20.9.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

L 257/11


DECISÃO DA COMISSÃO

de 2 de Agosto de 2004

relativa ao auxílio Estatal concedido pela França a favor da France Télécom

(notificada com o número C(2004)3060)

(O texto em língua francesa é o único que faz fé)

(Texto relevante para efeitos do EEE)

(2006/621/CE)

A COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS,

Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia, nomeadamente, o n.o 2, primeiro parágrafo, do artigo 88.o,

Tendo em conta o Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, nomeadamente o n.o 1, alínea a), do artigo 62.o,

Após ter convidado as partes interessadas a apresentarem as suas observações em conformidade com os referidos artigos (1) e tendo em conta tais observações,

Considerando o seguinte:

1.   ASPECTOS PROCESSUAIS

(1)

Por carta de 31 de Janeiro de 2003, a Comissão informou a França da sua decisão de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no n.o 2 do artigo 88.o do Tratado (a seguir, «decisão de início do procedimento») relativamente às medidas financeiras adoptadas pelas Autoridades francesas a favor da France Télécom (a seguir, «FT» ou «a empresa») e ao regime de taxa profissional aplicável a este operador. A descrição dos factos que levaram ao início deste procedimento não está incluída na presente decisão (2).

(2)

A decisão de início do procedimento foi notificada à França em 31 de Janeiro de 2003. Após correcção dos erros materiais, uma rectificação foi notificada à França em 7 de Março de 2003.

(3)

A França comunicou informações complementares à Comissão por cartas de 4 de Abril de 2003, 15 de Maio de 2003 e 29 de Janeiro de 2004.

(4)

A decisão da Comissão de dar início ao procedimento foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia  (3). A Comissão convidou os terceiros interessados a apresentarem as suas observações sobre as medidas de auxílio em causa.

(5)

A Comissão recebeu as seguintes observações na matéria, provenientes dos terceiros interessados:

21 de Março de 2003: observações da Cable and Wireless plc e da Cable and Wireless SA

11 de Abril de 2003: observações da Cégétel

10 de Abril de 2003: observações da AFORS Télécom

11 de Abril de 2003: observações da LDCOM

11 de Abril de 2003: observações de A (4)

10 de Abril de 2003: observações da Tiscali

11 de Abril de 2003: observações da WorldCom France (5)

11 de Abril de 2003: observações de B (6)

11 de Abril de 2003: observações da Bouygues SA e da Bouygues Télécom (7) (a seguir «BT»)

14 de Abril de 2003: observações da Télécom Itália

14 de Abril de 2003: observações de C (8)

29 de Abril de 2003: observações de B

30 de Abril de 2003: observações da LDCOM (9).

(6)

A Comissão transmitiu estas observações à França, em 16 de Maio de 2003, dando-lhe a oportunidade de as comentar. A Comissão recebeu observações da França, por cartas de 30 de Junho de 2003 e de 29 de Julho de 2003 (10).

(7)

Em 30 de Maio de 2003, a Comissão publicou um concurso público para a prestação de serviços de assistência para a avaliação da conformidade do auxílio financeiro concedido à FT, tendo em conta o princípio do investidor privado numa economia de mercado e para a eventual análise do plano de recuperação da FT (11). Por carta de 3 de Julho de 2003, as Autoridades francesas dirigiram-se à Comissão relativamente ao concurso público acima citado. A Comissão respondeu-lhes por carta de 24 de Setembro de 2003. Na mesma data, o contrato de prestação de serviços foi concedido ao gabinete NERA (a seguir, «NERA» ou «o consultor»). As Autoridades francesas foram informadas da identidade do consultor por fax de 8 de Outubro de 2003.

(8)

A Comissão recebeu outras informações e documentos provenientes de terceiros:

23 de Junho de 2003: carta da LDCOM

25 de Junho de 2003: carta de D (12)

27 de Outubro de 2003: carta da MCI

16 de Outubro de 2003: carta da ECTA

25 de Junho de 2003: carta de XXX

7 de Janeiro de 2004: carta da BT

16 de Janeiro de 2004: carta da BT (13)

19 Março 2004: carta da FT (14)

5 de Abril de 2004: carta da Tiscali

17 de Maio de 2004: carta da LDCOM

26 de Maio de 2004: carta da BT (15)

22 de Junho de 2004: carta da FT (16)

30 de Junho de 2004: fax da FT

2 de Julho de 2004: fax da FT.

(9)

A Comissão solicitou esclarecimentos complementares às Autoridades francesas através das seguintes cartas:

11 de Setembro de 2003 (resposta das Autoridades francesas de 20 de Outubro de 2003)

11 de Novembro de 2003 (resposta das Autoridades francesas de 4 de Dezembro de 2003)

12 de Janeiro de 2004 (resposta das Autoridades francesas de 21 de Janeiro de 2004)

2 de Fevereiro de 2004 (resposta das Autoridades francesas de 16 de Fevereiro de 2004)

1 de Junho de 2004 (resposta das Autoridades francesas por ocasião da reunião de 16 de Junho de 2004).

(10)

A Comissão enviou às Autoridades francesas, em 3 de Maio de 2004 e em 14 de Junho de 2004, as cartas indicadas no considerando 8 bem como o relatório da NERA de 28 de Abril de 2004 (a seguir, «relatório NERA»). Este relatório é composto por duas partes distintas: (i) um relatório jurídico redigido pelo professor Berlin e (ii) um relatório económico.

(11)

A Comissão ouviu os representantes das partes interessadas durante diversas reuniões realizadas no âmbito do procedimento.

(12)

A Comissão e o consultor reuniram-se com as Autoridades francesas e a FT em 22 de Janeiro e em 16 e 23 de Junho de 2004.

(13)

Por carta de 14 de Maio de 2004, confirmada em 3 de Junho de 2004, as Autoridades francesas salientaram que a decisão de início do procedimento não abrangia todos os factos objecto da investigação da Comissão. Por carta de 9 de Junho de 2004, confirmada por carta de 10 de Junho de 2004, as Autoridades francesas apresentaram observações sobre o relatório NERA, completadas por uma carta de 21 de Junho de 2004.

2.   DESCRIÇÃO DA FRANCE TELECOM

(14)

Tal como decorre da decisão de início do procedimento, este diz respeito ao grupo FT como entidade económica única. Com efeito, a Comissão fez sempre referência, desde o início do procedimento, às contas consolidadas da empresa. Ao adoptar esta abordagem, a Comissão segue uma via coerente com a realidade económica reflectida pelo mercado, que avalia os resultados e a solidez financeira da FT com base nos seus resultados consolidados. Na decisão de início do procedimento, o grupo FT foi descrito nos seguintes termos (tradução não oficial do original francês):

«Fazendo inicialmente parte do Ministério dos Correios e Telecomunicações, a FT foi constituída em 1991 como operador público dotado de personalidade jurídica. Desde 31 de Dezembro de 1996, o operador tem o estatuto de sociedade anónima e está cotado no Premier Marché da Euronext Paris SA e na New York Stock Exchange (NYSE) desde Outubro de 1997. Em 2002, o Estado detinha a maioria do capital da FT (56,45 %), estando a parte restante dividida entre o público (32,25 %), autocontrolo (8,26 %) e os trabalhadores da empresa (3,04 %) (17).

A FT é operador e fornecedor de redes e de serviços de telecomunicações, desenvolvendo actividades em França e a nível mundial nos seguintes mercados: telefonia fixa, telefonia móvel, Internet e outros serviços de informação, serviços às empresas, teledifusão e televisão por cabo. Na sequência da aquisição da Orange plc e da constituição da Orange SA como principal filial de telefonia móvel da FT, e da sua introdução na bolsa, e da introdução na bolsa da Wanadoo SA, as actividades da FT estão agora organizadas em quatro segmentos: (i) Orange; (ii) Wanadoo; (iii) Serviços fixos, vocais e de dados em França, e (iv) Serviços fixos, vocais e de dados fora de França, principalmente através da sua filial Equant.

Em 31 de Dezembro de 2001, a FT empregava 211 554 trabalhadores em todo o mundo, dos quais 146 882 em França» (18).

(15)

Esta descrição continua a ser válida para o período objecto da presente decisão. Por outro lado, durante o mesmo período, a estrutura do grupo caracterizou-se por «uma política inequívoca de criação de filiais através da constituição, em torno da FT, de quatro empresas cotadas na bolsa: Orange, Wanadoo, TPSA na Polónia e Equant. Assim, o grupo foi constituído de forma completamente paradoxal e desequilibrada, assumindo a empresa-mãe FTSA a totalidade da dívida, enquanto as filiais concentram o crescimento …» (19)

3.   DESCRIÇÃO CRONOLÓGICA DOS FACTOS E SITUAÇÃO FINANCEIRA DA EMPRESA

3.1.   Dados conhecidos no primeiro semestre de 2002 e factos registados durante esse período

(16)

A Comissão considera que a análise do comportamento do Estado, à luz das regras em matéria de auxílios estatais, deve ser efectuada com base nos dados e informações disponíveis no momento de cada intervenção estatal. Uma vez que o presente procedimento diz respeito a acontecimentos ocorridos em 2002 e início de 2003, é essencial retomar cronologicamente os elementos disponíveis a partir da publicação dos resultados do exercício de 2001 para compreender os factos em que a Comissão se baseou para analisar o comportamento do Estado. Por outro lado, é necessário recordar que os resultados financeiros do primeiro semestre de 2002 apenas foram publicados em 13 de Setembro de 2002. Antes desta data, os últimos resultados financeiros publicados pela FT foram os relativos ao exercício de 2001. Todavia, estavam disponíveis alguns dados complementares provenientes das previsões, pareceres e recomendações de analistas financeiros.

(17)

Tal como decorre da análise que se segue, a FT caracterizava-se, a partir de Junho de 2002, por graves problemas estruturais e apresentava um balanço desequilibrado. A partir do primeiro trimestre de 2002, a publicação das contas de 2001 veio evidenciar a natureza desses problemas. A publicação das contas revelou uma progressão dos resultados de exploração, bem como a criação de um volume substancial de cash flow. Contudo, realçou igualmente o peso do passado que anulou inteiramente o resultado líquido antes de provisões excepcionais, de 1,9 mil milhões de euros, convertendo-o num prejuízo de 8,3 mil milhões de euros. Apesar das provisões corrigirem o valor dos activos da FT para um nível mais realista, persiste o nível colossal da dívida, que se eleva a 63 mil milhões de euros. Este contexto, bem como a insuficiência do cash flow previsto, explicam os graves problemas estruturais. A situação fica bem demonstrada no estudo do HSBC apresentado pela FT (ver secção 4), que estima em 35 mil milhões de euros a necessidade de financiamento para o período 2002-2005.

(18)

O endividamento líquido da FT elevava-se a 63,5 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2001, tal como revelam os quadros 1 e 2.

Quadro 1

Rácios de endividamento («Rácios de “Leverage”»)

 

1999

2000

2001

Rácio de endividamento (20)

0,78

0,89

0,92

Dívida/capital social (21)

3,61

8,25

12,16

Times interest earned  (22)

14,52

5,39

3,2

Fonte: NERA

Quadro 2

Obrigações com vencimento entre o terceiro trimestre (T3) de 2002 e o quarto trimestre de 2003

 

2002

2003

T3

T4

T1

T2

T3

T4

Total 2003

Montante em mil milhões de euros  (23)

3,89

3,61

8,86

4,08

4,09

2,23

19,26

Fonte: NERA

(19)

Tomando em consideração estes dados, a Comissão verifica que, tendo em conta a importância da sua dívida a FT teve de anunciar, em 21 de Março de 2002, não só uma importante limpeza do seu balanço através de provisões contabilísticas e de cessões num montante de 27,2 mil milhões de euros (incluindo cessões num montante de 17 mil milhões de euros e provisões excepcionais num montante de 10,2 mil milhões de euros), mas também um importante aumento do cash flow disponível, no montante de 14 mil milhões de euros para o período 2002-2005.

3.1.1.   Descida da notação da FT

(20)

Durante o primeiro semestre de 2002, a situação da FT deteriorou-se rapidamente, o que se reflectiu numa série de downgrades da notação da empresa. Desta forma, em 27 de Março de 2002, a agência de notação Moody’s anunciou uma descida do rating da FT no que se refere à dívida a longo prazo (24)/ (25).

(21)

Em 28 de Março de 2002, a Standard & Poor’s («S & P») manteve o rating da FT, mas desceu a sua perspectiva para negativa (26), na sequência das notícias relativas à Mobilcom.

(22)

Em 13 de Maio de 2002, a Moody’s, tendo dúvidas quanto à capacidade de a empresa conduzir com êxito a sua estratégia de redução da dívida, anunciou uma descida eventual do rating da dívida a curto prazo da FT (27).

(23)

Em 14 de Maio de 2002, a Standard & Poor’s manteve o rating da FT (28).

(24)

Em 24 de Junho de 2002, a Moody’s baixou o rating da FT. A perspectiva do rating da empresa foi mantida a um nível negativo (29). A decisão da Moody’s foi motivada pelo facto de a agência não prever que a FT e a Orange estivessem em condições de gerar um cash flow suficiente para reduzir a dívida consolidada do grupo. Por outro lado, embora a Moody's não tivesse dúvidas quanto a uma possível crise de liquidez da empresa no imediato, a agência de notação salientava que a FT devia fazer face a uma dívida de cerca de 15 mil milhões de euros com vencimento em 2003.

(25)

Em 25 de Junho de 2002, a Standard & Poor’s baixou o rating da dívida da FT a curto e a longo prazo (30), apresentando como motivos para a sua decisão as dificuldades relativas à Mobilcom e a incapacidade de a empresa reduzir suficientemente a sua dívida com a rapidez necessária. A S & P menciona igualmente as importantes necessidades de financiamento da FT, fazendo referência aos 15 mil milhões de euros de dívida com vencimento em 2003.

(26)

Esta tendência no sentido da descida foi confirmada por diversas ocasiões (31) nos dias que se seguiram. Em 12 de Julho de 2002, a Standard & Poor’s realçou mesmo um problema potencial no que se refere ao refinanciamento da dívida com vencimento em 2003. A deterioração da notação da FT revelou claramente os problemas de endividamento da empresa (32), agravados pela incerteza quanto à situação da Mobilcom.

(27)

O Quadro 3 recapitula as diferentes posições da S & P, da Moody’s e da Fitch quanto à notação da FT:

Quadro 3

Acontecimentos relacionados com as notações de crédito

 

S & P

Moody's

Fitch

Curto prazo

Longo prazo

Curto prazo

Longo prazo

Curto prazo

Longo prazo

Situação em Maio de 2002

A2

BBB+

P2

Baa1

F2

BBB+

24 de Junho de 2002

 

 

P3

Baa3

 

 

25 de Junho de 2002

A3

BBB

 

 

 

 

05 de Julho de 2002

 

 

 

 

F3

BBB-

12 de Julho de 2002

 

BBB-

 

 

 

 

Fonte: NERA

3.1.2.   Análise dos «Credit spreads»

(28)

Por outro lado, é importante analisar o comportamento dos «spreads» nos mercados financeiros. Os spreads relativos à dívida de uma empresa reflectem a avaliação, pelos mercados, do risco ligado à capacidade de essa empresa respeitar as suas obrigações em matéria de pagamento de juros e de reembolso da dívida nas datas de vencimento. Os «spreads» influenciam a valorização das obrigações por parte do mercado, bem como o nível do juro exigido para a emissão de novas obrigações. O alargamento dos spreads revela um aumento do risco atribuído ao emissor e/ou à obrigação. A Comissão procedeu à análise dos spreads da FT no que se refere ao período que abrange o exercício de 2002, tendo verificado que a avaliação do risco no início de Julho era relativamente elevada.

(29)

Normalmente, os spreads relativos à «dívida a longo prazo» são mais importantes que os relativos à «dívida a curto prazo» devido a diversos factores: falta de visibilidade, incerteza quanto às perspectivas futuras, parâmetros macroeconómicos e a tendência das taxas de juro. Contudo, uma análise do Quadro 3 revela claramente que os problemas da FT se concentraram particularmente na «dívida a curto prazo». Desta forma, o estudo dos spreads da FT demonstrou que os riscos a muito curto prazo eram mais elevados que os riscos a médio e a longo prazo. Este fenómeno é designado por «spread inversion». A frequência destas «inversions», durante as quais o mercado considerou que a dívida com vencimento a um ano tinha um risco superior ao da dívida com vencimento a três anos, foi particularmente evidente durante o período compreendido entre Julho e Setembro de 2002.

(30)

O Quadro 4 fornece uma representação gráfica do comportamento dos spreads da FT.

Quadro 4

Credit spreads com vencimento a 1 e 3 anos — France Télécom

Image

Fonte: Bloomberg

(31)

Uma forma diferente de observar o aumento do risco associado à dívida da FT consiste no estudo do preço das suas obrigações. O Quadro 5 apresenta um subconjunto de obrigações da FT. A queda dos preços das obrigações em Junho/Julho de 2002, que constitui a imagem inversa do aumento dos «credit spreads», reflecte um valor inferior da dívida da FT devido ao facto de o mercado considerar que existia um maior risco de incumprimento.

Quadro 5

Preço das obrigações da FT entre Maio de 2002 e 24 de Julho de 2002

Image

Fonte: Bloomberg

(32)

Além disso, parece evidente que, apesar das dificuldades de alguns outros operadores do sector das telecomunicações na Europa, a difícil situação com que a FT se confrontava resultava directamente do seu balanço e da sua estrutura financeira.

(33)

Esta conclusão foi evidenciada num estudo dos spreads da Deutsche Telekom e da KPN, tal como revelam os Quadros 6 e 7.

Quadro 6

Credit spreads com vencimento a 1 e 3 anos — KPN

Image

(Fonte: Bloomberg)

Quadro 7

Credit spreads com vencimento a 1 e 4 anos — Deutsche Telekom

Image

(Fonte: ibid)

(34)

Este estudo revela que a Deutsche Telekom registou igualmente «spreads inversions», mas que a sua duração foi curta e a sua amplitude claramente inferior. Desta forma, os níveis atingidos pela FT durante o período compreendido entre Junho e Julho de 2002 foram muito superiores.

3.1.3.   Cotação das acções da FT

(35)

Paralelamente, a cotação das acções da FT sofreu uma descida significativa durante o primeiro semestre de 2002 e atingiu o seu nível mais baixo, numa primeira fase, em 27 de Junho de 2002 (7,79 euros) e, numa segunda fase, em 30 de Setembro de 2002 (6,01 euros), como revela o Quadro 8.

Quadro 8

Cotação das acções da FT

Image

Fonte: Bloomberg

3.1.4.   Acontecimentos de Julho de 2002

(36)

Numa entrevista publicada no Les Echos de 12 de Julho de 2002, o Ministro francês da Economia, Finanças e Indústria (a seguir, Ministro da Economia e Finanças) declarou que: «O Estado accionista irá actuar como um investidor prudente e, caso a France Télécom tenha dificuldades, tomaremos as medidas adequadas … Repito que, se a France Télécom registar problemas de financiamento, o que não acontece actualmente, o Estado adoptará as decisões necessárias para que tais dificuldades sejam ultrapassadas» (33) .

(37)

Na mesma data, como já mencionado, a S & P baixou a notação da FT para o nível BBB-. Esta descida limitou-se contudo a uma notação que tem ainda qualidade de investimento: qualquer descida suplementar provocaria a classificação da dívida da empresa no nível de «junk bond», ou seja, deixaria de ter qualidade de investimento. O facto de o rating da FT ter sido mantido no «investment grade» foi sublinhado pelo analista Goldman Sachs, num relatório de 22 de Julho de 2002, que precisa que a FT esteve prestes a ser classificada no nível de «junk bond» pela S & P e pela Moody’s (34).

(38)

No seu comunicado de imprensa de 12 de Julho de 2002, a S & P precisa que tinha decidido manter a FT no nível de investimento devido às indicações do Estado no que se refere às suas intenções face à empresa: «A FT poderá deparar-se com algumas dificuldades para refinanciar a sua dívida obrigacionista com vencimento em 2003. Contudo, a indicação do Estado vem apoiar a notação da FT no nível de investimento». («FT could face certain difficulties refinancing its debt obligations coming due in 2003. Nevertheless, the State’s indication underpins France Télécom’s investment-grade credit quality».) Esta garantia tinha sido fornecida, por um lado, directamente pelo Governo francês à S & P: «o Estado francês — que detém 55 % da France Télécom — indicou claramente à Standard & Poor’s que iria actuar enquanto investidor prudente e que tomaria as medidas adequadas caso a FT registasse dificuldades. A notação a longo prazo da France Télécom desceu para BBB- (35)». («the French State — which owns 55 % of France Télécom — has clearly indicated to Standard & Poor’s that it twill behave as an aware investor and would take appropriate steps if France Télécom were to face any difficulties. France Télécom LT rating cut to BBB-».) e, por outro lado, publicamente na entrevista referida no considerando 36.

(39)

Tendo em conta o que precede, parece indiscutível que em Julho de 2002 a FT estava a atravessar uma crise de confiança. As agências de notação e os analistas estavam convencidos de que a empresa corria o risco de não conseguir executar o plano de refinanciamento apresentado pelos seus órgãos de gestão para fazer face aos seus compromissos. Desta forma, a FT via-se confrontada com um grave problema de financiamento relacionado com o seu endividamento (36). Contudo, as agências tinham mantido a notação da empresa no nível de investimento, tendo em conta as indicações formuladas pelo Estado. Uma descida do rating para um nível inferior teria agravado esta crise e teria diminuído os meios da empresa para lhe fazer face. «Será por conseguinte por volta de Junho de 2003 que os problemas de financiamento da FT poderão tornar-se cruciais ou mesmo “inextricáveis” (segundo as palavras do anterior Presidente do grupo, Michel Bon). Se até lá a France Télécom não tiver acesso ao mercado (devido a uma notação penalizadora), o Estado deverá encontrar instrumentos que ajudem a France Télécom a proceder ao seu refinanciamento» (37).

3.2.   Dados publicados a partir de 13 de Setembro de 2002 e acontecimentos durante este período

3.2.1.   Dados publicados em 13 de Setembro de 2002

(40)

A conclusão que figura no considerando 39 foi confirmada retroactivamente, em Setembro de 2002, quando as contas semestrais da FT foram apresentadas. Na sua análise das contas semestrais publicadas em 13 de Setembro de 2002, a Comissão regista uma progressão dos números da FT no primeiro semestre de 2002 relativamente ao ano anterior: progressão de 10 % no volume de negócios, de 13,2 % no EBITDA e 17,3 % no resultado operacional. A Comissão regista igualmente o contínuo crescimento da telefonia móvel e uma melhoria dos resultados da actividade Internet. Contudo, o resultado operacional do segmento fixo em França, que representava 31 % do volume de negócios durante o mesmo período, apresenta uma descida de 12,2 %.

(41)

Paralelamente aos bons resultados de exploração acima descritos, a FT confirmou o desequilíbrio da sua situação financeira. O resultado negativo no montante de 12,2 mil milhões de euros em 30 de Junho de 2002 deve-se principalmente às importantes provisões efectuadas no que se refere aos investimentos. Os prejuízos semestrais implicam que os fundos próprios consolidados da FT passaram a negativos em 30 de Junho de 2002, num montante de 440 milhões de euros, embora registassem anteriormente um saldo positivo.

(42)

Uma análise simplificada do fluxo de tesouraria em 30 de Junho de 2002 revela que a dívida líquida aumentou durante o primeiro semestre de 2002 em 6,3 mil milhões de euros, uma vez que o EBITDA, correspondente a 6,870 mil milhões de euros, não cobriu as despesas constituídas por:

juros ligados à dívida (3 099 milhões de euros),

investimentos (3 820 milhões de euros),

compra de acções da FT à VODAFONE (4 973 milhões de euros),

compra de acções Orange à E.On (950 milhões de euros) e

pagamento de impostos (608 milhões de euros).

(43)

A maior parte do endividamento líquido de 69,69 mil milhões de euros, ou seja, um montante de 50,6 mil milhões de euros em 30 de Junho de 2002 é composta por empréstimos obrigacionistas. O Quadro 9 apresenta uma repartição, por grandes categorias, das diversas componentes da dívida.

Quadro 9

(mil milhões de euros)

30 de Junho de 2002

Empréstimos de obrigações passíveis de troca ou convertíveis

10,75

Empréstimos obrigacionistas

39,85

Operação de locação financeira

0,42

Empréstimos bancários

6,62

Outros empréstimos não bancários

0,72

Saques nas linhas de crédito do consórcio bancário de 15 mil milhões de euros

8,15

Saques nas linhas de crédito do consórcio bancário de 1,4 mil milhões de dólares dos Estados Unidos

1,48

Outros descobertos bancários e outros empréstimos a curto prazo

4,14

Total da dívida bruta

72,13

Valores mobiliários de investimento

(0,15)

Disponibilidades

(2,29)

Endividamento líquido

69,69

Fonte: Contas consolidadas France Télécom: semestre encerrado em 30 de Junho de 2002

(44)

O calendário desta dívida caracteriza-se pela sua curta duração. Desta forma, 12,9 mil milhões de euros de dívidas vencem em 2003, correspondendo 10,5 mil milhões de euros a empréstimos obrigacionistas (38), mil milhões de euros a empréstimos às filiais e 1,4 mil milhões de euros a investimentos privados.

(45)

No primeiro semestre de 2004, chegaram ao seu termo empréstimos obrigacionistas num montante de 5,5 mil milhões de euros e linhas de crédito num montante de 6,4 mil milhões de euros (1,4 mil milhões de euros e 5 mil milhões de euros relativos à linha de 15 mil milhões de euros), ou seja, um total de 11,9 mil milhões de euros. Desta forma, a FT teve de fazer face a compromissos de reembolso num montante de 24,8 mil milhões de euros entre 1 de Janeiro de 2003 e 30 de Junho de 2004.

(46)

No segundo semestre de 2004, chegarão ao seu termo empréstimos obrigacionistas num montante de 2,8 mil milhões de euros e empréstimos às filiais num montante de 2,6 mil milhões de euros, ou seja, um montante de 5,4 mil milhões de euros e um montante total de 17,4 mil milhões de euros durante 2004.

(47)

Por último, em 2005, chegarão ao seu termo empréstimos obrigacionistas num montante de 8,5 mil milhões de euros, o saldo da linha de crédito de 15 mil milhões de euros, num montante de 10 mil milhões de euros, e investimentos privados num montante de 0,1 mil milhões de euros, ou seja, um montante total de 18,6 mil milhões de euros durante 2005.

(48)

Durante o período compreendido entre 2003 e 2005, a FT deverá fazer face a uma dívida exigível total de 48,9 mil milhões de euros.

(49)

Tal como foi referido na decisão de início do procedimento, a Comissão salienta que a origem da dívida da FT reside essencialmente nas importantes aquisições efectuadas pela empresa a partir de 1999 (39), que foram principalmente financiadas em numerário (40). Desta forma, no total, a FT despendeu mais de 100 mil milhões de euros na sua política de desenvolvimento, dos quais 80 % foram pagos em numerário (41).

(50)

A Comissão salienta, por outro lado, que o desenvolvimento externo da empresa se centrou no sector da telefonia móvel (42)(nomeadamente a aquisição da Orange plc (43), que foi a mais onerosa, e a operação Mobilcom (44), não se podendo no entanto ignorar as outras operações relativas à telefonia fixa (por exemplo TPSA (45), Internet (Freeserver) ou cabo (NTL) (46).

3.2.2.   Setembro de 2002

(51)

Em 12 de Setembro, o Governo comunicou publicamente que tinha aceite a demissão do Presidente da FT, Michel Bon, sem todavia anunciar a nomeação de um novo Presidente (47). Em 13 de Setembro, o Governo reiterou, num comunicado de imprensa, o seu apoio à empresa e indicou expressamente que tinha decidido participar numa futura operação de reforço dos fundos próprios da FT: «… Após os prejuízos excepcionais registados no primeiro semestre, a France Télécom encontra-se confrontada com uma grave insuficiência de fundos próprios. Esta situação financeira fragiliza o potencial da empresa. O Governo está consequentemente determinado a exercer plenamente as suas responsabilidades… Ao tomar conhecimento da nova situação criada pela forte deterioração das contas, Michel Bon propôs a sua demissão ao Governo, que a aceitou. Esta demissão produzirá efeitos por ocasião de um Conselho de Administração que será realizado nas próximas semanas e durante o qual será apresentado um novo Presidente… O novo Presidente irá propor muito rapidamente ao Conselho de Administração um plano de recuperação das contas que permita o desendividamento e o restabelecimento da sua estrutura financeira, mantendo simultaneamente os seus elementos estratégicos. O Estado apoiará a France Télécom na execução deste plano e contribuirá, por seu turno, para um reforço significativo dos fundos próprios da empresa, segundo um calendário e modalidades a determinar em função das condições de mercado. Até lá, o Estado adoptará, se necessário, medidas que permitam evitar à empresa qualquer problema de financiamento...» (48).

