerância zero para todas as formas de violência exercida contra crianças, e liderar as campanhas lançadas a nível europeu, sempre que adequado em conjugação com organizações não governamentais.

3.8. Requisitos da legislação paneuropeia

3.8.1. Existe actualmente uma grande diversidade quer de legislação, na Europa, em matéria de protecção das crianças, de poderes da polícia e das autarquias locais e regionais, quer de capacidade de os sistemas e processos judiciais se centrarem na criança e se adaptarem a ela, por exemplo no que diz respeito à utilização de depoimentos efectuados por crianças e registados em vídeo, bem como à existência de juizes especializados. A UE deveria analisar a legislação vigente, identificar os benefícios para as crianças e recomendar medidas para que cada país pudesse contribuir para um quadro jurídico à escala europeia para a protecção das crianças.

4. Conclusões

4.1. A União Europeia incentiva a maior mobilidade dos cidadãos no espaço europeu mas, até recentemente, pouco tinha sido feito para coordenar práticas, promover o bem-estar e os direitos das crianças e para ponderar vias para melhor as proteger contra sevícias.

4.2. Deveria ser reconhecido de forma mais clara, e trabalhar-se a partir dele, o papel-chave do poder local e regional na Europa em empreender uma acção positiva no interesse das crianças, para apoiar os princípios fundamentais da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, bem como para aprovar decisões que garantam a protecção das crianças contra sevícias e negligência.

4.3. A Europa dos Cidadãos requer estruturas mais descentralizadas e também maior coordenação e cooperação transfronteiriça e transnacional. As crianças e os jovens não devem ser ignorados neste processo e a UE deveria considerar formas de promover, nos Estados-Membros e na Europa, os direitos das crianças e dos jovens, o que pode compreender a designação de provedores da criança locais, que partilhariam conhecimentos e práticas sobre questões que envolvem e afectam crianças e jovens em toda a Europa. Com efeito, as pessoas colectivas territoriais regionais e locais, dadas a sua proximidade da população e as suas competências no domínio social, estão em condições de iniciar acções especificas em favor das crianças. No entanto, visto que a União Europeia é favorável a tais iniciativas, seria bom conhecer-se a forma como vai apoiar as acções conduzidas localmente pelas pessoas colectivas territoriais ou o intercâmbio de experiências a nível transfronteiriço, para além dos financiamentos previstos através do futuro programa Daphne.

4.4. O Comité das Regiões tem um papel a desempenhar na coordenação do desenvolvimento de modelos de "melhores práticas" de organizações e autarquias de toda a Europa e em os tornar acessíveis às autoridades locais. As recomendações para acções do poder local e regional, em toda a UE, para combater as sevícias a crianças (em anexo), apresentadas pelo Comité das Regiões no "Seminário sobre a cooperação local e regional para a protecção das crianças contra os maus tratos" é a expressão do empenhamento do CR na cooperação transfronteiriça e na partilha de práticas entre autoridades, bem como do papel eficaz do CR na coordenação de actividades.

4.5. No passado, a ausência de referências às crianças nos Tratados Europeus dificultou a concentração directa nas necessidades e interesses das crianças e dos jovens, bem como a orientação dos fundos estruturais europeus para actividades orientadas para a promoção do seu bem-estar. O Tratado de Amsterdão, ao introduzir uma nova cláusula de não discriminação, clarifica o facto de as crianças deverem ser incluídas nas disposições do Tratado, reconhecendo que as crianças também são cidadãs da Europa. Esta posição poderia, ainda, ser consagrada em legislação, devendo ser reconhecida a necessidade urgente de uma estratégia a nível da União Europeia em matéria de prevenção de maus tratos a crianças e negligência (e actuar nesse sentido), sem prejuízo das competências específicas das autoridades nacionais, regionais e locais.

4.6. O Comité das Regiões acolhe favoravelmente as oportunidades oferecidas pelo programa Dafne de reforço da cooperação entre as ONG e as autoridades locais e regionais em toda a UE. O CR congratula-se com o facto de verificar que o apelo que fez no seu parecer(3) à promoção da cooperação entre autoridades locais e regionais e ONG na aplicação do programa e em redes de informação ter sido recentemente apoiado pelo Parlamento Europeu (primeira leitura), pela Comissão (proposta alterada) e pelo Conselho (posição comum). Para além desta cooperação entre as pessoas colectivas locais e as ONG, parece importante a ligação em rede das pessoas colectivas territoriais, para enriquecer as acções actualmente conduzidas em cada Estado-Membro.

4.7. O Comité das Regiões entende que os recursos disponíveis devem ser aumentados para facilitar a criação pelos órgãos de poder local e regional de mecanismos de identificação, registo, acompanhamento e apoio das crianças que são vítimas de maus tratos, exploração e abandono, bem como das suas famílias. Estes mecanismos devem:

- garantir a possibilidade de acesso às estruturas de protecção social, saúde e educação das crianças em situação de trabalho precoce ou forçadas à mendicidade ou pornografia ou que vivem na miséria;

- assegurar o desenvolvimento físico, afectivo e intelectual das crianças;

- alargar a prestação de serviços a todas as crianças que se encontrem no território de um Estado-Membro (quer vivam em condições legais ou clandestinas, provisórias ou permanentes);

- cooperar com os mecanismos ou serviços correspondentes nos locais de acolhimento futuro das crianças com vista ao seu acompanhamento.

