24.3.2023   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

L 86/44


RECOMENDAÇÃO (UE) 2023/681 DA COMISSÃO

de 8 de dezembro de 2022

relativa aos direitos processuais dos suspeitos e arguidos sujeitos a prisão preventiva e às condições materiais de detenção

A COMISSÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 292.o,

Considerando o seguinte:

(1)

Nos termos do artigo 2.o do Tratado da União Europeia, a União Europeia funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Os artigos 1.o, 4.o e 6.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a Carta) preveem que a dignidade do ser humano é inviolável e deve ser respeitada e protegida, que ninguém pode ser submetido a tortura ou a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes e que todas as pessoas têm direito à liberdade e à segurança. Os artigos 7.o e 24.o da Carta consagram o direito à vida familiar e os direitos das crianças. O artigo 21.o da Carta estabelece que ninguém pode ser objeto de discriminação. Os artigos 47.o e 48.o da Carta reconhecem o direito à ação e a um tribunal imparcial, bem como a presunção de inocência e os direitos de defesa. O artigo 52.o da Carta prevê que qualquer restrição ao exercício dos direitos fundamentais nela reconhecidos deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades, bem como os princípios da necessidade e da proporcionalidade.

(2)

Os Estados-Membros já estão juridicamente vinculados pelos instrumentos existentes do Conselho da Europa em matéria de direitos humanos e de proibição da tortura e dos tratamentos desumanos ou degradantes, nomeadamente a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH), os protocolos a essa Convenção, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e a Convenção Europeia para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes, de 1987. Todos os Estados-Membros são, além disso, partes na Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes (CCT).

(3)

Há também que ter em conta uma série de instrumentos juridicamente não vinculativos que abordam mais especificamente os direitos das pessoas privadas de liberdade, nomeadamente: a nível das Nações Unidas, as regras mínimas das Nações Unidas para o tratamento de reclusos (Regras Nelson Mandela); as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio); bem como, a nível do Conselho da Europa, a Recomendação Rec(2006)2-Rev sobre as Regras Penitenciárias Europeias; a Recomendação Rec(2006)13 sobre a utilização da prisão preventiva, as condições em que esta tem lugar e a previsão de salvaguardas contra abusos; a Recomendação CM/Rec(2017)3 sobre as Regras Europeias referentes a sanções e medidas comunitárias; a Recomendação CM/Rec(2014)4 sobre vigilância eletrónica; a Recomendação CM/Rec(2010)1 sobre as Regras de Liberdade Condicional do Conselho da Europa; e o Livro Branco relativo à sobrelotação das prisões.

(4)

Além disso, existem outros instrumentos que visam grupos específicos de pessoas privadas de liberdade, nomeadamente: a nível das Nações Unidas, as Regras das Nações Unidas para a Proteção dos Menores Privados de Liberdade e as Regras das Nações Unidas relativas ao Tratamento das Reclusas e à aplicação de Medidas não Privativas de Liberdade às Mulheres Delinquentes (Regras de Banguecoque); a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC); bem como, a nível do Conselho da Europa, a Recomendação CM/Rec(2008)11 sobre as Regras Europeias para os menores delinquentes sujeitos a sanções ou medidas de coação; e a Recomendação CM/Rec(2018)5 sobre as crianças com pais presos; a Recomendação CM/Rec(2012)12 sobre reclusos estrangeiros; e ainda, a nível internacional não governamental, os Princípios sobre a aplicação da legislação internacional dos direitos humanos em matéria de orientação sexual e identidade de género (Princípios de Yogyakarta), desenvolvidos pela Comissão Internacional de Juristas e pelo Serviço Internacional para os Direitos Humanos.

(5)

O Tribunal de Justiça da União Europeia reconheceu, nos acórdãos Aranyosi/Căldăraru e subsequentes (1), a importância das condições de detenção no contexto do reconhecimento mútuo e da aplicação da Decisão-Quadro 2002/584/JAI relativa ao mandado de detenção europeu (2). O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos também se pronunciou sobre o impacto das más condições de detenção na execução do mandado de detenção europeu (3).

(6)

Nas conclusões do Conselho, de dezembro de 2018, intituladas «Promover o reconhecimento mútuo reforçando a confiança mútua», os Estados-Membros foram incentivados a recorrer a medidas alternativas à detenção, a fim de reduzir a população nos respetivos estabelecimentos prisionais, promovendo assim o objetivo da reabilitação social e atendendo igualmente ao facto de que a confiança mútua frequentemente é minada devido a deficientes condições de detenção e ao problema da sobrelotação nas prisões (4).

(7)

Nas conclusões do Conselho, de dezembro de 2019, sobre as medidas alternativas à detenção, os Estados-Membros comprometeram-se a tomar várias medidas no domínio da detenção a nível nacional, tais como a adoção de medidas alternativas à detenção (5).

(8)

Nas conclusões do Conselho, de junho de 2019, sobre a prevenção e a luta contra a radicalização nas prisões e sobre a forma de lidar com os infratores terroristas e extremistas violentos após a sua libertação, os Estados-Membros comprometeram-se com urgência a tomar medidas efetivas neste domínio (6).

(9)

Desde há vários anos que o Parlamento Europeu tem instado a Comissão a tomar medidas para resolver a questão das condições materiais nas prisões e assegurar que a prisão preventiva continue a ser uma medida excecional, a utilizar em conformidade com a presunção de inocência. Este pedido foi reiterado no relatório do Parlamento Europeu sobre o mandado de detenção europeu (7).

(10)

A pedido da Comissão e por ela financiada, a Agência dos Direitos Fundamentais desenvolveu uma base de dados sobre as condições de detenção, que foi lançada em dezembro de 2019 e está acessível ao público (8). A base de dados da Agência sobre detenção penal recolhe informações sobre as condições de detenção em todos os Estados-Membros. Com base nas normas nacionais, da União e internacionais, na jurisprudência e nos relatórios de acompanhamento, presta informações sobre determinados aspetos fundamentais das condições de detenção, incluindo a dimensão das celas, as condições sanitárias, o acesso aos cuidados de saúde e a proteção contra a violência.

(11)

As estatísticas disponíveis sobre o mandado de detenção europeu mostram que, desde 2016, os Estados-Membros recusaram ou atrasaram a execução de mandados por motivos relacionados com um risco real de violação dos direitos fundamentais em cerca de 300 casos, nomeadamente com base em condições materiais de detenção inadequadas (9).