(52)

No mesmo dia, a agência Moody’s alterava a perspectiva de dívida da FT de negativa para estável, devido à confirmação do compromisso de apoio à FT (49).

3.2.3.   Outubro de 2002

(53)

Em 2 de Outubro de 2002, o Governo nomeou Thierry Breton como Presidente da FT. Um comunicado de imprensa do Ministro da Economia e Finanças anunciou esta nomeação. No mesmo comunicado, o Governo repetia os seus compromissos: «Mediante proposta do Conselho de Administração da empresa, o Conselho de Ministros decidiu nomear Thierry Breton Presidente da France Télécom… Para o efeito, o novo Presidente vai imediatamente estabelecer um ponto da situação da empresa, cujos resultados serão comunicados ao Conselho de Administração nas próximas semanas e que servirá de base a um plano de recuperação financeira e de desenvolvimento estratégico que permita reduzir a dívida da empresa, reforçando os seus pontos fortes. Neste âmbito, Thierry Breton contará com o apoio do Estado accionista que está determinado a assumir todas as suas responsabilidades. O Estado contribuirá para a execução das medidas de recuperação e contribuirá, por seu turno, para o reforço dos fundos próprios da empresa segundo modalidades que serão determinadas em estreita colaboração com o Presidente da empresa e o Conselho de Administração. Como já indicado, o Estado tomará entretanto, se necessário, medidas que permitam evitar à empresa qualquer problema de financiamento» (50).

3.2.4.   Dezembro de 2002/Janeiro de 2003

(54)

Em 4 de Dezembro de 2002, por ocasião do Conselho de Administração da empresa, os novos dirigentes da FT apresentaram o plano de acção «Ambition FT 2005» (51) (a seguir «o plano Ambition 2005») destinado a garantir, segundo as Autoridades francesas (52), uma melhoria sensível dos resultados de exploração da empresa e perspectivas de rendibilidade satisfatória dos fundos próprios investidos. Desta forma, os objectivos a médio prazo eram duplos: (i) fazer face às necessidades de financiamento da FT, e (ii) realizar um desendividamento líquido e uma reconstituição dos fundos próprios, condição sine qua non da reabilitação a prazo da empresa, em termos de crédito face ao mercado bolsista. No relatório do HSBC, precisa-se que: «Ao adoptar um plano de actividades que integra a melhoria operacional do programa TOP, consideramos que a FT tem uma necessidade de refinanciamento, no período 2002-2007, de cerca de 22 mil milhões de euros… [Por outro lado], adoptando um plano de actividades que não integre a melhoria operacional do programa TOP, consideramos que a FT tem uma necessidade de refinanciamento, no período 2002-2007, de cerca de 35 mil milhões de euros.»

(55)

Os principais elementos do plano em questão, bem como as medidas que as Autoridades francesas tencionavam adoptar relativamente à FT foram notificados à Comissão por carta de 3 de Dezembro de 2002, tendo sido apresentadas informações complementares por cartas de 14 e 15 de Janeiro de 2003. A descrição pormenorizada do plano Ambition 2005 e dos seus diferentes vectores (operacional, de renegociação da dívida e de reforço dos fundos próprios), bem como das outras medidas previstas pelas Autoridades francesas figura na decisão de início do procedimento e não será repetida na presente decisão.

(56)

A apresentação do plano Ambition 2005 foi acompanhada de um comunicado de imprensa do Ministro da Economia e Finanças, no qual o Governo confirmou o seu apoio ao plano em questão, o seu compromisso de participar na operação de reforço dos fundos próprios e a colocação à disposição de um adiantamento de accionista sob a forma de uma linha de crédito num montante de 9 mil milhões de euros. Os parágrafos deste comunicado pertinentes para efeitos da presente decisão são os seguintes: «Francis Mer, Ministro da Economia, Finanças e Indústria, confirma o apoio do Estado ao plano de acção aprovado pelo Conselho de Administração da France Télécom em 4 de Dezembro. 1/O grupo France Télécom constitui um conjunto industrial coerente cujos resultados são notáveis. Todavia, a empresa tem hoje de fazer face a uma estrutura financeira desequilibrada, e a necessidades de fundos próprios e de refinanciamento a médio prazo. Esta situação resulta do fracasso dos investimentos anteriores, mal conduzidos e realizados no auge da “bolha” financeira e, em termos mais gerais, da viragem dos mercados. O facto de a France Télécom não poder financiar o seu desenvolvimento de outra forma a não ser o endividamento agravou esta situação. 2/O Estado, accionista maioritário, solicitou aos novos dirigentes que restabelecessem o equilíbrio financeiro da empresa, mantendo a integridade do grupo… 3/Tendo em conta o plano de acção elaborado pelos dirigentes e as perspectivas de rendibilidade do investimento, o Estado participará no reforço dos fundos próprios de 15 mil milhões de euros proporcionalmente à sua participação no capital, ou seja, um investimento de 9 mil milhões de euros. O Estado accionista entende que, desta forma, age enquanto investidor prudente. Caberá à France Télécom definir as modalidades e o calendário preciso do reforço dos seus fundos próprios. O Governo deseja que esta operação se desenrole tomando o mais possível em consideração a situação dos accionistas individuais e dos trabalhadores accionistas da empresa. Para proporcionar à empresa a possibilidade de lançar uma operação de mercado no momento mais oportuno, o Estado está disposto a antecipar a sua participação no reforço dos fundos próprios, através de um adiantamento de accionista temporário, remunerado a condições de mercado, colocado à disposição da France Télécom. 4/A totalidade da participação do Estado na France Télécom será transferida para o ERAP, estabelecimento público industrial e comercial. O ERAP contrairá empréstimos junto dos mercados financeiros para financiar a parte do Estado no reforço dos fundos próprios da empresa» (53) .

(57)

Alguns dias após a apresentação do plano Ambition 2005, a FT lançou duas emissões obrigacionistas sucessivas em 11 de Dezembro e 12 de Dezembro de 2002, num montante total de 2,9 mil milhões de euros. A primeira emissão obrigacionista elevou-se a 2,5 mil milhões de euros, a 7 anos, com uma taxa fixa de 7 %, ou seja EURIBOR + 290pb. Para a FT, o custo da fracção com taxa fixa é de 7,165 % (all-in). O segundo empréstimo obrigacionista foi colocado no mercado da libra esterlina (GBP), num montante de 250 milhões de GBP, com uma taxa fixa de 8 %, a 15 anos, ou seja, LIBOR + 330pb (54). Em 15 de Janeiro de 2003 foram realizadas outras emissões, num montante total de 5,5 mil milhões de euros (55). Trata-se de um empréstimo obrigacionista em 3 fracções (mil milhões de euros com uma taxa fixa de 6 % e vencimento a 4,7 anos; 3,5 mil milhões de euros com uma taxa fixa de 7,5 %, vencimento a 10 anos; e mil milhões de euros com uma taxa fixa de 8,125 %, vencimento a 30 anos). Em 10 de Fevereiro de 2003, a parte do crédito concedido pelo consórcio bancário de 15 mil milhões de euros, que vencia nessa altura, foi renovada, ou seja, cerca de 5 mil milhões de euros, a 3 anos, com uma taxa Euribor +125pb.

(58)

Em 17 de Dezembro de 2002, a S & P esclareceu que desde Julho de 2002 o apoio do Governo tinha constituído um dos factores determinantes para a manutenção da notação da FT no nível de investimento (56) e que o anúncio do Governo relativo ao adiantamento de accionista e ao compromisso de subscrever, proporcionalmente à sua participação, uma operação de recapitalização de 15 mil milhões de euros tinham confirmado este apoio (57).

3.2.5.   Fevereiro/Março 2003

(59)

A FT encerrou o exercício de 2002 com um prejuízo de cerca de 21 mil milhões de euros e uma dívida financeira líquida de cerca de 68 mil milhões de euros.

(60)

Em 4 de Março de 2003, foi lançada a operação de reforço dos fundos próprios, de 15 mil milhões de euros, prevista no plano Ambition 2005. A operação obteve grande êxito e foi concluída em 11 de Abril. Em 14 de Abril de 2003, o Estado detinha 58,9 % do capital da FT, dos quais 28,6 % através do ERAP.

(61)

A Comissão verifica que o aumento de capital satisfaz, amplamente, as necessidades estruturais de financiamento da FT. Assim, na sequência desta operação, a notação da FT começou a melhorar, tendo a S & P passado a notação para BBB, com perspectiva estável, em 14 de Maio de 2003 (de A-3 para A-2, no que se refere à notação a curto prazo) e a Fitch melhorado a notação da FT de BBB- para BBB em 8 de Agosto de 2003. A Comissão salienta neste contexto que as agências deixaram, nesse momento, de considerar o apoio do Estado como um elemento fundamental da notação da empresa (58).

4.   OBSERVAÇÕES DAS PARTES INTERESSADAS

(62)

A Comissão recebeu observações de diversas partes interessadas. O conteúdo destas observações é, no seu essencial, apresentado na presente secção.

4.1.   Observações da Telecom Italia

(63)

A Telecom Italia sublinha que qualquer medida de auxílio concedida em benefício da FT é susceptível de afectar a concorrência nos mercados das telecomunicações e, nomeadamente, no mercado francês. Assim, é essencial que as medidas concedidas pelas Autoridades francesas sejam acompanhadas de contrapartidas destinadas a atenuar os seus efeitos sobre a concorrência. Neste contexto, seria particularmente adequado adoptar medidas de regulação que facilitassem e acelerassem o acesso de novos participantes e a sua utilização das infra-estruturas da FT, nomeadamente no que se refere ao acesso à rede local de assinantes e à duração do prazo de negociação dos acordos de interconexão e de provisioning.

4.2.   Observações da WorldCom

(64)

A WorldCom afirmou que partilhava a análise apresentada pela Comissão na decisão de início do procedimento. Esta empresa alegou nomeadamente que o auxílio concedido pelo Estado à FT tinha permitido a esta última obter a liquidez necessária para reembolsar a sua dívida, sem ter de ceder activos estratégicos. A WorldCom referiu igualmente que o apoio do Estado permitiu que a FT assegurasse a continuidade da sua estratégia industrial, ou seja, a criação de uma série de operadores de redes e de serviço de telecomunicações integrados verticalmente. A WorldCom concluiu que esta estratégia industrial implica práticas anti-concorrenciais, nomeadamente a existência de subvenções cruzadas e de price squeeze entre o preço proposto pela FT ao cliente final e o preço do acesso proposto aos concorrentes do operador histórico e a possibilidade de apresentar ofertas específicas muito competitivas no âmbito de contratos públicos (os contratos «Sipperec» e «Assistance publique/Hôpitaux de Paris» constituem dois exemplos desta situação).

(65)

Afim de reduzir as distorções de concorrência causadas pelos auxílios concedidos à FT, a WorldCom propôs contrapartidas de natureza estrutural, nomeadamente a cessão de activos como a Global One/Equant, a Orange, a Wanadoo/Oléane e/ou a rede de serviço local em França, ou ainda a separação estrutural efectiva e transparente entre a FT e as suas actividades comerciais. No que se refere às contrapartidas a nível do comportamento, a WorldCom refere a necessidade de uma separação contabilística entre as actividades comerciais e não comerciais da FT, a publicação integral da sua contabilidade e um controlo das tarifas.

4.3.   Observações de C

(66)

C apresentou as observações seguintes:

a)

As medidas em causa constituem um auxílio estatal. C alegou que, nos termos das Orientações comunitárias dos auxílios estatais de emergência e à reestruturação de empresas em dificuldade (59)(a seguir, «as Orientações»), a concessão de fundos de origem pública a uma empresa em dificuldades financeiras implica a presunção da existência de elementos de auxílio. C afirma que o anúncio e as condições da disponibilização da linha de crédito, num montante de 9 mil milhões de euros, pelo Estado francês em benefício da FT, bem como a participação do Estado francês na recapitalização da FT contêm elementos de auxílio. C salienta que o princípio do investidor prudente não foi respeitado no que se refere às modalidades de colocação à disposição da linha de crédito, devido nomeadamente à taxa de juro proposta e ao montante do «commitment fee». C sublinha igualmente que o princípio de concomitância não foi respeitado, na medida em que as Autoridades francesas concederam a linha de crédito e anunciaram a sua participação na recapitalização antes do anúncio do plano Ambition 2005 e do compromisso firme dos investidores. Uma vez que os concorrentes da FT não estão em condições de obter capitais nestes termos e deste montante, a FT beneficiou de uma vantagem que não teria obtido em condições de mercado.

b)

As medidas em causa não podem ser consideradas compatíveis na acepção das Orientações. A título acessório, C refere que o auxílio concedido deve limitar-se ao estritamente necessário para assegurar a viabilidade da FT e não deve participar no financiamento da expansão agressiva da FT. C acrescenta que a privatização da FT asseguraria o respeito do princípio «one time last time», aplicável aos auxílios à reestruturação. C chamou a atenção da Comissão para as distorções da concorrência no mercado alemão das telecomunicações causadas pelas medidas de auxílio e propôs, a título das contrapartidas previstas nas Orientações, a cessão da totalidade ou parte da Orange, filial da FT.

4.4.   Observações de A

(67)

A alegou que tal como indicado na decisão de início do procedimento, a intenção do Estado de restabelecer a viabilidade financeira da FT através da concessão de um adiantamento de accionista num montante de 9 mil milhões de euros e a concessão, pelo Estado, de uma garantia «material» em benefício da FT, destinada a cobrir as suas emissões obrigacionistas, constituem medidas que não correspondem ao princípio do investidor privado prudente e que contêm elementos de auxílio. A acrescentou que a política da FT relativa à cobrança de taxas pelas suas licenças contém elementos de auxílio.

4.5.   Observações da Bouygues e da Bouygues Télécom

(68)

A Bouygues e a Bouygues Télécom apresentaram as seguintes observações:

a)

A BT afirma que o apoio inabalável e irrevogável do Estado constitui a pedra angular do plano de recapitalização da FT que permitiu a recuperação da empresa. Desta forma, segundo a BT, apenas o Estado francês poderia, tendo em conta a situação financeira crítica da empresa, restabelecer a confiança dos mercados e criar um círculo virtuoso que lhe permitisse fazer face aos seus compromissos a curto prazo e lançar uma vasta operação de recapitalização em condições económicas favoráveis. Segundo a BT, as medidas seguintes preenchem as condições do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado constituindo, por conseguinte, auxílios estatais:

i)

As declarações do Ministro da Economia e Finanças durante o período compreendido entre 12 de Julho e 4 de Dezembro de 2002 constituem uma garantia estatal que implica recursos do Estado;

ii)

O adiantamento de accionista e a operação de reforço dos fundos próprios implicam recursos do Estado;

iii)

As medidas em causa proporcionam à France Télécom vantagens que esta empresa não teria obtido em condições normais de mercado;

iv)

As medidas em causa não respeitam o princípio do investidor privado prudente que desenvolve as suas actividades em condições de mercado;

v)

As medidas em causa afectam a concorrência;

vi)

As medidas em causa afectam o comércio intracomunitário.

b)

As medidas em causa não podem ser consideradas compatíveis na acepção das Orientações.

(69)

A título preliminar, a BT salientou que a política de expansão seguida durante 2000 no sector da telefonia móvel, sob o impulso do Estado, provocou a deterioração da situação financeira e económica do operador, que um primeiro plano de economias não conseguiu conter.

(70)

No que se refere às declarações do Ministro da Economia e Finanças, o apoio inabalável e reiterado do Estado, formulado através de uma série de anúncios entre 12 de Julho de 2002 e 4 de Dezembro de 2002 e completado por diversas medidas, entre as quais a abertura da linha de crédito de 9 mil milhões de euros, e o compromisso irrevogável do Estado de participar num aumento de capital correspondente à sua quota-parte na empresa, constituem um compromisso assumido pelo Estado, sem qualquer possibilidade de derrogação, no sentido de minorar por todos os meios um eventual incumprimento, por parte da empresa, das suas obrigações financeiras. A BT salienta, neste contexto, que tal compromisso constitui uma verdadeira garantia estatal, com valor jurídico e que recorre a recursos do Estado. A BT acrescenta que a garantia do Estado é ilimitada em termos de montante e de duração.

(71)

A BT recorda neste contexto a decisão relativa ao Crédit Foncier de France (CFF) (60), em que a Comissão considerou que as declarações públicas do Governo tinham por objectivo e efeito tranquilizar os credores do banco relativamente à qualidade dos seus créditos e não podiam ser consideradas — como o afirmavam as Autoridades francesas — um simples compromisso político, sem valor jurídico. Desta forma, a BT afirma que, neste processo, as declarações de apoio tinham tranquilizado os credores do CFF, impedindo que exigissem o reembolso imediato dos seus créditos, evitaram que a CFF tivesse de utilizar a linha de crédito aberta pelo Estado em seu benefício e permitiram que este último elaborasse e aplicasse um plano de reestruturação.

(72)

A título acessório, a BT observa que as soluções do direito comunitário são confirmadas pela análise do direito interno. Em direito comercial francês por exemplo, este tipo de declarações de apoio pode ser considerado como cartas de intenção que os tribunais equiparam a verdadeiras garantias, como demonstra a jurisprudência recente (61). A BT acrescenta que, embora o Tribunal de Cassação francês não tenha ainda adoptado uma posição de princípio sobre o valor geral do compromisso unilateral como fonte de obrigações, reconhece o seu valor numa base casuística.

(73)

A BT, no âmbito das suas observações, recorreu a um perito (62), que afirma que decorre de jurisprudência constante do tribunal administrativo francês que a existência de um compromisso assumido por uma autoridade administrativa não deve ser apreciada em função da sua forma, mas sim em função das suas características intrínsecas. O perito da BT recorda que esta jurisprudência foi expressamente aplicada ao caso específico das declarações: o tribunal administrativo considera assim que as promessas, apesar de não serem acompanhadas de um acto jurídico específico, constituem compromissos porque traduzem uma manifestação de vontade da autoridade administrativa. Com efeito, para que exista um compromisso do Estado é suficiente que o comportamento da administração permita concluir, de modo convincente, que irá agir de determinada forma. É irrelevante, por conseguinte, que a promessa seja escrita ou verbal ou que possa simplesmente deduzir-se do comportamento da administração; a única condição imposta pelo tribunal administrativo consiste no facto de a promessa em causa ser firme e precisa ou constituir um incentivo suficiente.

(74)

O perito da BT precisa que, no caso em apreço, as declarações do Ministro da Economia e Finanças preenchem todas as condições exigidas para que sejam consideradas um compromisso do Estado. Em cada uma das suas declarações, o Ministro manifesta, com efeito, a sua vontade de apoiar incondicionalmente a FT — segundo modalidades que, além disso, são expressamente definidas: o reforço dos fundos próprios, a tomada de medidas que permitam evitar à empresa qualquer problema de financiamento e o recurso ao ERAP, para o qual seria transferida a totalidade da participação do Estado. Uma vez que estas declarações são firmes e precisas e formuladas sem reservas, devem ser analisadas como compromissos do Estado. Além disso, uma vez que o Ministro teve o cuidado de publicar as suas declarações, estas não podem constituir simples declarações de intenção.

(75)

O perito da BT realça o facto de que, uma vez que estas promessas devem ser analisadas como um compromisso do Estado têm, por definição, um valor jurídico e são susceptíveis, independentemente de serem ou não legais, de vincular o Estado em termos de responsabilidade face à FT, aos seus credores ou aos seus trabalhadores.

(76)

A BT salienta que as declarações do Governo francês a partir de 12 de Julho de 2002 constituem «actos administrativos» que vinculam o Estado e que são susceptíveis de o responsabilizar perante os tribunais administrativos. Desta forma, o tribunal administrativo analisa todos os comportamentos da administração através dos actos administrativos que dela emanam, independentemente da sua forma, quer sejam ou não prejudiciais, e cujos efeitos resultem quer de uma alteração do ordenamento jurídico, quer de uma afectação da situação pessoal do queixoso. A BT submeteu igualmente à Comissão, em26 de Maio de 2004, um outro estudo (63) que conclui igualmente que as declarações do Estado constituem a expressão de um compromisso formal, preciso e irrevogável do Estado, no caso em apreço sancionável juridicamente através da responsabilização do Estado, caso este tenha cometido uma falta por não respeitar os seus compromissos face à FT.

(77)

A BT precisa que não existem quaisquer dúvidas quanto ao facto de as medidas em causa não constituirem uma ajuda psicológica — como afirmaram as Autoridades francesas — constituindo antes uma garantia que vincula juridicamente o seu autor.

(78)

Por último, a BT salienta sobre esta questão que o carácter vinculativo das declarações formuladas pelo Estado relativamente à garantia é confirmado por uma circular do Ministério da Economia e Finanças de 22 de Julho de 2003, que faz expressamente referência à existência de garantias implícitas (64).

(79)

No que se refere ao adiantamento de accionista e à operação de reforço dos fundos próprios, a BT alega que, por um lado, a abertura de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros em benefício da FT e, por outro, o compromisso irrevogável do Estado de participar num futuro aumento de capital correspondente à sua quota-parte na FT, seguido da operação de recapitalização propriamente dita, constituem a execução da garantia do Estado e são financiados por recursos estatais. Neste contexto, a BT acrescenta que o facto das Autoridades francesas terem recorrido ao ERAP para conceder uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros em benefício da FT não altera em nada a origem estatal dos fundos. A BT defende que o recurso ao ERAP fez com que a FT beneficiasse de uma taxa de juro vantajosa devido, por um lado, ao estatuto de estabelecimento público industrial e comercial (EPIC) do ERAP e, por outro, à garantia expressa concedida pelo Estado num montante de 10 mil milhões de euros (65). Por conseguinte, as medidas em causa são financiadas por recursos provenientes do Estado, apesar de a linha de crédito não ter sido na prática utilizada.

(80)

Nas suas observações complementares de 11 de Abril de 2003, a BT alega que, tendo em conta a situação financeira da empresa, a operação de recapitalização realizada em 24 de Março de 2003 foi apenas possível devido à intervenção prévia das outras medidas de auxílio. Por conseguinte, a recapitalização constitui per se um auxílio estatal, uma vez que decorre directamente de um auxílio estatal prévio (66).

(81)

No que se refere à condição relativa à vantagem, a BT defende que o facto gerador da garantia se situava posteriormente à descida da notação da FT pelas agências de notação, com o objectivo de restaurar a confiança do mercado.

(82)

Além disso, relativamente à mesma questão, a BT precisa que a garantia permitiu que a FT tivesse novamente acesso aos mercados financeiros. Desta forma, a garantia melhorou a perspectiva que acompanha a notação da FT, permitindo-lhe evitar a classificação de «junk bonds». A BT observa ainda que a cotação na bolsa dos títulos da FT melhorou consideravelmente. Por outro lado, os spreads no mercado obrigacionista diminuíram a partir de Junho de 2002 e a FT pôde reescalonar a dívida e fazer face à «barreira à liquidez». A BT sublinha que a garantia não só permitiu que a FT recorresse ao mercado financeiro, como permitiu também que as emissões obrigacionistas fossem realizadas a uma taxa que não reflectia a situação financeira real da FT.

(83)

A BT salienta mais precisamente, nas suas observações de 11 de Abril de 2003, que o anúncio e a concretização do apoio do Estado deram lugar a um auxílio que esteve na origem das vantagens relacionadas com o adiantamento de accionista e a recapitalização. Estas vantagens tiveram nomeadamente como consequência afastar a «barreira à liquidez», ou seja, aumentar o montante dos meios de financiamento para fazer face às obrigações de pagamento da dívida, permitir um desfasamento real e potencial das saídas de tesouraria e uma economia efectiva e potencial de custos.

(84)

Para concluir sobre este ponto, a BT alega que a vantagem de que a FT beneficiou se eleva a mais de 40 mil milhões de euros (3 mil milhões de euros relativos ao conjunto das medidas de apoio do Estado francês em benefício da FT e 36,7 mil milhões de euros relativos à participação do Estado na recapitalização da FT) e que este montante não toma em consideração a importante margem de manobra proporcionada à FT devido à supressão de todas as suas preocupações financeiras, uma vez que a «barreira à liquidez» recuou em cerca de 43 mil milhões de euros.

(85)

Nas suas observações complementares de 7 de Janeiro de 2004, a BT precisou igualmente que a vantagem de que a FT beneficia, devido ao compromisso de apoio irrevogável do Estado, poderia quantificar-se em mais de 30 mil milhões de euros, enquanto a vantagem decorrente da operação de recapitalização poderia elevar-se a mais de 50 mil milhões de euros.

