Parecer do Comité Económico e Social sobre «Os serviços de interesse geral»
Jornal Oficial nº C 368 de 20/12/1999 p. 0051 - 0057
Parecer do Comité Económico e Social sobre "Os serviços de interesse geral" (1999/C 368/17) Em 29 de Abril de 1999, em conformidade com o n.o 3 do artigo 23.o do Regimento, o Comité Económico e Social decidiu elaborar um parecer sobre "Os serviços de interesse geral". A Secção de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, responsável pela elaboração dos correspondentes trabalhos, adoptou o parecer em 5 de Outubro de 1999 (relator B. Hernández Bataller). Na 367.a reunião plenária de 20 e 21 de Outubro de 1999 (sessão de 21 de Outubro), o Comité Económico e Social aprovou por 78 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções o seguinte parecer. 1. Introdução 1.1. É óbvio que o conceito de serviço de interesse geral é entendido de diversas maneiras na União Europeia e que as concepções germânica, nórdica, latina e anglosaxónica não são idênticas. Em alguns países da União, a própria ideia de serviço público é inexistente. De qualquer modo, encontram-se concepções bastante similares e realidades também próximas (por exemplo, nos Países Baixos os "beheer van diensten"; na Itália as "gestioni di pubblica utilità"; no Reino Unido as "public utility"; na República Federal da Alemanha os "Daseinsvorsorge"; e em França o "service public"). 1.2. Há que distinguir os "serviços de interesse geral", que abrangem tanto as actividades comerciais como as não comerciais, dos "serviços de interesse económico geral", que abrangem unicamente as actividades comerciais, isto é que se exercem ou podem exercer-se no âmbito de um mercado, e caracterizam a actividade de uma empresa. Esta última categoria de serviços está sujeita às regras de concorrência, podendo ser-lhe aplicável o artigo 86.o do Tratado(1). É o caso dos serviços em rede dos transportes, da energia e das comunicações. 1.3. Os serviços de interesse geral caracterizam-se essencialmente pelo objecto da sua actividade. Neste caso concreto, deve satisfazer uma necessidade "geral"(2) e "fundamental" dos membros da colectividade, isto é de um grupo de pessoas entre as quais existem relações de igualdade e solidariedade. Para apreciar as necessidades da colectividade é deixada ampla liberdade aos Estados-Membros para que definam eles próprios os objectivos da política nacional. Assim, a jurisprudência do TJE reconheceu que a segurança, a defesa, a protecção e a coesão social dos cidadãos, entre outras, fazem parte dessas necessidades. 1.4. Os serviços de interesse geral devem responder a determinadas exigências, tais como ensino, saúde, comunicações, informação, abastecimento de água potável e transportes, que se revestem de capital importância para a protecção das liberdades fundamentais dos cidadãos e melhoram a vida da sociedade. Trata-se de actividades económicas e sociais que não costumam ser deixadas unicamente às forças de mercado, porquanto existe um certo grau de intervenção dos poderes públicos em matéria de regulamentação e controlo. 1.4.1. As "carências do mercado" são uma das principais razões da existência de empresas públicas ou da adopção de medidas reguladoras por parte dos Estados. Estas carências, devidas em parte à ineficiência dos mecanismos de mercado na afectação de serviços e bens, levam a que estejam dependentes destes serviços numerosas pessoas com rendimentos muito baixos, pelo que não podem aceder aos produtos ou bens fornecidos unicamente por circuitos comerciais. Um dos pressupostos basilares do modelo social europeu é precisamente que a coesão social correrá perigo, a mais ou menos longo prazo, sempre que as necessidades de uma faixa mais ou menos larga da população não forem devidamente salvaguardadas. 1.4.2. O presente parecer organiza-se como segue: após uma breve referência à comunicação da Comissão sobre serviços de interesse geral na Europa, passa-se em revista a regulamentação actual que se aplica aos diversos tipos de serviços desta natureza, abordando-se, em seguida, a situação a partir do Tratado de Amesterdão. Numa passagem que ocupa a parte central do parecer, indica-se quais são, na opinião do Comité, os princípios orientadores dos serviços de interesse geral e evoca-se, igualmente, alguns aspectos gerais e específicos dos serviços em questão. 