(12)

As autoridades judiciais nacionais solicitaram orientações mais concretas sobre a forma de lidar com estes casos. Os problemas identificados pelos profissionais como desafios para a cooperação judiciária em matéria penal prendem-se com a falta de harmonização, dispersão e falta de clareza das normas de detenção em toda a União (10).

(13)

Metade dos Estados-Membros que forneceram à Comissão estatísticas sobre as suas populações de reclusos indicaram que têm um problema de sobrelotação nos seus estabelecimentos prisionais, com uma taxa de ocupação superior a 100 %. A utilização excessiva ou desnecessária e a duração da prisão preventiva também contribuem para o fenómeno da sobrelotação nos estabelecimentos prisionais, o que compromete seriamente a melhoria das condições de detenção.

(14)

Há divergências substanciais entre os Estados-Membros em relação a aspetos importantes da prisão preventiva, como o uso da prisão preventiva como último recurso e a reavaliação das decisões de prisão preventiva (11). O prazo máximo para a prisão preventiva difere igualmente de um Estado-Membro para outro, podendo ir de menos de um ano a mais de cinco anos (12). Em 2020, a duração média da prisão preventiva nos diferentes Estados-Membros variou entre dois e 13 meses (13). O número de reclusos em prisão preventiva em relação à população prisional total também varia significativamente de um Estado-Membro para outro, oscilando entre menos de 10 % e mais de 40 % (14). Estas grandes discrepâncias afiguram-se injustificadas num espaço comum de liberdade, segurança e justiça na UE.

(15)

Relatórios recentes do Comité para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes do Conselho da Europa chamam a atenção para a persistência de certos problemas graves em alguns Estados-Membros, como os maus tratos, a inadequação dos estabelecimentos prisionais e a falta de atividades úteis e de prestação adequada de cuidados de saúde.

(16)

Além disso, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos continua a considerar que há Estados-Membros que violam o artigo 3.o ou 5.o da CEDH no contexto da detenção.

(17)

Tendo em conta o grande número de recomendações elaboradas por organizações internacionais no domínio da privação de liberdade penal, estas podem nem sempre estar facilmente acessíveis para juízes e procuradores individuais dos Estados-Membros que têm de avaliar as condições de detenção antes de tomarem as suas decisões, quer no contexto de um mandado de detenção europeu, quer a nível nacional.

(18)

Na União e, em especial, no espaço de liberdade, segurança e justiça, são necessárias normas mínimas específicas da União, aplicáveis de igual modo aos sistemas de detenção de todos os Estados-Membros, para reforçar a confiança mútua entre os Estados-Membros e facilitar o reconhecimento mútuo das sentenças e decisões judiciais.

(19)

Para aumentar a confiança nos sistemas de justiça penal entre os Estados-Membros, aumentando assim o reconhecimento mútuo das decisões em matéria penal, foram adotadas designadamente seis medidas relativas aos direitos processuais em processo penal, a saber, as Diretivas 2010/64/UE (15), 2012/13/UE (16), 2013/48/UE (17), (UE) 2016/343 (18), (UE) 2016/800 (19) e (UE) 2016/1919 (20) do Parlamento Europeu e do Conselho, bem como a Recomendação da Comissão, de 27 de novembro de 2013, sobre as garantias processuais das pessoas vulneráveis suspeitas ou arguidas em processo penal (21). Estas medidas visam assegurar o respeito dos direitos processuais dos suspeitos e arguidos em processo penal, incluindo nos casos em que é imposta a prisão preventiva. Para o efeito, estas diretivas preveem garantias processuais específicas para os suspeitos e arguidos privados de liberdade. A Diretiva (UE) 2016/800 contém disposições específicas sobre as condições de prisão preventiva dos menores; estas disposições visam salvaguardar o seu bem-estar quando sujeitas a tal medida coerciva. É necessário complementar as normas em matéria de direitos processuais estabelecidas nestas diretivas e na Recomendação de 2013, bem como, no caso da Diretiva (UE) 2016/800, as normas pertinentes relativas às condições materiais de detenção de menores sujeitos a prisão preventiva.

(20)

A Comissão pretende consolidar e desenvolver as normas mínimas estabelecidas no âmbito do Conselho da Europa, bem como a jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Para o efeito, é necessário apresentar uma panorâmica das normas mínimas selecionadas em matéria de direitos processuais dos suspeitos e arguidos sujeitos a prisão preventiva e das condições materiais de detenção em domínios prioritários essenciais para a cooperação judiciária em matéria penal entre os Estados-Membros.

(21)

No que diz respeito aos direitos processuais dos suspeitos e arguidos sujeitos a prisão preventiva, as orientações constantes da presente recomendação devem abranger as principais normas sobre o uso da prisão preventiva como medida de último recurso e alternativas à detenção, os motivos para a prisão preventiva, os requisitos para a tomada de decisões pelas autoridades judiciais, a reavaliação periódica da prisão preventiva, a audição dos suspeitos ou arguidos com vista à toma de decisões relativas à prisão preventiva, as vias de recurso efetivas e o direito de recurso, a duração da prisão preventiva e o reconhecimento do tempo passado em prisão preventiva sob a forma de uma redução da duração de condenação definitiva.

(22)

No que diz respeito às condições materiais de detenção, devem ser dadas orientações sobre normas fundamentais nos domínios do alojamento, da afetação de reclusos, da higiene e saneamento, da alimentação, dos regimes de detenção no que diz respeito ao exercício e às atividades fora da cela, do trabalho e da educação, dos cuidados de saúde, da prevenção da violência e dos maus tratos, do contacto com o mundo exterior, do acesso a assistência jurídica, dos procedimentos para pedidos e queixas e das inspeções e acompanhamento. Além disso, devem ser fornecidas orientações sobre a salvaguarda dos direitos das pessoas para as quais a privação de liberdade constitui uma situação de especial vulnerabilidade, como as mulheres, os menores, as pessoas com deficiência ou condições de saúde graves, as pessoas LGBTIQ e os estrangeiros, bem como sobre a prevenção da radicalização nas prisões.

(23)

A prisão preventiva deve ser sempre utilizada como medida de último recurso, com base numa avaliação caso a caso. Deverá ser disponibilizada e aplicada, sempre que possível, uma gama o mais ampla possível de medidas menos restritivas alternativas à detenção (medidas alternativas). Os Estados-Membros devem igualmente assegurar que as decisões de prisão preventiva não sejam discriminatórias e não sejam automaticamente impostas aos suspeitos e arguidos com base em determinadas características, como a nacionalidade estrangeira.