(86)

No que se refere ao princípio do investidor prudente, a BT alega que as medidas de apoio não estão em conformidade com este princípio pelos seguintes motivos:

a)

Compromisso incondicional ilimitado: A BT recorda que as declarações do Estado constituem um compromisso jurídico firme e incondicional que um investidor nunca teria assumido sem formular a mínima reserva. Trata-se assim de uma garantia ilimitada concedida a uma empresa extraordinariamente endividada e frágil a curto prazo. Segundo a BT, a medida em causa não preenche as condições previstas na Comunicação da Comissão relativa à aplicação dos artigos 87.o e 88.o do Tratado CE aos auxílios estatais sob a forma de garantia (67) (a seguir, «Comunicação relativa aos auxílios estatais sob a forma de garantia») na medida em que, nomeadamente, a FT se encontrava em dificuldades financeiras aquando da concessão da garantia e esta última não incide sobre qualquer operação precisa e não dá lugar a qualquer remuneração. Desta forma, a FT obteve vantagens que não teria obtido em condições normais de mercado.

b)

Condições de concessão do adiantamento de accionista: A BT alega que o mecanismo adoptado pelo Estado dá, no seu conjunto, resposta a uma preocupação do foro das finanças públicas (nomeadamente o respeito dos critérios de Maastricht) que não corresponde ao comportamento de um investidor prudente em economia de mercado. Com efeito, não está assegurado o reembolso do empréstimo subscrito pelo ERAP por conta do Estado, para participar na recapitalização. Desta forma, a modalidade de reembolso prevista em primeiro lugar diz respeito à cessão de títulos, o que constitui um ganho potencial, não podendo, por este motivo, conferir ao investimento em causa o carácter de investimento «prudente». A BT alega que a garantia concedida pelo Estado francês ao ERAP, num montante de 10 mil milhões de euros, permitiu que o ERAP reunisse os fundos necessários para a concessão da linha de crédito em condições vantajosas, ou seja, a uma taxa de 3,375 %. Qualquer investidor privado prudente teria efectuado esta operação a um custo superior e teria exigido garantias específicas associadas aos activos da empresa.

c)

Recapitalização: Relativamente ao compromisso assumido pelas Autoridades francesas no sentido de recapitalizar a FT e à própria operação de recapitalização, a BT alega essencialmente que o princípio do investidor privado prudente não foi respeitado no caso em apreço, uma vez que o Estado se comprometeu a participar na recapitalização da FT em 12 de Julho de 2002, ou seja, anteriormente à existência do plano Ambition 2005, sem conhecer a situação económica exacta da FT, que se tinha fortemente deteriorado, e sem a participação concomitante de investidores privados. A este propósito a BT sublinha os seguintes pontos:

situação financeira da empresa: a BT sublinha que a situação financeira do operador histórico no momento da tomada de decisão de investimento não lhe permitia recorrer aos investidores privados sem o apoio do Estado (70 mil milhões de euros de prejuízos, fundos próprios negativos no montante de 8 mil milhões de euros, obrigações de reembolso de dívidas no montante de 50 mil milhões de euros durante os próximos três anos). Além disso, o mercado considerou que o plano apresentado por M. Bon nessa época não era pertinente, tendo sido seguido da deterioração da nota da FT por parte das agências de notação. A BT precisa que esta situação está patente na declaração de Thierry Breton perante a Comissão das Finanças do Senado (68).

rendimento da operação: a BT considera que o período para calcular a rendibilidade do investimento tem início, quanto muito, em 12 de Julho de 2002, data da primeira declaração do Estado através da qual este assumiu um compromisso jurídico face à FT e aos seus credores, terminando, no máximo, em 4 e 5 de Dezembro de 2002, datas em que o plano Ambition 2005 foi tornado público e em que foi aberta a linha de crédito de 9 mil milhões de euros. A BT alega que o rendimento razoável que um investidor privado prudente tinha o direito de esperar numa situação deste tipo não pode ser calculado de forma fiável. Desta forma, a recapitalização da FT não pode ser comparada com nenhuma outra operação financeira, devido à gravidade da crise de liquidez que a empresa atravessava. Assim, o Estado não pôde apreciar o risco em que incorria procedendo a um cálculo de probabilidades, e estava confrontado com uma incerteza radical (ou seja, um risco não probabilizável) quando decidiu conceder uma garantia a FT: desta forma, tanto o nível do risco como a rendibilidade não eram quantificáveis. A BT acrescenta que, de qualquer forma, o investimento não podia ser qualificado como razoável. Em especial, uma projecção baseada na capitalização bolsista da FT e na rendibilidade do investimento prevista por um investidor privado revela que o investimento não é razoável. Em conformidade com o método utilizado pela Comissão para determinar o carácter prudente de um investimento, a rendibilidade que um investidor prudente teria exigido, principalmente tendo em conta os riscos relacionados com esta operação, poderia estimar-se no mínimo em 30 % a 40 %. Esta taxa corresponde à taxa mínima que a Comissão exigiu nos processos Alitalia (69) e Iberia (70). Ora, segundo o método utilizado pela BT, ou seja EPS (Enterprise value ou Analysts target price 12 months), a rendibilidade do investimento na operação em causa atingiria apenas os 16 %. Por outro lado, o Estado não pode contar com uma remuneração em termos de dividendos, uma vez que a FT anunciou que não procederia à sua distribuição. De forma geral, a BT refere que não é conveniente efectuar uma análise ex post dos resultados positivos da FT ao apreciar o princípio do investidor prudente. Assim, um investidor privado nunca se teria comprometido financeiramente, sem formular a mínima reserva, numa altura em que o montante total das dívidas do grupo FT não tinha ainda sido aprovado. A BT acrescenta ainda que, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, não é defensável que os compromissos assumidos pelo Estado face à FT correspondam ao comportamento de um investidor prudente exclusivamente devido ao facto de a FT ter passado a ser uma empresa rendível.

diferença de situação entre um investidor privado e o Estado: a BT alega que, dada a situação de crise prolongada da economia mundial e mais especificamente de um sector das telecomunicações em fase de transição, e tendo em conta a importância dos montantes em causa, nenhum investidor privado teria colocado a hipótese de um aumento de capital desta importância sem condições, acrescentando que apenas um Estado com a credibilidade da França poderia assumir tal incerteza. Desta forma, a BT salientou que o financiamento do reforço dos fundos próprios, assegurado a 100 % pela dívida, sem qualquer contribuição dos fundos próprios, teria pesado sobre a notação de qualquer investidor privado que tivesse procedido da mesma forma enquanto, em contrapartida, um Estado apenas pode ser sancionado pelos seus eleitores, que não prosseguem os mesmos objectivos. Os credores e accionistas do investidor privado teriam exigido que o investimento em causa fosse garantido por um plano de actividades com compromissos precisos, entre os quais cessões de activos. A BT conclui que, de qualquer forma, um investidor prudente cujas capacidades financeiras fossem comparáveis às do Estado francês e que emitisse uma tal garantia, não teria inspirado muita confiança aos mercados; além disso, é óbvio que a confiança foi restabelecida devido à qualificação de «dívida soberana» de que beneficiam os compromissos do Estado.

critério de concomitância: a BT defende que o princípio de concomitância não foi respeitado. Com efeito, as Autoridades francesas tomaram a decisão de investimento em 12 de Julho de 2002 e as dificuldades financeiras da empresa, nessa altura, permitem por si só concluir que a recapitalização constitui um auxílio estatal, tanto mais que o Estado adoptou a sua decisão de investimento sem conhecer a situação económica e financeira exacta da FT e antes da elaboração do plano de financiamento. A BT considera que a participação dos investidores privados não era nem certa nem significativa quando o Governo anunciou a sua participação no aumento de capital, mesmo que, na análise, a data da tomada de decisão de investir passe para 5 de Dezembro. Decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, quando os investidores apenas estão dispostos a intervir após as Autoridades terem decidido conceder um auxílio, o facto de esses investidores privados estarem dispostos a intervir na mesma altura, deixa de ser pertinente. Esta intervenção é consequência do apoio dado pelo Estado e não resultado de uma decisão de um investidor privado. Desta forma, no caso em apreço, o facto de um consórcio bancário se ter comprometido a garantir o êxito da operação não pode ser tomado em consideração para concluir que o princípio de concomitância foi respeitado. A decisão de investir tomada pelas Autoridades francesas é firme e incondicional, o mesmo não acontecendo com a decisão dos investidores privados, visto que estes apenas decidiram contribuir após terem obtido, por diversas ocasiões e de forma inequívoca, a garantia de que o Estado participaria também na operação e sobretudo que tomaria todas as medidas para evitar que a FT registasse problemas de financiamento. De qualquer forma, a BT alega que em conformidade com a jurisprudência relativa à decisão Seleco referida no considerando 80, uma participação significativa dos investidores privados não é suficiente, por si só, para excluir a existência de elementos de auxílio. A BT defende igualmente que o investimento do Estado é superior ao montante da sua participação no capital da FT. Por último, a BT alega que o montante muito elevado das comissões bancárias permite reduzir o preço de subscrição das acções para um nível inferior ao resultante da desvalorização.

(87)

No que se refere à afectação da concorrência, a BT alega nomeadamente que as medidas em causa afectaram a concorrência no mercado das telecomunicações móveis. A BT faz essencialmente referência ao facto de o volume da dívida da FT ser consequência do desenvolvimento das actividades das telecomunicações móveis. Desta forma, a Orange não suporta a dívida ligada às suas aquisições, que é integralmente suportada pela empresa mãe. Dotada dos meios necessários para fazer face à sua dívida graças às medidas em causa, a FT permite que a Orange confirme e desenvolva a sua posição nos mercados das telecomunicações móveis. A BT recorda que a Orange ocupa uma posição dominante no mercado francês da telefonia móvel, com uma quota do parque instalado de 49,8 %. A BT especifica nas suas observações de 11 de Abril de 2003 que a estrutura do mercado das telecomunicações móveis em França resulta de uma estratégia de investimento de elevada intensidade de capital conduzida pela Orange (nomeadamente uma estratégia comercial agressiva) em detrimento da sua rendibilidade operacional, graças ao apoio que lhe é concedido pelo Estado através da FT, nomeadamente através dos auxílios em causa no presente procedimento. A BT sublinha igualmente que as medidas em causa afectam a concorrência em todos os mercados das telecomunicações e dissuadem os operadores estrangeiros de proporem os seus serviços em França. Desta forma, a França é o único país europeu onde nenhum operador móvel «estrangeiro» conseguiu estabelecer-se.

(88)

No que se refere à compatibilidade destas medidas, na acepção das Orientações, a BT alega que as medidas de apoio não apresentam o carácter excepcional exigido para poderem ser classificadas como auxílios de emergência, na acepção das Orientações. A BT faz referência ao facto de o plano Ambition 2005 não satisfazer as exigências mínimas previstas nas Orientações. Contém medidas que não podem ser consideradas de emergência, como o recurso ao mercado obrigacionista ou a recapitalização prevista. A BT refere nomeadamente que o montante da recapitalização se afigura excessivo para cobrir apenas as necessidades de exploração da FT a curto prazo, excluindo o reembolso dos créditos subscritos por ocasião do seu desenvolvimento. A BT defende igualmente que o plano Ambition 2005 não é um plano de reestruturação destinado a alterar a estrutura da FT com o objectivo de melhorar a sua rendibilidade, mas que se limita a aumentar a liquidez da empresa a fim de minorar as suas dificuldades actuais. A BT insiste igualmente sobre o facto de as medidas em causa parecerem insuficientes comparativamente com as que foram adoptadas pelos concorrentes do operador histórico, nomeadamente a KPN, a Deutsche Telekom ou a British Telecom, tanto a nível das cessões de activos como das medidas sociais.

(89)

Por outro lado, o plano de reestruturação não contém contrapartidas substanciais que permitam prevenir distorções de concorrência indevidas a fim de compensar o auxílio concedido pelo Estado. A BT salienta nomeadamente o facto de não estar prevista qualquer cessão de activos de valor ou estratégicos. Desta forma, as cessões previstas pela FT limitam-se a activos não estratégicos de um montante muito reduzido (3,5 mil milhões de euros segundo as estimativas da própria FT).

(90)

A título acessório, a BT defende que deviam ser adoptadas medidas compensatórias em benefício dos concorrentes do operador histórico no mercado das telecomunicações móveis e, principalmente, em benefício do último participante cuja presença é indispensável para a existência de uma verdadeira concorrência no mercado francês. A BT propõe nomeadamente como medidas compensatórias na acepção das Orientações, proibir durante 5 anos, que a Orange proponha tarifas inferiores às dos seus concorrentes para ofertas de serviços equivalentes e impor uma auto-limitação das quotas de mercado mensais da Orange, de 33 %, até que a quota de mercado líquida da Orange desça para 40 %. A BT propõe igualmente a limitação da duração dos compromissos subscritos pelos consumidores perante a Orange a 12 meses (aquisição e renovação), o congelamento da extensão da rede GSM e GPRS da Orange, a fim de estabelecer um equilíbrio concorrencial, a obrigação de ceder activos estratégicos e a obrigação de limitar as acções de marketing.

(91)

Nas suas observações de 26 de Maio de 2004, a BT forneceu nomeadamente uma análise económica segundo a qual, tendo em conta a atitude específica dos Estados (variável segundo a sua própria credibilidade), o apoio estatal tem um âmbito substancialmente diferente do apoio de um accionista maioritário. A análise salienta igualmente que a intervenção estatal se insere numa longa tradição e que é analisada com base numa reputação já estabelecida. Segundo a BT, é óbvio que o Estado, ao apoiar a FT, põe em jogo a sua reputação e, por conseguinte, a sua aptidão para intervir de novo em favor de outras empresas francesas. A análise salienta igualmente que a questão da credibilidade do Estado francês deverá ser analisada em articulação com a especificidade da situação francesa em matéria de privatização. Se o Estado não tivesse concedido o seu apoio ficaria impedido de actuar posteriormente, o que aliás fez rapidamente no que se refere à Alstom.

(92)

A BT forneceu igualmente uma análise centrada na questão de saber se as declarações do Estado tinham um efeito vinculativo nos termos do direito do Estado de Nova Iorque, em que a empresa está igualmente cotada. Segundo esta análise, é provável que tais declarações sejam consideradas vinculativas, quer como contrato unilateral, quer nos termos do princípio de estoppel.

(93)

A BT forneceu igualmente um estudo quanto à questão de saber se declarações semelhantes provenientes do Governo inglês teriam um carácter vinculativo em direito inglês. Este estudo conclui que tais declarações seriam vinculativas ou imporiam ao Estado o dever de justificar uma alteração de posição.

4.6.   Observações da Cable & Wireless

(94)

A Cable & Wireless referiu que as medidas em causa constituem um auxílio estatal. A confiança do mercado na sequência do anúncio da concessão do adiantamento de accionista pelas Autoridades francesas foi suficiente para proporcionar uma vantagem à FT. Na medida em que um investidor privado prudente não teria tomado a decisão de recapitalizar uma empresa como a FT, que era claramente ineficiente antes da adopção do plano Ambition 2005, a FT beneficiou de uma vantagem que não teria obtido em condições normais de mercado. A Cable & Wireless salientou igualmente o precedente perigoso que constituiria o facto de deixar um Governo garantir todos os problemas financeiros das empresas públicas e a dinâmica negativa que daí adviria para a concorrência. A Cable & Wireless acrescentou ainda que estas medidas não podiam ser consideradas compatíveis na acepção das Orientações. Uma vez que a empresa não se encontra em dificuldades financeiras, as Orientações não são aplicáveis.

4.7.   Observações da AFORS Télécom

(95)

A AFORS Télécom (Associação Francesa dos Operadores de Redes e Serviços de Telecomunicações) observou que as medidas em causa constituíam um auxílio estatal tendo, mais precisamente, alegado o seguinte:

(96)

Através de uma série de decisões progressivas durante 2002 — entre as quais o facto de o Estado ter optado por uma remuneração dos dividendos de 2002 em acções e não em numerário — até à abertura de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros colocada à disposição da FT através do ERAP, as Autoridades francesas restabeleceram a confiança dos investidores ao concretizarem o seu apoio. A AFORS Télécom salienta igualmente que, mesmo que nunca fosse utilizada pela FT, a linha de crédito aberta pelo ERAP simboliza a garantia de um apoio do Estado e mobiliza deste modo recursos estatais, na acepção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado.

(97)

As condições de concessão e de remuneração da linha de crédito não preenchem as condições do princípio do investidor privado prudente. A AFORS Télécom alega que as dificuldades financeiras da FT registadas a partir de 2000 não teriam ocorrido em presença de um investidor prudente. Desta forma, o Estado não assumiu o seu papel de «guarda» e permitiu que a FT aumentasse a sua dívida em proporções nunca antes atingidas. A AFORS Télécom observa que a estratégia anterior de aquisições da FT foi seguida sem uma avaliação dos riscos inerentes, uma vez que o Estado enquanto accionista assegurava à FT o seu apoio contra qualquer perspectiva de falência.

(98)

O apoio do Estado teve por efeito impedir qualquer deterioração suplementar da notação da FT por parte das agências de notação, o que permitiu acelerar o regresso da empresa ao mercado e o refinanciamento da sua dívida em condições financeiras menos onerosas. A FT beneficiou de uma vantagem que a AFORS Télécom quantifica em 1,5 mil milhões de euros (71). Desta forma, foi a credibilidade do Estado francês, dotado de uma excelente fiabilidade creditícia, e não a credibilidade do plano de reestruturação que determinou as condições do regresso da FT aos mercados financeiros. Por outro lado, o apoio do Estado teve a vantagem de evitar que a FT alterasse o seu perímetro estratégico.

(99)

O plano Ambition 2005 é composto por orientações e não por compromissos claramente definidos, vinculativos e irreversíveis e não pode ser comparado com os processos de reestruturação realizados na Europa, nomeadamente pela British Telecom.

(100)

As vantagens obtidas pela FT fazem com que as distorções de concorrência prejudiciais afectem os membros da AFORS Télécom. Segundo a AFORS Télécom, o auxílio concedido pelo Estado francês reforça as práticas anticoncorrenciais já existentes, extremamente prejudiciais para os operadores alternativos. A AFORS Télécom menciona nomeadamente a utilização exclusiva da rede de distribuição da FT pela Orange e pela Wanadoo, as ofertas de desagregação que beneficiam sistematicamente a Wanadoo e a FT e a posição de monopólio detida pela FT no mercado dos serviços com receitas partilhadas (fornecimento aos consumidores de conteúdos com valor acrescentado acessíveis por telefone). A AFORS Télécom refere seguidamente que o auxílio estatal implicava um risco real de prolongamento destes comportamentos.

(101)

Deviam ser impostas contrapartidas à FT, com o objectivo, por um lado, de aproximar o comportamento do Estado ao de uma empresa que deve restabelecer as suas capacidades financeiras sem beneficiar de um auxílio excepcional e, por outro, de restabelecer uma concorrência equitativa. Trata-se nomeadamente de (1) restringir os investimentos da FT aos de uma empresa endividada, ou seja, por exemplo, limitar a política de investimento global da FT aos investimentos com um período de recuperação inferior a 12 meses para as actividades a retalho; (2) criar estruturas transparentes entre cada actividade do grupo; e (3) impedir a afectação do auxílio estatal a uma «guerra» tarifária, por exemplo, através da publicação sistemática das ofertas retalhistas por medida.

4.8.   Observações da Cégétel

(102)

A Cégétel defende que existem duas medidas de auxílio distintas: (1) por um lado, o anúncio, pelas Autoridades francesas, da concessão de um adiantamento de accionista em benefício da FT e (2) por outro lado, a participação do Estado na recapitalização da FT.

(103)

No que se refere à primeira medida, a Cégétel afirma a título preliminar que a situação de uma empresa com um accionista de referência privado e a de uma empresa com um accionista maioritário público não podem ser comparadas. A Cégétel precisou que um anúncio semelhante feito por um accionista privado teria sido acolhido com a maior prudência pelas agências de notação e tê-las-ia levado a interessar-se de perto pelas modalidades de refinanciamento, pelo accionista em causa, da linha de crédito assim criada. A Cégétel conclui que o mero facto de estar ligada ao Estado implica, por si só, uma vantagem considerável face aos investidores e impediu a deterioração suplementar da notação da FT por parte das agências de notação, numa altura em que o operador se encontrava, à priori, numa situação sem solução. A Cégétel defende que se justifica que a Comissão considere que o Estado francês concedeu um auxílio à FT, mesmo antes da assinatura de uma convenção relativa à concessão de uma linha de crédito num montante de 9 mil milhões de euros, uma vez que o anúncio do apoio foi suficiente para tornar inútil este financiamento de urgência. Desta forma, os mutuantes tinham a certeza de que a FT nunca se poderia encontrar numa situação de incumprimento de pagamento, porque o Estado estaria sempre disposto a conceder-lhe os fundos necessários para honrar os seus compromissos, o que permitiu que a FT obtivesse directamente financiamento no mercado. A Cégétel conclui relativamente a este ponto que as declarações governamentais foram formuladas para que os mercados tivessem a certeza de que conceder empréstimos à FT era rigorosamente equivalente a conceder empréstimos directamente ao Estado. A FT pôde assim beneficiar de vantagens que não teria obtido em condições normais de mercado, nomeadamente em comparação com a situação da Vivendi Universal. O recurso ao mercado obrigacionista permitiu-lhe evitar recorrer exclusivamente às instituições financeiras para fazer face à sua crise de liquidez, evitando todas as limitações relacionadas com este tipo de financiamento. A Cégétel defende que as condições de concessão da linha de crédito pelas Autoridades francesas não estão em conformidade com as impostas por um investidor prudente relativamente a uma das suas participações. Mais especificamente, um investidor prudente não teria nunca aceite a política de financiamento das aquisições através de endividamento, que conduziu a FT a uma situação financeira de tal forma crítica que o Estado teve de proceder a uma recapitalização. A Cégétel faz referência à decisão Crédit Lyonnais II, na qual a Comissão especifica que as medidas de auxílio não podem ser imputáveis às omissões do Estado accionista durante vários anos (72). Por outro lado, segundo a Cégétel, a escolha de fazer transitar os auxílios pelo ERAP, não corresponde ao comportamento de um investidor prudente. A este respeito, a Cégétel salienta em especial a taxa de juro aplicável aos saques sobre o adiantamento e a ausência de cauções e garantias. No que se refere à quantificação do auxílio relativo ao adiantamento de accionista, a Cégétel defende que se aplica o 4.o parágrafo do ponto 3.2 da Comunicação relativa aos auxílios estatais sob forma de garantias e que, visto que graças ao apoio do Estado a FT pôde contrair um empréstimo de 16 mil milhões de euros para fazer face aos seus compromissos numa altura em que a sua situação financeira era catastrófica, o montante do auxílio equivale ao montante obtido graças a este anúncio.

(104)

A Cégétel alega que deve ser aplicado o mesmo raciocínio à recapitalização que na sua opinião corresponde, de um ponto de vista económico, à transferência de 9,2 mil milhões de euros de dívidas da FT para o ERAP, que beneficia da garantia do Estado. A Cégétel contabiliza a totalidade deste montante como auxílio. Salienta igualmente o montante do auxílio correspondente aos custos dos despedimentos, que uma empresa teria de suportar ao proceder a uma redução de efectivos, ou seja, 1,5 mil milhões de euros, que não estariam a cargo do operador histórico devido à transferência dos trabalhadores da FT para a administração pública, prevista no plano Ambition 2005.

(105)

Por outro lado, a Cégétel alega que a FT beneficia de uma garantia formal, na medida em que o Tribunal de Cassação considera que as empresas de direito privado dotadas de um estatuto legislativo especial não estão sujeitas aos procedimentos de liquidação judiciária em vigor (por exemplo, a SEITA ou a Air France). Desta forma, tendo em conta esta jurisprudência, deve considerar-se que a FT não é abrangida pelo regime de direito comum. A Cégétel reconhece que a FT deixou de beneficiar do seu estatuto de EPIC desde 1996, mas observa que na realidade a garantia não desapareceu, uma vez que as Autoridades estatais tentaram, através das suas declarações reiteradas, convencer os mercados de que a FT contaria, em todas as circunstâncias, com o apoio do seu accionista de referência e que, se fosse necessário, o Estado auxiliaria o operador a fazer face às suas obrigações em matéria de pagamentos (73).

(106)

Por último, a Cégétel afirma que as medidas não podem ser consideradas compatíveis na acepção das Orientações. A Cégétel recorda que, segundo as Orientações, quando o Estado procede a uma injecção de capital numa empresa em dificuldade, «deve considerar-se que é provável que as transferências financeiras contenham elementos de auxílio estatal» (74). A Cégétel precisa que as contrapartidas adoptadas pela FT não podem ser consideradas suficientes face às Orientações. Por exemplo, o plano Ambition 2005 não contém qualquer vector específico relativo a cessões de activos ou a um plano social. A título acessório, a Cégétel propõe nomeadamente as seguintes contrapartidas no mercado das telecomunicações fixas: (i) a revenda dos serviços de acesso à linha local de assinantes e dos serviços associados, bem como (ii) o reforço da separação entre a FT e as empresas Orange e Wanadoo.

4.9.   Observações da LDCOM (75)

(107)

A LDCOM identifica um mecanismo duplo de auxílio em benefício da FT, acompanhado de um apoio à mobilidade dos efectivos: (i) concessão de uma garantia ilimitada; e (ii) concessão de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros.

(108)

Concessão da garantia ilimitada: A LDCOM baseia-se no conteúdo das declarações das Autoridades francesas publicadas na imprensa a partir de 20 de Junho de 2002, em comunicados da imprensa do Ministério das Finanças e Economia e em comunicados dirigidos directa ou indirectamente às agências de notação. Estas declarações, que se destinam a tranquilizar os mercados financeiros relativamente à situação da FT (76), contribuíram directamente para a melhoria da notação da FT nos mercados e permitiram-lhe fazer face à «à barreira à liquidez» que afectava a empresa. Segundo a LDCOM, a intervenção do Estado poderá ter diversas qualificações jurídicas. No que se refere ao direito francês, a LDCOM recorda que a criação de uma obrigação jurídica não implica qualquer exigência formal e que uma declaração oral pode consequentemente, em determinadas condições, constituir um acto jurídico gerador de um direito para o seu destinatário. Com efeito, a força obrigatória do acto unilateral baseia-se na teoria da assumpção de um compromisso por vontade unilateral, que constitui uma fonte do direito das obrigações. Esta obrigação ocorre desde que esteja preenchida a seguinte condição dupla: a vontade deve ter um carácter firme e preciso. A LDCOM afirma igualmente que a responsabilidade do Estado decorre nomeadamente, em direito das sociedades, da análise da teoria do mandato aparente e do dirigente de facto, nomeadamente no que se refere ao último ponto, por ter directamente contactado as agências de notação. Quanto ao direito internacional, a responsabilidade contratual do Estado intervém igualmente na medida em que um acto jurídico unilateral tem força obrigatória quando se pode demonstrar que a declaração foi expressa publicamente com intenção de vincular o seu autor (77). Desta forma, uma simples declaração oral e pública formulada por um Estado pode assim criar, para este último, uma obrigação jurídica. No caso em apreço, segundo a LDCOM, o conteúdo das declarações vincula as Autoridades francesas, uma vez que os termos utilizados constituem um compromisso unilateral do Estado, claro e inequívoco, para se constituir como mutuante em última instância da FT e para não deixar esta última na crise financeira em que se encontrava no Verão de 2002. Uma vez que o compromisso do Estado tem um carácter vinculativo, qualquer incumprimento desse compromisso é susceptível de pôr em jogo a sua responsabilidade contratual (os terceiros teriam podido forçar o Estado a executar o seu compromisso).

(109)

A LDCOM afirmou que a responsabilidade delitual do Estado estava também em jogo, nomeadamente no que se refere ao direito das sociedades. Desta forma, uma empresa que dá a aparência de assumir as dívidas de uma outra empresa cria um crédito a seu respeito no património dos terceiros. Ora, segundo a LDCOM, através das suas declarações o Estado deu aos terceiros a garantia de que assumiria a dívida da FT cujo vencimento estava próximo. Mais precisamente, a LDCOM alega que as declarações do Estado, segundo as quais contribuiria «por seu turno, para um reforço significativo dos fundos próprios da empresa (78)», criam uma obrigação para o Estado, que faz intervir a sua responsabilidade jurídica e financeira (79). Segundo a doutrina: «se o Estado não respeitar o compromisso assim assumido, a sua responsabilidade deveria incontestavelmente intervir, podendo ser invocada perante os tribunais administrativos no âmbito do contencioso das promessas do Estado não cumpridas» (80). Por outro lado, a LDCOM precisou que o terceiro parágrafo do artigo L465-1 do código monetário e financeiro sanciona as pessoas que falseiam o funcionamento normal dos mercados através de acções ilícitas que influenciam a evolução das cotações da bolsa. Por conseguinte, segundo a LDCOM, a incidência desta qualificação revela bem que o Estado não pretendia de forma alguma proceder a um anúncio de futuros factos hipotéticos, mas que anunciava efectivamente o seu comportamento futuro.

(110)

Segundo a LDCOM, a jurisprudência comunitária confirma igualmente que qualquer artigo de imprensa proveniente da empresa interessada em causa ou do Governo, que tenha carácter incondicional, demonstra necessariamente a colocação à disposição de recursos estatais (81). Ora, no caso em apreço, as declarações provêm directamente do Governo e têm carácter incondicional.

(111)

Resulta do que precede que as declarações juridica e financeiramente vinculativas de apoio das Autoridades francesas proferidas a partir de 2 de Junho de 2002 correspondem a uma garantia, cujo objecto é evitar a falência da FT e permitir a sua sobrevivência no seu perímetro de actividades. Trata-se, segundo a LDCOM, de uma garantia ilimitada. A LDCOM precisa que não é só a colocação à disposição de uma linha de crédito e o montante desta forma concedido que constituem auxílios, mas também o próprio anúncio desta colocação à disposição. Nos termos da Comunicação relativa aos auxílios estatais sob forma de garantias, o critério relativo aos recursos estatais encontra-se preenchido quer se recorra ou não à garantia. Considerando que as medidas em causa não preenchem os critérios dessa Comunicação, uma vez que a FT não podia obter os fundos necessários nos mercados, a LDCOM observa que as medidas em causa constituem um auxílio. A LDCOM alega igualmente que «tendo em conta os montantes em jogo, só o Estado poderia estar em condições de fornecer uma garantia deste tipo, uma vez que nenhum investidor prudente poderia assegurar a credibilidade, face aos mercados, da “recuperação” da FT» (82). Por último, a LDCOM sublinha que uma análise noutro sentido teria pesadas consequências, na medida em que não só seria contrária aos princípios do direito positivo interno, mas daria ainda, aos Estados-Membros, a possibilidade de apoiarem impunemente a cotação na bolsa das empresas em que detêm uma participação (83).

(112)

O efeito desta garantia ilimitada tem claramente repercussões no mercado e a reacção deste último corresponde ao valor que os investidores atribuem efectivamente a esta garantia. Desta forma, a cotação na bolsa das acções da FT aumentou a partir de Julho de 2002, o que provocou um aumento da capitalização bolsista do operador. A LDCOM adianta que o aumento de valor provocado pelo anúncio do Estado representa 5,9 mil milhões de euros. Além disso, os spreads  (84) da FT começaram a registar uma melhoria a partir de Julho de 2002, diminuindo assim os encargos financeiros do operador e permitindo a reconstituição da sua capacidade financeira. Esta variação nos spreads permite avaliar concretamente o peso financeiro do anúncio do Estado, devendo aliás ser extrapolada para o conjunto da dívida da FT financiada através de empréstimos obrigacionistas. A variação dos spreads situa-se, consoante o caso em apreço, entre 2 e 3 %, o que representa uma economia anual de 1,37 a 2,05 mil milhões de euros. Partindo do pressuposto de que a FT manterá um nível de endividamento constante e que, por consequência, a dívida será financiada perpetuamente, a LDCOM avalia que o impacto das economias assim realizadas se situa entre 19,57 e 29,36 mil milhões de euros. Por outro lado, o apoio do Estado permitiu que a FT obtivesse refinanciamentos nos mercados obrigacionistas em condições mais vantajosas do as que teria obtido anteriormente.

