21.7.2012   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

L 195/19


DECISÃO DA COMISSÃO,

de 9 de março de 2012,

relativa ao Auxílio estatal SA.12522 (C 37/08) — França — Aplicação da Decisão «Sernam 2»

[notificada com o número C(2012) 1616]

(Apenas faz fé o texto em língua francesa.)

(Texto relevante para efeitos do EEE)

(2012/398/UE)

A COMISSÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), nomeadamente o artigo 108.o, n.o 2, primeiro parágrafo (1),

Tendo em conta o Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, nomeadamente o artigo 62.o, n.o 1, alínea a),

Após ter convidado as partes interessadas a apresentarem as suas observações nos termos dos referidos artigos (2),

Considerando o seguinte:

1.   PROCEDIMENTO

1.1.   CONTEXTO PROCESSUAL GERAL

(1)

Em 23 de maio de 2001, a Comissão autorizou um auxílio à reestruturação da SCS Sernam (sociedade em comandita simples), que passou a denominar-se Sernam SA em dezembro de 2001 («Decisão Sernam 1») (3).

(2)

Em 20 de outubro de 2004, a Comissão adotou uma decisão final em que confirmava que o auxílio autorizado pela decisão Sernam 1, num montante de 503 milhões de EUR, era compatível com o mercado interno sob certas condições («Decisão Sernam 2») (4). Essa decisão assinalou igualmente a presença de um auxílio adicional de 41 milhões de EUR, incompatível com o mercado interno, a recuperar pela França.

(3)

Por carta de 24 de junho de 2005, uma primeira parte interessada («autor da primeira denúncia») queixou-se da aplicação incorreta da Decisão Sernam 2 (5).

(4)

Em 22 de fevereiro de 2006, o autor da primeira denúncia introduziu igualmente um recurso por omissão contra a Comissão, na medida em que esta não tinha, na altura, dado seguimento à sua denúncia.

(5)

Por carta de 10 de abril de 2006, uma segunda parte interessada, a empresa Mory Group («autor da segunda denúncia») também apresentou uma denúncia à Comissão (6).

(6)

Os dois autores das denúncias consideravam, em substância, que a decisão Sernam 2 tinha sido aplica da de forma abusiva e solicitaram que a Comissão desse início a um novo procedimento formal de investigação sobre a aplicação por parte da França da Decisão Sernam 2.

(7)

Por carta de 16 de julho de 2008, a Comissão informou a França da sua decisão de iniciar o procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, do TFUE relativamente à aplicação por parte deste país da Decisão Sernam 2 («decisão de início do procedimento»). A Comissão expôs, nomeadamente, as suas dúvidas sobre a compatibilidade com a Decisão Sernam 2 das modalidades escolhidas pela França para aplicar essa decisão e sobre a possibilidade de tais modalidades implicarem novos auxílios estatais.

(8)

A decisão da Comissão de dar início ao procedimento foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia  (7). Os argumentos dos dois autores das denúncias são resumidos no ponto 16. Pela mesma decisão, a Comissão convidou os interessados a apresentarem as suas observações sobre a aplicação por parte da França da Decisão Sernam 2.

(9)

Em 8 de outubro de 2008, as autoridades francesas apresentaram observações sobre a decisão de início do procedimento.

(10)

A Comissão recebeu das partes interessadas observações sobre o assunto. O autor da primeira denúncia apresentou observações em 13 de novembro de 2008. A Société nationale des chemins de fer («SNCF») comunicou observações em 6 de fevereiro de 2009. O fundo de investimento Butler Capital Partners («BCP») apresentou observações em 9 de fevereiro de 2009. A Comissão transmitiu as observações recebidas à França em 25 de março de 2009, concedendo-lhe a possibilidade de as comentar e recebeu os comentários das autoridades francesas sobre as observações do autor da primeira denúncia em 7 de maio de 2009.

(11)

Em 15 de março de 2011, o autor da segunda denúncia solicitou à Comissão que adotasse «atos de instrução» destinados a verificar as condições de aplicação da Decisão Sernam 2. A Comissão respondeu em 18 de maio de 2011, indicando os atos de instrução realizados após a adoção da decisão de início de procedimento.

(12)

Em 25 de novembro de 2009 e em 29 de novembro de 2011, a Comissão enviou pedidos de informações às autoridades francesas. As respostas foram recebidas, respetivamente, em 15 de janeiro de 2010 e 25 de janeiro de 2012.

1.2.   CONTEXTO PROCESSUAL NACIONAL

(13)

Em 3 de janeiro de 2007, a empresa Mory group solicitou às autoridades francesas a emissão de duas declarações de dívida: 1) uma contra a Sernam SA, relativa ao auxílio de 41 milhões de EUR, declarado incompatível com o mercado comum pela Decisão Sernam 2 e que, segundo a empresa, não teria sido objeto de uma recuperação efetiva por parte da França e 2) a outra contra o beneficiário (não designado) de auxílios à reestruturação da Sernam SA, pretensamente concedidos pela França com vista à operação de transferência dos ativos da Sernam SA (sobre os pormenores desta operação, ver Secção 2.4 da presente decisão).

(14)

O Ministro da Economia, das Finanças e da Indústria rejeitou os pedidos do autor da segunda denúncia por carta. A referida decisão de rejeição foi objeto de um recurso por excesso de poder apresentado pela empresa Mory group perante o tribunal administrativo de Paris. Segundo as informações de que dispõe a Comissão, esse litígio está ainda pendente.

(15)

Além disso, em 31 de janeiro de 2012 foi introduzido um processo de recuperação judicial contra a empresa Sernam Xpress («Sernam Xpress»). A Sernam Xpress é a empresa que recebeu os ativos e os passivos não financeiros da Sernam SA no momento da operação de transferência dos ativos da Sernam SA (sobre os pormenores desta operação, ver Secção 2.4 da presente decisão). O tribunal de comércio de Nanterre decidiu um período de observação de seis meses e fixou uma nova audiência para 27 de março de 2012.

2.   DESCRIÇÃO

2.1.   A EMPRESA SERNAM

(16)

Desde a sua criação, em 1970, pela SNCF como serviço interno, as atividades da empresa Sernam consistem em serviços de entregas e de transporte expresso de encomendas e de paletes (8).

(17)

Em 1 de fevereiro de 2000, a totalidade da atividade da Sernam foi atribuída a uma filial e a SCS Sernam (Sociedade em comandita simples) foi assim constituída. A SCS Sernam foi transformada em sociedade anónima (Sernam SA) em 21 de dezembro de 2001. Em 2005, a Sernam SA contava 10 filiais operacionais, bem como uma empresa de prestação de serviços rodoviários, a Sernam Transport Route.

(18)

Em 17 de outubro de 2005, a Sernam Xpress recebeu os ativos e os passivos não financeiros da Sernam SA, por ocasião da transmissão das atividades da Sernam SA à Financière Sernam (sobre os pormenores desta operação, ver Secção 2.4). A Sernam Xpress era então detida a 100 % pela Financière Sernam.

(19)

Durante o ano de 2006, o BCP entrou no capital da Sernam Xpress com uma quota de 51,8 %. Simultaneamente, a Sernam Xpress adquiriu a empresa Coulonge, uma empresa de transportes sediada em Limoges.

(20)

Em 2011, as empresas Financière Sernam e Sernam Xpresss viram-se na obrigação de reconstituir os seus capitais próprios antes do fim do exercício contabilístico. Dado que o BCP não forneceu o capital necessário, foram realizadas duas operações.

(21)

Em primeiro lugar, em maio de 2011, a Sernam Xpress transferiu a marca Sernam para a sua filial operacional, a empresa Sernam Services (esta contribuição foi avaliada em 15 milhões de EUR).

(22)

Em segundo lugar, em 30 de junho de 2011, a empresa Sernam Xpress foi dissolvida e a empresa Financière Sernam, seu sócio único, absorveu o seu património (operação denominada «transmissão universal de património»).

(23)

Por conseguinte, o grupo Sernam é hoje constituído pela empresa Financière Sernam e pelas filiais da ex-Sernam Xpress, isto é, a Sernam Services, já evocada, e a Aster («Aster»). A Aster é a antiga empresa Sernam Transport Route. A Sernam Xpress vendeu essa filial em dezembro de 2005, tendo concedido uma garantia sobre o volume de negócios ao adquirente. Em março de 2008, a Sernam Xpress adquiriu a empresa, que entretanto tinha mudado a sua denominação para Aster. No momento da aquisição, a Sernam Xpress procedeu a uma entrada de fundos no montante de 5 milhões de EUR na Aster. Este montante em conta à ordem foi oferecido à Aster aquando de um conselho de administração realizado em julho. Em dezembro de 2011, a Financière Sernam, que tinha absorvido entretanto a Sernam Xpress (ver ponto 22) recapitalizou a Aster, fornecendo um montante de 5 599 998 EUR inscritos em conta à ordem.

(24)

A situação financeira do grupo Sernam continuou a deteriorar-se e, em 31 de janeiro de 2011, foi iniciado um processo de recuperação judicial em relação às empresas Financière Sernam e Sernam Services. Em 3 de fevereiro de 2011, a filial Aster foi colocada em liquidação com manutenção temporária da atividade. O tribunal de comércio de Nanterre decidiu conceder um período de observação de seis meses e fixou uma nova audiência para 27 de março de 2012.

2.2.   A DECISÃO SERNAM 1 DE 23 DE MAIO DE 2001

(25)

Na Decisão Sernam 1, a Comissão autorizou um auxílio num montante de 503 milhões de EUR a título da reestruturação da SCS Sernam. Esse auxílio tinha sido autorizado nomeadamente com base num compromisso da França de que a empresa seria vendida. Com efeito, 60 % do capital da SCS Sernam deveria ser adquirido pela Geodis SA (9), uma empresa de transportes e logística de direito comum cotada no segundo mercado da Bolsa de Paris. A Geodis SA deveria, assim, ficar integral e ilimitadamente responsável pelas dívidas da SCS Sernam (10) e cobrir as despesas suplementares da restruturação desta última, num montante de 67 milhões de EUR. Por seu lado, a SCS Sernam comprometia-se a reduzir o número de centros de exploração de 107 para 72 entre 1999 e 2004, a reduzir em 18 % o volume de negócios, a reduzir o pessoal e a proceder à restruturação com o orçamento atrás indicado e no prazo previsto, isto é, até ao início de 2004.

2.3.   A DECISÃO SERNAM 2 DE 20 DE OUTUBRO DE 2004

(26)

Na sua Decisão Sernam 2, a Comissão verificou que o auxílio de 503 milhões de EUR autorizado ao abrigo da Decisão Sernam 1 foi pago em condições diferentes das previstas na Decisão Sernam 1, nomeadamente em virtude da aquisição pela Géodis de 15 % (em vez de 60 %) das ações da SCS Sernam. Além disso, a Géodis renunciou contribuir, com base nos recursos próprios, para os custos de reestruturação da empresa num montante de 67 milhões de EUR.

(27)

Perante estes elementos, a Comissão impôs condições para a autorização dos auxílios à reestruturação no valor de 503 milhões de EUR pagos à Sernam SA. O artigo 3.o da Decisão Sernam 2, que especifica essas condições, está formulado da seguinte forma:

«Artigo 3.o

1.   Sob reserva do disposto no n.o 2, deverão ser respeitadas as seguintes condições:

a)

A Sernam apenas poderá desenvolver a sua atividade de expedição de encomendas por via ferroviária (segundo o conceito do «train bloc express», «TBE»). A este respeito, a SNCF garantirá que serão oferecidas a qualquer outro operador que o solicite as mesmas condições que oferece à Sernam para a atividade de transporte ferroviário de mercadorias «TBE».

b)

Em contrapartida, durante os dois próximos anos, a contar da data de notificação da presente decisão, a Sernam deverá substituir integralmente os seus meios próprios e serviços de transporte rodoviário por meios e serviços de transporte rodoviário de uma ou várias empresas, jurídica e economicamente independentes da SNCF e selecionadas por um processo aberto, transparente e não-discriminatório.

Por meios próprios e serviços de transporte rodoviário da Sernam entende-se o conjunto dos meios rodoviários – a saber, os veículos de transporte rodoviário – da empresa Sernam em regime de propriedade plena ou em leasing/locação.

As empresas que passem a exercer as atividades rodoviárias da Sernam deverão assegurar o conjunto das prestações de transporte rodoviário com os seus recursos próprios.