(24)

É fundamental que existam condições materiais de detenção adequadas para salvaguardar os direitos e a dignidade das pessoas privadas de liberdade e para prevenir violações da proibição da tortura e das penas ou tratamentos desumanos ou degradantes (maus tratos).

(25)

A fim de assegurar normas de detenção adequadas, os Estados-Membros devem proporcionar a cada recluso um espaço vital individual mínimo, em conformidade com as recomendações do Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT) e a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

(26)

As pessoas privadas de liberdade tornam-se particularmente vulneráveis à violência e aos maus tratos, bem como ao isolamento social. A fim de garantir a sua segurança e apoiar a sua reintegração social, a afetação e a separação dos reclusos devem ter em conta as diferenças nos regimes de detenção, bem como a necessidade de proteger contra abusos os reclusos em situações de especial vulnerabilidade.

(27)

Os regimes de detenção não devem limitar indevidamente a liberdade de circulação dos reclusos no interior do estabelecimento prisional e o seu acesso ao exercício, aos espaços exteriores, às atividades úteis e à interação social, a fim de lhes permitir manter a sua saúde física e mental e promover a sua reintegração social.

(28)

As vítimas de crimes cometidos em detenção têm frequentemente um acesso limitado à justiça, não obstante a obrigação de os Estados preverem vias de recurso eficazes nos casos em que os seus direitos tenham sido violados. Em consonância com os objetivos da Estratégia da UE sobre os Direitos das Vítimas (2020-2025), recomenda-se que os Estados-Membros assegurem vias de recurso eficazes em caso de violação dos direitos dos reclusos, bem como medidas de proteção e apoio. A assistência jurídica e os mecanismos para a apresentação de pedidos e queixas devem ser facilmente acessíveis, confidenciais e eficazes.

(29)

Os Estados-Membros devem ter em conta as necessidades especiais de grupos específicos de reclusos, incluindo mulheres, menores, idosos, pessoas com deficiência ou problemas de saúde graves, pessoas LGBTIQ, pessoas de minorias étnicas ou raciais e estrangeiros, em todas as decisões relacionadas com a sua detenção. Em especial, em caso de detenção de menores, o interesse superior do menor deve ser sempre uma consideração primordial.

(30)

No que diz respeito aos infratores terroristas e extremistas violentos, os Estados-Membros devem tomar medidas eficazes para prevenir a radicalização nas prisões e implementar estratégias de reabilitação e reintegração, tendo em conta o risco que representam os infratores terroristas e extremistas violentos ou os infratores radicalizados enquanto cumprem penas de prisão, bem como o facto de alguns desses infratores serem libertados após um curto espaço de tempo.

(31)

A presente recomendação dá apenas uma panorâmica das normas selecionadas e deve ser considerada à luz das orientações mais pormenorizadas fornecidas nas normas do Conselho da Europa e da jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e sem prejuízo das mesmas. Não prejudica o direito da União em vigor nem a sua evolução ulterior. Não prejudica igualmente a interpretação autorizada do direito da União que possa ser dada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

(32)

A presente recomendação deverá também facilitar a execução de mandados de detenção europeus ao abrigo da Decisão-Quadro 2002/584/JAI, bem como o reconhecimento das sentenças e a execução das penas ao abrigo da Decisão-Quadro 2008/909/JAI do Conselho (22) relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sentenças em matéria penal que imponham penas ou outras medidas privativas de liberdade.

(33)

A presente recomendação respeita e promove os direitos fundamentais reconhecidos na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Em especial, a presente recomendação visa promover o respeito pela dignidade humana, o direito à liberdade, o direito à vida familiar, os direitos da criança, o direito à ação e a um tribunal imparcial, bem como a presunção de inocência e o direito de defesa.

(34)

As referências feitas na presente recomendação a medidas adequadas para garantir o acesso efetivo das pessoas com deficiência à justiça devem ser entendidas à luz dos direitos e obrigações decorrentes da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da qual a União Europeia e todos os seus Estados-Membros são partes. Além disso, deve garantir-se que, se as pessoas com deficiência forem privadas de liberdade no âmbito de um processo penal, têm direito, em igualdade de condições com as demais pessoas, a garantias em conformidade com o direito internacional em matéria de direitos humanos e são tratadas em conformidade com os objetivos e princípios da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, nomeadamente através da disponibilização de adaptações razoáveis para dar resposta a necessidades especiais e garantindo a acessibilidade.

ADOTOU A PRESENTE RECOMENDAÇÃO:

OBJETIVO DA RECOMENDAÇÃO

(1)

A presente recomendação estabelece orientações para que os Estados-Membros tomem medidas eficazes, adequadas e proporcionadas com vista a reforçar os direitos de todos os suspeitos e arguidos em processo penal que se encontrem privados de liberdade, tanto no que diz respeito aos direitos processuais das pessoas sujeitas a prisão preventiva como às condições materiais de detenção, a fim de assegurar que as pessoas sujeitas a privação de liberdade sejam tratadas com dignidade, que os seus direitos fundamentais sejam respeitados e que só sejam privadas de liberdade como medida de último recurso.

(2)

A presente recomendação consolida as normas estabelecidas no âmbito das políticas existentes a nível nacional, da União e internacional sobre os direitos das pessoas privadas de liberdade na sequência de processos penais, que revestem uma importância fundamental no contexto da cooperação judiciária em matéria penal entre os Estados-Membros.

(3)

Os Estados-Membros podem alargar as orientações estabelecidas na presente recomendação, no intuito de proporcionar um nível de proteção mais elevado. Estes níveis de proteção mais elevados não devem constituir um obstáculo ao reconhecimento mútuo das decisões judiciais que estas orientações visam facilitar. O nível de proteção nunca deverá ser inferior ao das normas previstas pela Carta e pela CEDH, conforme interpretadas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

DEFINIÇÕES

(4)

Nos termos da presente recomendação, entende-se por «prisão preventiva» qualquer período de detenção de um suspeito ou arguido em processo penal ordenado por uma autoridade judiciária e antes da condenação. Não deve incluir a privação inicial de liberdade por parte de um agente da polícia ou outro agente de aplicação da lei (ou de qualquer outra pessoa autorizada a agir) para efeitos de interrogatório ou de detenção do suspeito ou arguido até que seja tomada uma decisão sobre a prisão preventiva.

(5)

Nos termos da presente recomendação, entende-se por «medidas alternativas» as medidas menos restritivas como alternativa à detenção.