(113)

Anúncio da colocação à disposição da linha de crédito num montante de 9 mil milhões de euros: a LDCOM não efectuou uma análise desta medida face ao n.o 1 do artigo 87.o do Tratado e remete para a análise da Comissão na sua decisão de início do procedimento, insistindo sobre o papel do ERAP.

(114)

Segundo a LDCOM, o Estado não pode invocar a aplicação do critério do investidor prudente relativamente ao apoio que concedeu, tanto devido ao seu montante como devido às suas modalidades ou mesmo ao seu objectivo. Desta forma, nenhum investidor prudente teria, em Setembro de 2002 (data em que o Estado anunciou que iria apoiar financeiramente a FT), avançado 9 mil milhões de euros nestas circunstâncias económicas, sem se basear num plano de reestruturação. Além disso, a LDCOM explicou que nenhum investidor prudente teria a capacidade financeira para mobilizar tais quantias num período tão limitado. A LDCOM precisou igualmente que, para um investidor privado, a manutenção da integridade da estrutura operacional de um grupo constitui um meio ao serviço do objectivo da rendibilidade do seu investimento. No caso em apreço, trata-se, para as Autoridades francesas, de um fim em si mesmo. É compreensível que o Estado tenha em conta estes aspectos sociais e políticos, mas uma tal apreciação na sua intervenção constituiria uma infracção ao princípio da igualdade entre os sectores público e privado.

(115)

Por outro lado, segundo a LDCOM, a posição do Estado segundo a qual um investidor prudente maioritário não teria posto em causa a integridade funcional da FT não resiste à análise do comportamento de tal investidor nas condições reais de mercado que existiam em Junho-Julho de 2002. Assim, os investidores que tivessem investido uma parte extremamente importante dos seus activos numa empresa susceptível de se encontrar numa situação de falência vão, em primeiro lugar, exigir uma revisão radical e imediata da estratégia que poderá, se necessário, incluir significativas cessões de activos estratégicos. A pertinência desta análise pode ser confirmada, comparando a situação em que a FT se teria encontrado sem o apoio do Estado e a da Vivendi Universal que se viu obrigada, sob pressão dos mercados, a rever o seu perímetro de activos. Desta forma, a LDCOM defende que a Comissão deve não só recusar tomar como ponto de partida a manutenção da integridade funcional do grupo, mas também analisar os efeitos da manutenção desta integridade como a verdadeira distorção da concorrência. A LDCOM afirma que em Julho de 2002, sem a intervenção estatal, a FT não teria tido outra opção senão reduzir o seu perímetro de activos, efectuar despedimentos (85) e rever os seus objectivos estratégicos.

(116)

A LDCOM avalia o montante total do auxílio em 15 mil milhões de euros, o que corresponde ao montante que a FT conseguiu obter nos mercados financeiros graças ao auxílio concedido pelo Estado. Assim, o montante do auxílio não pode, com efeito, estar limitado aos 9 mil milhões de euros directamente fornecidos pelo Estado, uma vez que foi através das diferentes intervenções estatais (garantia ilimitada, adiantamento de accionista e retoma de efectivos) que a FT pôde proceder a tal aumento de capital.

(117)

Segundo a LDCOM, o auxílio concedido pelo Estado constitui um auxílio à reestruturação. A LDCOM estabeleceu uma comparação entre a situação anterior e posterior à intervenção pública nos mercados da telefonia vocal, do acesso Internet de elevado débito e do acesso Internet de baixo débito e a situação que se teria verificado na ausência da intervenção pública. Esta comparação confirma que o auxílio teve efectivamente como efeito manter o statu quo ante numa perspectiva até 2005 (capacidades operacionais e de marketing intactas), o que permite, por dedução, quantificar em termos de quotas de mercado alguns dos efeitos da intervenção pública. A LDCOM propôs nomeadamente, em conformidade com o ponto 35 das Orientações, impor à FT medidas de correcção cujo efeito deveria consistir em repor a situação que se verificaria no mercado caso a FT tivesse sido obrigada a proceder espontaneamente a uma alteração do seu perímetro de actividades. Na medida em que, segundo a LDCOM, o Estado fixou como principal objectivo manter a FT como operador integrado de telecomunicações, os principais mercados afectados são os da telefonia móvel e os da telefonia fixa, tanto a montante (interconexão, acesso DSL) como a jusante (venda retalhista de comunicações, acesso Internet por DSL, nomeadamente). A LDCOM propôs por conseguinte que a Comissão adopte medidas, a nível do comportamento, susceptíveis de limitar a distorção da concorrência assim provocada e de permitir que os operadores alternativos disponham das condições de que teriam beneficiado na ausência de auxílios. A LDCOM propõe assim a redução das quotas de mercado da FT e das suas filiais no mercado da Internet de elevado débito (máximo de 42 % do mercado da venda do acesso Internet de elevado débito por DSL, em termos de valor) e no mercado das telecomunicações vocais (máximo de 55 % do mercado das comunicações locais, vocais e nacionais, em termos de valor), bem como uma série de medidas destinadas a impor uma limitação das quotas de mercado da FT (86). A segunda categoria de medidas propostas pela LDCOM consiste na imposição de medidas destinadas a permitir o desenvolvimento de concorrentes (87).

(118)

Nas suas observações de 17 de Maio de 2004, a LDCOM precisou que as declarações do Ministro da Economia e Finanças constituíam um acto estatal unilateral cujo incumprimento seria sancionado em direito internacional. A LDCOM precisou igualmente que a proibição de se contradizer em detrimento de outrém (estoppel), constitui um princípio geral do direito comercial internacional a que o Estado está sujeito. A LDCOM precisa neste contexto que a sua aplicabilidade ao caso em apreço é incontestável tendo em conta que, neste caso, o Estado francês actua enquanto accionista e, por conseguinte, também como operador do comércio internacional.

(119)

A LDCOM sublinhou igualmente que o Estado não podia voltar atrás nas suas declarações sem prejudicar a sua própria credibilidade financeira. Com efeito, ao intervir no mercado, o Estado assume um papel de mutuário e um papel de accionista maioritário de diversas empresas. Este duplo papel implica uma notação dupla por parte das agências de notação, tanto enquanto mutuário como enquanto accionista, através das notações dadas às empresas públicas. Esta dupla possibilidade de intervenção pressupõe uma vigilância particular, uma vez que qualquer incumprimento verificado numa destas qualidades é susceptível de ter consequências na outra e na notação (a LDCOM faz referência à avaliação das empresas públicas feita pela Moody’s). A LDCOM salienta igualmente o facto de a credibilidade do Estado ser fundamentalmente diferente daquela de que podem beneficiar outras empresas que se encontram numa situação análoga e que não podem tranquilizar o mercado (caso da Vivendi Universal). A segurança que representam, para os mercados financeiros, os empréstimos públicos franceses justifica assim a confiança incondicional que os investidores consagraram às declarações do Estado, uma vez que o Estado respeitou sempre os seus compromissos. A tomada em consideração do apoio do Estado na sequência do contacto directo com as agências de notação, que desempenham um papel extremamente importante na determinação do risco inerente a um investimento financeiro, faz salientar a credibilidade do apoio que o Estado concedeu à FT. A LDCOM sublinha igualmente que a notação do Estado atinge a nota máxima de Aaa, uma vez que o Estado honra os seus compromissos. A LDCOM salienta que a anulação de um compromisso por parte do Estado provocaria uma baixa da sua notação, o que implicaria a reavaliação dos juros da dívida pública. Da mesma forma, a anulação de um compromisso assumido perante uma empresa pública poderia ter consequências sobre a notação de todas as outras.

4.10.   Observações de B

(120)

Segundo B, a colocação à disposição dos fundos, acompanhada do compromisso público do Estado de apoiar a FT, é equiparável à concessão de uma garantia financeira susceptível de tranquilizar não só os credores da empresa, mas também todo o mercado, o que contribuiu para melhorar a situação da FT face aos mercados bolsistas. Desta forma, B concluiu que a medida em causa foi concedida através de recursos estatais. Uma vez que não se pode considerar que o comportamento do Estado equivale ao de um investidor privado em economia de mercado, a empresa beneficiou de uma vantagem que não teria podido obter em condições normais de mercado. Desta forma, no momento da abertura da linha de crédito a situação financeira da FT era tal que nenhum investidor prudente teria procedido a uma operação deste tipo. Do mesmo modo, B alega que o princípio de concomitância não foi respeitado, precisando que a participação dos investidores privados apenas foi possível devido ao anúncio e à colocação à disposição de um adiantamento de accionista de um montante de tal forma colossal que nenhum investidor privado estaria em condições de proceder a uma tal mobilização de capitais. B sublinha que as medidas de apoio tranquilizaram os investidores privados quanto ao facto de poderem excluir qualquer risco de falência da FT. B defende igualmente que o montante da recapitalização da FT (num valor compreendido entre 80 e 100 % da sua valorização na bolsa) é de tal ordem que não se pode colocar a hipótese de que um investidor privado procederia a uma operação desta envergadura, tendo em conta a situação económica da FT, na ausência das declarações de apoio e das medidas de pré-financiamento adoptadas pelo Governo.

(121)

B defende que as medidas não podem ser consideradas compatíveis na acepção das Orientações. A título acessório, B propôs contudo medidas de compensação, nomeadamente no mercado da telefonia fixa, no mercado do acesso à Internet e no mercado da telefonia móvel. B precisou igualmente as diferentes restrições ao desenvolvimento concorrencial no mercado francês (88). No que se refere ao mercado da telefonia fixa, B preconiza nomeadamente a separação contabilística e a aplicação de uma verdadeira economia de gestão às actividades de redes da FT, a fim de evitar o prosseguimento de práticas anti-concorrenciais. B propõe igualmente que seja imposta à FT uma obrigação de informação dos assinantes do serviço telefónico fixo, quanto à possibilidade de escolherem um outro operador para o encaminhamento das suas chamadas telefónicas, a fim de atenuar «a formidável “alavanca concorrencial” que lhe proporciona a sua posição quase-monopolística no mercado do acesso à rede telefónica e nos mercados do encaminhamento das comunicações telefónicas». No que se refere ao mercado da telefonia móvel, B propõe nomeadamente a obrigação, imposta à Orange, de fornecer uma oferta de MVNO (Mobile Virtual Network Operator) aos operadores que desejem penetrar neste mercado.

4.11.   Observações da Tiscalinet

(122)

A Tiscalinet afirmou que as declarações do Estado formuladas a partir de 2 de Julho de 2002 indicam ao mercado que se pode excluir o risco de um processo de recuperação judiciária da FT. Paralelamente, a opção tomada pelo Estado no sentido de os seus dividendos de 2002 serem remunerados em acções e não em numerário constitui uma outra indicação do Estado, dirigida ao mercado, do seu apoio à FT, numa situação em que um investidor prudente teria optado pela remuneração em numerário desses dividendos. A Tiscalinet acrescenta também que a intervenção do Ministério da Economia e Finanças junto da Caisse des Dépôts et Consignations, que detém 5 % do capital social do operador histórico, para que bloqueie os títulos a fim de os tornar menos voláteis e reforçar a confiança dos investidores, suscita a questão de saber qual o investidor privado que teria podido agir desta forma. A Tiscalinet sublinha igualmente que todas as medidas legislativas destinadas a alargar o objecto social do ERAP, a fim de lhe permitir deter as acções da FT (89), a concessão de uma garantia estatal em benefício do ERAP para lhe permitir investir na FT (90) e, por último, o texto sobre as modalidades de detenção, pelo Estado, do capital social da FT consolidam a análise do carácter irrevogável da garantia do Estado, em que se basearam os intervenientes dos mercados e, mais particularmente, os detentores de obrigações, para subscrever as sucessivas emissões lançadas pela FT desde essa data. Estes elementos corroboram o facto de que o Estado se coloca como «mutuante em última instância» face à FT, operação que um investidor prudente não teria subscrito. Segundo a Tiscalinet, apenas o Estado francês estaria em condições de mobilizar tais recursos.

(123)

A Tiscalinet defende que a garantia dada pelo Estado e a subscrição do aumento de capital que nenhum investidor privado prudente teria realizado, permitiram que a FT evitasse significativas cessões de activos, exclusivamente com o objectivo de conservar o seu perímetro de actividades e de beneficiar de taxas obrigacionistas relativamente reduzidas em relação à sua situação financeira intrínseca.

(124)

Os auxílios são incompatíveis com as Orientações. A Tiscalinet alega que as condições de concessão de um auxílio à reestruturação não estão preenchidas, nomeadamente porque o plano Ambition 2005 não contém contrapartidas suficientes para preservar a concorrência. A Tiscalinet salienta as distorções de concorrência provocadas pelo apoio do Estado francês no que se refere ao mercado do acesso Internet de elevado débito. A Tiscalinet defende que a FT pode realizar investimentos de grande envergadura em certos elementos de rede e no orçamento publicitário, o que vem beneficiar a Wanadoo. Além disso, a Wanadoo não teve de ceder activos importantes e continua a beneficiar das receitas das páginas amarelas e também da rede de agências comerciais da FT. A Tiscalinet sublinhou ainda que a estratégia adoptada pela FT, nomeadamente no que se refere ao lançamento da oferta pública mista simplificada de aquisição e de troca relativa às acções da Wanadoo, de 11 de Março de 2004, proporciona à FT um auxílio fiscal de que não teria beneficiado sem as medidas de apoio do Estado. A Tiscali insiste, por outro lado, na sua carta de 5 de Abril de 2004, sobre a estratégia anticoncorrencial seguida no mercado da DSL em França, graças ao auxílio inicial do Estado francês.

(125)

A título acessório, caso os auxílios fossem considerados compatíveis nos termos das Orientações, a Tiscalinet propõe contrapartidas essencialmente no mercado do acesso Internet de elevado débito, como a fixação de um preço mínimo para as ofertas ADSL a retalho da FT às suas filiais, a proibição de apresentar propostas agrupadas entre os serviços da FT e os da Wanadoo, a proibição de distribuição dos serviços da Wanadoo nas agências comerciais da FT e a cessão das páginas amarelas e das filiais estrangeiras da Wanadoo.

4.12.   Observações de D

(126)

D apresentou um documento intitulado «Relatório intercalar sobre a realização dos compromissos da campanha eleitoral do Presidente Jacques Chirac nos domínios da indústria, energia, telecomunicações e da La Poste, em Junho de 2003». No que se refere à FT, o documento menciona que: «Graças ao apoio firme do Estado e à nomeação de Thierry Breton, a France Télécom não se limitou a sair de uma asfixia mortal.»

4.13.   Observações da FT

(127)

A FT apresentou observações sob a forma de três relatórios: (i) relatório redigido por C.D. Ehlermann, de 12 de Janeiro de 2004«Parecer à atenção da France Télécom»; (ii) relatório redigido pelo Sr. Galmot, de 6 de Janeiro de 2004«A jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias permite admitir que “as medidas financeiras adoptadas pelo Estado em apoio da France Télécom” relativamente às quais a Comissão deu início ao procedimento previsto no n.o 2 do artigo 88.o do Tratado corresponderam a uma “transferência de recursos estatais” em benefício desta empresa?»; e (iii) relatório do HSBC «Parecer do HSBC, de 6 de Janeiro de 2004». Segue-se uma descrição resumida destes três relatórios.

(128)

O primeiro relatório analisa o comportamento das Autoridades francesas relativamente às regras aplicáveis aos auxílios estatais, em geral, e ao princípio do investidor prudente, em especial. Os argumentos desenvolvidos neste relatório, que pretende demonstrar que a declaração de 5 de Dezembro de 2002 relativa ao adiantamento de accionistas não afecta os recursos estatais, são essencialmente os seguintes: (i) o anúncio do adiantamento de accionista de Dezembro de 2002 não constitui um compromisso irrevogável (mas sim uma simples declaração de intenção) e é condicional. Por conseguinte, o anúncio não constitui uma garantia e ainda menos uma garantia ilimitada; (ii) a decisão Crédit Foncier de França (acima citada) não constitui um precedente válido e, por outro lado, diz respeito a uma declaração que não se pode comparar ao anúncio de Dezembro de 2002. O relatório pretende além disso demonstrar que a FT não era uma empresa em dificuldades financeiras, na acepção das Orientações, no momento em que o Estado decidiu participar na recapitalização e anunciou a sua intenção de conceder um adiantamento de accionista. O relatório salienta que é normal e habitual que o accionista maioritário conceda um adiantamento para antecipar a sua participação na recapitalização.

(129)

O segundo relatório centra-se na questão de saber se um simples anúncio de colocação à disposição de um adiantamento de accionista sob a forma de linha de crédito pode, enquanto tal, constituir uma afectação de recursos estatais. O relatório salienta que, segundo a tese da Comissão, um anúncio irrevogável de um compromisso de concessão de um adiantamento, juntamente com a sua aparente colocação à disposição, são suficientes para determinar que foram afectados recursos estatais, o que corresponde ao conceito de medida de efeito equivalente a um auxílio estatal, já rejeitado pelo Tribunal de Justiça. Segundo o relatório, não existe uma transferência de recursos do Estado porque, em última análise, a abertura da linha de crédito não se concretizou nem foi concedida qualquer garantia, para a qual teria sido necessária uma autorização através de uma lei de finanças. Por outro lado, não se verificou uma transferência de recursos estatais porque, em direito francês, nenhuma declaração oral de uma autoridade pública pode provocar o mínimo efeito sobre as finanças públicas nem provocar a menor transferência de recursos estatais e, no caso em apreço, trata-se de simples declarações ministeriais, sem qualquer impacto negativo sobre as finanças públicas.

(130)

O terceiro relatório concentra-se sobre a justificação económica do comportamento do Estado entre 4 de Setembro de 2002 (anúncio dos resultados do primeiro semestre) e 15 de Abril de 2003 (realização do aumento de capital). O relatório baseia-se numa análise da situação da FT em Setembro de 2002 e estabelece uma distinção entre, por um lado, os resultados de exploração da FT (actividades sãs com um potencial de melhoria do cash flow operacional) e, por outro lado, o montante da dívida do operador (nível de endividamento, escalonamento da dívida, capitais próprios consolidados negativos resultantes de prejuízos ligados a elementos não recorrentes). O relatório conclui relativamente a este ponto que o desfasamento, em termos de tempo, entre a geração de cash flow do grupo e as pesadas obrigações financeiras a curto prazo (2003-2005) coloca um problema de refinanciamento, mas não um problema de solvabilidade.

(131)

O HSBC descreve igualmente o contexto da crise de liquidez a curto prazo, agravado por uma crise de confiança do mercado relativamente ao grupo. O HSBC precisa que, numa situação deste tipo, a razão impunha urgência, preconizando a elaboração de um plano destinado a melhorar os resultados de exploração, um aumento do capital, um reescalonamento da dívida e uma política efectiva de cessão de activos. O HSBC precisa que, no caso em apreço, o plano Ambition 2005 é um plano coerente, completo e racional porque permite nomeadamente gerar 15 mil milhões de euros de cash flows através de uma melhoria operacional e uma cessão de activos que não afecta as actividades principais. O HSBC salienta que um aumento de capital destinado a apoiar uma empresa que adopta um plano de recuperação operacional constitui uma solução natural para reequilibrar o balanço. O HSBC sublinha que o apoio oral de um accionista maioritário é igualmente usual e racional e que é normal e corrente que os accionistas de referência anunciem a sua decisão antes dos outros accionistas. O HSBC salientou igualmente que o adiantamento de accionista constituía, no caso em apreço, uma operação pouco arriscada, rentável e usual — na pendência de um aumento de capital — para proteger os interesses patrimoniais do accionista maioritário numa situação em que não era possível recapitalizar no mês de Dezembro, por razões de calendário. O HSBC precisou igualmente que o adiantamento estava previsto em condições de mercado.

(132)

O relatório do HSBC menciona também a evolução da cotação na bolsa das acções da FT, insistindo sobre o facto de as acções terem subido em Julho de 2002 devido aos rumores de nacionalização, tendo seguidamente baixado fortemente em Setembro uma vez que, apesar de o mercado ter tomado conhecimento da eventualidade de um aumento de capital de 15 mil milhões de euros, as modalidades não eram ainda claras. O relatório salienta igualmente que as projecções financeiras da FT permitiam prever, para o Estado, uma rendibilidade muito satisfatória: segundo a metodologia DCF — discounted cash flow — a recapitalização inclui uma taxa de rendibilidade anual de 25 %, enquanto a taxa média no mercado das telecomunicações é de 9,9 %.

(133)

Em resposta ao envio do relatório jurídico e do relatório económico do consultor, a FT apresentou três notas jurídicas, que criticam o conteúdo desses relatórios, e um relatório económico (91).

(134)

A primeira nota salienta que as diversas categorias jurídicas abrangidas pelo direito civil, comercial ou administrativo francês utilizadas pelo consultor na análise das declarações do Estado não são pertinentes para determinar se as declarações ministeriais seriam susceptíveis de criar direitos em benefício de terceiros. Mais especificamente, a nota salienta que as condições exigidas para invocar a responsabilidade do Estado devido ao não respeito da sua promessa não estão reunidas no caso em apreço. A nota especifica que, por si só, o mero facto de fazer uma promessa, mesmo que consista em pagar determinadas quantias em dinheiro, não é suficiente para afectar as finanças públicas e para «imobilizar recursos estatais» sem um acto jurídico. A nota conclui, relativamente a este ponto, que a jurisprudência francesa não pode demonstrar que, no caso em apreço, se verificou uma «transferência de recursos estatais» devido à promessa condicional de um adiantamento de accionista. A nota precisa igualmente que deve existir um nexo entre os recursos estatais e a vantagem concedida. O contencioso das promessas cumpridas tem por único objectivo compensar um prejuízo eventualmente sofrido pelo beneficiário da promessa. A indemnização devida não pode, por conseguinte, proporcionar a este último uma vantagem.

(135)

A nota conclui que o Tribunal de Justiça não definiu em que medida uma promessa incondicional e juridicamente vinculativa de conceder um auxílio podia ser considerada como «tendo sido executada».

(136)

A segunda nota salienta que a Comissão deveria, formalmente, alargar o procedimento às medidas analisadas pelos peritos nomeados pela Comissão, uma vez que tais medidas não foram abrangidas pela decisão de início do procedimento. A nota precisa, além disso, que «as declarações unilaterais proferidas por uma autoridade estatal, na sua qualidade de accionista maioritário, devem, em direito francês e em direito comunitário, satisfazer diversas condições para poderem ser qualificadas como um compromisso irrevogável, claro e incondicional e a fim de poderem ser qualificadas como auxílios estatais». A nota conclui, relativamente a este ponto, que as diferentes declarações que os peritos utilizaram não preenchem manifestamente estas condições. Segundo C.D. Ehlermann, a análise defendida pelos peritos teria por consequência «um efeito constrangedor para qualquer autoridade estatal que, quando é accionista maioritário de uma empresa, é obrigada a informar previamente a Comissão de qualquer declaração pública relativa às suas acções, intenções ou opiniões enquanto accionista maioritário, no âmbito ou a favor da empresa que controla». A análise dos peritos conduziria igualmente a «um enriquecimento sem justificação da mesma autoridade que, devido ao não respeito de uma obrigação de silêncio, beneficiaria de uma ordem de recuperação de fundos que não mobilizou de nenhuma forma. Deste modo, o Estado seria retribuído — pela empresa, que não controla as declarações dos seus accionistas — devido à violação desta alegada “obrigação de silêncio”. O cálculo do auxílio efectuado pelos peritos contém, para além dos erros materiais e das insuficiências a nível económico salientadas pelo HSBC, erros de direito fundamentais que o invalidam e fazem com que não possa ser utilizado pela Comissão.» O autor da nota contesta nomeadamente a quantificação do auxílio mencionada no relatório do perito e precisa que, para quantificar o auxílio, apenas deve ser tomado em consideração o custo líquido para o Estado da sua intervenção em benefício da empresa.

(137)

Segundo a terceira nota apresentada pela FT, o Estado não colocou a linha de crédito à disposição da FT através do ERAP. A nota precisa, além disso, que em direito interno, as declarações não vinculam juridicamente o Estado face à FT ou face a terceiros. A nota salienta que as declarações não constituem um acto jurídico, na acepção do direito comum, nem um acto gerador de um direito, na acepção do direito público. Ora, o Estado não pode assumir um compromisso sem um acto gerador de direito adoptado em conformidade com as regras em matéria de competência (trata-se, no caso em apreço, de uma declaração de intenção, sem execução material) e de procedimento orçamental. A nota salienta igualmente que a responsabilidade do Estado não intervém e que, de qualquer forma, a obrigação de indemnização decorrente de um facto delituoso não constitui um auxílio estatal, uma vez que «em caso de condenação do Estado ao pagamento de indemnizações, a transferência de recursos não resulta do facto jurídico em si, mas da intervenção da responsabilidade devido a esse facto. E o beneficiário da transferência de recursos estatais não é a empresa em causa mas a vítima que sofreu o dano». O autor da nota precisa igualmente que é impossível notificar um facto jurídico enquanto, em conformidade com o Tratado, todas as medidas de auxílio devem ser notificadas à Comissão.

(138)

O anexo da nota salienta mais especificamente o contexto em que as declarações foram formuladas e precisa que tal é necessário para determinar o seu verdadeiro alcance. Desta forma, uma análise das declarações à luz dos acontecimentos que se produziram entre o final do mês de Junho e Dezembro de 2002 revela que tais declarações não podiam constituir uma promessa, e não demonstra que as medidas adequadas previstas pelo Estado constituíam medidas financeiras. Nessa altura, existiam nomeadamente divergências no âmbito do Governo, e o Ministro da Economia e Finanças não representava o ponto de vista do Governo. O autor precisa que o perito não apresenta qualquer demonstração jurídica ou factual da vontade do Estado de assumir um compromisso. Um estudo dos factos revela que não existia qualquer intenção por parte dos responsáveis, que tinham dúvidas quanto à solução para o problema, e que operadores nunca tinham declarado que consideravam que o Estado se tinha comprometido a adoptar uma determinada solução.

(139)

Quanto ao relatório económico apresentado pela FT, sublinha que o âmbito de análise do relatório do consultor é muito restritivo «porque analisa principalmente os efeitos da declaração de 12 de Julho de 2002 e utiliza uma metodologia única, denominada “event studies”». O relatório precisa igualmente que a metodologia utilizada pela NERA se baseia «numa abordagem muito teórica, que consiste em partir do pressuposto de que os mercados são eficientes e em avaliar os efeitos de um acontecimento através da quantificação das variações das cotações na bolsa observadas quando ocorre esse acontecimento. Esta abordagem demasiado teórica não corresponderia à realidade da situação de um accionista de referência». O relatório económico salienta igualmente que o relatório NERA é «confuso no que se refere aos benefícios, às fontes de tais benefícios e aos custos para a FT e para os seus accionistas».

(140)

O relatório conclui que as conclusões do consultor são erradas visto que:

«A análise da situação do grupo FT na altura do anúncio dos resultados do primeiro semestre de 2002 revela que (i) o grupo apresenta um balanço desequilibrado e um problema de liquidez a curto prazo mas (ii) os resultados de exploração da actividade são muito positivos.

A análise das medidas possíveis que um accionista prudente deve prever numa situação de pesado endividamento indica que seria lógico adoptar um plano de recuperação, incluindo uma recapitalização, para um grupo com activos sólidos e com um valor intrínseco superior à soma da capitalização bolsista e do endividamento líquido.

A análise da criação de valor e as perspectivas de rendibilidade sugerem que o Estado realiza um bom investimento ao participar no aumento de capital e assume poucos riscos ao conceder, se necessário, um empréstimo de accionista».

4.14.   Observações da ECTA

(141)

A ECTA considera que as medidas seguintes constituem auxílios estatais: (i) as declarações ministeriais de Julho e Outubro de 2002, informando o mercado que o Estado não deixaria a FT em dificuldades financeiras; (ii) a aceitação, pelo Estado, de dividendos remunerados em acções e não em numerário, relativamente a 2001; (iii) a concessão de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros, bem como o compromisso antecipado, assumido pelo Estado, de participar no futuro aumento de capital; (iv) a concessão, pelo Estado, de uma garantia estatal em benefício do ERAP a fim de lhe permitir contrair empréstimos nos mercados a uma taxa de 3,375 % em vez da taxa de 10,4-10,9 % aplicável a uma empresa com uma notação de «junk bond»; e (v) a aparente transferência dos trabalhadores da FT para o ERAP quando, na realidade, continuam a trabalhar para a FT.