2.   Caso a Sernam venda em bloco os seus ativos até 30 de junho de 2005, ao preço de mercado, a uma sociedade sem vínculo jurídico com a SNCF, por meio de um processo transparente e aberto, as condições definidas no n.o 1 não são aplicáveis.»

(28)

Na Decisão Sernam 2, a Comissão explicou ainda que as autoridades francesas desembolsaram um auxílio suplementar de 41 milhões de EUR à Sernam. Esta instituição considerou o referido auxílio incompatível com o mercado interno, tendo ordenado a sua recuperação pela França.

2.4.   TRANSFERÊNCIA DAS ATIVIDADES DA SERNAM SA PARA A FINANCIÈRE SERNAM

(29)

Para efeitos da execução da Decisão Sernam 2, a França alega ter respeitado a condição prevista no artigo 3.o, n.o 2. As autoridades francesas explicaram que a SNCF convidou, num comunicado de imprensa (11), as partes interessadas a contactarem o banco ABN AMRO. 34 grupos industriais, financeiros ou consórcios teriam sido convidados a estudarem o processo. As cartas de convite para a primeira volta, enviadas pelo ABN AMRO às partes que solicitaram o processo contêm um convite à apresentação de propostas para a aquisição da totalidade dos ativos (visto que a carta é redigida em língua inglesa, o termo utilizado é assets) da Sernam SA.

(30)

Segundo as autoridades francesas, a situação económica da Sernam não permitiu obter propostas de valorização positiva. Todas as propostas apresentadas no âmbito deste processo implicavam um valor fortemente negativo:

[candidato 1] (proposta preliminar): -120 milhões de EUR;

[candidato 2] (proposta preliminar): -90,4 milhões de EUR;

[candidato 3] (proposta preliminar): -90,4 milhões de EUR;

[candidato 4] (proposta segunda volta): -65,2 milhões de EUR;

[candidato 5] (proposta segunda volta): -56,4 milhões de EUR.

(31)

Perante a ausência de uma oferta firme, a equipa de direção da Sernam SA, através de uma empresa ainda por criar e inicialmente denominada Bidco e, em seguida Financière Sernam, fez uma proposta de aquisição.

2.4.1.   Data efetiva das operações de transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam

(32)

Esta proposta foi transmitida à SNCF em 30 de junho de 2005 e aceite, em princípio, pela Direção-Geral da SNCF no mesmo dia. Contudo, a conclusão formal do protocolo de acordo entre todas as partes implicadas carecia de determinadas formalidades. O Protocolo de Acordo entre a SNCF e a Sernam SA, Sernam Xpress (uma das 10 filiais a 100 % da Sernam S.A., criada em 2002) e os dirigentes da futura empresa Financière Sernam foi assinado em 21 de julho de 2005 (a seguir denominado «Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005»). A Financière Sernam foi inscrita no registo comercial em 14 de outubro de 2005. As diferentes operações de transferência das atividades da Sernam à Financière Sernam, descritas em pormenor nos pontos seguintes, foram efetuadas em 17 de outubro de 2005.

2.4.2.   Diferentes operações de transferência das atividades da Sernam à Financière Sernam

(33)

As autoridades francesas indicaram que a transferência das atividades da Sernam à Financière Sernam foi dividida em quatro etapas:

a)

a SNCF recapitalizou sua filial a 100 %, Sernam SA, num montante de 57 milhões de EUR;

b)

a Sernam SA realizou, a favor da sua filial a 100 % Sernam Xpress, uma entrada constituída por todos os elementos do ativo, incluindo os 57 milhões de EUR da recapitalização descrita na alínea a) e do passivo da Sernam, exceto os passivos denominados «financeiros» (empréstimo participativo contraído pela empresa Sernam SA junto do grupo SNCF, passivo relativo à rescisão do contrato «IBM – GPS»), num montante de 38,5 milhões de EUR (12); em contrapartida desta entrada, a Sernam SA recebeu uma quota da Sernam Xpress, num valor nominal de 100 EUR;

c)

a Sernam Xpress procedeu de seguida a um aumento de capital de 2 milhões de EUR, que foi inteiramente subscrito pela SNCF; na sequência dessa operação, a SNCF passou a deter a maioria das ações da Sernam Xpress;

d)

a Sernam SA e a SNCF cederam à Financière Sernam por um preço de 2 milhões de EUR a totalidade das suas participações na Sernam Xpress, correspondentes à totalidade do capital desta última.

(34)

A Sernam SA foi objeto de uma liquidação judicial em 15 de dezembro de 2005. Os 41 milhões de EUR reembolsáveis à SNCF ao abrigo da Decisão Sernam 2 foram inscritos no passivo da massa insolvente (13).

(35)

As operações são representadas no quadro seguinte:

Image

(36)

O Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 previa, para além da recapitalização pela SNCF da Sernam SA, num montante de 57 milhões de EUR, e da Sernam Xpress, num montante de 2 milhões de EUR, garantias concedidas pela SNCF à Financière Sernam (descritas pormenorizadamente nos pontos 72 a 85 da decisão de início do procedimento) e uma cláusula resolutiva em caso de decisão negativa da Comissão no prazo de cinco anos a contar da conclusão do Protocolo de Acordo (descrita em pormenor no ponto 117 da decisão de início do procedimento).

2.5.   MOTIVOS QUE ORIGINARAM A ABERTURA DO PROCEDIMENTO

(37)

Na sua Decisão de 16 de julho de 2008, a Comissão verificou se a França respeitou, tal como alegou, o artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 e se o processo de recuperação do auxílio incompatível de 41 milhões de EUR escolhido pela França, isto é, a inscrição do crédito do Estado na massa insolvente da Sernam SA, implicava a eliminação da distorção da concorrência provocada pelo auxílio. Além disso, a Comissão verificou se a operação de transferência dos ativos da Sernam SA não deu lugar a novos auxílios estatais incompatíveis com o mercado interno.

2.6.   OBSERVAÇÕES DAS PARTES INTERESSADAS

2.6.1.   Observações dos autores das denúncias

(38)

Numa primeira fase, o autor da primeira denúncia considera que as condições estabelecidas na Decisão Sernam 2 para a venda dos ativos da Sernam SA não foram cumpridas.

(39)

Em primeiro lugar, o prazo imposto pela Decisão Sernam 2, ou seja, 30 de junho de 2005, para a realização da cessão não teria sido respeitado, dado que as operações de transferência só teriam sido aprovadas em 17 de outubro de 2005 e a cessão das ações deveria ocorrer no mesmo dia.

(40)

Além disso, no que se refere ao preço da transferência, o autor da primeira denúncia considera que este foi fixado tendo unicamente como referência a proposta feita pela Financière Sernam. Esta proposta teria sido, por si mesma, ilícita porque implicava a concessão de novos auxílios, nomeadamente a recapitalização da Sernam SA. Por último, o autor da primeira denúncia salienta que a Sernam Xpress não era uma empresa independente da Sernam SA, tal como demonstrado pela Comissão na sua decisão de início do procedimento.

(41)

Por outro lado, as operações de transferência constituiriam na realidade um share deal, ou seja, a manutenção no mercado da entidade beneficiária com uma simples mudança de proprietário da entidade.

(42)

O autor da primeira denúncia assinala igualmente a violação da condição de organizar a alienação por meio de um processo transparente e aberto. Segundo ele, teria sido necessário submeter a uma consulta pública e a um concurso a alienação da Sernam Xpress, após a dupla recapitalização da Sernam SA e da Sernam Xpress, em vez da alienação apenas da Sernam SA.

(43)

Numa segunda fase, o autor da primeira denúncia sublinha as manipulações realizadas no cálculo do valor dos ativos e dos passivos transferidos e a subvalorização da entidade vendida.

(44)

Numa terceira fase, o autor da primeira denúncia enumera uma série de medidas que, em sua opinião, constituiriam novos auxílios: a recapitalização de 57 milhões de EUR, a não cobrança dos 41 milhões de EUR de auxílio ilegal, o perdão de créditos financeiros detidos pela SNCF sobre a Sernam SA. Todas estas medidas seriam auxílios incompatíveis com o mercado interno.

(45)

Numa quarta fase, o autor da primeira denúncia salienta que a Sernam SA deveria ter sido liquidada em vez de cedida. Na verdade, partilha as dúvidas da Comissão quanto à tomada em consideração de certos custos no cálculo da liquidação e considera que não se verifica em qualquer momento que o custo real da reestruturação da Sernam tenha sido inferior ao custo de uma liquidação.

(46)

O autor da primeira denúncia conclui que não só as autoridades francesas se subtraíram à obrigação de recuperação de um auxílio de 41 milhões de EUR, mas também que teriam concedido novos auxílios num montante de, pelo menos, 95 milhões de EUR, a que há que acrescentar diversos auxílios concedidos sob forma de garantias.

(47)

O autor da segunda denúncia, por seu lado, não apresentou observações sobre a decisão de início do procedimento.

2.6.2.   Observações das partes interessadas considerando que a Decisão Sernam 2 foi respeitada

2.6.2.1.   Observações da SNCF

(48)

A SNCF considera ter respeitado a condição prevista no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2. Esta empresa afirmou ter vendido todos os ativos da Sernam num único bloco, antes de 30 de junho de 2005, ao preço de mercado, a uma empresa sem qualquer vínculo jurídico e por meio de um processo transparente e aberto.

(49)

Segundo a SNCF, as operações de transferência teriam sido indissociáveis e simultâneas. Por conseguinte, a Comissão não poderia proceder à sua separação artificial.

(50)

A SNCF considera que, em caso de preço negativo, o princípio do investidor numa economia de mercado teria sido respeitado se o custo da cessão fosse inferior ao custo de liquidação que o Estado acionista teria suportado e apresenta observações pormenorizadas para demonstrar esta afirmação.

(51)

Por último, salientou que a obrigação relativa à restituição do auxílio de 41 milhões de EUR teria sido inscrito no passivo da massa insolvente da Sernam SA.

2.6.2.2.   Observações da Butler Capital Partners

(52)

Numa primeira fase, o BCP esclarece a sua intervenção no capital da Sernam Xpress.

(53)

Numa segunda fase, o BCP precisa o objetivo visado pela aquisição da empresa Coulonge.

(54)

Numa terceira fase, o BCP contesta que a Sernam Xpress dispusesse de um excedente de tesouraria na sequência das recapitalizações de 57 milhões e 2 milhões de EUR. O BCP teria sido obrigado a injetar 6 milhões de EUR de capital para assegurar um nível de tesouraria aceitável, tendo em conta as perdas a financiar.

(55)

Numa quarta fase, o BCP contesta que o benefício do auxílio de 41 milhões de EUR tenha sido transmitido à Sernam Xpress. O BCP considerou que essa situação só teria sido possível se tivesse sido demonstrado que a transferência das atividades da Sernam SA não tinha sido concretizada ao preço de mercado. Ora, segundo o BCP, a transferência teria sido efetuada na sequência de um procedimento aberto, transparente e não discriminatório. O BCP recorda igualmente que o processo de transferência foi acompanhado de uma análise de um perito.

(56)

Por último, no tocante às consequências da sua tomada de controlo da Sernam, o BCP analisa o aumento de capital como se tratasse de uma venda e considera que, em conformidade com a jurisprudência Banks  (14) e SMI  (15), a recuperação de um auxílio hipotético não pode ser imposta à Financière Sernam ou à sua filial Sernam Xpress.

2.7.   OBSERVAÇÕES DA FRANÇA

2.7.1.   Quanto ao respeito da Decisão Sernam 2

2.7.1.1.   Quanto ao respeito do prazo para a venda

(57)

As autoridades francesas consideraram que a oferta firme de retoma, juridicamente vinculativa para o comprador, foi transmitida em 30 de junho de 2005 e aceite no mesmo dia pela SNCF, o que tornou acordo irrevogável à luz do direito francês dos contratos.

2.7.1.2.   Quanto ao preço de venda

(58)

As autoridades francesas consideraram que a Decisão Sernam 2 não proibia a venda a um preço negativo e que a jurisprudência reconhecia que tal preço negativo pode constituir um preço de mercado.

(59)

Os ativos teriam sido vendidos pelo preço negativo de 57 milhões de EUR, correspondente ao montante da recapitalização da Sernam SA pela SNCF. Este preço era melhor do que as propostas indicativas apresentadas inicialmente e constituiria a única proposta firme apresentada pelo mercado à SNCF, tendo sido validado por vários peritos independentes (ABN AMRO, Oddo Corporate Finance/Paul Hastings e Commission des Participations et Transferts).