(6)

Nos termos da presente recomendação, entende-se por «recluso(a)» uma pessoa privada de liberdade em prisão preventiva e uma pessoa condenada a cumprir uma pena de prisão. Entende-se por «estabelecimento prisional» qualquer prisão ou outro centro de detenção, tal como definido na presente recomendação.

(7)

Nos termos da presente recomendação, entende-se por «menor» uma pessoa com menos de 18 anos de idade.

(8)

Nos termos da presente recomendação, entende-se por «jovem adulto» uma pessoa com mais de 18 anos e menos de 21 anos.

(9)

Nos termos da presente recomendação, entende-se por «pessoas com deficiência», em conformidade com o artigo 1.o da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aqueles que têm incapacidades duradouras físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais, que em interação com várias barreiras podem impedir a sua plena e efetiva participação na sociedade em condições de igualdade com os outros.

PRINCÍPIOS GERAIS

(10)

Os Estados-Membros só devem recorrer à prisão preventiva como medida de último recurso. Devem ser preferidas medidas alternativas à detenção, em especial se a infração for punível apenas com uma pena de prisão de curta duração ou se o autor da infração for um menor.

(11)

Os Estados-Membros devem garantir que os reclusos sejam tratados com respeito e dignidade e em conformidade com as respetivas obrigações em matéria de direitos humanos, incluindo a proibição da tortura e das penas ou tratamentos desumanos ou degradantes, tal como previsto no artigo 3.o da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 4.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

(12)

Os Estados-Membros são incentivados a gerir a detenção de forma a facilitar a reintegração social dos reclusos, a fim de prevenir a reincidência.

(13)

Os Estados-Membros devem aplicar a presente recomendação sem distinção de qualquer tipo, como a origem racial ou étnica, cor, sexo, idade, deficiência, orientação sexual, língua, religião, opiniões políticas ou outras, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição.

NORMAS MÍNIMAS EM MATÉRIA DE DIREITOS PROCESSUAIS DOS SUSPEITOS E ARGUIDOS SUJEITOS A PRISÃO PREVENTIVA

A prisão preventiva como medida de último recurso e alternativas à detenção

(14)

Os Estados-Membros só devem impor a prisão preventiva quando estritamente necessário e como medida de último recurso, tendo devidamente em conta as circunstâncias específicas de cada caso individual. Para o efeito, os Estados-Membros devem aplicar medidas alternativas sempre que possível.

(15)

Os Estados-Membros devem adotar uma presunção a favor da libertação. Os Estados-Membros devem exigir às autoridades nacionais competentes que assumam o ónus da prova para demonstrar a necessidade de impor a prisão preventiva.

(16)

A fim de evitar o recurso inadequado à prisão preventiva, os Estados-Membros devem disponibilizar o mais amplo leque possível de medidas alternativas, tais como as medidas alternativas mencionadas na Decisão-Quadro 2009/829/JAI do Conselho (23) relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às decisões sobre medidas de controlo, em alternativa à prisão preventiva.

(17)

Essas medidas podem incluir: a) o compromisso de comparecer perante uma autoridade judicial sempre que necessário, de não interferir com a justiça e não adotar determinados comportamentos, incluindo os relacionados com uma determinada profissão ou com um determinado emprego; b) a obrigação de apresentar relatórios diários ou periódicos a uma autoridade judicial, à polícia ou a outra autoridade; c) a obrigação de aceitar a supervisão por uma agência designada pela autoridade judicial; d) a obrigação de sujeição à vigilância eletrónica; e) a obrigação de residência num endereço especificado, com ou sem condições quanto às horas que aí devem ser passadas; f) a interdição de sair ou entrar em determinadas pessoas sem autorização; h) a obrigação de entrega de passaportes ou outros documentos de identificação; e i) a obrigação de fornecer ou assegurar uma caução financeira ou de outra natureza para garantir a conduta durante a pendência do processo.

(18)

Os Estados-Membros devem, além disso, exigir que, caso seja fixada uma caução financeira como condição para a libertação, o montante seja proporcional aos meios do suspeito ou arguido.

Suspeita razoável e motivos para a prisão preventiva

(19)

Os Estados-Membros só devem impor a prisão preventiva com base numa suspeita razoável, estabelecida através de uma avaliação casuística cuidadosa, de que o suspeito cometeu a infração em causa, e devem limitar os fundamentos jurídicos da prisão preventiva a: a) risco de fuga; b) risco de reincidência; c) risco de o suspeito ou arguido interferir no funcionamento da justiça; ou d) risco de ameaça para a ordem pública.

(20)

Os Estados-Membros devem garantir que a determinação de qualquer risco se baseie nas circunstâncias específicas do caso, mas que seja dada especial atenção aos seguintes aspetos: a) natureza e gravidade da alegada infração; b) pena suscetível de ser aplicada em caso de condenação; c) idade, saúde, caráter, condenações anteriores e circunstâncias pessoais e sociais do suspeito e, em especial, os seus laços comunitários; e d) conduta do suspeito, em especial a forma como cumpriu quaisquer obrigações que lhe tenham sido impostas no decurso de um processo penal anterior. O facto de o suspeito não ser nacional do Estado onde se presume que a infração foi cometida ou não ter qualquer outro vínculo com esse Estado não é, por si só, suficiente para concluir que existe um risco de fuga.

(21)

Os Estados-Membros são incentivados a impor a prisão preventiva apenas para infrações que impliquem uma pena privativa de liberdade mínima de um ano.

Fundamentação das decisões de prisão preventiva

(22)

Os Estados-Membros devem assegurar que todas as decisões de uma autoridade judicial de impor a prisão preventiva, prorrogar essa prisão preventiva ou impor medidas alternativas sejam devidamente fundamentadas e justificadas e se refiram às circunstâncias específicas do suspeito ou arguido que justificam a sua detenção. Deve ser facultada à pessoa afetada uma cópia da decisão, que deve também incluir os motivos pelos quais as alternativas à prisão preventiva não são consideradas adequadas.

Reavaliação periódica da prisão preventiva

(23)

Os Estados-Membros devem assegurar que a validade dos motivos pelos quais o suspeito ou arguido se encontra em prisão preventiva seja periodicamente reavaliada por uma autoridade judicial. Logo que deixem de existir motivos para a detenção da pessoa, os Estados-Membros devem assegurar que o suspeito ou arguido seja libertado sem demora injustificada.