(142)

O auxílio concedido à FT permitiu-lhe manter uma política comercial e publicitária agressiva e permitiu-lhe igualmente preservar a sua qualidade de operador integrado e aumentar a sua participação na Orange. A ECTA considera que uma empresa na situação da FT deveria ter reagido de forma completamente diferente, como o fizeram os operadores concorrentes da FT no mercado dos serviços globais de telecomunicações como a British Telecom e a KPN que tiveram de ceder activos estratégicos a fim de reduzir a sua dívida.

(143)

A ECTA é de opinião que as medidas referidas no considerando 141 constituem auxílios ilegais e que não se podem justificar nomeadamente face às Orientações, na medida em que não está preenchido nenhuma das condições nelas previstas. A título acessório, a ECTA afirma que, se a Comissão adoptar eventuais medidas de compensação, tais medidas deveriam ser significativas. A ECTA acrescenta, no que se refere às medidas estruturais que, sem o auxílio do Estado, a FT teria sido obrigada a ceder a Orange e a Wanadoo. Quanto às medidas a nível do comportamento, a ECTA propõe uma redução das quotas de mercado da FT, da Equant, da Orange e da Wanadoo, especificando que estas últimas medidas são de mais difícil execução que as medidas estruturais.

5.   OBSERVAÇÕES DA FRANÇA

5.1.   Resumo dos factos

(144)

As Autoridades francesas recordaram a título preliminar que actuaram desde o início em conformidade com o princípio do investidor privado prudente. Desta forma, a partir do momento em que foram anunciados os resultados da FT relativos ao primeiro semestre de 2002, que evidenciaram uma estrutura financeira desequilibrada e necessidades de fundos próprios importantes apesar dos bons resultados de exploração, o Estado actuou em conformidade, nomeando um novo dirigente para a empresa e reunindo um consórcio bancário que se comprometeu, a partir do mês de Setembro de 2002, a garantir oportunamente a boa execução de um aumento de capital. Paralelamente, o Estado solicitou aos novos dirigentes uma auditoria aprofundada da empresa. Com base no plano Ambition 2005, relativamente ao qual o accionista maioritário era regularmente informado, e com base no compromisso do consórcio bancário, o Estado anunciou, em 4 de Dezembro de 2002, a sua decisão de participar no reforço dos fundos próprios da empresa até um montante de 9 mil milhões de euros, tendo igualmente anunciado que estava disposto a colocar à disposição da FT, através do ERAP, um eventual adiantamento sobre esta subscrição, remunerado a condições de mercado. Todavia, tendo em conta as condições financeiras da concessão deste adiantamento pelas Autoridades francesas e as indicações da Comissão no que se refere às suas dúvidas relativamente à presença de elementos de auxílio nesta medida, a FT preferiu recorrer directamente ao mercado obrigacionista.

(145)

As Autoridades francesas esclareceram seguidamente que o montante total do financiamento resultante das emissões obrigacionistas se elevou a cerca de 9 mil milhões de euros, o que equivale ao montante máximo do adiantamento previsto no adiantamento de accionista. As Autoridades francesas referiram que o êxito das emissões obrigacionistas demonstrava a capacidade de a FT aceder aos mercados financeiros em boas condições e a confiança do mercado nas medidas operacionais incluídas no plano TOP e na capacidade do novo dirigente para o executar. As Autoridades francesas afirmaram igualmente que o aumento de capital tinha sido lançado logo que tecnicamente possível, em 24 de Março de 2003, e que tinha sido coroado de êxito.

(146)

Por ocasião da reunião entre as Autoridades francesas e a Comissão, em 22 de Janeiro de 2004, as Autoridades francesas salientaram que, na sua opinião, a operação de recapitalização respeitava o princípio do investidor prudente e que, por conseguinte, as medidas financeiras concedidas pelo Estado à FT não continham qualquer elemento de auxílio. Segundo as Autoridades francesas, o princípio do investidor prudente define-se como a necessidade, antes de agir, de nomear um novo dirigente, de realizar uma auditoria e de elaborar um plano credível. A cronologia dos acontecimentos ilustrada pelas Autoridades francesas demonstraria, por si só, a natureza prudente do comportamento do Estado. Dispondo destes elementos, as Autoridades francesas salientam que em seguida controlavam a situação (nomeadamente o preço de emissão).

5.2.   Situação financeira da empresa

(147)

As Autoridades francesas alegam que, quando adoptaram a decisão de investir, a FT não era uma empresa em dificuldades na acepção das Orientações. Com efeito, o volume de negócios da empresa registava um crescimento regular (aumento de 10 % entre o primeiro semestre de 2001 e o primeiro semestre de 2002) e a sua margem bruta de auto-financiamento era elevada e progredia mais rapidamente que o seu volume de negócios. Apesar disso, as Autoridades francesas referiram a estrutura financeira desequilibrada da empresa em 30 de Junho de 2002, afirmando que os prejuízos eram essencialmente imputáveis às provisões e amortizações excepcionais relacionadas com depreciações de activos adquiridos antes da viragem completamente imprevisível dos mercados. As Autoridades francesas informaram igualmente que os encargos de exploração da FT progrediam menos rapidamente que o volume de negócios, o que significava que a sua rendibilidade aumentava. Por outro lado, o resultado de exploração e o cash flow registavam um aumento (mais 15 % no que se refere ao cash flow relativamente ao primeiro semestre de 2001). As Autoridades francesas alegaram que as perspectivas muito positivas da FT em termos de resultados melhoraram ainda com o plano TOP. Estes resultados foram confirmados aquando da publicação das contas de 2002, que revelaram uma dinâmica virtuosa lançada pelos novos dirigentes da empresa.

(148)

Quanto ao critério relativo à evolução dos capitais próprios, previsto no ponto 5 a) das Orientações, as Autoridades francesas precisam que o indicador pertinente é, em conformidade com o artigo L225-248.o do Código Comercial, o capital social da FT SA, que permaneceu sempre positivo e que nunca registou uma diminuição para metade. As Autoridades francesas salientam que a FT não se encontrava, assim, na situação prevista nas Orientações, em que os fundos próprios passam a ser inferiores ao capital social.

(149)

A FT não se encontrava numa situação de cessação de pagamento, tendo sido simplesmente detectadas eventuais dificuldades de liquidez para o primeiro semestre de 2003, caso a retoma esperada do mercado não se concretizasse. As Autoridades francesas acrescentaram que a FT contava com uma disponibilidade antecipada de 6,9 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2003 e teria podido fazer face ao limiar de 2003 sem recorrer ao mercado financeiro. Durante a reunião de 22 de Janeiro de 2004, as Autoridades francesas precisaram que a empresa tinha recorrido ao crédito concedido por um consórcio bancário, menos oneroso que o mercado obrigacionista, e beneficiava de uma disponibilidade sobre este crédito de 4 mil milhões de euros.

(150)

As Autoridades francesas observaram nomeadamente que a FT tinha acesso aos mercados financeiros durante 2002 e descreveram o conjunto dos instrumentos de financiamento à disposição da FT entre 11 de Julho de 2002 e 15 de Janeiro de 2003 (92). Mencionaram nomeadamente o facto de, em 14 de Fevereiro de 2002, a FT ter negociado a obtenção de uma linha de crédito de consórcio bancário de 15 mil milhões de euros e ter lançado emissões obrigacionistas em 2002 (93), entre as quais um montante de 442,2 milhões de euros de obrigações reembolsáveis em acções.

(151)

As Autoridades francesas esclareceram igualmente que a FT não estava sujeita a nenhum risco financeiro devido à deterioração do seu rating pelas agências de notação, nomeadamente porque os covenants não previam qualquer cláusula de amortização antecipada.

(152)

Além disso, segundo a opinião concordante de diversos bancos consultados entre Junho e Novembro de 2002, a FT estava em condições, antes do anúncio do plano Ambition 2005 e do apoio do accionista maioritário, de se refinanciar nos mercados obrigacionistas. Desta forma, as Autoridades francesas indicaram que, respectivamente em Julho de 2002 e em Setembro de 2002, o banco […] (94) e o banco […] tinham proposto refinanciar, através de programas de troca realizados a partir de Outubro ou Novembro, as dívidas obrigacionistas da FT com vencimento entre 2003 e 2005.

(153)

Quanto à declaração do antigo dirigente da FT segundo a qual a empresa já não tinha acesso ao mercado (95), as Autoridades francesas observaram que o seu parecer era necessariamente subjectivo tendo em conta as circunstâncias.

5.3.   Diligência do Estado accionista

(154)

No que se refere à falta de diligência do Estado accionista quanto ao comportamento anterior da empresa, as Autoridades francesas alegaram que o argumento segundo o qual um investidor prudente não se teria encontrado na situação do Estado francês não se afigura pertinente uma vez que, segundo jurisprudência constante, a Comissão deve fazer incidir a sua análise sobre o momento em que a decisão de investir é adoptada, excepto se demonstrar que o comportamento anterior do Estado inclui elementos de auxílio, o que não se concluiu no caso em apreço. De qualquer forma, mesmo que obrigação jurídica de uma detenção maioritária do capital pelo Estado tenha constituído uma desvantagem para a FT, a Comissão não pode pôr em causa a escolha das Autoridades francesas de manter a empresa no sector público, sem ignorar o princípio de neutralidade que figura no Tratado. As Autoridades francesas salientam igualmente que intervieram logo que tiveram conhecimento das dificuldades financeiras da empresa. Nas suas observações de 29 de Julho de 2003, as Autoridades francesas insistiram no facto de que, de acordo com a jurisprudência Stardust  (96), seria conveniente colocar-se no contexto da época em que as medidas de apoio foram adoptadas e que tal «[…] excluía mecanicamente o período anterior a Julho de 2002». Salientaram igualmente que a remuneração dos dividendos de 2001 através de acções estava em conformidade com o princípio do investidor privado prudente, uma vez que existiam nessa altura fortes posibilidades de um aumento da cotação das acções.

5.4.   Racionalidade do plano TOP

(155)

As Autoridades francesas salientaram que, tendo em conta o que precede, o aumento do cash flow e o reforço dos fundos próprios previsto pelo plano Ambition 2005 constituem componentes de uma estratégia que teria sido seguida por qualquer accionista maioritário prudente. Desta forma, visto que os elementos fundamentais da empresa eram sólidos, a situação da FT não pode ser comparada à de empresas como a Vivendi Universal ou o Crédit Lyonnais.

(156)

Quanto à racionalidade do plano TOP, as Autoridades francesas salientam que este constitui um considerável esforço por parte da empresa. As Autoridades francesas realçam que se trata de um plano global de reorientação da gestão, baseado em acções concretas, que produziu já os primeiros resultados positivos. Neste contexto, afirmam que se trata de um plano extremamente preciso, que permite o aumento da rendibilidade da empresa, com uma taxa de rendibilidade do investimento (TRI) de 43 % em 2005 para os investidores que participaram no aumento de capital de Abril de 2003, ou seja, um rendimento claramente superior ao TRI de referência (11 %), que um investidor privado esperaria obter no sector das telecomunicações. O plano TOP inclui igualmente um vector de optimização da gestão dos efectivos. Quanto ao plano de cessões, as Autoridades francesas precisam que a cessão dos activos no final de 2002 permitiria adiar as eventuais dificuldades de liquidez para finais de 2003, mesmo sem qualquer recurso aos mercados financeiros. Além disso, uma cessão de activos estratégicos teria sido contrária aos interesses a médio e a longo prazo da FT e dos seus accionistas.

(157)

As Autoridades francesas salientam por último que as estratégias seguidas pelos operadores concorrentes não parecem mais prudentes e que um plano não pode ser apreciado face ao volume ou à natureza estratégica dos activos cuja cessão se prevê, devendo antes ser apreciado em função da lógica do seu conjunto. Além disso, o êxito das emissões obrigacionistas de Dezembro de 2002 e de Janeiro de 2003 confirmou, a posteriori, a confiança dos investidores privados no potencial operacional da empresa.

5.5.   Aplicação do princípio do investidor prudente à participação no reforço dos fundos próprios

(158)

Quanto à aplicação do princípio do investidor privado prudente ao anúncio, pelo Estado, da antecipação da sua participação no reforço dos fundos próprios, a Autoridades francesas observaram que tinham condicionado o seu acordo à apresentação pelo novo dirigente da empresa de um novo plano de reequilíbrio considerado credível e à participação dos bancos.

(159)

Quanto ao respeito do princípio da concomitância, as Autoridades francesas salientam que desde o início, o Estado accionista tinha tomado todas as medidas para assegurar a participação concomitante dos accionistas públicos e privados e que não tinha assumido qualquer risco antes dos investidores privados. Desta forma, o anúncio da intenção do Estado de participar no reforço dos fundos próprios foi feito em 12 de Setembro de 2002 (97) e, nesta data, um consórcio bancário tinha-se já comprometido, a partir de Setembro de 2002, a garantir oportunamente a realização da parte de um aumento de capital destinado aos investidores privados, juntamente com o accionista público, desde que fosse anunciado ao mercado um plano de reequilíbrio considerado credível. As Autoridades francesas salientaram que esta condição era normal, tendo em conta a situação financeira desequilibrada da FT e acrescentaram que a participação do Estado estava igualmente sujeita ao anúncio de um plano considerado credível pelo mercado. As Autoridades francesas alegaram que se os investidores privados não tivessem concedido uma garantia, o Estado não teria feito tal anúncio.

(160)

As Autoridades francesas esclareceram igualmente que os financiamentos privados foram concedidos antes do financiamento público, uma vez que as contribuições financeiras dos investidores privados — sob a forma de empréstimos obrigacionistas e de reescalonamento de créditos bancários entre de Dezembro de 2002 e Fevereiro de 2003 — foram significativas. As Autoridades francesas precisam que a análise de uma eventual colocação à disposição de fundos estatais deve ser efectuada à luz de tais financiamentos privados.

(161)

As Autoridades francesas sustentam que a operação de recapitalização realizada em 24 de Março de 2003 respeita o princípio da concomitância. No que se refere ao Estado, este não procedeu a nenhuma injecção de capital antes dos accionistas privados, como demonstram as modalidades do adiantamento de accionista, descritas no ponto 5.6, que não contêm nenhum compromisso de recapitalização incondicional do Estado antes de Março de 2003. O compromisso dos bancos de Setembro de 2002, referido no considerando 159, foi assim confirmado pela garantia formal do consórcio bancário em Março de 2003 e permitiu que o Estado não corresse qualquer risco quanto à participação dos investidores privados no aumento de capital. As Autoridades francesas realçam que, em conformidade com a jurisprudência Alitalia  (98), o Estado não se comprometeu formalmente antes do compromisso formal dos bancos. A participação dos accionistas privados é significativa, uma vez que se eleva a 40 %, percentagem que o Tribunal de Justiça considerou conforme ao princípio da concomitância. O consórcio bancário de garantia foi seleccionado no âmbito de um processo de concurso, o que garantiu que a remuneração dos bancos corresponderia a condições de mercado optimizadas, nomeadamente no que se refere à comissão que lhes foi paga. As Autoridades francesas mencionam igualmente que as comissões pagas no caso em apreço ([…] % do montante total garantido) estão em conformidade com as indicações que figuram na decisão Alitalia, de 19 de Junho de 2002 (99).

(162)

No que se refere ao rendimento esperado, as Autoridades francesas esclarecem que, tal como foi já indicado, as elevadas perspectivas de rendibilidade do plano TOP, confirmadas pelo acolhimento favorável que o mercado lhe consagrou, vêm demonstrar também o respeito do princípio do investidor privado prudente. Além disso, as Autoridades francesas defendem que quando foi tomada a decisão de investir, a FT não era uma empresa em dificuldade, na acepção das Orientações e que no segundo semestre de 2002 a empresa tinha acesso aos mercados financeiros.

(163)

As Autoridades francesas salientaram que o aumento de capital foi realizado logo que foi tecnicamente possível apresentar ao Estado e aos investidores declarações actualizadas sobre as perspectivas operacionais da empresa, o que é revelado pela escolha, feita pelo Estado, de investidores de qualidade, motivados por perspectivas de rendimento a longo prazo. As Autoridades francesas especificam que as limitações de calendário constituíam limitações técnicas inerentes à FT, independentes de eventuais condições favoráveis do mercado bolsista.

(164)

As Autoridades francesas salientam que a operação foi um êxito e que o montante firme garantido foi cinco vezes superior ao montante lançado no mercado.

(165)

As Autoridades francesas acrescentaram igualmente que o montante da recapitalização não constituía um elemento pertinente e que apenas era relevante saber se a operação era racional. De qualquer forma, o montante em apreço não era excessivo em comparação, nomeadamente, com o aumento de capital da KPN.

(166)

Para concluir relativamente a este ponto, as Autoridades francesas salientam que o aumento de capital parece já (as observações das Autoridades francesas datam de Julho de 2003) ser um investimento prudente, uma vez que a cotação das acções da FT progrediu em cerca de 50 % relativamente à cotação associada ao aumento de capital.

(167)

Quanto ao reembolso pelo Estado do empréstimo do ERAP, anunciado pelo Ministro Delegado ao Orçamento em Dezembro de 2002, este diz apenas respeito às modalidades de investimento pelo Estado, não tendo qualquer incidência sobre as relações entre o Estado, os accionistas e a empresa.

5.6.   O adiantamento de accionista

(168)

As Autoridades francesas defendem que o projecto de adiantamento nunca foi assinado pela FT devido, por um lado, ao custo demasiado elevado das condições financeiras propostas à empresa, e, por outro, ao facto de a Comissão ter expressado dúvidas quanto à legalidade desta medida face ao Tratado. Consequentemente, não foi colocado à disposição da empresa nenhum recurso estatal no âmbito do projecto de adiantamento de accionista. As Autoridades francesas precisam que a entrada em vigor do adiantamento não pode resultar do anúncio feito pelo Estado em 4 de Dezembro de 2002, que diz apenas respeito ao compromisso assumido pelo Estado accionista de participar na operação de reforço dos fundos próprios da empresa, sendo apenas mencionada uma «eventual»  (100) colocação à disposição de um adiantamento de accionista.

(169)

As Autoridades francesas observaram igualmente que, de qualquer forma, o projecto de adiantamento não tinha conferido qualquer vantagem à FT.

(170)

As Autoridades francesas esclarecem, desta forma, que uma vez que não entrou em vigor, o adiantamento não foi utilizado pela empresa e não pôde, por conseguinte, adiar as suas necessidades de liquidez. As Autoridades francesas defendem que o anúncio do adiantamento não constitui uma garantia, visto que o direito francês não reconhece a garantia implícita: qualquer garantia concedida pelo Estado deve ser consagrada por lei. Assimilar o anúncio de um eventual adiantamento do Estado a uma garantia é incorrecto. As Autoridades francesas insistem, por outro lado, que a garantia que o Estado concedeu ao ERAP, a fim de lhe permitir financiar a sua participação no reforço dos fundos próprios da FT, não deve ser assimilada a uma garantia concedida em benefício da FT. No que se refere ao ERAP, as Autoridades francesas precisam que o seu papel era completamente neutro e que a sua intervenção se devia apenas a razões orçamentais.

(171)

Da mesma forma, o anúncio de um projecto de adiantamento feito pelo Estado não facilitou o acesso da FT ao mercado obrigacionista. Em primeiro lugar, os empréstimos obrigacionistas não beneficiam de nenhuma forma de garantia, uma vez que a sua duração é superior à do adiantamento. Além disso, os titulares de obrigações não têm qualquer possibilidade de recurso em caso de não reembolso na data de vencimento. Em segundo lugar, as Autoridades francesas precisaram que não era possível comparar o anúncio, feito pelo Estado, da possibilidade de antecipar a sua participação no reforço dos fundos próprios com a garantia concedida no âmbito da decisão Crédit Foncier de France acima citada, uma vez que o adiantamento previsto no caso em apreço era hipotético e estritamente limitado, em termos de duração e de montante, não podendo assim resolver, por si próprio, nenhum dos problemas financeiros da empresa, tendo em conta o calendário da sua dívida. Em terceiro lugar, as Autoridades francesas sublinham que as emissões obrigacionistas foram exclusivamente determinadas pela percepção que o mercado tinha da capacidade de a FT honrar sozinha os seus compromissos, sem garantia estatal. Este facto foi atestado pelos spreads que são coerentes com a notação da FT e, por conseguinte, sensivelmente superiores aos dos outros operadores. Desta forma, a confiança que o mercado demonstrou durante as referidas emissões obrigacionistas provém essencialmente da alteração da equipa dirigente e do acolhimento favorável da nova estratégia, revelada por ocasião da apresentação do plano Ambition 2005.

(172)

Quanto ao respeito do princípio do investidor prudente no que se refere ao eventual adiantamento, as Autoridades francesas salientaram que a partir do momento em que foi adoptada a decisão de participar num aumento de capital e que as condições se encontravam reunidas (plano e dirigentes credíveis, consórcio bancário de garantia), era lógico que o Estado antecipasse a sua participação. As primeiras discussões relativas a este projecto de adiantamento remontam a Novembro de 2002. As Autoridades francesas salientaram igualmente que a legitimidade de uma tal medida era incontestável, uma vez que, como acima referido, se baseava num plano credível e pormenorizado, cujo conteúdo era no essencial conhecido quando foi anunciado o projecto de adiantamento, em 4 de Dezembro de 2002. Além disso, o Estado dispunha já do compromisso do consórcio bancário, condicionado à apresentação ao mercado de um plano credível, e dispunha, a partir de finais de Novembro, de todos os elementos necessários para concluir que esta condição seria retirada, tendo observado a reacção positiva dos mercados a partir da nomeação dos novos dirigentes. As Autoridades francesas sublinham neste contexto que não é pertinente apreciar o montante em jogo no caso vertente mas que, em conformidade com a jurisprudência Alitalia, é necessário examinar a conformidade das condições de financiamento da operação para uma empresa de dimensão comparável.

(173)

Quanto à remuneração do eventual adiantamento, as Autoridades francesas salientam que estava em conformidade com as condições de mercado e que tinha sido majorada de um acréscimo para tomar em consideração o seu carácter subordinado. As Autoridades francesas sublinharam igualmente que o projecto previa uma comissão de não utilização e que a ausência de caução estava em conformidade com a prática de um investidor privado no caso de um adiantamento de curta duração concedido por um accionista em antecipação da sua subscrição de um aumento de capital. As Autoridades francesas indicaram igualmente que o reembolso da quantia em acções era equivalente ao pagamento em numerário.

(174)

As Autoridades francesas precisaram que, em conformidade com a jurisprudência Alitalia, não incumbe à Comissão comparar a estratégia escolhida pelo accionista público com soluções alternativas que teriam comportado riscos menos elevados, mas sim determinar se, em condições semelhantes, um investidor privado teria podido adoptar uma medida deste tipo.

5.7.   Anúncios do Estado

(175)

Nas suas observações de 29 de Julho de 2003, as Autoridades francesas salientam o contexto em que devem ser analisadas as declarações do Estado na sua qualidade de accionista prudente e não de poder público. Desta forma, entre o mês de Setembro e o mês de Dezembro de 2002, o Estado promoveu alterações a nível da gestão da empresa, cujo elemento determinante foi a substituição do dirigente da empresa, e seguiu de perto a elaboração de um plano de reequilíbrio assegurando simultaneamente o apoio de investidores privados em caso de lançamento posterior de um eventual aumento de capital (ver supra, descrição pormenorizada da intervenção do Estado). Segundo as Autoridades francesas, estas medidas operacionais tiveram um impacto financeiro decisivo e obtiveram um acolhimento muito favorável dos mercados financeiros, tendo permitido a recuperação da cotação na bolsa da FT.

(176)

As Autoridades francesas salientam que o Estado nunca indicou nem sugeriu que daria à FT um apoio incondicional e ilimitado. Acrescentam que «O Estado sublinhou […] a partir do Verão [as Autoridades francesas referem-se à declarações do Ministro da Economia, de 12 de Julho] que actuaria como um accionista privado prudente e não na sua qualidade de poder público e que tencionava intervir enquanto accionista segundo modalidades (então por definir) que não seriam diferentes das que escolheria um investidor privado, o que excluía necessariamente que o Estado tivesse nessa altura já decidido intervir de forma incondicional e irrevogável» (101). Estas declarações, que não seriam diferentes das modalidades que um investidor privado escolheria, excluem de facto qualquer apoio incondicional e irrevogável. As Autoridades francesas alegam igualmente que as declarações que proferiram entre Julho e Outubro de 2002 constituíam «vagas declarações prévias» sem «qualquer medidas que as concretize» (102). As Autoridades francesas especificaram a este respeito que as declarações posteriores deviam ser apreciadas à luz da primeira declaração e que é errado afirmar que, a partir de 12 de Julho de 2002, o Estado assumiu «o compromisso irrevogável de apoiar a FT», tendo nessa ocasião assumido, «um compromisso irrevogável de participar no reforço dos fundos próprios». As Autoridades francesas indicam que o accionista anunciou pela primeira vez em Setembro de 2002 a sua intenção de participar no reforço dos fundos próprios da empresa e que «tal assumiria a forma de uma operação seguida pelo mercado (referência a um calendário a definir, em função das condições de mercado) (103)».

(177)

No que se refere à declaração de 2 de Outubro de 2002, as Autoridades francesas afirmaram que esta declaração confirmava que a apresentação de um plano considerado credível constituía uma condição prévia para a participação do Estado.

(178)

As Autoridades francesas referiram que, de qualquer forma, não era possível «deduzir da ausência de precisão das declarações relativas à FT proferidas pelo Estado entre Julho e Outubro de 2002, justamente quando o próprio Estado tinha indicado que agiria como investidor prudente, qualquer intenção do Estado — nem a fortiori — ou qualquer compromisso de tomar medidas que fossem contrárias às regras comunitárias em matéria de auxílios estatais. Com efeito, a violação das regras do Tratado não se pode presumir e não pode resultar de vagas declarações prévias a uma tomada de decisão, sem qualquer medida que as concretize» (104).

(179)

As Autoridades francesas defenderam igualmente que «As únicas medidas específicas previstas pelo Estado na sua qualidade de accionista maioritário da FT são as que foram expostas no processo de informação/notificação apresentado à Comissão e que foram anunciadas publicamente em 5 de Dezembro de 2002, ou seja, a participação, juntamente com investidores privados, num aumento de capital de 15 mil milhões de euros, num montante correspondente à parte detida pelo Estado no capital da FT e um eventual adiantamento de accionista remunerado a condições de mercado, em antecipação deste aumento de capital. O facto de o Estado ter recordado que desempenharia o seu papel de accionista prudente não constitui, de modo algum, uma garantia do Estado. Se as declarações do Estado proferidas entre Julho e Outubro de 2002 tivessem realmente sido juridicamente equivalentes, ou mesmo simplesmente consideradas pelo mercado e pelas agências de notação como uma promessa de “garantia ilimitada” a favor da FT, não se teria registado a deterioração da notação da FT em Julho e os “spreads” e a notação da FT durante este período teria reflectido o risco do Estado (notação AAA e um “spread” muito reduzido). Por último, a eventual tomada em consideração, pelas agências de notação, da presença do Estado enquanto accionista maioritário, independentemente de qualquer garantia implícita ou explícita ou de qualquer medida específica e independentemente da situação financeira específica da empresa num determinado momento não pode, por si própria, ser considerada um auxílio estatal. Uma tal abordagem seria directamente contrária ao princípio de neutralidade do direito comunitário, reconhecido pelo artigo 295.o do Tratado CE» (105).

5.8.   Evolução da cotação na bolsa das acções e dos «spreads» da FT

(180)

As Autoridades francesas alegam que só as medidas operacionais tiveram um impacto sobre a cotação na bolsa da FT. Desta forma, a cotação das acções da empresa explodiu em 2 de Outubro de 2002 (progressão de mais de 10,4 % na semana de 2 de Outubro), na sequência do anúncio da nomeação do novo dirigente, anunciadora de uma nova gestão operacional, e a progressão da cotação manteve-se e foi reforçada com o anúncio do plano TOP e do novo comité executivo em 5 de Dezembro de 2002, que provocou um aumento de mais de 25 % em dois dias. As Autoridades francesas sustentam que a participação do Estado num reforço dos fundos próprios e num eventual adiantamento de accionista eram medidas que tinham sido descritas na imprensa antes de 5 de Dezembro de 2002 e que, consequentemente, não se pode considerar que estivessem na origem da progressão da cotação das acções. As Autoridades francesas indicam que as declarações de princípio proferidas pelo Estado entre Julho e Outubro de 2002 não foram determinantes para esta progressão e que, enquanto não foram adoptadas medidas operacionais, a evolução da cotação se manteve flutuante, o que traduz a incerteza de mercado quanto à situação da empresa, nomeadamente o risco Mobilcom. As Autoridades francesas salientam que esta percepção provocou uma queda da cotação em bolsa, que atingiu o seu ponto mais baixo em 30 de Setembro de 2002, com um parêntises de relativa estabilidade durante o Verão, sem anúncios nem rumores particulares. As Autoridades francesas precisam que, durante este período, as declarações do Estado quanto à sua intenção de desempenhar plenamente o seu papel de accionista não eliminaram a tendência no sentido da baixa das acções da FT.