(60)

Segundo as autoridades francesas, a recapitalização anteriormente realizada pela SNCF é apenas uma modalidade de atuação. Por conseguinte, a Comissão não poderia reportar-se a esta recapitalização para contestar o valor de mercado dos ativos da Sernam, dado que a existência de um preço de mercado excluiria a qualificação de auxílio para a totalidade do preço negativo.

2.7.1.3.   Quanto à venda de ativos

(61)

Em resposta à análise da Comissão, segundo a qual a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam compreendeu duas operações sucessivas, a saber: 1) uma transferência intragrupo dos ativos em bloco da Sernam SA para a Sernam Xpress (nessa fase, filial a 100 % da Sernam SA) e, de seguida 2) a alienação da Sernam Xpress à Financière Sernam, correspondente a um share deal e não a uma venda de ativos, as autoridades francesas consideraram que se trata de uma desagregação artificial e injustificada.

(62)

Em primeiro lugar, as operações de transferência corresponderiam a uma «operação de entrada-cessão», executada mediante recapitalização, isto é, uma operação indissociável que foi realizada por duas razões: 1) o direito francês não permite proceder a uma venda de ativos por um preço negativo, e 2) era conveniente garantir que o adquirente não tivesse um vínculo jurídico com a SNCF.

(63)

Tendo em conta a sua situação económica estruturalmente deficitária (as perdas acumuladas dos quatro últimos exercícios anteriores à cessão tinham-se elevado a 309,2 milhões de EUR), os ativos da Sernam SA teriam tido um valor global negativo.

(64)

Para dar cumprimento à proibição de venda a um preço negativo prevista no direito francês e garantir a neutralidade económica da operação de cessão, a prática dos profissionais em caso de valor negativo dos ativos a ceder consiste em prever que 1) o preço pago pelo adquirente seja um preço simbólico e 2) criar um dispositivo destinado a indemnizar o adquirente (quer através de uma participação do vendedor num aumento de capital anterior à cessão, quer através de uma remissão de dívidas, por parte do vendedor, a favor da empresa cedida).

(65)

Além disso, a fim de evitar pôr em causa a validade da operação pelos credores da Sernam SA ou o exercício por parte destes do seu direito de oposição, era conveniente juntar aos ativos em bloco os passivos necessários à prossecução da atividade da Sernam. Uma simples venda dos ativos não teria permitido juntar esses passivos.

(66)

Era, por conseguinte, conveniente proceder a uma entrada parcial de ativos sujeitos ao regime das cisões visado nos artigos L.236-16 a L.236-21 do Código Comercial francês. A este respeito, as autoridades francesas precisaram que a entrada equivaleria a uma venda, dado que também implicava uma transferência de propriedade, sendo remunerada por títulos emitidos pela sociedade beneficiária da entrada.

(67)

Visto que, por força do artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2, a adquirente não podia ter um vínculo jurídico com a SNCF, não era possível realizar a entrada de ativos em bloco diretamente na Financière Sernam, uma vez que, nesse caso, a Sernam SA tornar-se-ia automaticamente, em virtude da entrada, acionista da Financière Sernam. Tal facto explicaria a entrada parcial de ativos na Sernam Xpress e, em seguida, a cessão da Sernam Xpress à Financière Sernam.

(68)

Segundo as autoridades francesas, a entrada parcial de ativos a favor da Sernam Xpress não constitui, em caso algum, uma transferência intragrupo, dado que a Sernam Xpress é uma sociedade «instrumental», utilizada para acolher os ativos em bloco da Sernam SA, apenas para efeitos de permitir a sua cessão simultânea ao adquirente - a empresa Financière Sernam - e não para prosseguir a atividade da sua empresa-mãe. Estes ativos seriam acolhidos e transferidos para a Sernam Xpress pelo seu valor de mercado, para efeitos da operação. De qualquer modo, a entrada de ativos, implicaria a transferência de propriedade, em contrapartida da qual a Sernam Xpress teria emitido uma quota de 100 euros de valor nominal. Segundo as autoridades francesas, esta ação representa o preço do valor real dos elementos do ativo e do passivo objeto de transferência, após a recapitalização num montante de 57 milhões de EUR.

(69)

As autoridades francesas juntaram às suas observações em resposta à decisão de início do procedimento o parecer do Professor de direito Nicolas Molfessis, segundo o qual «[o] direito francês […] não permitia à SNCF ceder diretamente em bloco os ativos da Sernam à Financière Sernam; as regras jurídicas aplicáveis obrigariam a SNCF a realizar uma operação de entrada-cessão para respeitar as limitações impostas pela Comissão:

uma vez que o direito francês ignora o próprio conceito de venda a preço negativo, a operação não podia fazer-se ao preço de mercado, tal como imposto pela Comissão, sem que fosse realizada uma recapitalização prévia;

dado que o direito francês ignora a figura da cessão de dívida e subordina a cessão de contrato ao acordo prévio do conjunto dos contratantes cedidos, acordo na prática impossível de obter, a cessão do passivo de exploração necessário para a prossecução da atividade impunha o recurso à técnica da transferência parcial de ativos para superar esse obstáculo. O recurso à técnica da transferência parcial de ativos impunha a interposição de uma sociedade, a Sernam Xpress, para respeitar a condição de ausência de vínculo jurídico entre o cedente e o cessionário imposta pela Comissão.

O sistema instaurado pela Sernam deve ser equiparado a uma cessão em bloco dos ativos:

a operação entrada-cessão, bem conhecida na prática, foi equiparada pelo Tribunal de Cassação a uma cessão de ativos, sempre que os indícios apontavam para uma indivisibilidade entre as duas operações, visto que estas últimas só se destinavam, em última instância, à transferência dos ativos;

essa indivisibilidade está presente neste caso, dado que as diversas convenções assinadas entre as partes demonstram muito claramente a sua vontade de considerar as diferentes operações interdependentes e sem outra finalidade do que a cessão dos ativos da Sernam para a Financière Sernam.»

(70)

Segundo as autoridades francesas, os ativos da Sernam SA foram vendidos em bloco a uma empresa sem vínculo jurídico com a SNCF, a um preço negativo correspondente a um preço de mercado, na sequência de uma negociação de cessão efetuada no âmbito de um concurso aberto, transparente, incondicional e não discriminatório, de acordo com as condições impostas pelo artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2.

2.7.1.4.   Quanto à natureza aberta e transparente do processo de seleção

(71)

Para as autoridades francesas, a alegação de que o processo apresentado aos potenciais adquirentes dos ativos da Sernam SA não fazia referência à alienação da Sernam Xpress, mas sim à dos ativos da Sernam SA é materialmente falsa. Por outro lado, a exigência de um concurso aberto, transparente e não discriminatório não implicaria a realização de um novo concurso após a recapitalização, dado que esta é apenas o resultado direto do concurso e do preço negativo daí resultante.

2.7.1.5.   Quanto à confiança legítima

(72)

As autoridades francesas consideram que, ao prever expressamente a possibilidade de proceder à cessão dos ativos em bloco da Sernam, a Decisão Sernam 2 teria feito surgir, tanto para a SNCF como para as autoridades francesas, esperanças fundadas de que estavam autorizadas a atuar desse modo. O início do procedimento de exame dos auxílios estatais ignoraria, por conseguinte, a confiança legítima que as autoridades francesas tinham depositado na Decisão Sernam 2, tanto mais que estas teriam atuado com total transparência com a Comissão, fornecendo-lhe todas as explicações úteis sobre as modalidades dessa cessão.

2.7.2.   Quanto às alegadas manipulações realizadas no cálculo do valor dos ativos e passivos transferidos da Sernam SA para a Sernam Xpress

(73)

No que se refere às alegadas manipulações realizadas no cálculo do valor, as autoridades francesas rejeitaram, em primeiro lugar, o desconto de 22 milhões de EUR que teria sido aplicado no cálculo do valor dos ativos. Com efeito, tratando-se de uma operação de entrada parcial de ativos seguida de uma cessão, a regulamentação contabilística aplicável teria exigido um cálculo do valor, não segundo o valor líquido contabilístico, tal como pretende o autor da primeira denúncia, mas com base nos valores reais dos ativos e passivos transferidos. Estes valores seriam apreciados em função do preço de mercado ou de análises de peritos independentes. As regras contabilísticas em vigor teriam igualmente sido aplicadas para o cálculo do valor dos créditos fiscais diferidos. No que diz respeito à avaliação da carteira de marcas, a mesma ter-se-ia baseado numa estimativa efetuada pela Comissão Europeia em 23 de maio de 2001, aquando de uma entrada da SNCF na SCS Sernam.

(74)

Relativamente à avaliação do passivo, as autoridades francesas consideram que só os passivos necessários à prossecução da atividade da empresa beneficiária da entrada teriam sido transferidos. Além disso, o valor do badwill corresponderia apenas à transcrição contabilística do valor de mercado negativo de 57 milhões de EUR.

2.7.3.   Quanto à ausência de uma obrigação de recuperação do auxílio de 41 milhões de EUR da Sernam Xpress

(75)

As autoridades francesas alegam que a distinção entre share deal e asset deal, em que se baseiam os argumentos que a Comissão desenvolveu no quadro dos processos SMI (16) e CDA (17), não seria pertinente no caso em apreço.

2.7.3.1.   Sobre a desagregação da operação entre transferência intragrupo e share deal

(76)

Pelas razões descritas nos pontos 61 a 70, as autoridades francesas consideram que as operações de transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam não constituem uma transferência intragrupo seguida de um share deal, mas sim uma cessão de ativos a terceiros.

(77)

A título subsidiário, argumentam que o preço de mercado da Sernam Xpress teria necessariamente em conta a existência da dívida de 41 milhões de EUR, se o auxílio tivesse sido transferido. Nesta hipótese, o preço negativo teria sido de 98 milhões de EUR (57 + 41). Ora, o preço negativo «pago» – em realidade recebido – pela Financière Sernam teria de ser de 57 milhões de EUR. Por conseguinte, o vendedor teria realizado uma economia de 41 milhões de EUR, sendo, consequentemente, ele quem teria conservado o benefício económico do auxílio. As autoridades francesas referem-se, neste contexto ao acórdão Banks  (18).

2.7.3.2.   Sobre o respeito das condições dos acórdãos CDA e SMI

(78)

As autoridades francesas alegam que, no seu acórdão CDA, o Tribunal teria considerado que o facto de a CDA prosseguir as atividades das empresas beneficiárias dos auxílios, não permitia, por si só, demonstrar a existência de uma vontade de contornar os efeitos de uma ordem de recuperação (19).

(79)

O Tribunal de Justiça teria precisado que não se teria verificado uma vontade de contornar os efeitos da ordem de recuperação, na medida em que teria sido pago um preço de compra em conformidade com o mercado pela CDA, com vista à retoma dos elementos do ativo da sociedade LCA (20).

(80)

Segundo as autoridades francesas, pelo facto de a Sernam Xpress ter adquirido a propriedade dos ativos e passivos da Sernam SA pelo seu valor de mercado, esta operação não teria transferido para Sernam Xpress o benefício efetivo da vantagem gerado pela concessão do auxílio de 41 milhões de EUR. Além disso, a Comissão não poderia argumentar que, na sequência da aquisição dos seus ativos, a Sernam SA continuaria a ser uma empresa «instrumental», em relação à qual não seria possível obter a restituição do auxílio declarado incompatível. Tal argumento já desenvolvido no acórdão CDA teria sido rejeitado pelo Tribunal (21).

(81)

As autoridades francesas sublinham que a cessão em bloco dos ativos da Sernam SA era uma possibilidade prevista expressamente pela Comissão. O facto de a SNCF ceder em bloco os ativos da Sernam, pelo preço de mercado, a uma outra empresa, por meio de um processo transparente e aberto, não poderia, pois, em caso algum ser considerado como uma forma de contornar essa obrigação.

(82)

Tanto mais que a própria Comissão teria considerado que essa situação, em que se pretendia contornar uma obrigação, estaria excluída «quando a cessão «em bloco» dos bens da sociedade beneficiária, além de ter ocorrido ao preço de mercado, for feita no âmbito de um processo incondicional e aberto a todos os concorrentes desta última» (22).

(83)

Quanto ao argumento da Comissão (23), segundo o qual a operação não só teria permitido colocar os ativos em segurança, como o autoriza o acórdão CDA, mas também criar uma estrutura que permita financiar novos investimentos, tais como a aquisição da empresa Coulonge, bastaria observar que a aquisição da empresa Coulonge Services pela Sernam Xpress foi realizada simultaneamente com a tomada de controlo da Sernam Xpress pelo BCP e que a Sernam Xpress pôde utilizar a tomada de controlo da BCP, por intermédio da injeção de capitais frescos, para proceder a essa aquisição.