2. A comunicação da Comissão, de 11 de Setembro de 1996, sobre serviços de interesse geral na Europa(3) 2.1. A Comissão clarifica a terminologia existente nesta área, definindo os seguintes termos: - Serviços de interesse geral, é a actividade de serviço, comercial ou não, considerada de interesse geral pelas autoridades públicas competentes e por isso sujeita a obrigações específicas de serviço público; - Serviços de interesse económico geral, é a actividade de serviço comercial, que tem uma missão de interesse geral, estando por isso sujeita a obrigações específicas de serviço público impostas pelos Estados-Membros; - Serviço público, possui duplo sentido, designando tanto o organismo que produz o serviço como a missão de interesse geral que lhe é confiada, sendo precisamente para favorecer ou permitir a realização dessa missão que o produtor de serviço fica sujeito a obrigações específicas de serviço público; - Serviço universal(4), designa um conjunto de exigências de interesse geral a que devem submeter-se determinadas actividades na Comunidade. As obrigações daí decorrentes visam assegurar o acesso de todos a determinadas prestações essenciais, de qualidade e a preços acessíveis. 2.2. De acordo com a comunicação, os serviços de interesse geral contribuem para a competitividade europeia, a solidariedade social e a qualidade de vida dos cidadãos europeus, representando, inclusivamente para muitos destes, verdadeiros direitos sociais. 2.3. Salienta ainda que a Comunidade tem por objectivo apoiar a competitividade da economia europeia num mundo cada vez mais concorrencial e proporcionar aos consumidores mais possibilidades de escolha, melhor qualidade e preços mais acessíveis. Ao mesmo tempo, contribui, através das suas políticas, para reforçar a coesão económica e social dos Estados-Membros e reduzir algumas disparidades. 3. Legislação nas áreas dos transportes, energia, infra-estruturas e sociedade da informação 3.1. No âmbito dos transportes ferroviários, rodoviários e por via navegável, o Regulamento (CEE) n.o 1191/69 do Conselho, de 26 de Junho, dispõe que as autoridades dos Estados-Membros, a fim de garantir a prestação de serviços suficientes de transporte, tendo especialmente em conta os factores sociais, ambientais e de ordenamento do território, ou de oferecer condições tarifárias especiais a determinadas categorias de utentes, poderão celebrar contratos de serviço público com uma empresa de transportes para assegurar frequências mínimas, capacidade, rotas, tarifas, horários e continuidade do serviço. Existem também outros aspectos práticos que justificam a existência e a continuidade dos contratos de serviço público. Por exemplo, a oferta eficaz e dirigida ao utente de transportes públicos de autocarros pode resolver o problema do congestionamento de algumas estradas europeias causado pelo aumento de veículos ligeiros em circulação. 3.1.1. Nos pareceres do CES sobre transportes(5) assinala-se que, de acordo com o princípio da subsidiariedade, as decisões sobre as modalidades de organização ou as condições qualitativas e quantitativas devem poder continuar a ser da responsabilidade das autoridades locais competentes, de acordo com as necessidades locais. 3.1.2. A aplicação do princípio da subsidiariedade pressupõe que se mantenham o acervo comunitário e o equilíbrio institucional, não devendo, por isso, afectar os princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça no atinente à relação entre direito comunitário e direito nacional. De qualquer modo, as medidas adoptadas devem ser compatíveis com a realização do objectivo perseguido e com a necessidade de uma implementação eficaz, deixando às autoridades nacionais ou locais a possibilidade de escolher a forma e os meios de o alcançar, na medida em que é a elas que compete pôr em prática a planificação estratégica dos serviços de interesse geral. 