(24)

Os Estados-Membros devem permitir que a reavaliação periódica das decisões de prisão preventiva seja iniciada a pedido do arguido ou, ex officio, de uma autoridade judicial.

(25)

Os Estados-Membros devem, em princípio, limitar o intervalo entre as reavaliações a um máximo de um mês, exceto nos casos em que o suspeito ou arguido tenha o direito de apresentar, a qualquer momento, um pedido de libertação e de receber uma decisão sobre esse pedido sem demora injustificada.

Audição do suspeito ou arguido

(26)

Os Estados-Membros devem assegurar que um suspeito ou arguido seja ouvido pessoalmente ou através de um representante legal por meio de uma audição oral contraditória perante a autoridade judicial competente que toma uma decisão sobre a prisão preventiva. Os Estados-Membros devem assegurar que as decisões sobre a prisão preventiva sejam tomadas sem demora injustificada.

(27)

Os Estados-Membros devem defender o direito do suspeito ou arguido a um julgamento num prazo razoável. Em especial, os Estados-Membros devem garantir que os casos em que tenha sido imposta a prisão preventiva sejam tratados com urgência e com a devida diligência.

Vias de recurso efetivas e direito de recurso

(28)

Os Estados-Membros devem garantir que os suspeitos ou arguidos que se encontrem privados de liberdade tenham acesso a um processo perante um tribunal competente para verificar a legalidade da sua detenção e, se for caso disso, ordenar a sua libertação.

(29)

Os Estados-Membros devem conceder aos suspeitos ou arguidos objeto de uma decisão de prisão preventiva o direito de recurso contra essa decisão e informá-los desse direito quando a decisão for tomada.

Duração da prisão preventiva

(30)

Os Estados-Membros devem assegurar que a duração da prisão preventiva não excede a pena que pode ser imposta pela infração em causa nem é desproporcionada relativamente à infração.

(31)

Os Estados-Membros devem garantir que a duração da prisão preventiva imposta não colide com o direito de uma pessoa detida a ser julgada num prazo razoável.

(32)

Os Estados-Membros devem considerar prioritários os casos que envolvam uma pessoa sujeita a prisão preventiva.

Dedução do tempo de prisão preventiva da duração da condenação definitiva

(33)

Os Estados-Membros devem deduzir da duração de qualquer pena de prisão posteriormente imposta qualquer período de prisão preventiva anterior à condenação, inclusive quando executado através de medidas alternativas.

NORMAS MÍNIMAS RELATIVAS ÀS CONDIÇÕES MATERIAIS DE DETENÇÃO

Alojamento

(34)

Os Estados-Membros devem atribuir a cada recluso uma superfície mínima de, pelo menos, 6 m2 em celas individuais e de 4 m2 em celas coletivas. Os Estados-Membros devem garantir que o espaço pessoal mínimo absoluto disponível para cada recluso, incluindo numa cela coletiva, corresponda ao equivalente a, pelo menos, 3 m2 de superfície por recluso. Se o espaço pessoal disponível para um recluso for inferior a 3 m2, existe uma forte presunção de violação do artigo 3.o da CEDH. O cálculo do espaço disponível deve incluir a área ocupada pelo mobiliário, mas não a área ocupada pelas instalações sanitárias.

(35)

Os Estados-Membros devem assegurar que qualquer redução excecional da superfície mínima absoluta de 3 m2 por recluso seja breve, ocasional, menor e acompanhada de liberdade de circulação suficiente fora da cela e de atividades adequadas fora da cela. Além disso, os Estados-Membros devem assegurar que, nesses casos, as condições gerais de detenção no estabelecimento são adequadas e que não existem outros fatores agravantes nas condições de detenção da pessoa em causa, tais como outras deficiências nos requisitos estruturais mínimos para as celas ou instalações sanitárias.

(36)

Os Estados-Membros devem garantir que os reclusos tenham acesso a luz natural e ar fresco nas suas celas.

Afetação

(37)

Os Estados-Membros são incentivados e, no caso dos menores, devem assegurar que os reclusos sejam afetados, na medida do possível, a estabelecimentos prisionais próximos das suas casas ou de outros locais adequados para a sua reinserção social.

(38)

Os Estados-Membros devem assegurar que as pessoas detidas antes de julgamento sejam mantidas separadamente das que foram condenadas. As mulheres devem ser separadas dos homens. Os menores não devem ser detidos com adultos, a menos que tal seja considerado do interesse superior da criança.

(39)

Quando um menor detido atinge a idade de 18 anos e, se for adequado, no caso dos jovens adultos com menos de 21 anos, os Estados-Membros devem prever a possibilidade de manter essa pessoa separadas dos outros reclusos adultos caso se justifique, tendo em conta as circunstâncias da pessoa em causa e desde que tal seja compatível com o superior interesse dos menores detidos juntamente com essa pessoa.

Higiene e condições sanitárias

(40)

Os Estados-Membros devem garantir que existem instalações sanitárias permanentemente acessíveis e que oferecem privacidade suficiente aos reclusos, incluindo uma separação estrutural efetiva dos espaços de vida nas celas coletivas.

(41)

Os Estados-Membros devem estabelecer medidas eficazes para manter boas normas de higiene através da desinfeção e da fumigação. Além disso, devem assegurar que sejam fornecidos aos reclusos produtos sanitários de base, incluindo pensos higiénicos, e que as celas disponham de água quente e corrente.

(42)

Os Estados-Membros devem facultar aos reclusos vestuário e roupa de cama limpos e adequados, bem como meios para manter esses artigos limpos.

Alimentação

(43)

Os Estados-Membros devem assegurar que os alimentos são fornecidos em quantidade e qualidade suficientes para satisfazer as necessidades nutricionais dos reclusos e que os alimentos são preparados e servidos em condições de higiene. Além disso, os Estados-Membros devem garantir a disponibilidade permanente de água potável limpa para os reclusos.

(44)

Os Estados-Membros devem proporcionar aos reclusos uma alimentação nutritiva que tenha em conta a idade, a deficiência, a saúde, o estado físico, a religião, a cultura e a natureza do seu trabalho.

Tempo passado fora da cela e no exterior

(45)

Os Estados-Membros devem permitir que os reclusos façam exercício ao ar livre durante, pelo menos, uma hora por dia e devem fornecer instalações e equipamentos espaçosos e adequados para o efeito.