(84)

Por conseguinte, contrariamente às dúvidas expressas pela Comissão, o que as autoridades francesas identificam como «terceiro critério» do acórdão CDA estaria, portanto, igualmente respeitado.

2.7.4.   Quanto aos novos auxílios a favor da Sernam Xpress e/ou da Financière Sernam

(85)

Quanto à existência de novos auxílios no Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 (recapitalização da Sernam SA pela SNCF num montante de 57 milhões de EUR; recapitalização da Sernam Xpress pela SNCF num montante de 2 milhões de EUR; garantias concedidas pela SNCF à Financière Sernam; cláusula resolutiva), as autoridades francesas consideram que, quando uma venda é efetuada ao preço de mercado na sequência de um concurso público aberto e transparente e por um custo inferior ao custo de uma liquidação, esta não contém elementos de auxílio.

(86)

Além disso, o preço negativo apresentado pela Financière Sernam corresponde às estimativas dos peritos independentes.

(87)

As autoridades francesas precisam, de resto, que a cláusula resolutiva foi incluída no Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 a pedido da Financière Sernam e unicamente para a proteger contra o risco de uma decisão negativa da Comissão. As autoridades francesas consideram que não teria sido possível qualquer cessão sem este tipo de cláusula e alegam que a Comissão não pôs em causa essa cláusula num processo anterior (24).

3.   APRECIAÇÃO DA COMISSÃO

3.1.   RESUMO DA JUSTIFICAÇÃO DO ARTIGO 3° DA DECISÃO SERNAM 2

(88)

A título preliminar, a Comissão recorda que o presente procedimento foi iniciado ao abrigo do artigo 16.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93.o do Tratado CE (25), uma vez que a Comissão tinha indicações de que a França tinha aplicado de forma abusiva o auxílio autorizado sob condições pela Decisão Sernam 2, e isto após a aplicação abusiva do auxílio autorizado, igualmente sob condições, pela Decisão Sernam 1.

(89)

A Comissão considera que é conveniente recordar as razões que a levaram a impor as condições previstas no artigo 3.o da Decisão Sernam 2 (26):

«[…], tendo em conta a utilização abusiva de um auxílio, conforme se constata atrás, e o prolongamento da duração do plano de restruturação, a Comissão considera que a Sernam deve oferecer uma contrapartida específica, retirando-se dos segmentos de mercado com excesso de capacidade, a fim de que a aprovação de parte do auxílio em questão se possa justificar.

Com efeito, em mercados que sofrem de sobrecapacidade estrutural ou se encontram em declínio, a atribuição de auxílios estatais terá como consequência imediata dar a uma empresa que deveria ter cessado atividades devido às suas notórias dificuldades a possibilidade de ocupar artificialmente uma parte de mercados extremamente disputados, em detrimento de empresas concorrentes com uma situação financeira sólida. É preciso, pois, evitar que o auxílio tenha o indesejável efeito de afastar do mercado em disputa empresas em boa situação financeira, em proveito de empresas que se mostram incapazes de sobreviver pelos seus próprios meios.

Neste sentido, a Comissão considera que a Sernam se deverá desligar da atividade nos segmentos de mercado com excesso de capacidade, ou seja, no caso concreto, o segmento da grupagem/serviço de entregas clássico por via rodoviária.

Embora a Sernam tenha já iniciado tal retirada, a Comissão considera que os esforços empreendidos são insuficientes e devem ser prosseguidos de forma sustentada. Considera necessário, por isso, impor condições que permitam i) que a Sernam continue a expandir-se no sentido de uma diversificação inovadora, para um segmento de mercado a desenvolver (portanto, sem excesso de capacidade) e ii) que, nos segmentos de mercado com excesso de capacidade, em estagnação ou em declínio, os serviços da Sernam sejam substituídos pelos serviços de outros operadores (o que terá por efeito a libertação das quotas de mercado da Sernam nestes segmentos).

[…]

A Comissão lembra também que as condições da decisão (cessão da atividade rodoviária da Sernam a outras empresas e recentragem das atividades da Sernam no transporte ferroviário) são aplicáveis mesmo em caso de alienação da totalidade da Sernam (ativo e passivo) conforme preveem as autoridades francesas. Em contrapartida, caso a Sernam venda os seus ativos em bloco, a Comissão lembra que as duas condições supramencionadas, relativas à restruturação da empresa, não se aplicarão, uma vez que a Sernam deixará de exercer atividades sob a sua forma jurídica atual e terá libertado as suas quotas de mercado em proveito do adquirente independente (que poderá de facto prosseguir as suas atividades com os ativos da Sernam).»

(90)

A Decisão Sernam 2 prevê, assim, dois cenários de venda diferentes para a Sernam SA: a venda da totalidade da Sernam SA (ativos e passivos) e a venda unicamente dos ativos. Na primeira hipótese, a empresa que adquire os ativos e passivos está sujeita às condições estabelecidas no artigo 3.o, n.o 1, da Decisão Sernam 2; na segunda, estas condições não são aplicáveis.

(91)

Convém ainda recordar o contexto mais amplo em que se inscrevem as Decisões Sernam 1 e Sernam 2 da Comissão. A Sernam SA, empresa constantemente em défice, beneficiava de auxílios estatais ao funcionamento, que lhe foram concedidos pela sua empresa-mãe, a SNCF e que eram necessários para a sua sobrevivência.

(92)

Era necessário pôr termo à sobrevivência artificial de uma empresa que ocupava indevidamente quotas de mercado, na medida em que não era competitiva. Daí resulta que, por um lado, o processo de financiamento regular pelo Estado da Sernam terminou e, por outro, que as distorções de concorrência criadas por tais financiamentos deviam desaparecer, ou dar origem a medidas de compensação. Deveriam assim ser recuperados as 41 milhões de EUR de auxílios ilegais incompatíveis, concedidos à empresa Sernam entre 2001 e 2004, e deveriam ser adotadas medidas compensatórias, libertando quotas de mercado em contrapartida dos 503 milhões de EUR de auxílio à reestruturação.

(93)

Ora, a Comissão verifica, em primeiro lugar, que a forma como a França decidiu executar a decisão de 2004 vai diretamente contra os objetivos visados. Com efeito, as autoridades francesas prosseguiram a concessão de auxílios ao funcionamento ao abrigo da execução da referida decisão e esforçaram-se por preservar a continuidade económica da empresa, sem libertar as quotas de mercado e procurando, pelo contrário, reforçar a posição competitiva desta.

(94)

É necessário, nesta fase, proceder a um exame sistemático dos meios utilizados pelas autoridades francesas para atingir os seus objetivos.

3.2.   UTILIZAÇÃO ABUSIVA DO AUXÍLIO AUTORIZADO PELA DECISÃO SERNAM 2

(95)

As autoridades francesas confirmam que as condições enunciadas no artigo 3.o, n.o 1, da Decisão Sernam 2 não foram respeitadas. Por conseguinte, a Comissão pode limitar-se a verificar se a França respeitou as condições estabelecidas no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2. Recorde-se que o referido número está redigido da seguinte forma:

«Caso a Sernam venda em bloco os seus ativos até 30 de junho de 2005, ao preço de mercado, a uma sociedade sem vínculo jurídico com a SNCF, por meio de um processo transparente e aberto, as condições definidas no n.o 1 não são aplicáveis.»

(96)

Tal como a seguir demonstrado, a França não respeitou essas condições.

3.2.1.   A transferência das atividades não foi efetuada até 30 de junho de 2005

(97)

Segundo as observações das autoridades francesas e do autor da primeira denúncia, em 30 de junho de 2005, a direção da SNCF aceitou apenas em princípio a oferta firme da Financière Sernam. O Protocolo de acordo que vincula todas as partes na transação não foi, no entanto, assinado em 21 de julho de 2005 e as diferentes operações de transferência só foram executadas em 17 de outubro de 2005.

(98)

A Comissão conclui que a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam não ocorreu até 30 de junho de 2005, tal como o exigia a condição imposta pela Decisão Sernam 2. Este facto é já suficiente para concluir que a França fez uma aplicação abusiva do auxílio autorizado de forma condicional pela Decisão Sernam 2.

3.2.2.   A transferência das atividades não constitui uma venda  (27)

(99)

O contrato de venda nos sistemas jurídicos dos Estados-Membros da União baseia-se nos princípios desenvolvidos pelo direito romano (emptio venditio). A venda consiste na transferência de propriedade de um bem contra o pagamento de um preço. Esse preço deve ser, como sublinha o governo francês referindo-se ao direito francês, um preço positivo.

(100)

Uma transação pela qual a pessoa que quer transmitir a propriedade de um ou mais bens oferece dinheiro à pessoa que os retoma não é uma venda, mas um tipo de contrato diferente.

(101)

No presente caso, a SNCF pagou 59 milhões de EUR, procedendo à recapitalização da Sernam SA num montante de 57 milhões de EUR e da Sernam Xpress num montante de 2 milhões de EUR e concedeu várias garantias à Financière Sernam. O pagamento de 2 milhões de EUR pela Financière Sernam a favor da SNCF e da Sernam SA neutraliza a recapitalização da Sernam Xpress, mas não os outros elementos da transação. Por conseguinte, o contrato celebrado entre a SNCF e a Financière Sernam não pode ser qualificado como um contrato de venda. Tal facto não é, de resto, contestado pelas autoridades francesas, que explicam que as diferentes operações de transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam não constituem uma venda, porque o direito francês não lhes teria permitido efetuar uma venda que conduzisse a este resultado.

(102)

A Comissão conclui que o contrato entre a SNCF e a Financière Sernam não constitui uma venda. Também por esse motivo, o artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 não foi respeitado, uma vez que não se verificou uma venda. Por conseguinte, a França fez uma aplicação abusiva do auxílio autorizado de forma condicional pela Decisão Sernam 2.

3.2.3.   A transferência das atividades não constitui uma venda dos ativos, mas sim uma transferência da totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA

(103)

Ainda que se considere que a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam constitua uma venda, o respeito do artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 pressupõe que esta venda incida exclusivamente nos ativos e não na totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA. Tal resulta do ponto 217 da Decisão Sernam 2, citado no ponto 89 da presente decisão.

(104)

Tal como indicado na Secção 2.4., a transferência por parte da SNCF das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam assenta na utilização pela Sernam SA da sua filial detida a 100 %, a Sernam Xpress, para a qual foram transferidos os ativos da Sernam SA, bem como os passivos da mesma, com exceção de algumas das suas dívidas para com a sua empresa-mãe, a SNCF. Antes dessa transferência, a Sernam SA tinha sido recapitalizada pela SNCF num montante de 57 milhões de EUR e esses capitais frescos foram incluídos nos ativos transferidos. Após a transferência, a Sernam Xpress foi, por sua vez, recapitalizada pela SNCF num montante de 2 milhões de EUR. As ações da Sernam Xpress foram então vendidas à Financière Sernam pelo mesmo montante (2 milhões de EUR).

(105)

Tal como indicado na Secção 2.7.1.3., as autoridades francesas justificam essa operação pela dupla restrição do direito francês e da Decisão Sernam 2.

(106)

As referidas autoridades argumentam que o resultado global da transação é idêntico ao da venda dos ativos. Consequentemente, tal operação deveria ser equiparada a uma venda em bloco dos ativos da Sernam SA, na aceção do artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2.

(107)

A Comissão chegou a uma conclusão diferente, por duas razões.

3.2.3.1.   A transmissão consiste numa transferência em bloco dos ativos e passivos no âmbito de um grupo, seguido de uma venda das ações (share deal) da filial que os recebeu

(108)

A operação efetuada pela SNCF permitiu à Financière Sernam adquirir as ações da Sernam Xpress e, por conseguinte, proceder a uma venda de ações (share deal).

(109)

É verdade que, numa primeira fase, a SNCF procedeu a uma operação qualificada pelo direito francês, segundo as autoridades francesas, como «entrada parcial de ativos» (na realidade de ativos e passivos). Contudo, mesmo analisada de forma isolada, esta operação não pode ser qualificada como «venda de ativos a um terceiro». Esta ocorreu por um preço negativo de 57 milhões de EUR e não constitui, por esse facto, uma venda (ver Secção 3.2.2.). Além disso, inclui não só os ativos, mas também todo o passivo, com exceção de determinadas dívidas da Sernam SA para com a sua empresa-mãe, a SNCF. Tratava-se, por conseguinte, de uma transferência da totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA, e não de uma venda dos ativos (ver igualmente Secção 3.2.3.2.).