3.1.3. Em relação aos transportes aéreos, o Regulamento (CEE) n.o 2408/92 do Conselho, de 23 de Julho de 1992, regula o acesso das companhias aéreas da Comunidade às rotas intracomunitárias e as obrigações de serviço público impostas aos serviços aéreos regulares no atinente a frequência mínima, horários, tipo de aparelhos utilizados e capacidade oferecida(6). 3.1.4. Relativamente aos transportes marítimos, o Regulamento (CEE) n.o 3577/92, de 7 de Dezembro de 1992, que aplica o princípio da livre prestação de serviços aos transportes marítimos internos nos Estados-Membros (cabotagem marítima), prevê, no artigo 4.o, a possibilidade de celebrar contratos de serviço público ou impor obrigações de serviço público limitadas aos requisitos respeitantes a portos a escalar, regularidade, continuidade, frequência, capacidade de prestação do serviço, taxas a cobrar e tripulação do navio(7). 3.1.5. A segurança é uma vertente importante da política de transportes comunitária. Existe uma correlação entre, por um lado, transparência, qualidade e protecção dos trabalhadores e, por outro, o interesse público destinado a conseguir um equilíbrio entre as zonas rurais e as urbanas e para o qual é necessário utilizar recursos públicos. Nos serviços de interesse geral as limitações impostas pela concorrência devem ser necessárias e proporcionais aos objectivos perseguidos. As autoridades públicas devem avaliar a restrição da concorrência necessária para que as empresas possam oferecer serviços públicos, tendo em conta as condições económicas em que operam, os custos que devem suportar e a legislação que devem cumprir. 3.2. Nos mercados da energia, liberalizados pela Directiva 96/92/CE respeitante à electricidade e pela Directiva 98/30/CE relativa ao gás, prevê-se a abertura dos mercados, a regulamentação do acesso à rede, a elaboração de contabilidades separadas para as diferentes actividades das empresas, o cálculo das tarifas, a obrigação de fornecimento e a possibilidade de impor obrigações de serviço público. 3.2.1. A directiva respeitante à electricidade prevê um mecanismo que permite aos Estados-Membros ter em conta considerações de ordem pública sem limitar, em circunstâncias normais, o processo de liberalização. Os Estados-Membros podem determinar cinco categorias de obrigações de serviço público: protecção do meio ambiente, segurança, regularidade, limitações da qualidade dos abastecimentos e política de preços, e adoptar as medidas necessárias para o seu cumprimento. 3.2.2. Por seu lado, a Directiva respeitante ao gás prevê que os Estados-Membros podem impor às empresas de gás natural, no interesse económico geral, obrigações de serviço público em cinco domínios concretos: segurança do abastecimento, regularidade, qualidade, preço do fornecimento e protecção do ambiente. 3.3. No âmbito das telecomunicações, existe, por um lado, a obrigação de prestar um serviço universal imposto pela Directiva 97/33/CE de 30 de Junho de 1997(8) e, por outro lado, a directiva sobre licenças(9), aprovada em 1997, e a Directiva 98/10/CE sobre telefonia vocal que prevê a possibilidade de imposição de obrigações de serviço público aos operadores para assegurar o cumprimento de determinados "requisitos essenciais"(10). 3.4. Também se introduziram normas comuns para o desenvolvimento do sector postal e a melhoria da qualidade do serviço, bem assim a abertura progressiva e controlada dos mercados à concorrência. A garantia a longo prazo do serviço postal universal está no cerne do dispositivo proposto. O serviço universal corresponde a uma oferta de qualidade em todo o território, a uma frequência mínima e a preços acessíveis para todos. Inclui a recolha, transporte, selecção e distribuição de correspondência, bem como, dentro de determinados limites de peso e de preço, de publicações periódicas, catálogos e encomendas. 3.5. A concessão de direitos exclusivos ou especiais às empresas deverá realizar-se mediante concurso público baseado em critérios objectivos, não discriminatórios e transparentes, devendo a adjudicação ter, na maior parte dos casos, carácter temporário. 