(181)

Quanto à evolução dos spreads da FT, as Autoridades francesas referem que esta situação não pode ser invocada para tentar realçar um alegado apoio à empresa, relacionado com as declarações de Julho. Com efeito, uma análise comparativa dos spreads da FT e da Deutsche Telekom desde Janeiro de 2002 revela uma certa semelhança para a totalidade do período: os spreads da FT baixaram em Julho de 2002, o que reflecte a apreciação do risco do sector das telecomunicações, independentemente das declarações do Estado. Além disso, os spreads aumentaram em Dezembro de 2002, após o Estado ter anunciado as medidas operacionais que tencionava adoptar. As Autoridades francesas concluíram que a evolução dos spreads da FT está ligada à evolução do sector das telecomunicações, e que as declarações do Estado não foram determinantes.

(182)

Em resposta ao envio do relatório jurídico e do relatório económico do consultor, em 9 e 10 de Junho de 2003, as Autoridades francesas alegaram que as declarações do Ministro da Economia e Finanças, durante uma entrevista publicada no Les Echos de 12 de Julho de 2002, não são abrangidas pelo âmbito de aplicação do procedimento de investigação a que a Comissão deu início em 30 de Janeiro de 2003. A Comissão não podia alargar o procedimento a outras afirmações, uma vez que o prazo de 18 meses, previsto no n.o 6 do artigo 7.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999 relativo às modalidades de execução do artigo 93.o do Tratado CE (106), tinha praticamente chegado ao seu termo. De qualquer forma, as Autoridades francesas reservaram-se o direito de apresentar à Comissão peritagens complementares relativamente ao relatório do consultor.

(183)

Quanto ao relatório jurídico, as Autoridades francesas apresentaram as seguintes observações:

Salientam «em primeiro lugar que o relatório jurídico se baseia numa interpretação errada (e mesmo tendenciosa) dos factos. Em especial … este relatório desvirtua de forma manifesta as afirmações, no entanto claras, proferidas pelo Ministro da Economia numa entrevista com um jornalista, publicada em Julho de 2002. As Autoridades francesas contestam firmemente que seja possível propor interpretações tão infundadas para, alegadamente, extrair conclusões jurídicas e, nomeadamente, afirmar que existe qualquer tipo de garantia concedida pelo Estado à France Télécom».

«Reiteram … que o Estado, accionista da France Télécom, não só sempre considerou comportar-se como investidor prudente face à France Télécom, como optou também por expressar clara e publicamente que esta posição constituiria uma condição prévia a qualquer intervenção no processo ...». A entrevista do Ministro de Julho de 2002 não revela que tenha sido adoptada nenhuma decisão. «… [E]mbora mantendo a sua confiança relativamente à viabilidade da empresa, o Estado limitou-se a verificar as dúvidas do mercado quanto à situação da France Télécom e, na sua qualidade de accionista maioritário, esforçou-se por aperfeiçoar a sua análise, sem poder, nesse momento, estabelecer um diagnóstico preciso nem adoptar qualquer decisão». «Além disso, não há qualquer razão para supor a priori que a expressão “disposições adequadas” visava especificamente medidas financeiras».

«As Autoridades francesas salientaram além disso numerosas inexactidões na argumentação formulada no relatório jurídico. Este relatório revela assim uma evidente falta de objectividade, quer adoptando análises jurídicas muito contestáveis (nomeadamente sobre a qualificação das cartas de intenção e o alcance de um compromisso unilateral em direito civil e comercial), quer aplicando injustificadamente aos factos em análise certas qualificações jurídicas despropositadas (por exemplo, a aplicação da teoria da gestão de negócios ou das regras de direito internacional público nas relações entre uma empresa e o seu accionista maioritário)».

«As conclusões do relatório jurídico que tendem a estabelecer a existência de uma “garantia ilimitada” concedida pelo Estado à France Télécom são, além disso, totalmente infundadas em termos do direito comunitário». Em conformidade com a jurisprudência Compagnie nationale Air France (107), as intenções contestadas não podiam incluir um compromisso firme e incondicional por parte do Estado. Da mesma forma, «a solução encontrada no processo do Crédit Foncier de France — supondo que está em conformidade com a jurisprudência comunitária, o que não é certo, uma vez que a decisão não foi objecto de qualquer recurso — diz respeito a circunstâncias radicalmente diferentes». «Nem sequer se trata de um comunicado oficial do Governo ou da France Télécom, mas sim de um simples artigo de imprensa que reproduz o texto de uma entrevista do Ministro da Economia num contexto mais global relativo às prioridades do Governo, estando por conseguinte desprovido de qualquer força probatória». «As tentativas de qualificação das declarações ministeriais de 12 de Julho de 2002 em função de categorias jurídicas de direito interno (em especial o direito das sociedades e o direito administrativo) não permitem também demonstrar a existência de qualquer garantia em benefício da France Télécom». No que se refere à equiparação das declarações do Ministro proferidas em Julho a uma carta de intenção, as Autoridades francesas realçam que «(i) em primeiro lugar, faz parte da própria natureza da carta de intenção que seja dirigida a um beneficiário, (ii) em segundo lugar, e no seguimento da observação precedente, a eficácia do procedimento está condicionada à aceitação do referido beneficiário, (iii) por último, o alcance do compromisso assumido (quer se trate do seu objecto, quer da força que o seu autor lhe deseja consagrar) depende exclusivamente dos termos empregues». «Desta forma, … a natureza no mínimo geral, das declarações ministeriais … exclui indubitavelmente qualquer compromisso a favor da France Télécom ou dos seus credores e, a fortiori, qualquer obrigação de resultado (e, por conseguinte, qualquer conceito de garantia), bem como qualquer obrigação de meios». «a resposta do Ministro … prova apenas que o Estado accionista não tinha nesse momento tomado qualquer decisão — para além da de agir enquanto “investidor prudente” — e que, embora o Estado estivesse confiante quanto à qualidade operacional da empresa, não estava nessa data em condições de efectuar um diagnóstico suficientemente preciso nem de adoptar qualquer decisão». «A jurisprudência … nunca considerou que um compromisso no sentido de conceder uma garantia, sem um beneficiário determinado, possa assim ser invocado por qualquer pessoa que nele tivesse interesse. Aliás, este facto nada tem de extraordinário, uma vez que faz parte da própria natureza da garantia ou da carta de intenção que seja dirigida a um ou diversos beneficiários. Uma vez que não se destinava a um beneficiário determinado, não é também de estranhar que o alegado compromisso não tenha sido aceite». No que se refere à hipótese da gestão de negócios, este conceito é totalmente inoperante no caso em apreço. «Quanto ao artigo L 465-1 do Código Monetário e Financeiro, as AF [Autoridades francesas] sublinharam que “partindo-se do pressuposto de que pode ser transposto para o Estado, não condenaria o simples facto de o Estado evoluir nas suas intenções, mas apenas o facto de o Estado declarar uma intenção que seria falsa ou enganadora desde o início, o que manifestamente não acontece no caso em apreço, uma vez que as declarações apenas reflectem a ausência de decisão de qualquer tipo, face às informações de que dispunha então o accionista”. No que se refere ao direito administrativo, as Autoridades francesas defendem que «por um lado, uma simples afirmação feita a um jornalista — como as do Ministro da Economia, em 12 de Julho de 2002 — não constitui “um acto lesivo” susceptível de criar direitos e obrigações, e ainda menos uma garantia concedida pelo Estado à France Télécom. Por outro lado, a responsabilidade do Estado não podia de forma alguma surgir com base nas afirmações de carácter muito geral proferidas pelo Ministro, quer devido à alegada ausência de execução — hipótese da promessa não cumprida — quer, pelo contrário, devido à sua execução — hipótese da promessa ilegal».

«As conclusões do consultor jurídico são manifestamente contrárias à prática decisional da Comissão e à jurisprudência comunitária aplicável em matéria de auxílios estatais, que condicionam a existência de um auxílio à verificação da existência de um compromisso firme, preciso e incondicional do Estado em causa, o que não corresponde, de forma alguma, às declarações ministeriais de 12 de Julho de 2002». «Com efeito uma medida estatal deve, independentemente da sua forma, ser suficientemente precisa e concreta para que a Comissão possa nomeadamente determinar a própria existência de uma vantagem». «Ora, para poder aplicar o critério do investidor prudente, a Comissão deve dispor de todos os elementos de informação necessários, relativos às modalidades concretas da medida em análise».

«A adopção, por parte da Comissão, das teses do consultor jurídico teria além disso efeitos discriminatórios e contrários ao princípio da segurança jurídica. Em especial, a argumentação defendida pelo consultor teria consequências processuais absurdas, provocando uma obrigação, para cada Estado-Membro, de notificar à Comissão o menor projecto de entrevista ou de declarações públicas relativas a uma empresa de que seja accionista de referência». Além disso, esta tese provocaria uma discriminação injustificada entre as instituições comunitárias e os Estados-Membros. «Ora, é um princípio do direito comunitário que ninguém pode invocar mesmo as promessas feitas por uma instituição comunitária na ausência de “garantias precisas, incondicionais e concordantes, provenientes de fontes autorizadas e fiáveis, fornecidas pela administração”» (108).

«Neste contexto, é ainda importante o facto de a abordagem utilizada pelo consultor jurídico ser susceptível de prejudicar o princípio da neutralidade estabelecido pelo artigo 295.o do Tratado CE e impossibilitar a aplicação do critério do investidor prudente. Se a argumentação do consultor fosse levada até às suas últimas consequências, qualquer intervenção pública de um Estado relativa a uma empresa pública constituiria assim um auxílio e presumir-se-ia sempre que o Estado actuava na sua qualidade de poder público e não na sua qualidade de accionista da empresa».

(184)

Quanto ao relatório económico, as Autoridades francesas apresentaram as seguintes observações:

«As conclusões do consultor económico não têm qualquer validade em si mesmas, uma vez que se baseiam exclusivamente no postulado errado (estabelecido pelo relatório jurídico), segundo o qual a France Télécom teria recebido uma “garantia ilimitada” do Estado».

«Além disso … o relatório económico não demonstra, de forma alguma, que a empresa tenha beneficiado de qualquer vantagem relativamente aos seus concorrentes».

«A metodologia microeconómica do “event study”, utilizada pelo consultor económico, suscita diversas dificuldades fundamentais que se relacionam nomeadamente com a utilização da evolução a muito curto prazo da cotação na bolsa como única medida da evolução do valor de uma empresa, em contradição com as práticas reconhecidas (incluindo pelos tribunais comunitários (109) em matéria de valorização, numa altura em que os erros manifestos cometidos recentemente pelos mercados na avaliação do valor de operadores de telecomunicações, deveria, no mínimo, suscitar precauções sérias. Além disso, o consultor económico ignora totalmente as especificidades da situação dos títulos da France Télécom na época em análise, assim como o seu nível historicamente elevado de volatilidade, que invalidam claramente a utilização desta metodologia no caso em apreço».

«O método do “event study” afigura-se, no presente caso, ainda mais inadequado, uma vez que a cotação não registou uma evolução unívoca durante o período em análise, mas sim uma rápida sucessão de fortes subidas e descidas que demonstram a diversidade dos factores contraditórios susceptíveis de influenciar a evolução da cotação durante o período em análise, de tal forma que o consultor não tem qualquer fundamento para conduzir as suas análises em função de um único factor (entrevista ministerial de 12 de Julho de 2002), ignorando todos os outros factores (quando nada permite afirmar que os operadores do mercado tinham considerado a entrevista ministerial como um elemento importante para os investidores, em Julho de 2002)». «Desta forma, os mercados receberam neste período informações relativas à situação da própria empresa (por exemplo, no que se refere ao risco relacionado com a MobilCom)».

«Além disso, os cálculos do consultor são, na realidade, essencialmente determinados pela escolha de hipóteses metodológicas (nomeadamente a janela de observação e o período de estimativa) estabelecidas sem uma justificação sólida e de forma extremamente arbitrária, o que retira qualquer valor probatório aos resultados apresentados pelo consultor». «O montante calculado pelo consultor económico está principalmente ligado à utilização de uma tendência de referência da cotação da France Télécom que não tem qualquer relação com o acontecimento analisado no estudo (as declarações ministeriais de 12 de Julho de 2002)». «Além disso, as deduções do consultor podem ser contestadas através de testes simples e incontornáveis, como a observação de que, no período em análise, as acções e obrigações da France Télécom evoluíram de forma em tudo semelhante aos títulos da empresa mais próxima comparável, a Deutsche Telekom». O relatório do consultor seria além disso criticável devido à «heterogeneidade não justificada do método de reconstituição da evolução “normal”» das acções e obrigações, ou ainda à falta de cautela, revelada pelo consultor, ao colocar em evidência uma tendência «normal» da evolução da dívida de mercado a partir de determinadas linhas obrigacionistas muito pouco líquidas, ou ao extrapolar o valor de mercado de algumas obrigações para a totalidade da dívida. Da mesma forma, convém salientar a extrema fragilidade do cálculo teórico efectuado pelo consultor para estimar, com base nos Credit Default Swaps («CDS»), o custo da alegada garantia concedida pelo Estado à France Télécom. Com efeito, o consultor não toma de forma alguma em consideração a escassez específica dos CDS durante o período em análise, que explica a reactividade excessiva deste instrumento (nomeadamente relativamente aos spreads obrigacionistas) e o invalida como instrumento pertinente de avaliação para o mesmo período.

«As conclusões do consultor económico quanto à existência de um alegado auxílio concedido à France Télécom baseiam-se, além disso, em erros de lógica e resultam de uma confusão entre o alegado aumento do valor teórico de mercado da empresa, o lucro decorrente deste aumento para os accionistas e credores e a concessão de uma suposta vantagem à empresa». «O consultor parte do princípio de que um auxílio estatal aumentaria o valor da empresa beneficiária … [enquanto] não se pode ignorar que actualmente os intervenientes no mercado estão perfeitamente conscientes dos riscos que representa para uma empresa a concessão de um auxílio incompatível … Por conseguinte… a concessão de um auxílio, se for considerado ilegal pelos mercados, poderia provocar … uma diminuição da cotação dos títulos da empresa e, por conseguinte, do valor da empresa no mercado».

«Estas conclusões, exclusivamente baseadas numa análise ex post da alegada “garantia” concedida pelo Estado à France Télécom são, além disso, inconciliáveis com a apreciação do critério do investidor, que implica uma avaliação ex ante».

«Por último, o relatório económico conclui além disso, o que se afigura redundante, que a France Télécom não era uma empresa em dificuldades na época dos factos considerados (uma vez que tinha acesso ao mercado de capitais e não tinha problemas de viabilidade a longo prazo) e que a participação do Estado accionista no plano de reequilíbrio do balanço da empresa estava em conformidade com o critério do investidor privado, confirmando assim a ausência de qualquer elemento de auxílio nas medidas financeiras objecto da investigação da Comissão».

6.   OBJECTO DA PRESENTE DECISÃO

(185)

Em 4 de Dezembro de 2002, a Comissão recebeu a notificação de um projecto de adiantamento de accionista que a França tencionava executar a favor da FT, em antecipação da sua participação numa futura operação de aumento de capital da empresa, no âmbito de um plano de recuperação denominado «Ambition 2005». O conteúdo desta notificação está descrito na decisão de início do procedimento. A fim de decidir sobre a conformidade destas medidas com o Tratado, a Comissão analisou os acontecimentos relacionados com a notificação deste projecto, entre os quais as declarações do Governo proferidas entre Julho e Dezembro de 2002 (110)(ver secção 5). Na sequência desta análise, a Comissão concluiu que as medidas notificadas não podem ser analisadas sem tomar em consideração as declarações do Governo proferidas entre Julho e Dezembro de 2002. Com efeito, através destas declarações, o Estado manifestou a sua vontade de adoptar as medidas adequadas para resolver as dificuldades financeiras da FT. Desta forma, o projecto de adiantamento constitui a concretização das intenções expressas anteriormente pelo Estado. Com efeito, de um ponto de vista material, não existe qualquer razão jurídica para limitar a análise dos factos pertinentes apenas àqueles que o Estado-Membro decidiu evocar na notificação. A noção de auxílio é uma noção objectiva e baseada na realidade económica. Consequentemente, se a Comissão tem conhecimento de factos anteriores que sejam objectivamente pertinentes deverá integrá-los na sua análise.

(186)

No caso em apreço, a Comissão verifica que as medidas de Dezembro de 2002, objecto da notificação, haviam sido precedidas, desde Julho, por diversas declarações e medidas das Autoridades francesas. Por um lado, estas declarações e medidas permitem compreender melhor as razões e o alcance das medidas de Dezembro. Por outro lado, estas declarações e medidas prévias tiveram certamente um impacto sobre a percepção dos mercados e dos intervenientes económicos relativamente à situação da FT no mês de Dezembro. Uma vez que o comportamento dos intervenientes económicos é também influenciado pelo comportamento do Estado, não constitui um parâmetro objectivo para seguidamente apreciar o comportamento do Estado. Estas intervenções prévias devem, por conseguinte, ser tomadas em consideração na análise da existência de auxílios nas medidas de Dezembro.

(187)

Como efeito, é possível analisar as sucessivas declarações e medidas das Autoridades francesas, a partir de Julho de 2002, como um conjunto, cujo momento de concretização consistiria nas medidas de Dezembro (colocação à disposição de um adiantamento de accionista) que correspondem às que foram notificadas. É evidente que apenas existem auxílios se estiverem presentes os diferentes elementos da noção de auxílio (vantagens selectivas, recursos estatais, afectação das trocas comerciais e da concorrência).

(188)

A análise do caso em apreço sugere, à primeira vista, um desfasamento temporal entre as vantagens para a empresa, que teriam sido particularmente significativas no mês de Julho, e a utilização potencial de recursos estatais, que parece mais claramente estabelecida no mês de Dezembro. Com efeito, as declarações do Ministro da Economia e Finanças poderiam ser qualificadas de auxílio, na medida em que tiveram claramente um efeito sobre os mercados e conferiram uma vantagem à empresa. Contudo, não seria fácil determinar, de forma irredutível, se as declarações de Julho de 2002 eram susceptíveis de implicar, pelo menos potencialmente, recursos estatais. Neste contexto, a Comissão analisou diversos argumentos jurídicos destinados a demonstrar, por um lado, que tais declarações públicas equivaliam a uma garantia estatal de um ponto de vista jurídico e, por outro, que colocavam em jogo a reputação do Estado, com custos económicos em caso de incumprimento. No seu conjunto, pode considerar-se que estes elementos eram efectivamente susceptíveis de colocar em risco recursos estatais (quer ao pôr em jogo a responsabilidade do Estado face aos investidores, quer ao aumentar o custo das futuras transacções do Estado). A tese segundo a qual as declarações de Julho de 2002 constituiriam auxílios é, por conseguinte, uma tese inovadora, mas provavelmente não desprovida de fundamento.

(189)

Não obstante, no caso em apreço, a Comissão não dispõe de elementos suficientes para provar de forma irrefutável a presença de auxílios com base nesta tese inovadora. Em contrapartida, a Comissão considera poder estabelecer a presença de elementos de auxílio seguindo uma abordagem mais tradicional, a partir das medidas de Dezembro que foram objecto da notificação.

(190)

Com efeito, por um lado, a existência de uma afectação de recursos estatais surge claramente no mês de Dezembro. Por outro lado, é também evidente a existência de uma vantagem para empresa no mês de Dezembro, quando se toma em consideração o impacto das declarações e medidas prévias sobre os mercados.

(191)

Neste contexto, o «princípio do investidor privado em economia de mercado» não pode ser utilizado para justificar esta intervenção de Dezembro, como pretendem as Autoridades francesas, uma vez que, em Dezembro, os comportamentos dos intervenientes económicos estavam claramente influenciados pela actuação e pelas declarações prévias do Governo desde Julho. Embora se possa duvidar que as declarações de Julho fossem suficientemente concretas para constituirem elas próprias auxílios estatais, não restam dúvidas de que tais declarações foram mais do que suficientes para «contaminar» a percepção dos mercados e influenciar o comportamento posterior dos intervenientes económicos. Assim sendo, não se pode utilizar este comportamento dos intervenientes económicos como ponto de comparação neutro para seguidamente apreciar o comportamento do Estado. A presunção baseada no «princípio do investidor privado em economia de mercado» não pode, consequentemente, apoiar-se na situação de mercado existente em Dezembro, devendo, logicamente, basear-se numa situação do mercado não contaminada pelo impacto das declarações prévias.

7.   APRECIAÇÃO DA MEDIDA EM CAUSA FACE AO n.o 1 DO ARTIGO 87.o DO TRATADO

(192)

O n.o 1 do artigo 87.o do Tratado prevê que são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções. O Tratado não estabelece qualquer distinção entre as intervenções do Estado em função das suas causas ou objectivos, mas define-as em função dos seus efeitos (111). A noção de auxílio tem por objectivo as medidas estatais que, independentemente da forma que assumam, são susceptíveis de favorecer directa ou indirectamente, de forma apreciável, empresas ou produtos e que ameaçam, mesmo eventualmente, falsear a concorrência (112). Segundo jurisprudência constante, a noção de auxílio inclui não só as subvenções propriamente ditas, mas também intervenções que, de formas diversas, reduzem os encargos que oneram o orçamento de uma empresa e que, por esse motivo, não sendo subvenções na acepção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (113). Resulta do que precede que a noção de auxílio se baseia no conceito económico de vantagem e que, por conseguinte, o critério formal é irrelevante (114). Em conclusão, a noção de auxílio é uma noção objectiva que não toma em consideração a forma jurídica que reveste uma medida estatal, centrando-se exclusivamente nos seus efeitos (115). Consequentemente, a interpretação destas disposições, em vez de se basear em critérios formais, deve ter em conta a finalidade das referidas disposições que, nos termos do artigo 3.o, alínea g), do Tratado, consiste em garantir que a concorrência não seja falseada (116).

(193)

É necessária a presença de diversos elementos para que uma medida possa ser qualificada de auxílio: uma vantagem selectiva, concedida através de recursos estatais, que falseia ou ameaça falsear a concorrência e as trocas comerciais entre os Estados-Membros.

(194)

No que se refere à vantagem, a Comissão salienta que o adiantamento de accionista (que constitui uma antecipação da participação do Estado na recapitalização da empresa), concede uma vantagem em benefício da FT, uma vez que lhe permite aumentar os seus meios de financiamento e tranquilizar o mercado quanto à capacidade da empresa cumprir as suas obrigações de pagamento. Apesar de a convenção relativa ao adiantamento não ter sido assinada, a mensagem transmitida ao mercado, relativa à existência deste adiantamento é susceptível de proporcionar uma vantagem à FT, uma vez que o mercado considerou que a situação financeira da empresa era mais sólida (117). Esta situação poderia influenciar as condições de contracção de empréstimos por parte da FT.

(195)

Quanto à condição relativa aos recursos estatais, a Comissão salienta que o facto de uma vantagem resultar de um compromisso estatal que implica uma transferência de recursos potencial mas não imediata, não exclui que essa vantagem seja proveniente de recursos estatais. «A este respeito, deve observar-se, em primeiro lugar que, segundo jurisprudência constante, não é necessário provar, em todos os casos, ter havido lugar a uma transferência de recursos estatais para que a vantagem concedida a uma ou mais empresas possa ser considerada um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.o n.o 1, CE» (118). Desta forma, mesmo uma vantagem decorrente de um encargo suplementar potencial para o Estado constitui um auxílio estatal desde que afecte a concorrência e as trocas comerciais entre Estados-Membros (119).

(196)

Contrariamente ao que defendem as Autoridades francesas e a FT, a Comissão verifica que o anúncio da colocação à disposição do adiantamento de accionista, juntamente com a realização das condições prévias a tal colocação à disposição (120), a aparência transmitida ao mercado de que tal adiantamento tinha efectivamente sido colocado à disposição (121) e, por último, o envio à FT do contrato de adiantamento rubricado e assinado pelo ERAP (122) implicam um encargo potencial suplementar para os recursos estatais. É um facto que este contrato nunca foi assinado pela FT; tal não significa, no entanto, que não se tenha verificado uma afectação potencial de recursos estatais. Com efeito, uma vez que este documento constituía uma proposta contratual e enquanto tal proposta não foi revogada, a FT teria podido assiná-lo em qualquer altura, outorgando-se assim o direito de obter imediatamente o pagamento do montante de 9 mil milhões de euros. O Estado, uma vez que não podia ignorar este facto, devia ter à disposição da FT, através do ERAP, o montante de recursos correspondentes.

(197)

Desta forma, a Comissão deve determinar se a vantagem assim concedida à FT respeita o princípio do investidor privado prudente e se afecta a concorrência e as trocas comerciais entre Estados-Membros.

(198)

A vantagem que as medidas em causa proporcionariam à FT permitir-lhe-iam atenuar ou evitar parcialmente as consequências que decorreriam normalmente da sua situação financeira desequilibrada. Com efeito, é necessário recordar que o objectivo da intervenção do Estado consistia explicitamente em resolver a crise financeira, preservando ao máximo, simultaneamente, a integridade da estrutura operacional da FT e o seu nível de crescimento interno (objectivo que foi amplamente atingido, uma vez que a FT restabeleceu a sua situação, preservando a integridade do grupo, excepto no que se refere a algumas cessões de importância relativa). Na medida em que a vantagem concedida à FT era selectiva, parece evidente que esta vantagem falsearia a concorrência entre a FT e os seus concorrentes. Deve assim concluir-se que, num sector concorrencial como é o das telecomunicações, as vantagens de que a FT beneficia falseiam ou ameaçam falsear a concorrência de forma particularmente significativa.

(199)

Sempre que um auxílio financeiro concedido pelo Estado reforça a posição de uma empresa relativamente a outras empresas concorrentes a nível do comércio intracomunitário, deve considerar-se que estas últimas são afectadas pelo auxílio (123). Da mesma forma, sempre que um Estado-Membro concede um auxílio a uma empresa que opera no sector dos serviços e da distribuição, não é necessário que as empresas beneficiárias exerçam, elas próprias, actividades fora do referido Estado-Membro para que os auxílios influenciem as trocas comunitárias (124).

(200)

Na medida em que a FT desenvolve actividades em mercados que foram progressivamente abertos à concorrência a partir do final dos anos 80, as declarações do Governo a partir de Julho de 2002 são susceptíveis de afectar as trocas comerciais entre Estados-Membros. O sector das telecomunicações constitui actualmente um dos sectores mais dinâmicos e mais integrados a nível europeu. São numerosos os intervenientes deste sector que, tal como a FT, desenvolvem actividades em diversos Estados-Membros (125).

(201)

Conclui-se do que precede que as medidas em questão são susceptíveis de afectar as trocas comerciais entre Estados-Membros.

(202)

O princípio do investidor privado prudente será analisado na secção 8, no âmbito de todas as declarações proferidas pelo Governo durante os meses que precederam o projecto de adiantamento.

8.   PRINCÍPIO DO INVESTIDOR PRIVADO PRUDENTE EM ECONOMIA DE MERCADO

(203)

Tal como foi referido anteriormente, a Comissão salienta que as medidas notificadas não podem ser analisadas sem tomar em consideração as declarações do Governo proferidas entre Julho e Dezembro de 2002. Com efeito, o teor destas declarações e o seu efeito sobre o mercado revelam que o Estado tinha decidido, já a partir de Julho, apoiar a empresa.

(204)

A Comissão sublinha a título preliminar que o direito comunitário reconhece de forma geral a importância das promessas e das declarações do Estado na aplicação das regras em matéria de auxílios estatais (126). Em 12 de Julho de 2002, o jornal Les Echos publicou uma entrevista do Ministro francês da Economia e Finanças na qual o Ministro confirmou em diversas ocasiões que, caso a FT se deparasse com problemas de financiamento, o Estado tomaria as medidas necessárias para os resolver. Mais precisamente, o texto publicado é o seguinte:

«Evoca os excessos dos mercados. A cotação na bolsa da France Télécom é muito volátil. É o accionista maioritário desta empresa, tem alguma mensagem a transmitir?

Somos o accionista maioritário com 55 % do capital, e evidentemente que não se coloca a questão de “voltar a nacionalizar” a empresa, como já ouvi dizer. Sinto-me responsável pelos interesses patrimoniais do Estado. O Estado accionista comportar-se-á como um investidor prudente e, caso a France Télécom registe dificuldades, tomaremos as medidas adequadas.