(110)

Por último, a transferência ocorreu para uma filial detida a 100 %, sendo a Sernam Xpress, uma entidade ad hoc e destinada a receber os ativos e passivos da Sernam SA, com o único objetivo de ser ela própria revendida à Financière Sernam. Consequentemente, tal transferência não foi feita para uma empresa terceira e independente da SNCF.

(111)

Numa segunda fase, as ações da Sernam Xpress foram vendidas à Financière Sernam, o que também não constitui uma venda dos ativos a um terceiro, mas uma transferência de ações ou share deal (e, por conseguinte, uma transferência da totalidade da empresa).

(112)

Consequentemente, nenhuma das operações efetuadas pela SNCF constitui uma venda em bloco dos ativos da Sernam SA a uma empresa sem vínculo jurídico com a SNCF, pelo que as condições previstas no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 não foram respeitadas.

3.2.3.2.   A transferência não foi limitada aos ativos, incluindo a totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA

(113)

O ponto 217 da Decisão Sernam 2, citado no ponto 89 da presente decisão, estabelece uma distinção clara entre, por um lado, uma venda dos ativos e, por outro, uma venda da totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA. Resulta claramente deste ponto que se as autoridades francesas pretendessem, como era sua intenção no momento da adoção da Decisão Sernam 2, proceder à venda da totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA, estavam obrigadas a respeitar as condições previstas no artigo 3.o, n.o 1, da Decisão Sernam 2.

(114)

O resultado das diferentes operações de transferência é que a Financière Sernam, ao adquirir a Sernam Xpress, adquiriu a totalidade dos ativos e passivos da Sernam SA no momento da adoção da Decisão Sernam 2, com as seguintes exceções: por um lado, os ativos foram acrescidos das injeções de 57 milhões de EUR a favor da Sernam SA e 2 milhões de EUR a favor da Sernam Xpress (ver também Secção 3.2.4. da presente decisão) e, por outro, os passivos foram reduzidos no montante do empréstimo participativo contraído pela empresa Sernam SA junto do grupo SNCF, passivo relativo à rescisão do contrato «IBM – GPS», e no montante da obrigação de reembolsar o auxílio incompatível de 41 milhões de EUR.

(115)

Ora, estes ajustamentos à margem não podem ocultar o facto de o essencial dos ativos e passivos da Sernam SA terem sido efetivamente transferidos, em primeiro lugar, à Sernam Xpress e, seguidamente, para a Financière Sernam.

(116)

A transferência das atividades não constitui, por conseguinte, uma venda dos ativos, mas sim uma transferência da totalidade (ativos e passivos) da Sernam SA, com algumas exceções. Por conseguinte e também por esta razão, as condições previstas no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 não foram respeitadas.

3.2.4.   A transferência não se limitou aos ativos que a Sernam SA possuía no momento da Decisão Sernam 2, mas foi aumentada em 59 milhões de EUR

(117)

Do lado dos ativos, a Comissão observa igualmente que foi acrescentado o montante de 59 milhões de EUR por força das recapitalizações da Sernam SA e da Sernam Xpress e que, no plano económico, tendo em conta o pagamento de 2 milhões de EUR pela Financière Sernam, este acréscimo é de 57 milhões de EUR. Tal acréscimo aos ativos não é autorizado pelo artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2.

3.2.5.   A transferência das atividades não teve lugar por meio de um processo transparente e aberto

(118)

As autoridades francesas organizaram, numa primeira fase, um processo transparente e aberto. No entanto, no final desse procedimento, a SNCF não tinha recebido qualquer proposta firme.

(119)

Na sequência do fracasso do processo transparente e aberto, o contrato relativo às diferentes operações de transferência das atividades da Sernam SA foi celebrado com a Financière Sernam. Dado que esta última não tinha participado, enquanto tal e de forma autónoma, no processo transparente e aberto, a transferência das atividades acabou por não se verificar por meio de um processo transparente e aberto.

(120)

Por esta razão igualmente, as condições previstas no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 não foram respeitadas.

3.2.6.   A finalidade de uma venda dos ativos não foi respeitada

(121)

A Decisão Sernam 2 explica no ponto 217 a finalidade de uma venda de ativos do seguinte modo:

«A Sernam […] terá libertado as suas quotas de mercado em proveito do adquirente independente (que poderá de facto prosseguir as suas atividades com os ativos da Sernam).»

(122)

A finalidade de uma venda dos ativos era, portanto, libertar as quotas de mercado e os ativos da Sernam SA, bem como permitir que um terceiro utilizasse esses ativos. A venda dos ativos tinha, pois, por objetivo interromper a atividade económica da Sernam SA.

(123)

Ora, no caso em apreço, a Sernam SA foi integralmente adquirida pelos seus quadros, tendo sido reagrupada na futura Financière Sernam. A continuidade económica foi total; além disso, a empresa foi libertada de uma parte importante da sua dívida e recebeu capitais frescos num montante de 59 milhões de EUR, dos quais 57 milhões se mantêm economicamente a cargo da SNCF. Por conseguinte, para além do facto de a operação realizada não respeitar as condições previstas no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2, também não permite atingir os objetivos prosseguidos por essa decisão. Pelo contrário, conduz a entidade económica a um reforço suscetível de agravar as distorções da concorrência, que as medidas impostas pela decisão visavam precisamente atenuar.

3.2.7.   Os argumentos apresentados pela França não permitem demonstrar o cumprimento do artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2

(124)

O argumento da França, segundo o qual as operações em termos globais seriam equivalentes a uma venda em bloco dos ativos não pode ser aceite. Com efeito, pela sua própria natureza, a primeira característica de uma venda em bloco de ativos consiste em não basear-se numa venda de ações. Por conseguinte, a Comissão não pode aceitar o argumento de que vários atos jurídicos diferentes (entrada parcial de ativos e passivos e seguidamente um share deal) corresponderiam a um ato jurídico (venda de ativos), ainda mais em virtude do facto de um dos atos jurídicos efetivamente executado constituir a negação do ato jurídico pretendido.

(125)

Do mesmo modo, o argumento segundo o qual uma venda direta dos ativos da Sernam SA à Financière Sernam não é possível ao abrigo do direito francês não pode ser aceite. Em primeiro lugar, convém recordar que a Decisão Sernam 2 conferia à França dois meios alternativos de dar execução à decisão. Admitindo que a venda de ativos era inaplicável, as autoridades francesas ainda podiam executar a decisão seguindo a possibilidade prevista no artigo 3.o, n.o 1, desta decisão (circunscrição das atividades da Sernam apenas à expedição de encomendas por via ferroviária, sendo o transporte rodoviário subcontratado). Em segundo lugar, se os credores terceiros se tivessem realmente oposto a uma venda a preço negativo, a Sernam SA poderia ter sido objeto de um processo coletivo, por forma a que a venda de ativos tivesse podido realizar-se no quadro desse processo.

(126)

Por último, se as autoridades francesas tinham dificuldades em executar a Decisão Sernam 2, deveriam contactar a Comissão, a fim de alcançar, com o acordo desta, uma solução baseada num plano alternativo, por força do princípio da cooperação leal prevista pelo artigo 4°, n.o 3, do Tratado da União Europeia (TUE). Embora as autoridades francesas tenham visitado a Comissão em 24 de novembro de 2004 e lhe tenham escrito oficialmente em 21 de dezembro de 2004 para a informar da opção de vender os ativos em bloco, sem descrever os elementos essenciais de tal venda, convém sublinhar que a França nunca notificou à Comissão uma alteração do plano de reestruturação aprovado condicionalmente por esta última na Decisão Sernam 2. Ora, a Secção 3.2.3. das Orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldade (28) confirma que um Estado-Membro não pode desviar-se do plano de reestruturação sem prévia notificação e aprovação pela Comissão.

(127)

Ora, a Comissão nunca deu o seu acordo à transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam realizada pela França.

3.2.8.   Conclusão: A França não respeitou o artigo 3.o da Decisão Sernam 2 e executou de forma abusiva o auxílio de 503 milhões de EUR

(128)

Em conclusão, a Comissão considera que o artigo 3.o da Decisão Sernam 2 não foi respeitado. Consequentemente, o auxílio à reestruturação de 503 milhões de EUR condicionalmente autorizado pela Decisão Sernam 2 foi executado de forma abusiva.

3.2.9.   O auxílio de 503 milhões de EUR é incompatível com o mercado interno

(129)

Uma vez que o auxílio de 503 milhões de EUR foi utilizado pelo beneficiário em violação da Decisão Sernam 2, não é compatível com o mercado interno com base nesta decisão.

(130)

Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, cabe ao Estado-Membro invocar as razões da compatibilidade de um auxílio. Visto que a França não invocou quaisquer razões que fundamentassem a compatibilidade, a Comissão conclui que o auxílio de 503 milhões de EUR é incompatível com o mercado interno, devendo ser recuperado e o seu montante acrescido de juros a contar da data da sua colocação à disposição.

(131)

Esta recuperação deve ser efetuada junto da Financière Sernam, bem como das suas filiais, nomeadamente a Sernam Services e a Aster, que prosseguem atualmente a atividade económica, beneficiando do auxílio, anteriormente exercida pela Sernam SA (atualmente liquidada) e, em seguida, pela Sernam Xpress (cujo património foi absorvido pela Financière Sernam na sequência de uma transferência universal do património). Com efeito, há que considerar, em primeiro lugar, que a Sernam Xpress assumiu todos os elementos do ativo e uma parte do passivo da Sernam SA, na sequência de uma transação realizada dentro do grupo. A Sernam Xpress continua, por conseguinte, a atividade económica da Sernam SA (ver igualmente a demonstração pormenorizada inserida na Secção 3.3.). Seguidamente, devido à transferência universal do património, a Financière Sernam é a sucessora legal da Sernam Xpress. Por último, a Financière Sernam, bem como as suas filiais, nomeadamente a Sernam Service e a Aster, prosseguem a atividade da Sernam SA e da Sernam Xpress, continuando, portanto, a beneficiar do auxílio de 503 milhões de EUR inicialmente concedido à Sernam SA.

3.3.   RECUPERAÇÃO DO AUXÍLIO DE 41 MILHÕES DE EUR

(132)

O auxílio estatal de 41 milhões de EUR, que deveria ser recuperado pela França junto do seu beneficiário por força da Decisão Sernam 2, foi inscrito no passivo da massa insolvente da empresa Sernam SA.

(133)

As autoridades francesas consideram que, nos termos do artigo 4.o da Decisão Sernam 2, a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam, mediante um processo que qualificam como transparente e aberto, teria como consequência circunscrever a obrigação de recuperação unicamente à empresa Sernam SA.

(134)

O artigo 4.o da Decisão Sernam 2 tem a seguinte redação:

«A eventual alienação parcial ou total da Sernam deve efetuar-se ao preço de mercado e por meio de um processo transparente e aberto a todos os concorrentes. Nessas condições, a restituição do auxílio de 41 milhões de EUR incumbirá à sociedade Sernam, caso esta continue a existir.»

(135)

O artigo 4.o estabelece uma distinção consoante o facto de haver ou não uma interrupção da atividade económica da Sernam. No caso da cessação dessa atividade, não é necessário recuperar o auxílio junto dos que adquiriram os ativos ao preço de mercado no quadro de um processo transparente e aberto.

(136)

A Comissão observa, aliás, que, na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância atribuem uma importância decisiva a estes fatores.

(137)

O acórdão SMI  (29) distingue duas hipóteses em caso de venda das atividades que tenham beneficiado de um auxílio, a saber, a venda das partes sociais da empresa, na sequência da qual a empresa que beneficiou dos auxílios conserva a sua personalidade jurídica (share deal) e a venda da totalidade ou de uma parte dos ativos da empresa a outra empresa, na sequência da qual a atividade económica que beneficiou do auxílio deixou de ser exercida pela mesma pessoa jurídica (asset deal).

(138)

Relativamente ao share deal, o Tribunal de Justiça estabeleceu o seguinte (30):

«[…] quando uma empresa que beneficiou de um auxílio de Estado ilegal é comprada ao preço de mercado, isto é, ao preço mais elevado que um investidor privado, atuando em condições concorrenciais normais, estava disposto a pagar por essa sociedade na situação em que se encontrava, designadamente após ter beneficiado de auxílios de Estado, o elemento de auxílio foi avaliado ao preço de mercado e incluído no preço de compra. Nestas condições, não se pode considerar que o comprador foi beneficiado relativamente aos outros operadores presentes no mercado (v., neste sentido, acórdão de 20 de setembro de 2001, Banks, C-390/98, Coletânea, p. I-6117, n.o 77).