(46)

Os Estados-Membros devem permitir que os reclusos passem um período razoável fora das suas celas para participarem em atividades profissionais, educativas e recreativas, conforme necessário para um nível adequado de interação humana e social. A fim de evitar uma violação da proibição da tortura e das penas ou tratamentos desumanos ou degradantes, os Estados-Membros devem garantir que quaisquer exceções a esta regra no contexto de regimes e medidas de segurança especiais, incluindo o isolamento, sejam necessárias e proporcionadas.

Trabalho e educação dos reclusos com vista a promover a sua reintegração social

(47)

Os Estados-Membros devem investir na reabilitação social dos reclusos, tendo em conta as suas necessidades individuais. Para o efeito, os Estados-Membros devem esforçar-se por oferecer trabalho remunerado de natureza útil. A fim de promover a reintegração bem sucedida do recluso na sociedade e no mercado de trabalho, os Estados-Membros devem dar preferência a trabalhos que envolvam formação profissional.

(48)

Para ajudar os reclusos a prepararem-se para a sua libertação e facilitar a sua reintegração na sociedade, os Estados-Membros devem certificar-se de que todos os reclusos têm acesso a programas educativos seguros, inclusivos e acessíveis (incluindo o ensino à distância) que satisfaçam as suas necessidades individuais tendo simultaneamente em conta as suas aspirações.

Cuidados de saúde

(49)

Os Estados-Membros devem garantir o acesso dos reclusos, em tempo útil, à assistência médica, incluindo psicológica, de que necessitam para manter a sua saúde física e mental. Para o efeito, os Estados-Membros devem assegurar que os cuidados de saúde nos estabelecimentos prisionais cumprem os mesmos padrões que os prestados pelo sistema nacional de saúde pública, nomeadamente no que diz respeito ao tratamento psiquiátrico.

(50)

Os Estados-Membros devem assegurar um acompanhamento médico regular e incentivar programas de vacinação e rastreio sanitário, incluindo de doenças transmissíveis (VIH, hepatite B e C viral, tuberculose e doenças sexualmente transmissíveis) e de doenças não transmissíveis (especialmente o rastreio do cancro), seguidas de diagnóstico e início de tratamento, sempre que necessário. Os programas de educação para a saúde podem contribuir para melhorar as taxas de rastreio e a literacia no domínio da saúde. Em especial, os Estados-Membros devem assegurar que seja prestada especial atenção ao tratamento dos reclusos toxicodependentes, à prevenção e cuidados de doenças infecciosas, à saúde mental e à prevenção do suicídio.

(51)

Os Estados-Membros devem exigir a realização de um exame médico sem demora injustificada no início de qualquer período de privação de liberdade e após qualquer transferência.

Prevenção da violência e dos maus tratos

(52)

Os Estados-Membros devem tomar todas as medidas razoáveis para garantir a segurança dos reclusos e prevenir qualquer forma de tortura ou maus tratos. Em especial, os Estados-Membros devem tomar todas as medidas razoáveis para assegurar que os reclusos não sejam vítimas de violência ou maus tratos por parte do pessoal do estabelecimento prisional e que sejam tratados com respeito pela sua dignidade. Os Estados-Membros devem também exigir que o pessoal do estabelecimento prisional e todas as autoridades competentes protejam os reclusos da violência ou dos maus tratos infligidos por outros reclusos.

(53)

Os Estados-Membros devem assegurar que o cumprimento deste dever de diligência e o eventual recurso à força por parte do pessoal do estabelecimento prisional estão sujeitos a supervisão.

Contacto com o mundo exterior

(54)

Os Estados-Membros devem permitir que os reclusos recebam visitas das suas famílias e de outras pessoas, tais como representantes legais, assistentes sociais e médicos. Os Estados-Membros devem também permitir que os reclusos se correspondam livremente com essas pessoas por carta e, o mais frequentemente possível, por telefone ou outras formas de comunicação, incluindo meios alternativos de comunicação para as pessoas com deficiência.

(55)

Os Estados-Membros devem disponibilizar instalações adequadas para acolher visitas familiares em condições adaptadas às crianças, compatíveis com as exigências de segurança, mas menos traumáticas para os menores. Essas visitas familiares devem assegurar a manutenção de contactos regulares e significativos entre os membros da família.

(56)

Os Estados-Membros devem ponderar a possibilidade de permitir a comunicação através de meios digitais, tais como videochamadas, a fim de, nomeadamente, permitir que os reclusos mantenham contacto com as suas famílias, se candidatem a empregos, frequentem cursos de formação ou procurem alojamento em preparação para a sua libertação.

(57)

Os Estados-Membros devem assegurar que, nos casos em que os reclusos estejam excecionalmente proibidos de comunicar com o mundo exterior, essa medida restritiva seja estritamente necessária e proporcionada e não seja aplicada durante um período prolongado.

Assistência jurídica

(58)

Os Estados-Membros devem assegurar que os reclusos tenham acesso efetivo a um advogado.

(59)

Os Estados-Membros devem respeitar a confidencialidade das reuniões e de outras formas de comunicação, incluindo a correspondência jurídica, entre os reclusos e os seus conselheiros jurídicos.

(60)

Os Estados-Membros devem conceder aos reclusos o acesso aos documentos relativos aos seus processos judiciais ou permitir-lhes conservá-los na sua posse.

Pedidos e queixas

(61)

Os Estados-Membros devem assegurar que todos os reclusos sejam claramente informados das regras aplicáveis nos seus estabelecimentos prisionais específicos.

(62)

Os Estados-Membros devem facilitar o acesso efetivo a um procedimento que permita aos reclusos contestarem oficialmente aspetos da sua vida em detenção. Em especial, os Estados-Membros devem assegurar que os reclusos possam apresentar livremente pedidos e queixas confidenciais sobre o seu tratamento, através de mecanismos de reclamação internos e externos.

(63)

Os Estados-Membros devem assegurar que as queixas dos reclusos sejam tratadas rápida e diligentemente por uma autoridade ou tribunal independente habilitado a ordenar medidas cautelares, em especial medidas destinadas a pôr termo a qualquer violação do direito de não ser submetido a tortura ou a tratamentos desumanos ou degradantes.

Medidas especiais para as mulheres e as raparigas

(64)

Os Estados-Membros devem ter em conta as necessidades físicas, profissionais, sociais e psicológicas específicas das mulheres e raparigas, bem como os requisitos sanitários e de cuidados de saúde, ao tomarem decisões que afetem qualquer aspeto da sua detenção.