Considera que o Estado foi prudente quando deixou a France Télécom endividar-se, iniciando actividades por exemplo na Alemanha?

Não me cabe criticar os meus antecessores. Saliento que todo o sector adoptou simultaneamente a mesma estratégia. É evidente que a vontade ideológica de conservar a maioria do capital não facilitou a internacionalização da France Télécom que não pôde adquirir empresas com “papel”. Daí o endividamento. Repito que, caso a France Télécom registe problemas de financiamento, o que não acontece actualmente, o Estado tomará as decisões necessárias para os resolver.

Relança o rumor de um aumento de capital…

Não, evidentemente que não! Afirmo simplesmente que tomaremos, oportunamente, as medidas adequadas. Se necessário.

…» (127)

(205)

Será conveniente salientar que esta entrevista nunca foi desmentida pelas Autoridades francesas (128). Pelo contrário, o seu conteúdo foi confirmado por sucessivas declarações incluídas nos comunicados de imprensa do Ministério da Economia e Finanças de 13 de Setembro de 2002, 2 de Outubro de 2002 e 4 de Dezembro de 2002. Nas últimas declarações são dados cada vez mais pormenores (129), até chegar à indicação das modalidades de execução do compromisso assumido no sentido de resolver os problemas de financiamento da France Télécom (montante do aumento de capital e participação do Estado, adiantamento de accionista, reforço da capacidade de refinanciamento da empresa antes da recapitalização) que foram objecto da notificação da França. O primeiro comunicado de imprensa do Ministério da Economia e Finanças, de 13 de Setembro de 2002, menciona nomeadamente de forma mais clara a sua participação no futuro aumento de capital da France Télécom «O Estado apoiará a France Télécom na execução deste plano e contribuirá, por seu turno, para um reforço significativo dos fundos próprios da empresa, segundo um calendário e modalidades a determinar em função das condições de mercado». Acrescenta «Até lá, o Estado adoptará, se necessário, medidas que permitam evitar à empresa qualquer problema de financiamento». As mesmas declarações foram proferidas no comunicado de imprensa do Ministério da Economia e Finanças de 2 de Outubro de 2002: «O Estado contribuirá para a execução das acções de recuperação e contribuirá, por seu turno, para o reforço dos fundos próprios da empresa segundo modalidades que serão determinadas em estreita colaboração com o Presidente da empresa e o Conselho de Administração. Como já indicado, o Estado tomará entretanto, se necessário, medidas que permitam evitar à empresa qualquer problema de financiamento». O comunicado de 4 de Dezembro centra-se igualmente nestes dois aspectos, por um lado, o que diz respeito à participação no aumento de capital e, por outro, o refinanciamento da empresa através, desta vez, de um adiantamento de accionista sob a forma de linha de crédito (130).

(206)

Pode considerar-se que, no seu conjunto, estas declarações tornaram pública a intenção do Estado segundo a qual, caso a France Télécom registasse problemas de financiamento ou dificuldades financeiras, o Estado faria o necessário para que a situação fosse resolvida. Como se observará na secção 9, é evidente que já na altura da primeira destas declarações, a FT registava dificuldades financeiras estruturais que se reflectiam no seu balanço desequilibrado. A geração de cash flows revelou-se inadequada para resolver os problemas relacionados com o endividamento. A verificação da insuficiência do cash flow e um optimismo indevido quanto às cessões de activos não estratégicos continuaram a afectar a cotação da FT e também a notação da sua dívida (131). Ao afirmar que o Estado tomará as decisões necessárias ou as medidas adequadas, o Ministro expressa o compromisso do Estado de fazer o necessário para resolver os problemas estruturais de financiamento da empresa. Foi esta, de qualquer forma, a percepção dos intervenientes económicos.

(207)

No que refere à imputabilidade destas declarações ao Estado, esta questão coloca-se apenas relativamente à declaração de Julho. A Comissão salienta que no contexto económico que acabou de ser recordado, o jornal financeiro francês de referência, Les Echos, contactou o Ministro competente e perguntou-lhe, não aquilo que pensava sobre os acontecimentos da altura, mas se tinha uma mensagem para transmitir ao mercado. Desta forma, a resposta do Ministro ao jornalista não é fruto do acaso nem constitui uma análise do passado. Trata-se antes da escolha do Ministro, apoiado pelo Governo, de dirigir uma mensagem clara a todas as componentes do mercado. O Ministro formulou nessa altura declarações precisas em nome do Estado e do Governo (aliás, no contexto de uma série de artigos relativos às prioridades em matéria de política económica do novo Governo). Nestas circunstâncias, não restam dúvidas de que a entrevista do Ministro comprova plenamente a resolução adoptada pelo Governo de apoiar a FT e constitui, por conseguinte, um acto imputável ao Estado. Além disso, tal como referido no considerando 205, as declarações feitas à imprensa não foram, subsequentemente, contrariadas nem alteradas pelo Ministro nem desmentidas pelo Governo.

(208)

A Comissão salienta que estas declarações públicas são suficientemente claras, precisas e firmes para constituirem uma manifestação da existência de um compromisso credível do Estado. Quanto à publicidade, a Comissão realça que a primeira declaração foi publicada num jornal diário de audiência nacional, além disso orientado para um público de operadores económicos e de banqueiros. Por outro lado, as respostas do Ministro não são apenas dadas aos jornalistas, mas dirigem-se claramente a toda a comunidade financeira e industrial. Com efeito, a primeira pergunta colocada pelo jornalista é muito reveladora: «A cotação na bolsa da France Télécom é muito volátil. É o accionista maioritário desta empresa, com 55 % do capital, tem alguma mensagem a transmitir?». Por conseguinte, o Ministro não pode ignorar que está a enviar uma mensagem à empresa, aos seus trabalhadores e também aos outros accionistas, aos bancos, aos credores e aos concorrentes da empresa. No que se refere às outras declarações, foram publicadas em comunicados de imprensa do Ministro da Economia e Finanças destinados, por definição, a serem amplamente divulgados.

(209)

Quanto à questão da clareza, a Comissão considera que já em Julho de 2002 a mensagem foi clara, embora os meios de intervenção do Estado, ou seja, as modalidades de execução do seu compromisso, não tivessem ainda sido especificados: «Sinto-me responsável pelos interesses patrimoniais do Estado. O Estado accionista comportar-se-á como um investidor prudente e, caso a France Télécom registe dificuldades, tomaremos as medidas adequadas» e um pouco mais à frente «Afirmo simplesmente que tomaremos, oportunamente, as medidas adequadas. Se necessário». Decorre assim claramente desta passagem que, por um lado, o Estado pretende colocar-se como um accionista maioritário prudente e que, por outro lado, adoptará as medidas necessárias para fazer face às dificuldades da France Télécom. A clareza do compromisso do accionista maioritário não suscita quaisquer dúvidas, uma vez que é repetida algumas linhas mais à frente: «Repito que, caso a France Télécom registe problemas de financiamento, o que não acontece actualmente, o Estado tomará as decisões necessárias para os resolver». A Comissão salienta que a clareza do compromisso do Estado não diminuiu nas declarações que se seguiram.

(210)

Quanto à firmeza deste compromisso, a Comissão não está convencida de que expressões como «caso a France Télécom registe dificuldades» ou «caso a France Télécom registe problemas de financiamento» (declarações de Julho) e «se necessário» (comunicados de imprensa de Setembro e Outubro) possam ser interpretadas como condições que tenham por efeito suspender a eficácia do compromisso do Estado. Com efeito, na altura da primeira declaração, a notação da FT tinha já descido significativamente, a empresa registava uma dívida de cerca de 70 mil milhões de euros e o mercado sabia que a empresa devia fazer face a obrigações de pagamento importantes no final de 2002 e no início de 2003 e financiar importantes necessidades de financiamento até ao final de 2003. Desta forma, tendo em conta o contexto financeiro geral, a ocorrência de problemas de financiamento não constituiu um facto aleatório. Esta situação não evoluiu aquando da publicação das outras declarações. Por conseguinte, não se pode considerar que as expressões em questão constituam condições suspensivas, uma vez que a condição suspensiva é, por definição, um acontecimento futuro e incerto (132). Por outro lado, as declarações em questão não contêm qualquer reserva de notificação prévia à Comissão. Será conveniente salientar que, contrariamente ao que defendem as Autoridades francesas, a sua afirmação segundo a qual o Estado pretende actuar como um investidor prudente (tal «prudência» foi aliás apenas mencionada em Julho e Dezembro) não pode ser considerada como uma condição do compromisso do Estado. Nenhum elemento permite demonstrar que o mercado tivesse considerado que existia qualquer condição. A única menção relativa à noção de investidor prudente encontra-se no comunicado da Standard & Poor’s de 12 de Julho de 2002, mas simplesmente como citação das declarações do Ministro; a interpretação das declarações do Ministro por parte dessa agência, que se segue à citação, é diferente (apesar disso, a indicação do Estado permitiu que a notação da FT se mantivesse no nível de investimento) (133). Além disso, este facto não foi incluído nos comunicados de outras agências de notação, como a Moody’, que considera que as declarações ministeriais dão uma indicação do compromisso firme do Estado de apoiar («support») a FT, independentemente das modalidades desse apoio. Neste contexto, não é suficiente o Estado afirmar que tenciona comportar-se como um investidor prudente para respeitar as regras em matéria de auxílios estatais e, em especial, o princípio do investidor privado prudente. Se assim fosse, seria suficiente que os Estados-Membros afirmassem que tinham respeitado estas regras, para que elas fossem efectivamente respeitadas, e a actividade de controlo da Comissão seria completamente desnecessária. Por outro lado, não incumbe aos Estados-Membros julgar o respeito do princípio do investidor prudente, mas sim à Comissão, sob controlo dos tribunais comunitários. Neste contexto, apesar das suas alegações, as Autoridades francesas não parecem ter-se comportado como um investidor prudente (ver ponto 5.5). A FT salientou aliás que a expressão «medidas adequadas» não significava, à priori, que o Estado se tivesse comprometido a adoptar disposições financeiras. A Comissão salienta a contradição evidente da argumentação das Autoridades francesas. Com efeito, por um lado, o Estado pretende que irá actuar como um accionista prudente. Tendo em conta a situação financeira da empresa, as análises financeiras e os meios dos accionistas privados, tal sugere que o Estado pretende fornecer um apoio financeiro à FT (e uma alteração dos órgão de direcção não pode, em caso algum, ser considerada suficiente, o que foi subsequentemente confirmado pelo teor do plano Ambition 2005). Por outro lado, quando as Autoridades francesas alegam que as medidas não são financeiras, tal sugere que pretenderiam actuar enquanto autoridade pública.

(211)

Quanto ao argumento das Autoridades francesas baseado na jurisprudência Compagnie nationale Air France (134), segundo o qual as declarações incriminadas não podem incluir um compromisso firme e incondicional do Estado, uma vez que não são suficientemente precisas, esse argumento baseia-se numa confusão entre a questão da data do compromisso e a apreciação desse compromisso face ao princípio do investidor privado prudente. Ora, no que se refere à data do compromisso, a Comissão salienta que esta jurisprudência não exclui que possa existir um compromisso firme antes de se ter conhecimento de todas as modalidades precisas de execução. Em contrapartida, o que o Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias salienta é que um investidor privado, em geral, não adoptaria uma decisão de investimento irrevogável, enquanto as suas modalidades definitivas não tivessem sido adoptadas.

(212)

Por outro lado, as restantes circunstâncias pertinentes que rodeiam as declarações referidas, confirmam a clareza e a firmeza da mensagem do Ministro, bem como a vontade do Estado de assumir um compromisso com pleno conhecimento de causa. Desta forma, já em Julho de 2002, o Estado não se contentou em proferir declarações públicas, mas contactou igualmente os principais intervenientes do mercado, para que estes servissem de «mensageiros» junto dos investidores (135). A urgência relativa à situação financeira da empresa confirma a existência de uma decisão firme do Estado de apoiar a FT. Durante o primeiro semestre de 2002, a notação da FT registou uma forte deterioração, na sequência da publicação das suas contas anuais de 2001. O ponto culminante desta deterioração foi atingido em 24 de Junho de 2002, quando a Moddy’s desceu a notação da empresa para uma classificação ligeiramente superior à de «junk bonds», tornando assim muito difícil o refinanciamento da sua dívida (136). Esta descida provocou uma grande inquietação nos mercados financeiros relativamente à situação financeira da FT (nomeadamente quanto à capacidade de refinanciar a sua dívida de 15 mil milhões de euros, que vencia no final de 2003) e, nessa altura, os mercados esperavam uma reacção do Estado susceptível de os tranquilizar. Estas circunstâncias indicam, segundo a Comissão, que o Estado considerava que devia intervir urgentemente, a fim de proporcionar confiança ao mercado e de prevenir qualquer descida posterior da notação da FT para uma classificação de «junk bonds», o que teria tido consequências muito negativas (137) sobre a situação financeira da empresa. O Estado preservou assim esta confiança através de sucessivas declarações. Com efeito, a intervenção do Estado teve por consequência prevenir qualquer descida da notação da empresa para um nível de «junk bonds» como, aliás, foi claramente indicado no comunicado de imprensa da S & P de 12 de Julho de 2002, que refere que as garantias fornecidas pelo Estado constituíam um elemento-chave para que a FT não tivesse descido para o nível de «junk bonds».

(213)

Para concluir, embora cada uma destas declarações consideradas separadamente pudesse não ser suficiente para demonstrar a existência de uma decisão do Estado de apoiar a FT, o conjunto das declarações em questão parece sugerir a existência desta decisão (que se concretizou na oferta de um adiantamento de accionista à FT, como antecipação da participação do Estado numa futura recapitalização). De qualquer forma, foi esta a percepção dos mercados. Além disso, o carácter firme desta decisão seria confirmado caso se concluísse que estas declarações são vinculativas em direito interno e são susceptíveis de colocar em jogo a credibilidade do Estado.

(214)

A título preliminar, a Comissão salienta que analisou a questão de saber se, em direito interno, um investidor privado que tivesse proferido as mesmas declarações que o Estado seria obrigado a respeitar as suas promessas. Uma vez que no caso em apreço o investidor é o Estado, o estudo do direito interno incidiu igualmente sobre o direito administrativo.

(215)

A Comissão salienta que solicitou um relatório de peritagem relativamente a este ponto e que recebeu igualmente diversos relatórios provenientes de terceiros. Com base nestas informações, a Comissão não pode excluir, na presente fase, que as declarações em questão tenham força vinculativa com base no direito administrativo, civil, comercial e penal francês (138), bem como com base no direito do Estado de Nova Iorque.

(216)

A principal crítica das Autoridades francesas consiste em salientar que os compromissos unilaterais constituem uma excepção em direito interno e que as cartas de intenção, que não formam uma categoria homogénea, só excepcionalmente equivalem a um compromisso unilateral. Contudo, a questão não consiste em saber se o direito francês é unívoco sobre a matéria, mas sim em saber se existem elementos, em direito privado, que permitam concluir pela existência de um compromisso unilateral em circunstâncias como as do caso em apreço. Ora, é incontestável o facto de existir uma jurisprudência do Tribunal de Cassação (139) que pode ser utilizada e cujo alcance as Autoridades francesas tentam simplesmente minimizar (140).

(217)

Declarações desta natureza, repetidas e concordantes, formuladas pelo Ministro competente em matéria de gestão das participações do Estado e que representa o accionista maioritário da empresa, podem perfeitamente ser consideradas como credíveis pelo mercado criando, por consequência, expectativas neste último, segundo as quais o Estado faria o necessário para resolver todas as dificuldades financeiras da FT. Se o Estado não tivesse honrado esta expectativa, tal teria afectado directamente a sua reputação enquanto proprietário, accionista ou gestor de empresas cotadas ou não cotadas na bolsa, bem como enquanto emissor de obrigações para financiar a dívida pública (141). Desta forma, a partir de Julho de 2002, as declarações do Governo francês expressam uma estratégia baseada na reputação do Estado. Esta estratégia consiste em assumir um compromisso credível a curto e a longo prazo. Um accionista maioritário ou um proprietário de empresas (ou, de forma mais geral, um gestor) que não actue em conformidade com o que publicamente anunciou e um emissor de obrigações que não cumpra a sua palavra, correm logicamente o risco, independentemente de qualquer obrigação jurídica, de perder a sua boa reputação. Esta perda de reputação implicará muito provavelmente custos económicos que pesarão sobre esse operador, quando tentar obter novamente capitais no mercado (admitindo que encontrará alguém disposto a conceder-lhe crédito) ou quando actuar na qualidade de proprietário ou gestor de empresa (142). No caso em apreço, o Estado francês é o accionista maioritário. O Estado francês é um interveniente económico importante, que desenvolve actividades na economia enquanto proprietário, accionista ou, de forma mais geral, enquanto gestor de um grande número de empresas públicas (143). O Estado francês é igualmente um importante mutuário no mercado de capitais para financiar a sua dívida pública (144). Uma perda de credibilidade do Estado teria assim consequências não negligenciáveis, tanto a nível da sua reputação enquanto importante interveniente económico e emissor nos mercados internacionais, como a nível da sua reputação enquanto interveniente político importante.

(218)

No seu conjunto, pode considerar-se que estes elementos são efectivamente susceptíveis de pôr em risco recursos do Estado (quer vinculando a responsabilidade do Estado face aos investidores, quer aumentando o custo das transacções futuras do Estado). A tese segundo a qual as declarações das Autoridades francesas, a partir de Julho de 2002, constituiriam auxílios é, por conseguinte, uma tese inovadora, mas provavelmente não desprovida de fundamento.

(219)

No entanto, a Comissão considera não poder estabelecer de forma irrefutável a presença de auxílios nesta base. Entende, em contrapartida, poder demonstrar a existência de elementos de auxílio, de uma forma mais tradicional, com base nas medidas de Dezembro de 2002 que foram objecto de uma notificação. Neste contexto, é suficiente estabelecer que as declarações prévias tiveram um impacto real sobre a percepção dos mercados em Dezembro, sem ser necessário qualificar estas declarações prévias como constituindo, elas próprias, auxílios estatais.

(220)

No caso em análise, a reacção do mercado, bem como os comentários dos analistas financeiros, confirmam que o mercado considerou estas declarações como uma estratégia de compromisso credível do Estado no sentido de apoiar a FT.

(221)

Quanto à reacção do mercado, a NERA sublinhou que o event Study realizado relativamente ao anúncio de 12 de Julho de 2002 demonstra que este anúncio provocou um aumento anormal e não negligenciável do valor das acções e das obrigações da FT. Desta forma, a cotação das acções da FT, relativamente a um conjunto de índices de telecomunicações representativos do mercado, aumentou entre 37,8 % e 43,8 %. Quanto ao crescimento anormal da cotação das obrigações, situa-se num intervalo de variação compreendido entre 3,2 % e 9,7 %. Esta reacção implica que o mercado considerou que através deste anúncio o Estado se comprometia a proporcionar um maior apoio à FT (145) e que o mercado atribuiu um valor muito importante a este anúncio. Quanto aos comentários dos analistas financeiros, a Deutsche Bank mencionou por diversas vezes, por exemplo num relatório publicado em 22 de Julho de 2002, que o apoio do Estado era determinante para evitar uma crise (146) e que o mercado estava convicto, à luz das declarações do Governo, de que este último iria conceder um apoio estatal à FT (147)(apesar de o mercado ter dúvidas quanto ao alcance e às modalidades deste apoio) (148). Da mesma forma, a agência S & P considerou que as declarações do Governo eram credíveis ao ponto de influenciar a notação da empresa. Em 12 de Julho, a S & P desceu a notação da FT para BBB-, mantendo contudo a sua notação na categoria de investimento com uma perspectiva estável (149), e salientando que «o Estado francês — que detém 55 % da France Télécom — indicou claramente à Standard & Poor’s que actuaria enquanto investidor prudente e que tomaria as medidas adequadas caso a FT registasse dificuldades. Desta forma, a S & P considera que a FT poderia registar algumas dificuldades para refinanciar a sua dívida obrigacionista que vencia em 2003. Todavia, a indicação do Estado vem apoiar a notação da FT na categoria de investimento». («The French state-which owns 55 % of France Télécom has clearly indicated to Standard & Poor’s that it will behave as an aware investor and would take appropriate steps if France Télécom were to face any difficulties … Indeed S & P believes that the company could face certain difficulties refinancing its debt obligations coming due in 2003. Nevertheless, the State’s indication underpins France Télécom’s investment-grade credit quality» (150). O facto de o apoio do Estado, declarado publicamente a partir de Julho de 2002, ter sido credível ao ponto de permitir que a notação da FT permanecesse na categoria de investimento, é também corroborado pela própria FT (151). Estes elementos confirmam a opinião da Comissão segundo a qual o Governo francês se sentia obrigado, para preservar a integridade da sua reputação nos mercados financeiros, a respeitar as promessas que tinha feito (aliás, não existe nenhum elemento no processo que faça pressupor que esta não tenha sido sempre a intenção do Governo).

(222)

A Comissão salienta por outro lado que estas declarações produziram efeitos extremamente importantes no mercado. Um estudo das observações e documentos fornecidos pelas Autoridades francesas, bem como dos trabalhos parlamentares disponíveis revela que as declarações do Estado contribuíram para restabelecer a confiança dos mercados financeiros (152). Com efeito, a partir do comunicado de imprensa da S & P de 13 de Julho de 2002, todas as agências de notação salientaram que o apoio declarado publicamente pelo Estado a partir de Julho de 2002 foi determinante para a manutenção da notação da FT na categoria de investimento. O facto de a notação da FT ter sido mantida a este nível permitiu-lhe evitar custos financeiros adicionais (153) sobre os empréstimos que tinha já contraído, devido à presença de step-up clauses  (154) em certas emissões obrigacionistas, bem como sobre os empréstimos a contrair posteriormente. Além disso, a manutenção da notação no nível de investimento permitiu que a empresa recuperasse a sua situação financeira através de uma operação de recapitalização realizada em condições optimizadas em Março/Abril de 2003. Com efeito, já em Setembro de 2002, uma das condições impostas pelos bancos para a sua participação na operação de recapitalização era a seguinte: «No mínimo, a manutenção das actuais notações {nível de investimento} da dívida a longo prazo da empresa por parte das agências de notação Moody’s e Standard & Poor’s; esta condição será retomada no contrato de garantia e de investimento» (155). Na medida em que o adiantamento constitui a antecipação da participação do Estado na recapitalização da FT, não pode ser apreciado sem tomar em conta os efeitos destas declarações. Uma deterioração da notação da FT teria tornado qualquer adiantamento de accionista improvável ou, pelo menos, mais oneroso.

(223)

A Comissão salienta que as observações das Autoridades francesas, que tentam demonstrar que o adiantamento de accionista considerado isoladamente, ou seja, ignorando os acontecimentos que o precederam respeita o princípio do investidor privado prudente, poderiam, à primeira vista, parecer não completamente desprovidas de fundamento. Todavia, esta aparência não resiste a uma análise mais aprofundada. Com efeito, a Comissão realça que, pelas razões que serão seguidamente expostas, a decisão de antecipar a operação de aumento de capital através da concessão de um adiantamento de accionista não pode ser analisada independentemente das declarações acima referidas.

(224)

Neste contexto, a Comissão recorda que o Estado tinha declarado, já em Julho de 2002, pretender adoptar as medidas necessárias para permitir que a empresa ultrapassasse os seus problemas de financiamento. As Autoridades francesas mantiveram-se vagas, numa primeira fase, quanto às modalidades de execução destas declarações. Seguidamente, precisaram-nas durante intervenções sucessivas através do anúncio, no mês de Setembro, da decisão de participar numa operação de reforço dos fundos próprios, através do anúncio, no mês de Dezembro, da colocação à disposição da empresa de uma linha de crédito num montante de 9 mil milhões de euros e através da criação das condições necessárias à realização desta operação.

(225)

O facto de as medidas notificadas em Dezembro (nomeadamente a decisão de antecipar uma futura recapitalização através da concessão de um adiantamento de accionista), consideradas isoladamente, poderem dar a ilusão de operações perfeitamente racionais, não invalida de modo algum o facto de o comportamento dos intervenientes económicos, em Dezembro, ter sido claramente influenciado pelo comportamento e declarações anteriores do Estado, nomeadamente a partir de Julho de 2002, indicando a sua intenção de minorar os problemas de financiamento da empresa. A Comissão recorda, neste contexto, que as declarações do Estado foram determinantes para a manutenção da notação da empresa no nível de investimento e que uma notação de «junk bond» teria tornado o adiantamento de accionista mais improvável e certamente muito mais oneroso.

(226)

Assim, a decisão do Estado de antecipar a recapitalização da empresa através da concessão de uma linha de crédito constitui, in fine, uma concretização dos anúncios do Estado.

(227)

A Comissão salienta, em primeiro lugar, que está consciente de que a operação de recapitalização da FT, realizada em Abril de 2003, foi um êxito e que o adiantamento de accionista nunca se concretizou. Recorda igualmente que a aplicação do critério do investidor privado prudente conduz normalmente a Comissão a verificar se um investidor privado prudente, de dimensão comparável à do investidor público, teria procedido de forma comparável ao investidor público. Decorre de jurisprudência constante que a análise do princípio do investidor privado prudente se baseia nos elementos de que o investidor dispõe no momento da adopção da decisão de investir. O êxito da operação de Março-Abril de 2003 não pode, por consequência, ser tomado em consideração para apreciar o comportamento do Estado em Dezembro de 2002. Por outro lado, a Comissão salienta que, na medida em que as declarações do Estado influenciaram o mercado e o comportamento dos intervenientes económicos, a Comissão se pode basear no comportamento dos outros intervenientes económicos para apreciar o comportamento do Estado e aplicar assim o critério da concomitância. Com efeito, as declarações do Estado segundo as quais faria o necessário para que a empresa ultrapassasse os seus problemas de financiamento, proferidas em Julho e seguidamente reiteradas, falseiam o teste da concomitância, na medida em que, mais uma vez, não se pode considerar que os investidores privados tivessem tomado as suas decisões baseando-se exclusivamente na situação da empresa, independentemente da questão de saber se as declarações contêm ou não um auxílio estatal (156). Acresce ainda que a aplicação do princípio do investidor privado prudente em economia de mercado não se pode basear na situação existente no mercado em Dezembro, devendo logicamente basear-se na situação de um mercado não contaminado pelas declarações e intervenções prévias.

(228)

Assim, parece lógico analisar as decisões em questão a partir da situação anterior a Julho de 2002. Desta forma, se as decisões forem analisadas no contexto da situação anterior a Julho de 2002, afigura-se que não respeitam o princípio do investidor privado prudente. Como já foi salientado, a FT encontrava-se, durante 2002, num contexto económico difícil. O plano de desendividamento anunciado pelos dirigentes e centrado numa importante cessão de activos tinha sido considerado inviável pela agência de notação Moody’s, que tinha descido a notação da empresa de dois níveis em 24 de Junho de 2002 (157). Consequentemente, a FT tinha perdido a confiança dos mercados. Nesta altura, o Governo não tinha ainda tomado qualquer medida destinada a melhorar a gestão da empresa e os seus resultados (158), nem tinha encomendado uma auditoria aprofundada. Em especial, o Governo não tinha ainda nomeado uma nova equipa dirigente e não existia qualquer plano de recuperação em aplicação ou em estudo (159). O apoio anunciado pelo Governo francês a partir das declarações de Julho de 2002 constitui, consequentemente, uma acção unilateral do Estado, numa altura em que o mercado se mostrava céptico quanto à capacidade de a empresa recuperar a sua situação financeira (160) e que os analistas financeiros recomendavam prudência no que se refere à participação numa possível operação de reforço dos fundos próprios da empresa (161).