Tratando-se do caso vertente, a empresa que recebeu os auxílios de Estado ilegais mantém a sua personalidade jurídica e continua a exercer, para ela própria, as atividades subvencionadas pelos auxílios de Estado. Consequentemente, é, em princípio, esta empresa que fica com a vantagem concorrencial ligada aos referidos auxílios e, portanto, é ela que deve ser obrigada a reembolsar o montante igual ao dos auxílios. […]»

(139)

Quanto ao asset deal, o Tribunal prossegue da seguinte forma (31):

«É verdade que não se pode excluir que, na hipótese de serem constituídas sociedades de credores a fim de se prosseguir uma parte das atividades da empresa beneficiária dos auxílios quando esta abriu falência, as referidas sociedades possam igualmente, se for caso disso, ser obrigadas a proceder ao reembolso dos auxílios em questão, quando se prove que ficam com o gozo efetivo da vantagem concorrencial ligada ao benefício dos referidos auxílios. Poderia ser esse o caso, nomeadamente, quando essas sociedades de credores adquirem ativos da sociedade em liquidação, sem pagar em contrapartida um preço conforme com as condições de mercado, ou quando se demonstre que a constituição de tais sociedades teve por efeito contornar a obrigação de restituição desses auxílios.»

(140)

A mesma distinção encontra-se no acórdão Seleco  (32). Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça confirma que a Comissão poderá vir a exigir que a recuperação não se limite à empresa inicial, mas que se alargue à empresa que assegura a sua perenidade graças aos meios de produção que lhe foram transferidos, quando determinados elementos da transferência permitirem constatar uma continuidade económica entre as duas entidades. O Tribunal aceitou igualmente a pertinência dos seguintes indicadores para estabelecer uma continuidade económica: o objeto da transferência (ativos e passivos, continuidade do pessoal da empresa, ativos agrupados), o preço da transferência, a identidade dos acionistas ou dos proprietários da empresa adquirente e da original, o momento em que a transferência é realizada (após o início das investigações, do início do procedimento ou da decisão final) ou por fim a lógica económica da operação (33).

(141)

Afigura-se oportuno sublinhar também que as vendas de ativos nos processos SMI e Seleco foram efetuadas no âmbito de um processo coletivo, sob o controlo de um juiz. Tais vendas só incidiam numa parte dos ativos das empresas sujeitas ao processo coletivo. Além disso, segundo o Tribunal, não tinha sido estabelecido que não correspondiam às condições do mercado.

(142)

O Tribunal analisou um asset deal no acórdão CDA  (34), tendo nomeadamente verificado se, no caso em apreço, existiam elementos que permitissem concluir pela existência de uma tentativa de contornar a ordem de recuperação através de uma venda parcial de ativos. O Tribunal considerou que, no caso concreto, não tinha sido estabelecida pela Comissão uma tal vontade e que a CDA não mantinha o gozo efetivo da vantagem concorrencial ligada ao benefício dos auxílios concedidos. O Tribunal baseou esta constatação em dois elementos factuais: a venda foi limitada a uma parte dos ativos, vendidos em bloco, e esta forma de proceder (isto é, a venda em bloco) permitiu obter um montante mais elevado do que o que teria sido obtido vendendo separadamente os elementos do ativo em causa.

(143)

Convém, portanto, examinar a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam à luz dos critérios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal de Primeira Instância, com vista a determinar se se deve alargar a recuperação à Financière Sernam e às suas filiais, Sernam Services e Aster.

(144)

No que diz respeito, em primeiro lugar, à transferência de todos os ativos e passivos da Sernam SA, com exceção de três passivos financeiros (empréstimo participativo contraído pela empresa Sernam SA junto do grupo SNCF, passivo relativo à rescisão do contrato «IBM – GPS» e obrigação de reembolso do auxílio incompatível de 41 milhões de EUR) para a Sernam Xpress, a Comissão observa que tal transferência abrangia a totalidade da empresa (ver Secção 3.2.3.). Por conseguinte, existe uma continuidade económica entre a Sernam SA e a Sernam Xpress. Este aspeto diferencia o presente caso dos factos que deram origem aos acórdãos SMI, Seleco e CDA, que diziam apenas respeito à venda de uma parte dos ativos. Além disso, a transferência realizou-se no âmbito de um grupo. Ocorreu após uma decisão final da Comissão que intimava a recuperação do auxílio e a sua única lógica económica consistia em permitir a prossecução das atividades da Sernam 2, sem dever respeitar as condições impostas pelo artigo 3.o da Decisão Sernam 2. Todos os critérios que permitem demonstrar a continuidade económica na aceção da decisão e do acórdão Seleco estão, portanto, presentes.

(145)

A Comissão observa ainda que a transferência para Sernam Xpress não se processou de acordo com as condições de mercado. A transferência para a Sernam Xpress teve lugar a um preço negativo e não ocorreu na sequência de um processo transparente e aberto (ver Secção 3.2.5.). Ao preço negativo de 57 milhões de EUR, que é concebido como um auxílio ao funcionamento que permite cobrir as perdas da Sernam Xpress relativas aos anos de 2005 a 2008 (35), acresce a remissão da dívida da Sernam SA para com a SNCF, num montante de 38,5 milhões de EUR (ver ponto 27). Por último, a Comissão observa igualmente que os passivos que permanecem na Sernam SA são dívidas para com terceiros e não para com a SNCF. Através da injeção de capital de 57 milhões de EUR, a SNCF permitiu que a Sernam Xpress, pelo menos em relação ao período de 2005 a 2008, honrasse a totalidade das suas dívidas. Se, em contrapartida, a SNCF tivesse vendido apenas os ativos a um preço positivo, as dívidas da Sernam SA para com terceiros só teriam sido honradas num montante correspondente às receitas da venda. Este é um índice suplementar de que o equilíbrio contratual entre a SNCF e a Financière Sernam não corresponde às condições de mercado.

(146)

Importa igualmente assinalar que o preço negativo de 57 milhões de EUR é mais elevado do que a melhor oferta recebida aquando do convite à apresentação de propostas infrutífero, que tinha sido um preço negativo de 56,4 milhões de EUR (oferta na segunda fase [candidato 5]).

(147)

A transferência permitiu que a Sernam Xpress se eximisse da ordem de recuperação de 41 milhões de EUR que pesava sobre a Sernam SA e que prosseguisse as atividades da Sernam SA sem dever reembolsar o auxílio e sem dever respeitar as condições previstas no artigo 3.o da Decisão Sernam 2.

(148)

Por estas razões, a Comissão conclui que a transferência das atividades da Sernam SA para a Sernam Xpress teve como consequência o facto de a Sernam Xpress manter o gozo efetivo da vantagem concorrencial ligada ao benefício dos auxílios concedidos. Com efeito, registou-se uma continuidade económica entre as duas empresas e a transferência correspondeu a uma forma de contornar a ordem de recuperação que pesava sobre a Sernam SA.

(149)

Tal como explicado nos acórdãos SMI e Seleco, a venda por um acionista de ações de uma empresa beneficiária de um auxílio ilegal a um terceiro não afeta a obrigação de recuperação junto da empresa beneficiária. Assim, a venda das quotas sociais da Sernam Xpress à Financière Sernam não teve como consequência libertar a Sernam Xpress da obrigação de reembolsar o auxílio de 41 milhões de EUR.

(150)

Na sequência da fusão entre a Sernam Xpress e a Financière Sernam, a obrigação de recuperação foi transferida para a Financière Sernam. Além disso, esta e as suas filiais, nomeadamente a Sernam Services e a Aster, prosseguem a atividade da Sernam SA e da Sernam Xpress, continuando, por conseguinte, a beneficiar do auxílio de 41 milhões de EUR inicialmente concedido à Sernam SA.

(151)

Além disso, pelas razões expostas no ponto 3.4, os argumentos utilizados pelas autoridades francesas em aplicação do princípio do investidor privado numa economia de mercado devem ser rejeitados.

3.4.   SOBRE O NOVOS AUXÍLIOS CONCEDIDOS À SERNAM XPRESS

(152)

O Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 prevê um certo número de medidas que poderão constituir novos auxílios (ver ponto 36). A Comissão deve verificar se estas medidas constituem novos auxílios e, se for caso disso, se estes auxílios podem ser declarados compatíveis com o mercado interno.

(153)

Segundo as autoridades francesas, todas estas medidas estariam em conformidade com o princípio do investidor privado numa economia de mercado. A SNCF teria transferido as atividades da Sernam SA para a empresa que apresentou a melhor oferta no quadro de um concurso transparente e aberto e essa oferta, embora consista num preço negativo, seria menos onerosa para o acionista Estado do que a liquidação da Sernam.

(154)

A Comissão considera que, numa situação de recuperação do auxílio, não se deve aplicar o princípio do investidor privado. O Estado atua, no momento da recuperação de um auxílio, em conformidade com as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União e não como um Estado acionista.

(155)

A Comissão observa, por outro lado, que o artigo 3.o, n.o 2, da Decisão Sernam 2 concebeu a venda de ativos como um equivalente das medidas de compensação previstas no artigo 3°, n.o 1. De acordo com o ponto 40 das Orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade (36), a cessão de uma atividade deficitária não pode ser considerada uma medida compensatória. O preço negativo aprovado entre a SNCF e a Financière Sernam demonstra que se trata da cessão de uma atividade deficitária, que não pode ser equivalente a uma medida compensatória. No caso em apreço, o preço negativo representa um auxílio ao funcionamento da empresa, que é, pela sua natureza, inadequado para reduzir as distorções da concorrência.

(156)

Além disso, se se aceitasse a posição defendida pela França, este país poderia eximir-se da sua obrigação de recuperar junto da Sernam SA e de qualquer empresa que prossiga a sua atividade económica o auxílio incompatível de 41 milhões de EUR declarado incompatível pela Decisão Sernam 2, bem como o auxílio de 503 milhões de EUR executado de forma abusiva. Este resultado estaria em flagrante contradição com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual o Estado-Membro deve proceder sem atrasos à recuperação do auxílio, recorrendo a todos os meios jurídicos disponíveis, incluindo o arresto dos ativos da empresa e se necessário a colocação em liquidação da mesma, caso esta não esteja em condições de proceder ao reembolso em questão (37).

(157)

A aceitação da posição defendida pela França conduziria também a uma discriminação entre uma empresa privada e uma empresa pública. Enquanto o Estado prosseguiria a recuperação junto da empresa privada, se necessário até à sua liquidação, uma empresa pública poderia escapar a esta situação com a única condição de que seria menos caro para o Estado vendê-la a um preço negativo em vez de recuperar os auxílios ilegais e incompatíveis que recebeu.

(158)

Por estas razões, a Comissão considera que o princípio do investidor privado numa economia de mercado não pode ser invocado pela França para eximir as medidas previstas no Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 da noção de auxílio estatal.

(159)

É, portanto, necessário estabelecer se as medidas em questão conferiram uma vantagem à Sernam Xpress ou à Financière Sernam. Dado que estas duas empresas se fundiram posteriormente, não é necessário distinguir entre as vantagens concedidas a uma ou a outra. Os outros três critérios para estabelecer a existência de um auxílio estão preenchidos: as medidas foram concedidas mediante recursos de uma empresa pública, a SNCF; a SNCF é um organismo de direito público (EPIC) sujeito a uma vigilância muito estreita do Estado; a concessão da vantagem é, por conseguinte, imputável ao Estado. Visto que a Sernam Xpress e a Financière Sernam exerciam atividades no setor do transporte rodoviário, que está aberto à concorrência na União, a vantagem é suscetível de distorcer a concorrência e afetar as trocas comerciais entre os Estados-Membros.

3.4.1.   Quanto à recapitalização da Sernam SA num montante de 57 milhões de EUR por parte da SNCF

(160)

Através da recapitalização da Sernam SA num montante de 57 milhões de EUR por parte da SNCF, a Sernam SA recebeu uma vantagem financeira considerável, de que não dispõem os seus concorrentes. Esta vantagem foi posteriormente transferida em conjunto com os outros ativos e passivos, para a Sernam Xpress.