4. A situação a partir do Tratado de Amsterdão 4.1. A Comunidade tem por objectivo promover o desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades económicas em todo o seu território, o crescimento sustentável e não inflacionista que respeite o ambiente, um alto grau de convergência dos resultados económicos, um elevado nível de emprego e de protecção social, o aumento do nível e da qualidade de vida, a competitividade, a coesão económica e social e a solidariedade entre os Estados-Membros. 4.1.1. Os meios para realizar estes objectivos são o estabelecimento de um mercado comum e de uma União Económica e Monetária e a aplicação de políticas e de acções comuns previstas no Tratado, entre as quais um regime que assegure a não distorção da concorrência no mercado interno. 4.2. O n.o 1 do artigo 86.o do TCE (antigo art. 90.o) dispõe que, no que respeita às empresas públicas e às empresas a que concedam direitos especiais ou exclusivos(11), os Estados-Membros não tomarão nem manterão qualquer medida contrária ao disposto no referido Tratado, designadamente ao disposto nos artigos 12.o (discriminação), e nos artigos 81.o e 89.o (práticas restritivas da concorrência e auxílios de Estado). São igualmente invocadas outras disposições do Tratado em relação com o artigo 86.o, tais como as do artigo 28.o (livre circulação de mercadorias), artigo 49.o (livre prestação de serviços) e artigo 43.o (direito de livre estabelecimento). 4.2.1. Por outro lado, o n.o 2 do artigo 86.o estabelece que as empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto no presente Tratado, designadamente às regras de concorrência, desde que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada e não afecte o desenvolvimento das trocas comerciais de maneira que contrarie os interesses da Comunidade. O n.o 3 estabelece que a Comissão velará pela aplicação do disposto no presente artigo e dirigirá aos Estados-Membros, quando necessário, as directivas ou decisões adequadas. 4.3. O artigo 16.o do TCE - introduzido pelo Tratado de Amsterdão - faz referência explícita aos serviços de interesse económico geral. O artigo salienta a importância desses serviços ao considerar que constituem um "valor comum" da União, atribuindo-lhes um papel na promoção da coesão social e territorial, o que pode ser considerado um esforço na procura de um equilíbrio entre as regras de concorrência e a necessidade de assegurar serviços públicos, respeitando ao mesmo tempo o artigo 86.o 4.4. Além disso, foi introduzido um Protocolo sobre o serviço público de radiodifusão que frisa a natureza específica do sistema em relação com as necessidades de natureza social e cultural. Concretamente, permite aos Estados-Membros financiarem canais de televisão desde que o financiamento seja concedido para efeitos do "cumprimento da missão de serviço público, tal como lhe tenha sido confiada, definida e organizada por cada um dos Estados-Membros, e na medida em que esse financiamento não afecte as condições das trocas comerciais, nem a concorrência na Comunidade de forma que contrarie o interesse comum". O Protocolo pretende encontrar um equilíbrio entre a aplicação das regras de concorrência e a necessidade de assegurar o serviço público na indústria televisiva. 4.5. Também foi introduzida no Tratado de Amesterdão uma Declaração relativa às instituições públicas de crédito na Alemanha que reconhece que as regras de concorrência comunitárias permitem ter em conta os serviços de interesse económico geral que estas instituições prestam na Alemanha, bem como os benefícios que lhe são concedidos como compensação pelos encargos decorrentes desses serviços. 4.6. O Conselho Europeu de Colónia de 3 e 4 de Junho de 1999(12) entende que na actual fase do desenvolvimento da União Europeia haveria toda a conveniência em reunir e sublinhar numa Carta os direitos fundamentais vigentes na União, que abrangesse "os direitos em matéria de liberdade e igualdade e os direitos processuais fundamentais, tal como garantidos na Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e como resultam das tradições institucionais comuns dos Estados-Membros enquanto princípios gerais do direito comunitário. A Carta deverá ainda consagrar os direitos que apenas são outorgados aos cidadãos da União. Na elaboração da Carta deverão ser igualmente tidos em conta os direitos económicos e sociais". 