4.8. O Comité das Regiões considera ainda que convém solucionar por via legislativa, a nível nacional e europeu, os problemas específicos das crianças pertencentes a grupos deslocados (refugiados económicos, povos nómadas como ciganos, etc.) entre as regiões de um mesmo Estado ou os Estados-Membros da UE.

4.9. A informação sobre a extensão da prática de sevícias na UE deveria ser obtida através dos dados existentes, sabendo-se que actualmente há diversas formas de classificação e de registo de informações sobre sevícias infligidas a crianças. A UE deveria fazer um relatório da actual recolha de dados com o objectivo de identificar a informação que é pertinente para o entendimento do fenómeno das sevícias infligidas a crianças, à escala europeia.

4.10. Deveria haver outras bases de dados à escala europeia para protecção das crianças: um registo europeu de crianças desaparecidas; eventualmente, um sistema europeu de registo e localização de condenados por crimes sexuais e um protocolo para o intercâmbio de informações entre forças policiais, o que também aumentaria o cuidado posto no exame do perfil e do passado do pessoal, na sua selecção.

4.11. Em muitas áreas de actividade, os manuais de boas práticas profissionais, beneficiando de, e partilhando a prática a nível de cada Estado, seria muito útil para os profissionais no terreno e deveriam ser incentivados e desenvolvidos. Uma pista para o futuro seria examinar as práticas actuais, por exemplo no provimento, recrutamento e selecção de pessoal, bem como a formação básica em toda a Europa, para identificar as "melhores práticas". As autoridades locais e regionais estão bem colocadas para efectuar essa tarefa e a UE deveria incentivá-las a tal. Essa actividade poderia ser coordenada pelo Comité das Regiões.

4.12. Deveria ser reconhecido e apoiado o papel importante que as escolas desempenham na prevenção das sevícias, ouvindo e respondendo às necessidades das crianças. As escolas não só aumentam o conhecimento dos jovens sobre o mundo dos adultos, relações e perigos potenciais, como também lhes podem prestar informação e incentivar o acesso a fontes de auxílio. Deveria ser prioritário assegurar que os professores sejam formados, disponham de recursos e que sejam apoiados por guias de "melhores práticas" para tal educação pessoal e social. Para que o papel fundamental da escola seja realmente eficaz, há que optimizar a comunicação e o intercâmbio de informação entre o sistema educativo e o sistema assistencial. Sobretudo a nível de colaboração profissional entre os agentes dos dois meios, que muitas vezes agem em paralelo mas não em conjunto.

4.13. Devido à sua proximidade e representação das comunidades locais, as autoridades locais e regionais estão numa posição única para levar a cabo acções positivas em favor das crianças e, em particular, para promover campanhas de sensibilização acerca das sevícias a crianças nas suas comunidades. As autoridades locais e regionais podem lançar campanhas de combate aos maus tratos, defendendo, por exemplo, a tolerância zero para todas as formas de violência exercida contra crianças, e liderar as campanhas lançadas a nível europeu, sempre que adequado em conjugação com organizações não governamentais.

4.14. O quadro legislativo para a protecção da criança na Europa deveria ser revisto e feitas recomendações, tendo em conta acordos internacionais em vigor e as competências e possibilidades das autoridades nacionais, regionais e locais, para apoiar uma estratégia coordenada, na União Europeia, para a protecção do bem estar e dos direitos das crianças e para a prevenção dos maus tratos.

Bruxelas, 18 de Novembro de 1999.

O Presidente

do Comité das Regiões

Manfred DAMMEYER

(1) JO C 51 de 22.2.1999, p. 21.

(2) JO C 198 de 14.7.1999, p. 61.

(3) CdR 300/98 fin - JO C 198 de 14.7.1999, p. 61.

ANEXO

ao parecer do Comité das Regiões

Síntese das recomendações

Em 7 de Setembro e 4 de Dezembro de 1998, membros das Comissões 3, 5 e 7 do CR reuniram para ponderar as vias de promoção de uma Europa das Regiões em que as crianças estejam protegidas da crueldade. O seminário foi organizado pelo CR em cooperação com a "National Society for the Prevention of Cruelty to Children (UK)" e a "Irish Society for the Prevention of Cruelty to Children (Ireland)" e financiado pela Iniciativa Daphne da Comissão Europeia.

Os debates realizados nestes seminários permitiram um acordo sobre o seguinte plano de acção local e regional para combater a violência exercida contra as crianças:

Recomendações aos governos locais e regionais

1. Estabelecer na União Europeia uma definição comum de sevícias a crianças e recolher, tratar e trocar informações sobre a extensão desses actos

Acção:

- As autoridades locais e regionais devem cooperar com vista à criação de bases de dados comuns sobre esta matéria, em cooperação com o Eurostat.