3.4.2.   Quanto à recapitalização da Sernam Xpress num montante de 2 milhões de EUR por parte da SNCF

(161)

Através da recapitalização da Sernam Xpress de 2 milhões de EUR por parte da SNCF, a Sernam Xpress recebeu uma vantagem financeira considerável, de que não dispõem os seus concorrentes. No entanto, a Comissão observa que a SNCF recebeu da Financière Sernam um pagamento de 2 milhões de EUR, que neutraliza a recapitalização de 2 milhões de EUR, que, por conseguinte, não confere qualquer vantagem.

3.4.3.   Quanto à remissão das dívidas da Sernam SA para com a SNCF

(162)

Como explicado no ponto 33, a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam não compreende dois créditos da SNCF sobre a Sernam SA, num montante de 38,5 milhões de EUR. Através da remissão destas dívidas, a SNCF concedeu uma vantagem num montante igual a favor da Sernam Xpress/Financière Sernam.

3.4.4.   Quanto às garantias concedidas pela SNCF

(163)

No momento da transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam, a SNCF concedeu as seguintes garantias:

comprometeu-se a terminar num prazo estabelecido a adaptação de um sítio específico (Valenton) necessário para a exploração do TBE, sob pena de uma multa de 1 milhão de EUR em caso de atraso;

a empresa comprometeu-se a cobrir um eventual aumento das rendas de novos locais de exploração, limitado a um diferencial de um máximo de 3 milhões de EUR;

prorrogou por três anos o direito de regresso de […] trabalhadores ferroviários destacados na Sernam;

prorrogou por três anos um protocolo social que garante a […] empregados da Sernam uma reclassificação no âmbito da SNCF em caso de despedimento (pela Sernam);

garantiu a «perenidade do train bloc express (TBE)» (38) e o acesso ao TBE (39). a este título, a SNCF pagou 3 milhões de EUR à Sernam Xpress.

(164)

No que diz respeito às duas primeiras garantias, é evidente que conferem uma vantagem à Sernam Xpress/Financière Sernam. Com efeito, na ausência destas duas garantias, a Sernam Xpress e a Financière Sernam teriam de suportar, elas próprias, os custos em questão.

(165)

No que diz respeito às garantias TBE, a Comissão considera que reduzem significativamente o risco da Sernam Xpress/Financière Sernam. Por conseguinte, conferem a estas duas empresas uma vantagem.

(166)

Segundo a França, a garantia concedida aos trabalhadores ferroviários beneficiaria na realidade a SNCF. Com efeito, a SNCF teria destacado um certo número de trabalhadores ferroviários para a Sernam SA. Tais trabalhadores, cujo custo foi suportado pela Sernam SA, teriam o direito de reintegrarem os quadros da SNCF mediante simples pedido. Tendo em conta os receios que uma privatização poderia suscitar, a SNCF prorrogou o período durante o qual estes trabalhadores podiam exercer esse direito, a fim de evitar um retorno em massa dos mesmos, que seria mais oneroso para a SNCF.

(167)

A Comissão considera que na ausência desta garantia, os trabalhadores ferroviários teriam muito provavelmente solicitado a sua reintegração na SNCF no momento da transferência das atividades. A Sernam Xpress teria de os substituir por outros funcionários com estatuto privado. A Comissão considera que é provável que, no caso em apreço, o salário destes novos empregados teria sido menos elevado do que o dos trabalhadores ferroviários, o que teria compensado o custo adicional para a Sernam Xpress, decorrente da sua experiência mais limitada ou ainda das dificuldades recrutar um número importante de novos trabalhadores em muito pouco tempo.

(168)

Quanto à prorrogação da garantia de reclassificação por um período de três anos, a França considera que constitui um direito individual concedido a certos empregados pela SNCF. Nem a Financière Sernam, nem a Sernam Xpress seriam partes nesse acordo.

(169)

A Comissão não está de acordo com esta análise. Com efeito, esta garantia torna mais atrativo permanecer empregado na Sernam Xpress durante o período em questão, sem que a Sernam Xpress tenha de suportar qualquer custo adicional.

(170)

A Comissão conclui que as garantias concedidas pela SNCF no Protocolo de 21 de julho de 2005, com exceção da garantia para os trabalhadores ferroviários, conferem uma vantagem à Sernam Xpress/Financière Sernam.

(171)

Enquanto o valor das três primeiras garantias é facilmente quantificável (1 milhões de EUR, 3 milhões de EUR e 3 milhões de EUR, respetivamente), tal não é o caso para a garantia de reclassificação dos trabalhadores. A França deveria ter estabelecido o aumento de salário que a Sernam Xpress/Financière Sernam teria de conceder aos trabalhadores na ausência dessa garantia para alcançar o mesmo objetivo.

3.4.5.   Quanto ao preço de venda

(172)

No ponto 164 da Decisão de início do procedimento, a Comissão tinha colocado a questão de saber se o preço negativo «pago» pela Financière Sernam correspondia ao valor de mercado. A este respeito, a Comissão observa que, entretanto, verificou-se a fusão entre a Sernam Xpress e a Financière Sernam e que um eventual auxílio à Financière Sernam consubstanciado num preço negativo demasiado elevado não ultrapassaria os 57 milhões de EUR de auxílio que a Sernam Xpress recebeu como novo auxílio. Assim, deixa de ser necessário pronunciar-se sobre a questão de um eventual auxílio ao comprador.

3.4.6.   Conclusão sobre a existência de novos auxílios

(173)

As medidas previstas no Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 e descritas na presente Secção 3.4 constituem novos auxílios a favor da Sernam Xpress/Financière Sernam.

3.4.7.   Incompatibilidade com o mercado interno e recuperação

(174)

Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, cabe ao Estado-Membro invocar as razões que fundamentam a compatibilidade de um auxílio. Visto que a França não invocou quaisquer razões que levassem a concluir pela compatibilidade, a Comissão chega à conclusão de que estes auxílios são incompatíveis com o mercado interno e devem ser recuperados, devendo o seu montante ser acrescido de juros.

(175)

Esta recuperação deve ser efetuada junto da Financière Sernam, bem como das suas filiais, nomeadamente a Sernam Services e a Aster, que prosseguem atualmente a atividade económica, que beneficiou do auxílio, anteriormente exercida pela Sernam Xpress (objeto de fusão com a Financière Sernam).

3.5.   RELATIVAMENTE À CLÁUSULA RESOLUTIVA

(176)

O Protocolo de Acordo de 21 de julho de 2005 contém uma cláusula resolutiva em caso de decisão negativa da Comissão Europeia no prazo de cinco anos a contar da conclusão do Protocolo de Acordo. Esta cláusula pode igualmente constituir um novo auxílio. No entanto, em tal hipótese, a medida corretiva consistiria na sua inaplicabilidade. Uma vez que a cláusula permaneceu, de facto, inaplicada, este resultado foi alcançado. Por conseguinte, não é necessário analisar mais em pormenor a cláusula em questão.

3.6.   QUANTO À CONFIANÇA LEGÍTIMA

(177)

O argumento invocado pelas autoridades francesas, segundo o qual as diligências (designadamente a sua visita à Comissão em 24 de novembro de 2004 e a sua carta de 21 de dezembro de 2004) efetuadas de boa fé junto da Comissão, em conformidade com o seu dever de cooperação, teria feito nascer uma confiança legítima na conformidade da transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam com a Decisão Sernam 2 e o direito da União, não pode ser aceite.

(178)

Com efeito, as informações comunicadas pela França limitavam-se a informar a Comissão da opção pela venda dos ativos em bloco sem descrever os elementos essenciais da operação de transferência dos ativos da Sernam SA. Em especial, na carta de 21 de dezembro de 2004 dirigida à Comissão, a França limitou-se a indicar determinados elementos relativos à organização do processo de cessão dos ativos e a indicar o seu caráter aberto e transparente, com vista a realizar uma venda a um preço de mercado antes de 30 de junho de 2005.

(179)

Nenhum dos seguintes elementos foi na altura assinalado à Comissão:

1)

o facto de a cessão prevista assentar numa transferência intragrupo dos ativos e passivos para outra entidade jurídica (Sernam Xpress), seguida de uma cessão dessa outra entidade (share deal);

2)

o facto de uma parte dos passivos serem transferidos com os ativos e que apenas a ordem de recuperação relativa ao auxílio de 41 milhões de EUR e os créditos da SNCF, num montante de 38,5 milhões de EUR permanecerem no passivo da Sernam SA;

3)

o facto de a França estar disposta a recapitalizar a Sernam SA e a Sernam Xpress em caso de oferta de retoma a um preço negativo.

(180)

Na ausência de informação sobre estes elementos, não era possível à Comissão prever a forma como a França acabou por aplicar a Decisão Sernam 2. Pelo contrário, na carta de 21 de dezembro de 2004 sugere-se que a cessão seria realizada sem distinção entre os passivos e a um preço positivo, uma vez que indica que assim que a cessão for realizada, o produto resultante será utilizado para o reembolso dos passivos da pessoa coletiva Sernam, nomeadamente o auxílio incompatível, no quadro dos procedimentos nacionais habituais.

(181)

Se, atendendo ao caráter negativo dos preços oferecidos pelos ativos da Sernam SA, a eventualidade de uma recapitalização (elemento 3) só surgiu aquando da receção das propostas, pelo menos o início de uma venda dos ativos com uma parte dos passivos (elemento 2) deveria, em princípio, já ser conhecido da França quando esta redigiu a sua carta de 21 de dezembro de 2004. Seja como for, as autoridades francesas não podem pretender beneficiar de uma confiança legítima sem ter espontaneamente informado, em 21 de dezembro de 2004 ou mais tarde, a Comissão acerca destes elementos substanciais.

(182)

Por último e sobretudo, se as autoridades francesas tinham dificuldades em executar a Decisão Sernam 2, deveriam contactar a Comissão, a fim de alcançar, com o acordo desta, uma solução com um plano alternativo por força do princípio da cooperação leal previsto no artigo 4°, n.o 3, do TUE. A Secção 3.2.3. das Orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldade (40) confirma que, em aplicação deste princípio geral, um Estado-Membro não pode desviar-se do plano de reestruturação sem prévia notificação e aprovação pela Comissão.

(183)

Além disso, a Comissão nunca deu o seu acordo à transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam, executada pela França.

(184)

A Comissão conclui, por conseguinte, que nem a França, nem os beneficiários do auxílio podem invocar a confiança legítima.

4.   RECUPERAÇÃO

(185)

A Comissão concluiu que as condições enunciadas na Decisão Sernam 2 não foram respeitadas. Consequentemente, as medidas de auxílio autorizadas pela Decisão Sernam 2 foram executadas de forma abusiva, na aceção do artigo 16.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999. Na ausência da apresentação por parte da França de razões que justifiquem a compatibilidade desses auxílios, considera-se que são incompatíveis com o mercado interno. A França deve, por conseguinte, tomar todas as medidas necessárias para proceder à recuperação desses auxílios, acrescidos dos respetivos juros.

(186)

O montante destas medidas de auxílio ascende a 503 milhões de EUR. É composto por uma parte de diversos auxílios à reestruturação num montante de 2 938 milhões de francos, ou seja, 448 milhões de EUR. Estes auxílios estão inseridos no Quadro 3 da Decisão de 30 de abril de 2003, cujos elementos principais são inseridos no quadro abaixo apresentado:

(Em milhões de francos franceses)

Capital inicial

44

Financiamento do prejuízo 2000

698

Financiament o do prejuízo 2001

252

Financiamento da reestruturação : entrada SNCF

1 300

Financiamento da reestruturação: emp.participativo da SNCF

250

Custo adicional dos trabalhadores ferroviários

394

Total do auxílio à reestruturação

2 938

(187)

Para atingir o montante de 503 milhões de EUR, é necessário acrescentar o montante dos auxílios pagos no âmbito dos contratos de transporte de bagagens e de imprensa num montante de 34 milhões de EUR e no âmbito dos contratos de fornecimentos num montante de 21 milhões de EUR.

(188)

Para mais pormenores, remete-se para a Decisão Sernam 1 de 23 de maio de 2001.

(189)

A fim de proceder à recuperação efetiva e imediata do auxílio, as autoridades francesas devem fornecer a data em que cada auxílio foi colocado à disposição do beneficiário (41). É a partir dessa data que devem ser calculados numa base composta os juros relativos à recuperação em relação a cada medida, em conformidade com o Capítulo V do Regulamento (CE) n.o 794/2004 (42).