5. Princípios orientadores dos serviços de interesse económico geral 5.1. Com base em diversas publicações e comunicações respeitantes a resoluções do Conselho, da Comissão, do Parlamento Europeu e de outras fontes, bem como outros documentos da sua autoria, o Comité elaborou uma lista de princípios, com carácter de orientação, que deveriam ser respeitados pelos serviços de interesse geral. 5.2. O Comité considera que esta lista orientadora será de grande utilidade para a prestação desses serviços, pelo que a submete a debate público. 5.3. Por se tratarem de direitos dos cidadãos, os serviços de interesse económico geral deveriam reger-se pelos seguintes princípios orientadores: 5.3.1. Igualdade: Todos os cidadãos são iguais no que respeita ao acesso aos serviços de interesse geral. O termo igualdade deve ser entendido como uma proibição a qualquer discriminação injustificada, fundada no estatuto social ou pessoal em matéria de prestação de serviços e não como uma obrigação de uniformização. 5.3.2. Universalidade: Entre os serviços disponibilizados, os serviços básicos devem ser disponibilizados de modo universal. 5.3.3. Fiabilidade: A prestação de serviços de interesse geral deverá ser contínua, regular e ininterrupta. As hipóteses de funcionamento irregular ou de suspensão dos serviços deverão ser limitadas aos casos especificamente estabelecidos no regulamento que rege o sector. 5.3.4. Participação: Os utentes deverão participar activamente no desenvolvimento dos serviços de interesse geral. A finalidade desta participação é a de proteger os direitos dos cidadãos, favorecendo a prestação correcta dos serviços e a cooperação entre os prestadores. 5.3.5. Transparência: Os prestadores de serviços procurarão assegurar que os utentes recebam informação completa sobre a prestação de serviços, especialmente sobre as obrigações de serviço público e sobre as tarifas. 5.3.5.1. Para o efeito, os prestadores deverão informar os utentes das condições financeiras e técnicas da prestação dos serviços, bem como de toda e qualquer alteração que afecte essa prestação, publicando os textos que contenham a regulamentação do serviço. 5.3.6. Simplificação de procedimentos: Os prestadores deverão reduzir, na medida do possível, a complexidade dos procedimentos a seguir pelos utentes e fornecerão as explicações que se revelarem necessárias. 5.3.6.1. Para além disto, deverão utilizar, na medida do possível, formulários normalizados, esforçando-se por simplificar e divulgar as modalidades de assinatura e de pagamento dos serviços. 5.3.6.2. Em qualquer caso, os prestadores deverão instaurar procedimentos internos de resolução das reclamações apresentadas pelos utentes. Estes procedimentos deverão ser acessíveis, de fácil compreensão e aplicação, garantindo, em última análise, que os prestadores terão em conta as reclamações dos utentes ou das associações de consumidores e facultarão o direito à apresentação de reclamações perante a entidade reguladora e, em geral, o acesso à justiça(13). 5.3.7. Rentabilidade e eficácia: Os serviços de interesse económico geral deverão ser administrados de forma eficaz e rentável. Os prestadores adoptarão as medidas necessárias para a realização destes objectivos. 5.3.8. Qualidade dos serviços: Os prestadores deverão definir os factores determinantes da qualidade dos serviços e, com base nessa definição, procederão à publicação das normas de qualidade e de quantidade que se comprometem observar. 5.3.8.1. A manutenção destas normas não ficará sujeita a qualquer condição. As eventuais derrogações apenas serão autorizadas se comportarem vantagens para os utentes e após terem sido submetidas a controlo pelos mesmos no âmbito de reuniões periódicas. 5.3.9. Prestação de serviço adequado: Os serviços de interesse económico geral deverão ser adaptados ao desenvolvimento das necessidades colectivas e aos resultados dos progressos técnicos e económicos. 