(65)

Os Estados-Membros devem permitir que as reclusas deem à luz num hospital fora do estabelecimento prisional. No entanto, sempre que uma criança nasça no estabelecimento prisional, os Estados-Membros devem garantir todo o apoio e instalações necessários para proteger os laços entre a mãe e a criança e salvaguardar o seu bem-estar físico e mental, incluindo cuidados de saúde adequados pré-natais e pós-natais.

(66)

Os Estados-Membros devem permitir que as reclusas que tenham filhos pequenos as mantenham no estabelecimento prisional, na medida em que tal seja compatível com o superior interesse da criança. Os Estados-Membros devem proporcionar alojamento especial e tomar todas as medidas razoáveis adaptadas às crianças para garantir a saúde e o bem-estar das crianças afetadas durante a execução da pena.

Medidas especiais para os cidadãos estrangeiros

(67)

Os Estados-Membros devem garantir que os cidadãos estrangeiros e outros reclusos com necessidades linguísticas específicas privados de liberdade tenham acesso razoável a serviços de interpretação profissional e a traduções de material escrito numa língua que compreendam.

(68)

Os Estados-Membros devem assegurar que os cidadãos estrangeiros sejam informados, sem demora injustificada, do seu direito de contactar com o serviço diplomático ou consular do seu país de nacionalidade e de dispor de meios razoáveis para estabelecer essa comunicação.

(69)

Os Estados-Membros devem assegurar a prestação de informações sobre assistência jurídica.

(70)

Os Estados-Membros devem garantir que os estrangeiros sejam informados da possibilidade de solicitar que a execução da pena ou das medidas de controlo anteriores ao julgamento seja transferida para o seu país de nacionalidade ou de residência permanente, nomeadamente ao abrigo da Decisão-Quadro 2008/909/JAI e da Decisão-Quadro 2009/829/JAI.

Medidas especiais para os menores e jovens adultos

(71)

Os Estados-Membros devem garantir que o interesse superior do menor constitui uma consideração primordial em todas as questões relacionadas com a sua detenção e que os seus direitos e necessidades específicos são tidos em conta aquando da tomada de decisões que afetem qualquer aspeto da sua detenção.

(72)

Relativamente aos menores, os Estados-Membros devem estabelecer um regime de detenção adequado e multidisciplinar, que garanta e preserve a sua saúde e o seu desenvolvimento físico, mental e emocional, o seu direito à educação e à formação, o exercício efetivo e regular do seu direito à vida familiar e o seu acesso a programas que promovam a sua reintegração na sociedade.

(73)

Qualquer recurso a medidas disciplinares, incluindo o isolamento em cela especial de segurança, o recurso a restrições ou o uso da força, deve estar sujeito a considerações de estrita necessidade e proporcionalidade.

(74)

Sempre que adequado, os Estados-Membros são incentivados a aplicar o regime de detenção de menores aos jovens delinquentes com menos de 21 anos.

Medidas especiais para pessoas com deficiência ou problemas de saúde graves

(75)

Os Estados-Membros devem assegurar que as pessoas com deficiência ou outras pessoas com problemas de saúde graves recebam cuidados adequados, comparáveis aos prestados pelo sistema nacional de saúde pública, que satisfaçam as suas necessidades específicas. Em especial, os Estados-Membros devem garantir que as pessoas diagnosticadas com problemas de saúde mental recebam cuidados profissionais especializados, se necessário em instituições especializadas ou em secções especializadas do estabelecimento prisional sob supervisão médica, e que seja assegurada a continuidade dos cuidados de saúde aos reclusos em preparação para libertação, se necessário.

(76)

No que diz respeito às condições materiais de detenção e aos regimes de detenção, os Estados-Membros devem garantir que as necessidades dos reclusos com deficiência ou problemas de saúde graves são satisfeitas e que a sua acessibilidade é assegurada, incluindo através da disponibilização de atividades adequadas a esses reclusos.

Medidas especiais para proteger outros reclusos com necessidades ou vulnerabilidades especiais

(77)

Os Estados-Membros devem assegurar que a detenção não agrava ainda mais a marginalização de pessoas devido à sua orientação sexual, origem racial ou étnica ou convicções religiosas ou com base em qualquer outro motivo.

(78)

Os Estados-Membros devem tomar todas as medidas razoáveis para prevenir qualquer tipo de violência ou outros maus tratos, tais como abusos físicos, mentais ou sexuais, contra pessoas devido à sua orientação sexual, origem racial ou étnica, convicções religiosas ou com base em qualquer outro motivo por parte do pessoal do estabelecimento prisional ou de outros reclusos. Os Estados-Membros devem assegurar a aplicação de medidas de proteção especiais sempre que exista um risco de tais atos de violência ou maus tratos.

Inspeções e controlo

(79)

Os Estados-Membros devem facilitar a realização de inspeções regulares por uma autoridade independente para avaliar se os estabelecimentos prisionais são administrados em conformidade com os requisitos do direito nacional e internacional. Em especial, os Estados-Membros devem conceder acesso sem restrições ao Comité para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes e à rede de mecanismos nacionais de prevenção.

(80)

Os Estados-Membros devem conceder acesso aos estabelecimentos prisionais aos deputados nacionais e são incentivados a conceder acesso semelhante aos deputados do Parlamento Europeu.

(81)

Os Estados-Membros devem igualmente ponderar a organização de visitas regulares aos estabelecimentos prisionais e a outros centros de detenção para juízes, procuradores e advogados de defesa no âmbito da sua formação judiciária.

Medidas específicas para combater a radicalização nas prisões

(82)

Os Estados-Membros são incentivados a realizar uma avaliação inicial dos riscos com vista a determinar o regime de detenção adequado aplicável aos reclusos suspeitos ou condenados por crimes terroristas e extremistas violentos.

(83)

Com base nesta avaliação dos riscos, estes reclusos podem ser agrupados numa ala separada reservada aos terroristas ou podem estar dispersos pela população prisional geral. Neste último caso, os Estados-Membros devem impedir que essas pessoas tenham contacto direto com os reclusos em situações de especial vulnerabilidade.

(84)

Os Estados-Membros devem garantir que a administração prisional realiza regularmente novas avaliações de risco (no início da detenção, durante a detenção e antes da libertação dos reclusos suspeitos ou condenados por crimes terroristas e extremistas violentos).

(85)

Os Estados-Membros são incentivados a ministrar formação geral de sensibilização a todo o pessoal e formação a pessoal especializado, para que reconheçam sinais de radicalização numa fase precoce. Os Estados-Membros devem igualmente considerar a possibilidade de disponibilizar um número adequado de capelães prisionais bem formados que representem uma variedade de religiões.