- As autoridades locais e regionais devem trabalhar em cooperação com as instâncias policiais e a Europol no estabelecimento de bases de dados sobre condenações por crimes correspondentes a práticas de pedofilia, prostituição e tráfico de crianças e que cubra igualmente informações sobre crianças desaparecidas.

2. Assegurar que a legislação na União Europeia é adequada à protecção das crianças em perigo

Acção:

- As autoridades locais e regionais devem apoiar o desenvolvimento de legislação específica sobre protecção da criança a nível da UE, com base na Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas. Tal legislação permitiria uma abordagem coerente em toda a Europa.

- As autoridades locais e regionais devem promover a definição de linhas de orientação comuns ao nível da UE para a acção profissional a empreender em casos de maus tratos infligidos a crianças.

3. Garantir que as crianças na Europa estão protegidas contra a prática de sevícias por parte dos que delas cuidam e lhes fornecem serviços, estabelecendo boas práticas de recrutamento

Acção:

- Haveria que promover um intercâmbio de práticas de selecção e recrutamento entre as autoridades locais e regionais de toda a UE e emitidas recomendações em matéria de boas práticas.

- Haveria que criar unidades de polícia com vista ao estabelecimento de sistemas comuns de registo das condenações por crimes relacionados com crianças, desenvolvendo igualmente métodos de intercâmbio destas informações.

4. Garantir que todos os que lidam com crianças ou lhes prestam serviços têm formação para reconhecer os casos de sevícias e sabem como actuar em tais circunstâncias

Acção:

- As autoridades locais e regionais devem desenvolver as competências fundamentais que correspondem às qualificações e conhecimentos necessários nesta área, harmonizando-as nos vários Estados-Membros de modo a permitir a recolha e o intercâmbio de boas práticas.

- Os departamentos de pessoal e de formação dos órgãos de poder locais e regionais podem promover a formação do pessoal em diferentes departamentos e organizações com vista a dotá-lo da competência para reconhecer práticas de sevícias e garantir-lhe informação sobre esta problemática nas acções de formação inicial.

5. Assegurar a adopção de políticas e procedimentos locais para gerir os casos de maus tratos infligidos a crianças, que tenham em conta o papel do pessoal em todas as profissões e organizações

Acção:

- As autoridades locais e regionais devem promover a definição de orientações comuns, bem como de regras, funções e responsabilidades uniformes, para a acção profissional de todos os intervenientes em casos de maus tratos infligidos a crianças, nas áreas da saúde, da educação, da polícia ou da assistência social.

6. Assegurar a existência de serviços de acompanhamento após os casos de sevícias, tanto para as crianças como para quem delas cuida

Acção:

- As autoridades locais e regionais de toda a UE deveriam trocar informações sobre práticas eficazes de apoio às famílias em que ocorreram sevícias e de ajuda às crianças com vista à superação dos efeitos dos maus tratos, possibilitando assim a aprendizagem mútua.

7. Elaborar programas de prevenção dos casos de sevícias

Acção:

- As autoridades locais e regionais devem adoptar políticas que garantam a todas as crianças informação sobre a vida familiar, as relações, os seus direitos e os passos a dar e as pessoas a contactar em caso de ameaça.

- As autoridades locais e regionais devem promover o intercâmbio das suas práticas e desenvolver recursos a utilizar pelos professores na informação às crianças; devem igualmente desenvolver as suas capacidades e conhecimentos em matéria de relações entre pais e filhos.

- As autoridades locais e regionais da UE podem cooperar com vista ao desenvolvimento de programas que garantam a adopção pelas escolas e bibliotecas de políticas eficazes de segurança na utilização da Internet, ao lançamento de campanhas de segurança na Internet e ao estabelecimento de linhas de emergência para apresentação de problemas.

8. Dar às crianças um papel mais activo de acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança

Acção:

- As autoridades locais e regionais deveriam facultar o acesso a serviços de aconselhamento orientados para os problemas sentidos pelas crianças e encorajar a participação destas no planeamento e no desenvolvimento de serviços locais.

- As autoridades locais e regionais devem apoiar as crianças e os jovens, sensibilizando-os para os seus direitos, dando-lhes acesso a um sistema de queixas e a advogados independentes e designando um provedor independente para as crianças.

9. Assumir a responsabilidade de promover campanhas regulares de sensibilização do público

Acção:

- As autoridades locais e regionais podem cooperar, confrontar as respectivas práticas e lançar campanhas ao nível europeu para combater os maus tratos.

10. Reforçar a cooperação local e regional em toda a UE para combater os maus tratos de que são vítimas as crianças

Acção:

- Importa reforçar a cooperação entre as autoridades locais e regionais em toda a UE e nos países candidatos à adesão, trabalhando em parceria com as ONG, de modo a combater os maus tratos de que são vítimas as crianças, através da divulgação das melhores práticas, do intercâmbio de informação e do lançamento de campanhas de sensibilização pública.