5.3.10. Avaliação dos resultados: As condições de prestação de serviços públicos deverão ser periodicamente avaliadas pelo prestador. Para o efeito, recolher-se-ão, entre outras, informações sobre o índice de satisfação dos utentes. 5.3.11. Cooperação entre prestadores: Mesmo que o serviço se inclua num domínio concorrencial, os prestadores deverão esforçar-se por cooperar no sentido do cumprimento destes princípios. 5.3.12. Preços acessíveis: As condições de acesso a estes serviços devem ser realizadas a preços acessíveis para os cidadãos, orientando-se pelo conceito de "preço razoável". 5.3.13. Protecção do meio ambiente: A definição e funcionamento dos serviços de interesse económico geral deverão ter em conta as exigências de protecção ambiental como elemento determinante da coesão social e territorial. 6. Observações na generalidade 6.1. O Comité considera que a interacção entre o direito da concorrência e os serviços de interesse geral para os sectores dos transportes, energia e telecomunicações deverá ser equilibrada especialmente no que se refere ao artigo 86.o (ex-artigo 90.o), que está redigido de forma "negativa", na medida em que prevê a inaplicabilidade das regras do Tratado quando a sua aplicação constitua obstáculo ao cumprimento dos serviços de interesse económico geral confiados a esses sectores. 6.2. No entanto, o novo artigo 16.o impõe uma obrigação "positiva" à Comunidade e aos Estados-Membros para que, dentro das respectivas competências, zelem por que esses serviços funcionem com base em princípios e em condições que lhes permitam cumprir as suas missões. Para o efeito, o Comité considera que deve existir um equilíbrio entre, por um lado, a rentabilidade dos operadores no mercado e, por outro, as obrigações de ordem social e laboral e as respeitantes à economia de mercado, à segurança, ao meio ambiente e às orientações básicas de desenvolvimento sustentável. 6.2.1. Por outro lado, no que respeita, por exemplo, o sector dos transportes rodoviários, os operadores deverão, no momento de prestar um serviço de interesse geral, ter assegurados determinados aspectos por parte das autoridades, nomeadamente a descrição do objectivo do serviço, a compensação financeira, os incentivos, a descrição da exclusividade, a duração e extensão geográfica e as instalações disponibilizadas pelas diferentes entidades. 6.3. O Comité considera que os serviços económicos de interesse geral fazem parte, de facto, dos valores comuns da União. Favorecem uma política de integração europeia equilibrada ao providenciarem um melhor enquadramento político e jurídico para os cidadãos e para as empresas. 6.4. Considera ainda que é importante o papel que desempenham na promoção da coesão social e territorial da União. Deverão ser levados em conta especialmente no que se refere ao futuro da gestão e do ordenamento territorial; além disso, as "redes" deverão atender não só a aspectos económicos, mas ter também em conta outras considerações sociais. 6.5. O Comité é partidário de que estes serviços sejam definidos e prestados no respeito dos princípios da subsidiariedade e proporcionalidade. 6.6. No que respeita ao sistema de radiodifusão pública, o Comité considera que: 6.6.1. se deverão ter em conta os aspectos culturais como um dos elementos integrantes da definição do serviço público de radiodifusão, 6.6.2. a missão de serviço público no sector da radiodifusão comporta exigências concretas em termos de programação, bem como outras obrigações que os operadores, públicos ou privados, não deveriam ser os únicos a suportar, 6.6.3. o papel do serviço público de radiodifusão está associado ao fomento das necessidades democráticas, sociais e culturais de cada sociedade e grupos minoritários, bem como à necessidade de salvaguardar o pluralismo nos meios de comunicação, assegurar uma oferta de programas de qualidade, preservar a diversidade linguística e cultural e a protecção dos menores, 6.6.4. o financiamento do serviço público de radiodifusão deve pautar-se por critérios de proporcionalidade e transparência, não devendo afectar as condições de mercado nem a livre concorrência na Comunidade de modo contrário ao interesse comum, 6.6.5. quando um operador se dedique igualmente a actividades puramente comerciais, ou seja, que vão para além da sua missão de serviço público, deverá possuir contabilidades separadas para evitar que os fundos públicos sejam desviados para actividades comerciais. 