(86)

Os Estados-Membros devem aplicar medidas que prevejam programas de reabilitação, desradicalização e desvinculação na prisão, em preparação para a libertação, e programas após a libertação para promover a reintegração dos reclusos condenados por crimes terroristas e extremistas violentos.

ACOMPANHAMENTO

(87)

Os Estados-Membros devem informar a Comissão sobre o seguimento dado à presente recomendação no prazo de 18 meses a contar da sua adoção. Com base nestas informações, a Comissão deve acompanhar e avaliar as medidas tomadas pelos Estados-Membros e apresentar um relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho no prazo de 24 meses após a sua adoção.

Feito em Bruxelas, em 8 de dezembro de 2022.

Pela Comissão

Didier REYNDERS

Membro da Comissão


(1)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 5 de abril de 2016, Aranyosi e Căldăraru, C-404/15 e C-659/15 PPU, ECLI:EU:C:2016:198. Acórdão do Tribunal de Justiça, de 25 de julho de 2018, Generalstaatsanwaltschaft, C-220/18 PPU, ECLI:EU:C:2018:589 e Acórdão do Tribunal de Justiça, de 15 de outubro de 2019, Dimitru-Tudor Dorobantu, C-128/18, ECLI:EU:C:2019:857.

(2)  Decisão-Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros (JO L 190 de 18.7.2002, p. 1).

(3)  Bivolaru e Moldávia/França, acórdão de 25 de março de 2021, 40324/16 e 12623/17 (não traduzido para português).

(4)  https://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-14540-2018-INIT/pt/pdf

(5)  https://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-14075-2019-INIT/en/pdf

(6)  https://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-9727-2019-INIT/pt/pdf

(7)  [2019/2207 (INI)], tal como aprovado em 20 de janeiro de 2021.

(8)  Ver https://fra.europa.eu/en/databases/criminal-detention

(9)  Período abrangido: 2016-2019. Para mais informações, ver: https://ec.europa.eu/info/publications/replies-questionnaire-quantitative-information-practical-operation-european-arrest-warrant_en

(10)  9.a ronda de avaliações mútuas e conclusões da Conferência de Alto Nível sobre o mandado de detenção europeu, organizada pela Presidência alemã do Conselho da União Europeia em setembro de 2020.

(11)  Ver Direção-Geral da Justiça e dos Consumidores, Rights of suspects and accused persons who are in pre-trial detention (exploratory study): final report (não traduzido para português), Serviço das Publicações da União Europeia, 2022, https://data.europa.eu/doi/10.2838/293366; Direção-Geral da Justiça e dos Consumidores, Rights of suspects and accused persons who are in pre-trial detention (exploratory study). Annex 2, Country fiches (não traduzido para português), Serviço das Publicações da União Europeia, 2022, https://data.europa.eu/doi/10.2838/184080.

(12)  Menos de um ano na Áustria, Alemanha, Dinamarca, Estónia, Letónia, Suécia e Eslováquia; entre um e dois anos na Bulgária, Grécia, Lituânia, Malta, Polónia e Portugal; entre dois e cinco anos na Chéquia, França, Espanha, Croácia e Hungria; mais de cinco anos em Itália e na Roménia; sem limite de tempo na Bélgica, Chipre, Finlândia, Irlanda, Luxemburgo e Países Baixos.

(13)  Em 2020, desde pouco menos de dois meses e meio em Malta até quase 13 meses na Eslovénia. Média por Estado-Membro: Áustria — 2,9 meses; Bulgária — 6,5 meses; Chéquia — 5,1 meses; Estónia — 4,7 meses; Finlândia — 3,7 meses; Grécia — 11,5 meses; Hungria — 12,3 meses; Irlanda — 2,5 meses; Itália — 6,5 meses; Lituânia — 2,8 meses; Luxemburgo — 5,2 meses; Malta — 2,4 meses; Países Baixos — 3,7 meses; Portugal — 11 meses; Roménia — 5,3 meses; Eslováquia — 3,9 meses; Eslovénia — 12,9 meses; Espanha — 5,9 meses. Não havia dados disponíveis relativos a 2020 para a Bélgica, Dinamarca, França, Letónia, Polónia, Alemanha, Croácia, Chipre e Suécia.

(14)  Menos de 10 % na Bulgária, Chéquia e Roménia e mais de 45 % no Luxemburgo em 2019.

(15)  Diretiva 2010/64/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de outubro de 2010, relativa ao direito à interpretação e tradução em processo penal (JO L 280 de 26.10.2010, p. 1).

(16)  Diretiva 2012/13/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2012, relativa ao direito à informação em processo penal (JO L 142 de 1.6.2012, p. 1).

(17)  Diretiva 2013/48/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, relativa ao direito de acesso a um advogado em processo penal e nos processos de execução de mandados de detenção europeus, e ao direito de informar um terceiro aquando da privação de liberdade e de comunicar, numa situação de privação de liberdade, com terceiros e com as autoridades consulares (JO L 294 de 6.11.2013, p. 1).

(18)  Diretiva (UE) 2016/343 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, relativa ao reforço de certos aspetos da presunção de inocência e do direito de comparecer em julgamento em processo penal (JO L 65 de 11.3.2016, p. 1).

(19)  Diretiva (UE) 2016/800 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2016, relativa a garantias processuais para os menores suspeitos ou arguidos em processo penal (JO L 132 de 21.5.2016, p. 1).

(20)  Diretiva (UE) 2016/1919 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro de 2016, relativa ao apoio judiciário para suspeitos e arguidos em processo penal e para as pessoas procuradas em processos de execução de mandados de detenção europeus (JO L 297 de 4.11.2016, p. 1).

(21)   JO C 378 de 24.12.2013, p. 8.

(22)  Decisão-Quadro 2008/909/JAI do Conselho, de 27 de novembro de 2008, relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sentenças em matéria penal que imponham penas ou outras medidas privativas de liberdade para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia (JO L 327 de 5.12.2008, p. 27).

(23)  Decisão-Quadro 2009/829/JAI do Conselho, de 23 de outubro de 2009, relativa à aplicação, entre os Estados-Membros da União Europeia, do princípio do reconhecimento mútuo às decisões sobre medidas de controlo, em alternativa à prisão preventiva (JO L 294 de 11.11.2009, p. 20).