(190)

Do mesmo modo, o auxílio de 41 milhões de EUR já considerado incompatível pela Decisão Sernam 2 deve ser recuperado, acrescido dos juros calculados segundo o mesmo método.

(191)

Por último, a recapitalização de 57 milhões de EUR, a remissão das dívidas da Sernam SA para com a SNCF num montante de 38,5 milhões de EUR e as garantias concedidas pela SNCF no momento da transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam, com exceção da garantia concedida aos trabalhadores ferroviários, constituem igualmente auxílios estatais incompatíveis com o mercado interno. Estes novos auxílios devem ser recuperados, acrescidos dos juros calculados segundo o mesmo método. Relativamente ao método de cálculo dos montantes a recuperar, a Comissão remete para os pontos 171 e 189 da presente decisão.

(192)

De modo a determinar o montante de auxílios a recuperar, a França pode ter em conta eventuais montantes recebidos pela SNCF no quadro da liquidação da empresa Sernam SA a título de reembolso do auxílio de 41 milhões, acrescido de juros e/ou do empréstimo participativo, acrescido de juros.

(193)

Caso a SNCF tenha recebido um reembolso global pela totalidade dos seus créditos, a França só poderá ter em conta eventuais montantes recuperados pela SNCF na sequência da liquidação da Sernam SA em proporção do rácio entre o montante das duas medidas de auxílio que foram registadas e o montante total dos créditos inscritos no passivo da empresa Sernam SA.

(194)

Estas recuperações, incluindo a recuperação dos auxílios inicialmente concedidos à Sernam SA e à Sernam Xpress, devem ser efetuadas junto da Financière Sernam, bem como das suas filiais, Sernam Service e Aster, que prosseguem atualmente a atividade económica, que beneficiou dos auxílios, anteriormente exercida pela Sernam Xpress (objeto de fusão com a Financière Sernam) e antes dessa pela Senam SA.

(195)

Com efeito, não existe qualquer dúvida de que a Sernam Xpress e as suas filiais operacionais Sernam Services e Aster continuaram a atividade económica da Sernam SA, visto que a transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam, executada pela França, tinha precisamente este objetivo. Além disso, dos elementos constantes do processo resulta que a Sernam Xpress, a Sernam Services e a Aster continuaram a exercer a atividade, que beneficiou do auxílio, segundo o plano de negócios em curso da Sernam SA e com o mesmo pessoal. Seguidamente, em 30 de junho de 2011, a Financière Sernam, na qualidade de sócio único, dissolveu a empresa Sernam Xpress e absorveu o seu património. A Financière Sernam constitui assim a sucessora jurídica da Sernam Xpress, bem como o seu sucessor económico visto que é esta empresa (Financière Sernam) que atualmente detém e controla diretamente as filiais operacionais, que são a Sernam Services e Aster. Além disso, a Financière Sernam e as suas filiais, nomeadamente a Sernam Services e a Aster, prosseguem a atividade da Sernam SA e da Sernam Xpress, continuando assim a beneficiar do auxílio. Além disso, em maio de 2011, a Sernam Services recebeu uma entrada de ativos, com a transferência da marca Sernam, que é avaliada em 15 milhões de EUR, sem pagar uma contrapartida adequada. Quanto à Aster, por um lado beneficiou, em março de 2008, de uma entrada de fundos de 5 milhões de EUR em conta à ordem, montante que lhe foi oferecido em julho de 2008; por outro lado, foi recapitalizada em dezembro de 2011 através da remissão do montante de 5 599 998 EUR inscritos numa conta à ordem. Estas duas filiais beneficiaram assim dos auxílios inicialmente concedidos à Sernam SA e à Sernam Xpress, não apenas como empresas que fazem parte do grupo e devido ao facto de prosseguirem a atividade destas, mas também devido à transferência de determinados ativos ou às medidas de recapitalização a seu favor.

(196)

É conveniente precisar que a Sernam SA também nasceu da transformação em sociedade anónima da Sernam SCS no final de 2001 (ver, a este respeito, a Decisão Sernam 2, ponto 11). Consequentemente, a Sernam SCS foi o beneficiário original de uma parte dos auxílios em questão.

(197)

Dado que a empresa Financière Sernam, bem como a sua filial Sernam Services, foram colocadas sob administração judicial, em 31 de janeiro de 2012, e a Aster, filial da Financière Sernam, foi colocada em liquidação judicial em 3 de fevereiro de 2012, as autoridades francesas são convidadas a determinar o montante dos auxílios, acrescidos de juros, a recuperar sem demora, a fim de serem registados no passivo destas empresas.

ADOTOU A PRESENTE DECISÃO:

Artigo 1.o

1.   Os auxílios estatais num montante de 503 milhões de EUR concedidos pela França à Sernam SCS (que passou a ser Sernam SA) e aprovados pela Comissão através da Decisão 2006/367/CE (43), de 20 de outubro de 2004, foram executados de forma abusiva. Tais auxílios são incompatíveis com o mercado interno. Os referidos auxílios beneficiaram igualmente a Sernam Xpress, bem como a Financière Sernam e as suas filiais, Sernam Services e Aster.

2.   O auxílio estatal num montante de 41 milhões de EUR, concedido pela França à Sernam SCS e declarado incompatível pela Decisão Sernam 2, beneficiou igualmente a Sernam Xpress, bem como a Financière Sernam e as suas filiais, nomeadamente a Sernam Services e a Aster.

3.   A recapitalização de 57 milhões de EUR da Sernam SA realizada pela SNCF, a remissão de dívidas da Sernam SA operada pela SNCF num montante de 38,5 milhões de EUR e as garantias concedidas pela SNCF no momento da transferência das atividades da Sernam SA para a Financière Sernam, com exceção da garantia concedida aos trabalhadores ferroviários, constituem auxílios estatais incompatíveis com o mercado interno.

Artigo 2.o

1.   A França deve recuperar os auxílios referidos no artigo 1.o junto da Financière Sernam e das suas filiais, Sernam Services e Aster.

2.   O auxílio a recuperar vencerá juros, a contar da data em que foi colocado à disposição do beneficiário e até à data da sua recuperação efetiva.

3.   Os juros devem ser calculados numa base composta em conformidade com o capítulo V do Regulamento (CE) n.o 794/2004 da Comissão de 21 de abril de 2004.

Artigo 3.o

1.   A recuperação do auxílio visado no artigo 2.o é imediata e efetiva.

2.   A França deve assegurar a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da data da respetiva notificação.

3.   No contexto dessa aplicação, a França pode ter em conta eventuais montantes recuperados pela SNCF na sequência da liquidação da Sernam SA, nas condições acima indicadas.

Artigo 4.o

1.   No prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, a França deve apresentar à Comissão as seguintes informações:

a)

A data em que cada medida de auxílio foi posta à disposição do beneficiário e o montante total (capital e juros) a recuperar junto dele em relação a cada uma das medidas de auxílio;

b)

Uma descrição pormenorizada das medidas já adotadas e previstas para dar cumprimento à presente decisão;

c)

Os documentos comprovativos de que o beneficiário foi intimado a reembolsar o auxílio.

2.   A França manterá a Comissão regularmente informada sobre a evolução das medidas nacionais adotadas para aplicar a presente decisão até estar concluída a recuperação do auxílio referido no artigo 1.o. Deve apresentar imediatamente, a simples pedido da Comissão, as informações relativas às medidas já adotadas e previstas para dar cumprimento à presente decisão. Fornecerá também informações pormenorizadas sobre os montantes do auxílio e dos juros já recuperados junto do beneficiário.

Artigo 5.o

A República Francesa é a destinatária da presente decisão.

Feito em Bruxelas, em 9 de março de 2012.

Pela Comissão

Joaquín ALMUNIA

Vice-Presidente


(1)  Com efeitos a partir de 1 de dezembro de 2009, os artigos 87.o e 88.o do Tratado CE passaram a ser os artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE). As duas séries de disposições são idênticas em termos de substância. Para efeitos da presente decisão, deve considerar-se que as referências aos artigos 107.o e 108.o do TFUE são feitas, quando adequado, para os artigos 87.o e 88.o do Tratado CE.

(2)  JO C 208 de 14.7.2011, p. 8.

(3)  Decisão de 23 de maio de 2001 relativa ao auxílio estatal NN122/00 (ex NJ 140/00), JO C 268 de 22.9.2001, p. 15.

(4)  Decisão de 20 de Outubro de 2004 (JO L 140 de 29.5.2006, p. 1).

(5)  Essa denúncia foi completada nomeadamente pelas cartas de 13 de julho, 25 de agosto, 6 de setembro, 5 de outubro, 25 de outubro e 16 de dezembro de 2005.

(6)  Essa denúncia foi completada nomeadamente por carta uma de 23 de abril de 2007.

(7)  JO C 4 de 9.1.2009, p. 5.

(8)  Para uma descrição mais pormenorizada das atividades da empresa Sernam, ver pontos 12 a 31 da Decisão Sernam 2 e pontos 8 e 9 da Decisão de início do procedimento.

(9)  Recorde-se que a Geodis devia adquirir 60 % da Sernam pelo montante simbólico de 1 EUR (ver ponto 51 da Decisão Sernam 1).

(10)  Nas sociedades em comandita simples não há limitação de responsabilidade.

(11)  Comunicado de 24 de novembro de 2004.

(12)  A entrada da Sernam SA a favor da Sernam Xpress foi efetuado sob a figura jurídica francesa da «entrada parcial de ativos».

(13)  Carta das autoridades francesas de 7 de maio de 2008, ponto 77.

(14)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de setembro de 2001, Banks (C-390/98, Coletânea. 2001, p. I-6117).

(15)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 29 de abril de 2004, Alemanha/Comissão (C-277/00, Coletânea 2004, p. I-3925).

(16)  Acórdão Alemanha/Comissão, já citado na nota 14.

(17)  Acórdão do Tribunal, de 19 de outubro de 2005, CDA Datenträger Albrechts/Comissão (T-324/00, Coletânea 2005, p. II-4309).

(18)  Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17, ponto 78.

(19)  Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17, ponto 98.

(20)  Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17, ponto 99.

(21)  Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17, ponto 100.

(22)  Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17, ponto 70; Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17, ponto 73.

(23)  Ponto 128 da decisão de início do procedimento.

(24)  Decisão de 8 de julho de 2008, relativa às medidas executadas pela França em favor da Société Nationale Maritime Corse-Méditerranée (SNCM), JO L 225, de 27 de agosto de 2009, p. 180.

(25)  JO L 83 de 27.3.1999, p. 1.

(26)  Pontos 208 a 217 da Decisão Sernam 2.

(27)  A Comissão salienta que a questão de saber se um contrato pode ser qualificado como um contrato de venda é independente da questão de saber se a conclusão de um contrato corresponde ao comportamento de um operador privado.

(28)  JO C 244 de 1.10.2004, p. 2.

(29)  Acórdão Alemanha/Comissão, já citado na nota 15.

(30)  Acórdão Alemanha/Comissão, já citado na nota 15, n.os 80 e 81.

(31)  Acórdão Alemanha/Comissão, já citado na nota 15, n.o 86.

(32)  Relativamente ao share deal, ver acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de maio de 2003, Itália e SIM 2 Multimedia/Comissão, C-328/99 e C-399/00, Coletânea. 2003, p. I-4035, n.o 83: «É exato que a venda de ações de uma sociedade beneficiária de um auxílio ilegal por um acionista a um terceiro não influencia a obrigação de recuperação», relativamente ao asset deal, ver os n.os 65 a 85 do mesmo acórdão.

(33)  Acórdão Itália e SIM 2 Multimedia/Comissão, já citado na nota 32, n.os 77 e 78.

(34)  Acórdão CDA Datenträger Albrechts/Comissão, já citado na nota 17.

(35)  Ver relatório do ABN AMRO transmitido pelas autoridades francesas e descrito na Secção 2.5.8.2 da Decisão de início do procedimento, p. 47.

(36)  JO C 244 de 1.10.2004, p. 2.

(37)  Acórdão Itália e SIM 2 Multimedia/Comissão, já citado na nota 32, n.o 69.

(38)  Pontos 72 a 74 da Decisão de início do procedimento.

(39)  Pontos 75 a 77 da decisão de início do procedimento.

(40)  JO C 244 de 1.10.2004, p. 2.

(41)  Os valores indicados na presente decisão são arredondados ao milhão. O cálculo dos juros deverá, pelo contrário, basear-se no montante exato de cada um dos auxílios.

(42)  JO L 140 de 30.4.2004, p. 1.

(43)  JO L 140 de 29.5.2006, p. 1.