6.7. Sociedade da informação 6.7.1. Todos os aspectos da denominada "sociedade da informação" têm capacidade suficiente para modificar profundamente a relação entre as empresas e os consumidores, bem como a natureza do próprio consumo. 6.7.2. O Comité estima que os serviços de interesse económico geral terão que desenvolver um papel preponderante na "sociedade da informação" e considera que a sua implantação não deverá gerar exclusões sociais de relevo, pelo que o conceito de serviço universal e sua adaptabilidade às inovações tecnológicas deverão desempenhar uma função primordial. 6.7.3. O Comité considera que a sociedade da informação(14): - constitui um instrumento de política regional, - deve favorecer o desenvolvimento de uma rede de centros das tecnologias da informação, - permite uma melhor integração dos cidadãos potencialmente excluídos (deficientes, habitantes de regiões isoladas ou ultraperiféricas) no conjunto da sociedade europeia, - implica dotar a União Europeia de uma identidade cultural que, respeitando a riqueza de matizes nacionais e regionais, proporcione à sociedade da informação uma base filosófica e ideológica, - favorece a redução - através das possibilidades abertas pelas condições do sistema de concessão e no respeito do equilíbrio tarifário - das tarifas de acesso e utilização da Internet, garantindo ao mesmo tempo a segurança e a privacidade dos seus utilizadores. 6.8. Redes de transportes e energia 6.8.1. Se é certo que o serviço universal nos sectores dos transportes e da energia não deve ter necessariamente o mesmo alcance que em outros serviços económicos de interesse geral, a liberalização realizada até ao momento, no entender do Comité, não teve em conta, de modo adequado, os elementos determinantes da coesão económica, social e territorial, porquanto foi dada primazia aos critérios de eficiência económica. 6.8.2. No que respeita às medidas a adoptar no futuro, o Comité é de opinião que não deverão ser levados em conta apenas critérios económicos, mas também critérios baseados na necessidade de manter o emprego, a qualidade do serviço e o nível de satisfação dos utentes, pois o objectivo último deverá ser alcançar e aumentar o bem-estar social. Assim, por exemplo, dever-se-ia ter em consideração a produção ecológica de energia através de centrais combinadas para evitar o que se está a passar na República Federal da Alemanha, onde esta forma de energia é preterida devido à falta de competitividade face a outras energias obtidas com menos condições de segurança. 7. Conclusões 7.1. Os serviços de interesse económico geral desempenharão um papel determinante na promoção da coesão económica e social e na solidariedade territorial, porquanto constituem "valores comuns" que a União Europeia deve preservar e fomentar. 7.2. O Comité considera que a promoção da coesão económica e social na prestação dos serviços de interesse económico geral implica, em todo o caso, que os cidadãos reivindiquem a acessibilidade a todos os serviços ou prestações, sejam quais forem as condições sociais ou o local de residência, pois o objectivo destes serviços é satisfazer e assegurar a coesão social e territorial. 7.3. No tocante aos utentes dos serviços, o objectivo deverá consistir na garantia de um equilíbrio adequado entre a liberalização que implica um aumento da concorrência e as medidas pertinentes que se baseiam nos princípios orientadores enunciados (acessibilidade, qualidade do serviço, transparência da informação, etc.). 7.4. Em todo o caso, dever-se-á garantir que os interesses económicos e jurídicos dos consumidores, que fazem parte da sociedade civil organizada por intermédio das suas associações, serão levados em consideração de maneira mais coerente e continuada no conjunto das políticas da União Europeia. Deverá também ser tida em conta a situação dos operadores que prestam estes serviços de interesse geral, isto é concretamente, as condições económicas em que as empresas funcionam, os custos que devem suportar e a legislação em vigor que têm que cumprir. 7.4.1. O Comité considera que num sistema concorrencial os custos do serviço universal deverão ser assumidos proporcionalmente por todos os participantes. 7.5. Considera ainda que o direito dos cidadãos à igualdade de acesso à prestação dos serviços de interesse económico geral constitui um direito de todos os cidadãos, cujo objectivo é incrementar o bem-estar geral. Seja como for, para manter o modelo social europeu, deve existir equilíbrio entre os serviços de interesse geral e as regras do mercado interno, especialmente, a livre concorrência. 7.6. Por estas razões, o Comité solicita ao Conselho, ao Parlamento Europeu e à Comissão a inclusão do direito dos cidadãos à igualdade de acesso à prestação destes serviços na Carta dos Direitos Fundamentais, que o Conselho Europeu de Colónia decidiu elaborar. 7.7. Solicita ainda ao Conselho, ao Parlamento Europeu e à Comissão que velem, tanto quanto possível, por que a prestação destes serviços prossiga após a conclusão do próximo ciclo de negociações da OMC. Bruxelas, 21 de Outubro de 1999. A Presidente do Comité Económico e Social Beatrice RANGONI MACHIAVELLI (1) Acórdãos do TJCE: de 15.2.1993, Poucet et Pistre (C-159 e 160/91, Col. I-637); de 27.10.1993, Lagauche e.a. (C-46/90 e 93/91, Col. p. I-5267); de 19.1.1994, SAT - Flugesellshaft (C-364/92, Col. p. I-143); de 18.3.1997, Diego Cali & Figli (C-343/95, Col. p. I-1547). (2) Conclusões do Advogado-Geral Tesauro apresentadas em 9 de Fevereiro de 1993 no processo contra P. Corbeau, Acórdão de 19 de Maio de 1993, C-320/91, Col. p. I-2533, ponto 19. (3) JO C 281 de 26.9.1996, p. 3. (4) Serviço Universal, para o sector das telecomunicações, foi definido pelo n.o 1, alínea g) do artigo 2.o da Directiva 97/33 como "um conjunto mínimo definido de serviços, de qualidade especificada, acessível a todos os utilizadores, independentemente da sua localização geográfica e, em função das condições específicas nacionais, a um preço acessível". (5) JO C 138 de 18.5.1999, p. 7. (6) JO L 240 de 24.8.1992, p. 8. (7) JO L 364 de 12.12.1992, p. 7. (8) JO L 199 de 26.7.1997, p. 32. (9) JO L 117 de 7.5.1997, p. 15. (10) Requisitos essenciais: razões de interesse geral e de natureza não económica que podem levar um Estado-Membro a impor condições à prestação do serviço. (11) Entende-se por: - Direitos exclusivos: os direitos garantidos por um Estado-Membro que reservam a prestação de certos serviços a uma empresa por meio de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas, reservando-lhe o direito de prestar um serviço ou efectuar uma actividade numa determinada área geográfica. - Direitos especiais: os direitos concedidos por um Estado-Membro a um número limitado de empresas mediante disposições legislativas, regulamentares ou administrativas que, numa determinada área geográfica: - limitam de forma discricionária a dois ou mais o número de empresas autorizadas a prestar um serviço ou a desempenhar uma actividade, sem se basear em critérios objectivos, proporcionais e não discricionários, ou, - designam (sem se basear em tais critérios) várias empresas concorrentes como sendo as únicas autorizadas a prestar um serviço ou a efectuar uma actividade, ou - conferem a uma determinada empresa (sem se basear nos referidos critérios), vantagens legais ou regulamentares que afectam substancialmente a capacidade de outras empresas a prestar o mesmo serviço ou efectuar a mesma actividade no mesmo sector geográfico em condições praticamente equivalentes. (12) Conclusões, pontos 44 e 45 e Anexo IV. (13) Estes procedimentos deverão basear-se nos princípios estabelecidos na Recomendação da Comissão relativa aos princípios aplicáveis aos organismos responsáveis pela resolução extrajudicial dos litígios de consumo (COM(1998) 198 final, de 30 de Março de 1998), e, na medida do possível, dever-se-á fomentar a utilização do "formulário europeu de reclamação do consumidor". (14) Declaração de Oulu de 7 de Setembro de 1999.