(229)

À luz da situação financeira da empresa recordada na presente decisão, do contexto global de perda de confiança dos mercados na mesma altura e também da ausência de um plano de desendividamento credível e realista até Dezembro, a Comissão considera ser improvável que um investidor privado tivesse proferido, a partir de Julho de 2002, declarações semelhantes às formuladas pelo Governo francês, susceptíveis, de um ponto de vista puramente económico, de pôr seriamente em jogo a sua credibilidade e a sua reputação e, de um ponto de vista jurídico, de o obrigar, a partir dessa data, a apoiar financeiramente a empresa, em qualquer circunstância. Ao fazê-lo, qualquer investidor teria desta forma assumido, individualmente, um risco muito significativo face à empresa, sem ser compensado por ela ou pelos seus outros accionistas, e sem que estivesse prevista qualquer compensação como remuneração do seu apoio. É provável que mesmo um accionista de referência, na posse das mesmas informações sobre a situação económica da empresa que as que dispunham as Autoridades francesas na altura (162), não teria seguido uma tal abordagem sem ter efectuado previamente uma auditoria aprofundada da situação financeira da empresa (163) e das medidas necessárias para a restabelecer, a fim de ter uma ideia bastante precisa do risco que iria assumir e das suas perspectivas de remuneração. Por outro lado, um tal accionista de referência teria, de qualquer forma, necessitado da participação dos mercados financeiros para restabelecer a situação da empresa e os mercados não pareciam, nessa altura, dispostos a investir ou a conceder créditos elevados à FT. É pouco provável que um investidor privado prudente, colocado na mesma situação que o Estado francês, tivesse proferido declarações de apoio à FT em Julho de 2002, devido à situação económica da empresa e devido ao facto de não dispor de informações claras e completas. Por conseguinte, é ainda menos provável que tivesse concedido um adiantamento de accionista assumindo, individualmente, um risco financeiro muito importante. A Comissão não pode aceitar o argumento apresentado pela FT e pelas Autoridades francesas segundo o qual «poderia contrapor-se que qualquer manifestação de apoio pelo Estado teria um efeito de garantia implícita tendo em conta os meios “ilimitados” de que dispõe o Estado» o que «corresponderia a inviabilizar a aplicação do princípio do investidor privado prudente — cujos recursos são sempre limitados — e a tratar o comportamento do Estado accionista de forma diferente do do investidor privado» (164), e que tal impediria qualquer declaração pública do Estado. Com efeito, não se trata de impedir o Estado de se comportar como um investidor privado prudente e de formular, se necessário, declarações de apoio que um investidor privado prudente teria proferido (por exemplo, declarar a sua intenção de participar num eventual projecto de recapitalização baseado num plano de recuperação sério e credível), nem de obrigar o Estado a notificar todas as suas declarações. A Comissão salienta que uma reserva explícita, segundo a qual qualquer intervenção posterior seria previamente notificada à Comissão e apenas executada após ter sido aprovada, teria tornado as declarações condicionais e permitiria assim analisar a intervenção posterior do Estado com base na situação de mercado existente na altura da sua adopção.

(230)

Decorre das considerações que precedem que o princípio do investidor privado prudente em economia de mercado não foi observado. Por conseguinte, a vantagem concedida à FT através do projecto de concessão do adiantamento de accionista — analisado à luz das declarações e intervenções prévias das Autoridades francesas — constitui um auxílio estatal, apesar de ser díficil calcular a importância da vantagem.

9.   COMPATIBILIDADE DO AUXÍLIO

(231)

Quanto à compatibilidade do auxílio em questão, a Comissão precisa a título preliminar que a sua análise desenvolvida nos pontos 122 e 123 da decisão de início do procedimento é aplicável no caso em apreço. Por conseguinte, a compatibilidade do auxílio com o mercado comum poderá ser analisada segundo os critérios aplicados nas Orientações.

(232)

A Comissão salienta que a France Télécom era uma empresa em dificuldade, na acepção das Orientações, como o revela o Quadro 10. Mais especificamente, considera-se que uma empresa está em dificuldade quando «mais de metade do seu capital subscrito e mais de um quarto desse capital tiver sido perdido durante os últimos doze meses (165)».

Quadro 10

France Telecom

Balanço consolidado

(Montantes em milhões de euros)(Dados de 1998, 1 Euro = 6,55957 francos franceses)

 

Exercício encerrado em 31 de Dezembro

PASSIVO

2000

2001

2002

Capital social

4 615

4 615

4 761

Prémio de emissão

24 228

24 228

24 750

Reservas

2 748

4 682

–5 434

Resultado líquido da parte do grupo

3 660

–8 280

–20 736

Reserva de conversão

59

844

–3 315

Acções próprias

–2 153

–5 002

–9 977

Capitais próprios

33 157

21 087

–9 951

Participações minoritárias

2 036

8 101

9 780

Fundos não reembolsáveis e assimilados

Passivo financeiro a longo e médio prazo

30 547

54 543

46 898

Outras dívidas a longo prazo

5 220

8 663

14 978

Total das dívidas a longo prazo

35 767

63 206

61 876

Parte a menos de um ano do passivo financeiro a longo e médio prazo

7 542

1 596

13 495

Descobertos bancários e outros empréstimos a curto prazo

25 165

11 365

10 490

Dívidas a fornecedores

7 618

8 631

8 503

Encargos a pagar e outras provisões a curto prazo

7 729

7 259

7 395

Outras dívidas a longo prazo

8 113

2 481

1 712

Impostos diferidos

512

374

87

Proveitos antecipados

1 946

3 258

3 200

Total das dívidas a curto prazo

58 625

34 964

44 882

Total do passivo

129 585

127 358

106 587

Fonte: Relatórios anuais da France Télécom 1999, 2002, 2003.

(233)

Seguindo rigorosamente as Orientações, que fazem referência ao capital subscrito, os indicadores pertinentes no que se refere à qualificação da FT como uma empresa em dificuldade não incluem todos os elementos constitutivos dos capitais próprios, mas limitam-se ao capital social e ao prémio de emissão.

(234)

Em 31 de Dezembro de 2001, seguindo esta definição, o capital subscrito elevava-se a 28,8 mil milhões de euros (que corresponde a 4,6 mil milhões de euros de capital social e a 24,2 mil milhões de euros de prémio de emissão).

(235)

Em 31 de Dezembro de 2002, o capital subscrito elevava-se a 29,5 mil milhões de euros (que corresponde a 4,8 mil milhões de euros de capital social e a 24,7 mil milhões de euros de prémio de emissão). Relativamente ao exercício de 2002, os prejuízos líquidos do grupo elevavam-se a 20,7 mil milhões de euros, que correspondem a uma perda do capital subscrito de 70 % (20,7 mil milhões de euros/29,5 mil milhões de euros). Por outro lado, se se tomar em consideração as reservas negativas de 8,9 mil milhões de euros, chegar-se-á a uma perda total do capital subscrito.

(236)

Assim, é forçoso concluir que a FT era uma empresa em dificuldade na acepção das Orientações.

(237)

Por outro lado, esta conclusão é confirmada por uma análise do ponto 6 das Orientações. Este ponto refere diversos indicadores que ilustram as dificuldades financeiras de uma empresa. Trata-se de critérios qualitativos como o nível crescente dos prejuízos, a diminuição do volume de negócios, a redução da margem bruta da autofinanciamento, o endividamento crescente, a progressão dos encargos financeiros, bem como o enfraquecimento ou desaparecimento do valor do activo líquido (166).

(238)

Quanto aos argumentos das Autoridades francesas relativos ao crescimento das componentes da sua exploração, a Comissão salienta que o balanço de uma empresa, os seus resultados de exploração e as suas previsões no que se refere aos futuros cash flows são elementos que fazem parte integrante da avaliação dessa empresa. Por exemplo, a dívida inscrita no balanço de uma empresa influencia os seus futuros cash flows, mesmo se tem origem em acontecimentos passados. A Comissão salienta que está consciente da progressão do volume de negócios da empresa e do facto de a sua margem bruta de autofinanciamento ser elevada e progredir mais rapidamente do que o seu volume de negócios. Contudo não pode ocultar a realidade, em termos de mercado, de uma empresa que apresenta uma dívida colossal, não podendo também dissociar as decisões estratégicas das decisões operacionais adoptadas por uma empresa. Desta forma, contrariamente ao que sustentam as Autoridades francesas, a relevância consagrada à progressão do cash flow da empresa não pode ser considerada isoladamente. O relatório HSBC acima referido afirma, por outro lado, que mesmo com o plano TOP, a necessidade de financiamento da empresa elevar-se-ia a 21,9 mil milhões de euros em 2004 e 2005; sem o plano TOP essa necessidade de financiamento atingiria 33 mil milhões de euros para o mesmo período.

Quadro 11

France Telecom

Compte de resultat consolide

(Montantes em milhões de euros)(Dados de 1998, 1 Euro = 6,55957 Francos Franceses)

 

2001

2002

Volume de negócios

43 026

46 630

Custo dos serviços e produtos vendidos

(17 619)

(18 558)

Despesas comerciais e administrativas

(12 520)

(12 579)

Despesas de investigação e desenvolvimento

(567)

(576)

Resultado de exploração antes de amortização das imobilizações e dos custos actuariais do plano de saídas de final de carreira (EBITDA)

12 320

14 917

Resultado de exploração (EBIT)

5 200

6 808

Encargos financeiros líquidos, excluindo TDIRA

(3 847)

(4 041)

Encargos financeiros dos TDIRA

Diferenças cambiais líquidas

(337)

136

Efeito da actualização do plano de saídas de final de carreira

(229)

(216)

Resultados correntes das empresas integradas

787

2 687

Outros proveitos (encargos) não afectos à exploração, líquidos

(5 904)

(12 849)

Imposto sobre as sociedades

2 932

(2 499)

Participação dos trabalhadores

(131)

(148)

Resultado líquido das empresas integradas

(2 316)

(12 809)

Quota-parte dos resultados das empresas incluídas na consolidação

(890)

(367)

Amortização dos diferenciais de aquisição

(2 531)

(2 352)

Amortização excepcional dos diferenciais de aquisição

(3 257)

(5 378)

Resultado líquido consolidado

(8 994)

(20 906)

Participações minoritárias

714

170

Resultado líquido (parte do grupo)

(8 280)

(20 736)

Fonte: Relatórios Anuais France Télécom, 2001, 2002.

(239)

A análise dos diferentes critérios citados no considerando 237 revela que a FT registava perdas crescentes em 2001 e em 2002. Além disso, a dívida financeira líquida da empresa (ver Quadro 12) elevava-se a 63,5 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2001, a 69,7 mil milhões de euros em 30 de Junho de 2002 e a 68,0 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2002.

Quadro 12

Mil milhões de euros

 

31.12.2001

30.6.2002

31.12.2002

Total das dívidas a longo prazo

63,2

64,3

61,8

Parte das dívidas a menos de um ano

1,6

9,2

13,5

Descobertos bancários e outros empréstimos a curto prazo

11,4

13,8

10,5

Dívida bruta

76,2

87,3

85,8

Valores mobiliários de investimento

(1,1)

(0,1)

(—)

Disponibilidades

(2,9)

(2,3)

(2,8)

Outras dívidas a longo prazo

(8,7)

(15,2)

(15,0)

Dívida financeira líquida

63,5

69,7

68,0

Fonte: Relatórios anuais France Télécom e contas consolidadas France Télécom em 30 de Junho de 2002

(240)

A Comissão salienta igualmente a progressão dos encargos financeiros de 2 mil milhões de euros em 2000 para 3,8 mil milhões de euros em 2001 e para 4 mil milhões de euros em 2002.

(241)

O valor dos activos líquidos, que corresponde ao valor dos capitais próprios, passou de 33,2 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2000 para 21 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2001, tendo atingido um valor negativo de 10 mil milhões de euros em 31 de Dezembro de 2002.

(242)

Decorre do atrás exposto que, dos seis critérios mencionados no ponto 6 das Orientações como indicadores da situação díficil de uma empresa, quatro estão preenchidos.

(243)

Por último, as dificuldades financeiras da empresa foram por outro lado confirmadas pelas dificuldades que a FT registou, durante 2002, para se refinanciar em condições adequadas no mercado dos capitais. Contrariamente ao que afirmam as Autoridades francesas durante 2002, antes da série de declarações de apoio do Estado a partir de Julho e até Dezembro de 2002, a FT não tinha acesso aos mercados financeiros em condições adequadas, (167).

(244)

As dificuldades que a FT encontraria para se refinanciar em condições adequadas, sem apoio do Estado, são ilustradas, nomeadamente, pelos relatórios dos analistas financeiros.

(245)

Por exemplo, em de Julho de 2002, um analista afirmava que, com uma notação de Baa3, teria sido difícil que a empresa resolvesse o problema da sua dívida através da aquisição de novos capitais: «A notação de Baaa3 significava que era difícil encontrar quem subscrevesse uma eventual emissão obrigacionista. A perspectiva negativa aumenta a possibilidade de a empresa se tornar um “fallen angel” caso não consiga resolver os seus problemas de endividamento». (‘[FT’s Baa3 rating meant that it was] hard to say who would buy a potential bond issue. The negative outlook increases the possibility of the company becoming a fallen angel, if it is unable to solve its debt problem’.) (168)

(246)

Um relatório da JP MORGAN, de 2 de Dezembro de 2002, parece também confirmar que, sem o apoio do Estado, a FT não teria conseguido obter novos capitais no mercado para refinanciar a sua dívida. O relatório afirma que: «Continuamos a considerar o perfil da FT em termos de risco/remuneração como não atraente, enquanto aguardamos o resultado de uma revisão estratégica. […] Apesar de considerarmos que a FT tem grandes capacidades de reduzir os seus custos e produzir um rendimento muito importante, e apesar do Presidente ter uma sólida reputação, o papel do Governo é fundamental para conferir à FT a flexibilidade de que necessita. Entretanto, o risco de liquidez continua e, na nossa opinião, um aumento de capital ocorrerá mais cedo ou mais tarde. […] O papel do Governo será também central a nível do refinanciamento e da redução da dívida. Contudo, face a necessidades de refinanciamento desencorajadoras para 2003, a FT e as agências de notação centraram-se, a curto prazo, nos riscos de liquidez e de refinanciamento da empresa. Tal seria impossível sem a intervenção do Governo — mesmo a France Télécom reconheceu este facto durante a sua conferência telefónica do terceiro trimestre». (‘We continue to view FT’s risk/reward profile as unattractive pending the outcome of a strategy review. […] Although we see significant scope for FT to cut costs and deliver a compelling yield and even though the CEO has strong track record execution, the government role in giving FT the flexibility it requires is pivotal . In the meantime, liquidity risk remains and in our view, a right issue is a matter of when not if. […] The government’s role will again be pivotal in refinancing and reducing this debt. However it is liquidity or refinancing risk that is the near-term focus of FT and rating agencies alike, with a daunting refinancing schedule ahead in 2003. […] This would be impossible without government intervention — even FT acknowledged this in its Q3 conference call’) (sublinhado nosso).

(247)

Dois relatórios da Goldman Sachs e da SG Equity Research confirmam que foi só após a série de declarações do Estado que o mercado de capitais permitiu que a FT se refinanciasse em condições adequadas. A Global Equity Research precisa, em 20 de Fevereiro de 2003, que «[Os] problemas imediatos de liquidez estão resolvidos: desde a antecipação da sua participação no aumento de capital de 15 mil milhões de euros, sob a forma de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros, a FT pôde novamente aceder ao mercado obrigacionista para reduzir os seus problemas imediatos de liquidez». (‘[the] immediate liquidity issues are solved: since the government’s upfront prepayment of its €15bn equity offering in the form of a €9bn standby facility, FT has been able to re-access the debt capital markets to solve its immediate liquidity challenges’.)

(248)

A opinião dos analistas financeiros é aliás confirmada pelas declarações do Presidente da empresa da altura, M. Bon, publicadas em diversos artigos da imprensa (169), bem como pelas próprias Autoridades francesas aquando da notificação de Dezembro de 2002 (170). Apesar de as Autoridades francesas sustentarem que a opinião do anterior Presidente da FT não é pertinente, tendo em conta as circunstâncias em que foi formulada, é um facto que tal opinião foi confirmada, exactamente nos mesmos termos, pelo novo dirigente da FT, nomeado em Outubro de 2002, que aquando da sua audição de 5 de Dezembro de 2002 perante a Comissão das Finanças do Senado, precisou também que o grupo se encontrava numa situação preocupante: «Perante um endividamento gigantesco, a empresa não parece ter tomado consciência da situação de um grupo cuja cotação se degradava, que deixou de ter acesso aos mercados de capitais…» (171).

(249)

Da mesma forma, os documentos fornecidos pelas Autoridades francesas para ilustrar o acesso da FT ao mercado não parecem convincentes. Com efeito, as ofertas de troca do […] e do […], destinadas a substituir as obrigações reembolsáveis a curto prazo por obrigações a mais longo prazo, não reforçam a tese das Autoridades francesas relativamente ao acesso da FT ao mercado dos capitais. Desta forma, a proposta de troca proveniente do banco […], de Julho de 2002 e que teria sido transmitida à FT em 17 de Julho, contém apenas observações preliminares sobre uma possível operação de troca (172) e limita-se a referir um preço indicativo de Euribor +380 pontos de base relativamente a um título de 8,50 % (173). Quanto à oferta do banco […], de Setembro de 2002, esta não foi assinada pelas partes e não contém nenhuma taxa de refinanciamento. A Comissão salienta que, na medida em que as ofertas não foram formalizadas e que apenas uma das duas ofertas menciona uma taxa indicativa, mais elevada que a média das taxas das emissões da FT durante 2002 (174), estas duas ofertas não são pertinentes. De qualquer forma, parecem ter sido posteriores às declarações de apoio explícito.. do Estado, de Julho de 2002, e não podem, consequentemente, demonstrar que a FT tinha um acesso normal ao mercado dos capitais.

(250)

Quanto às diferentes operações mencionadas pelas Autoridades francesas (175), e nomeadamente a emissão, pela FT, de obrigações e de obrigações reembolsáveis em acções («ORA») durante 2002 (176), a Comissão salienta que estes factos não demonstram também que a FT tinha acesso ao mercado em condições adequadas. Neste contexto, salienta que o montante total das emissões é muito inferior (177) à média da FT no período compreendido entre 1997 e 2003 (178). Só a emissão de ORA tem uma importância significativa (179), mas trata-se precisamente de um instrumento utilizado quando o risco é elevado e a emissão de obrigações normais é demasiado onerosa.

(251)

Quanto à afirmação das Autoridades francesas segundo a qual preferiram recorrer ao crédito do consórcio bancário e não ao mercado obrigacionista para se refinanciarem, esta não é indicativa da capacidade de a FT se refinanciar em condições adequadas. Com efeito, o crédito do consórcio bancário a que se referem as Autoridades francesas nas suas observações de 22 de Janeiro de 2004, remonta a 14 de Fevereiro de 2002, ou seja, é anterior à descida da notação da FT pelas agências de notação. Em contrapartida, a utilização durante diversos meses deste instrumento de crédito a curto prazo, em vez de uma emissão de obrigações a mais longo prazo, que teria permitido refinanciar uma parte da dívida (180) da empresa, parece antes confirmar que o acesso da FT ao mercado dos capitais não era fácil. Esta situação foi aliás confirmada pelas Autoridades francesas nas suas observações de 22 de Janeiro de 2004, segundo as quais o recurso ao crédito do consórcio bancário era menos oneroso para a FT do que o acesso ao mercado obrigacionista.

(252)

Tendo em conta o que precede, a Comissão é de opinião que a FT deve ser considerada, no primeiro semestre de 2002, como uma empresa em dificuldade na acepção das Orientações (181).

(253)

No entanto, as medidas em causa não podem ser qualificadas como auxílios de emergência e à reestruturação de empresas em dificuldade uma vez que não preenchem as condições de autorização previstas nas Orientações. A Comissão salienta a título preliminar, relativamente a este ponto, que as Autoridades francesas não apresentaram qualquer argumento neste sentido e nunca afirmaram que as medidas em causa tinham por objectivo salvar e reestruturar a FT. Pelo contrário, as Autoridades francesas negaram sempre que a FT pudesse ser qualificada como empresa em dificuldade na acepção das Orientações e salientaram a solidez da exploração da empresa.

(254)

As medidas em causa não podem constituir auxílios de emergência. Com efeito, as Orientações prevêem que o crédito deve ser remunerado, o que não acontece no caso em apreço. Da mesma forma, os auxílios devem ser justificados por razões sociais graves, mas a Comissão não dispõe de nenhum elemento indicador de que, na ausência deste auxílio, se teria produzido uma situação difícil a nível social. Com efeito, na medida em que os activos da FT eram sãos do ponto de vista operacional, caso a empresa fosse obrigada a proceder a uma cessão de activos para fazer face às suas necessidades de financiamento, não teria, muito provavelmente, registado qualquer problema social grave. As Orientações prevêem igualmente que o auxílio de emergência deve limitar-se, no seu montante, ao necessário para a exploração da empresa durante o período em que o auxílio é autorizado. Ora, no caso em apreço, a Comissão não dispõe de nenhum elemento que lhe permita certificar-se que o compromisso do Estado de apoiar a empresa se limitava à exploração da FT. Além disso, as Autoridades francesas não notificaram formalmente as medidas em questão como auxílios de emergência, nem afirmaram que tais medidas teriam por objectivo salvar a FT. Os auxílios de emergência devem ser reembolsados no prazo de 12 meses a contar da data do último pagamento, caso contrário, o reembolso através de uma compensação em acções da FT não poderá constituir um reembolso na acepção das Orientações, constituindo uma simples injecção de capital, uma vez que nada garante que o valor nominal das acções corresponderá ao montante do auxílio. As Orientações prevêem igualmente que o auxílio de emergência só pode ser concedido por um período máximo de 6 meses. Ora, a linha de crédito está aberta por um período de 18 meses, o que, consequentemente, é superior ao prazo autorizado.

(255)

As medidas em causa não podem também constituir auxílios à reestruturação. A pedido da Comissão aquando da decisão de início do procedimento, as Autoridades francesas apresentaram o plano Ambition 2005. A leitura do plano confirmou que a FT iria entrar numa fase de profunda reestruturação, tanto a nível industrial como financeiro. Por conseguinte, a Comissão considera que as medidas financeiras concedidas pelas Autoridades francesas em apoio da FT eram susceptíveis de constituir auxílios à reestruturação, na acepção das Orientações. Aspesar disso, a Comissão não pode considerar estas medidas compatíveis com o mercado comum ao abrigo do n.o 3, alínea c), do artigo 87.o do Tratado e ao abrigo das Orientações. Com efeito, é necessário salientar que, segundo as Orientações, «os auxílios à reestruturação colocam problemas específicos em matéria de concorrência». Consequentemente, estes auxílios apenas podem ser concedidos «em função de critérios rigorosos e da garantia que as eventuais distorções da concorrência serão compensadas por benefícios resultantes da manutenção da empresa em funcionamento… e, se for caso disso, por contrapartidas suficientes a favor dos concorrentes». Ora, no caso em apreço, as informações fornecidas pelas Autoridades francesas não contêm qualquer elemento a este respeito e, nomeadamente, as Autoridades francesas não comunicaram à Comissão alguns dos elementos incluídos no anexo I das Orientações, nomeadamente uma descrição pormenorizada do auxílio (propondo contrapartidas) e estudos de mercado, que constituem elementos indispensáveis para que a Comissão se possa pronunciar sobre a gravidade das distorções da concorrência em jogo e, consequentemente, sobre as contrapartidas necessárias para determinar a compatibilidade do auxílio.

(256)

A Comissão conclui que as medidas financeiras concedidas pelas Autoridades francesas em apoio da FT são incompatíveis com o mercado comum nos temos do n.o 3, alínea c), do artigo 87.o do Tratado e nos termos das Orientações.

10.   RECUPERAÇÃO DO AUXÍLIO

(257)

À luz do que precede, o adiantamento de accionista de Dezembro de 2002 constitui um auxílio estatal incompatível com o mercado comum. O artigo 14.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999 exige assim, em princípio, que a Comissão solicite a sua recuperação.

(258)

É obvio que uma condição prévia para proceder à execução desta obrigação consiste em quantificar na decisão, de forma relativamente precisa, o montante do auxílio ou, se tal não for possível, em incluir parâmetros que permitam ao Estado-Membro, em cooperação com a Comissão, proceder a tal cálculo posteriormente.

(259)

A Comissão não se encontra em condições de proceder, na presente fase, a uma quantificação precisa dos auxílios em questão.

(260)

É um facto que a análise a partir da situação do mercado antes das declarações de Julho de 2002 sugere a existência de uma vantagem considerável concedida à FT. Contudo, a Comissão não considera adequado basear-se exclusivamente nestes elementos para quantificar o auxílio. Com efeito, a utilização da situação do mercado antes das declarações de Julho de 2002, embora permita tomar em consideração o efeito nos mercados das declarações prévias das Autoridades francesas, não permite isolar estes efeitos das consequências eventuais de acontecimentos como a alteração dos órgãos de direcção da FT ou o plano Ambition 2005. Por conseguinte, esta avaliação proporciona apenas uma visão «bruta» que não é provavelmente equivalente, de forma rigorosa, à vantagem recebida pela FT.

(261)

Apesar de todos os seus esforços, a Comissão não conseguiu obter uma avaliação razoável do impacto financeiro «líquido» das medidas notificadas, que deveria ser estabelecido com base num cálculo teórico que isolasse os efeitos das declarações e comportamentos imputáveis ao Estado de qualquer outro acontecimento susceptível de exercer uma influência sobre a situação da FT ou sobre a percepção desta situação pelos mercados. Não parece também possível integrar na decisão parâmetros de cálculo suficientemente precisos para poder efectuar um cálculo definitivo durante a fase de execução da decisão. Nestas circunstâncias específicas, o respeito dos direitos da defesa do Estado-Membro poderá constituir um obstáculo à recuperação, nos termos do n.o 1 do artigo 14.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999, segundo o qual «a Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se tal for contrário um princípio geral de direito comunitário».

(262)

Esta conclusão parece também decorrer do princípio da confiança legítima. É um facto que a França não apresentou à Comissão nenhum argumento relativo à existência de uma confiança legítima dos beneficiários do auxílio. Contudo, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça (182) que a Comissão deve tomar sempre em consideração as circunstâncias excepcionais que justificam, nos termos do n.o 1 do artigo 14.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999, que renuncie a ordenar a recuperação de auxílios concedidos ilegalmente se tal for contrário a um princípio geral do direito comunitário, como o respeito da confiança legítima dos beneficiários.

(263)

A Comissão tomou em consideração as declarações do Governo na sua apreciação da conformidade da medida em causa face às regras em matéria de auxílios estatais. Considerado isoladamente, o projecto de adiantamento de accionista teria, provavelmente, sido considerado como não constituindo um auxílio nos termos do Tratado. Contudo, a Comissão chegou à conclusão de que as declarações tiveram por efeito recuperar a confiança que o mercado consagrava à empresa, excluindo assim a aplicação do princípio do investidor privado prudente e tornando o projecto de adiantamento de accionista a concretização do auxílio concedido à FT. A Comissão reconhece que se trata da primeira vez que se encontra perante a questão de saber se este tipo de comportamento constitui um auxílio. Na medida em que o auxílio depende, por conseguinte, de comportamentos que precederam a notificação do projecto de adiantamento, um operador diligente teria podido confiar na legitimidade do comportamento do Estado-Membro em causa que, por seu turno, tinha notificado devidamente o projecto de adiantamento. Tal como referiu o Advogado-Geral Darmon nas suas conclusões no processo C 5/98 (183)«não se podem desprezar as hesitações que podem ter certas empresas, perante formas “atípicas” de auxílios, sobre a necessidade ou não de notificação».

(264)

Para terminar, a Comissão conclui que a FT pôde legitimamente ter confiança quanto ao facto de os comportamentos da França não constituírem um auxílio estatal. À luz do que precede, a Comissão considera que, no caso em apreço, ordenar a recuperação do auxílio seria contrário aos princípios gerais do direito comunitário.

11.   CONCLUSÕES

(265)

A Comissão verifica que o adiantamento de accionista concedido pela França à FT em de Dezembro de 2002, sob a forma de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros, considerado no contexto das declarações formuladas a partir de Julho de 2002 constitui um auxílio estatal,

ADOPTOU A PRESENTE DECISÃO:

Artigo 1.o

O adiantamento de accionista concedido pela França à France Télécom em Dezembro de 2002, sob a forma de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros, considerado no contexto das declarações formuladas a partir de Julho de 2002, constitui um auxílio estatal incompatível com o mercado comum.

Artigo 2.o

O auxílio referido no artigo 1.o não será objecto de recuperação.

Artigo 3.o

A República francesa é destinatária da presente decisão.

Feito em Bruxelas, em 2 de Agosto de 2004

Pela Comissão

Frederik BOLKESTEIN

Membro da Comissão


(1)  JO C 57 de 12.3.2003, p. 5.

(2)  Ver pontos 1 a 8 da decisão de início do procedimento, que devem ser considerados como parte integrante da presente decisão.

(3)  Ver nota n.o 1.

(4)  Parte que deseja manter a confidencialidade da sua identidade.

(5)  Igualmente designada MCI, para efeitos da presente decisão.

(6)  Parte que deseja manter a confidencialidade da sua identidade.

(7)  Acompanhadas de uma denúncia apresentada pelas mesmas empresas com data de 22 de Janeiro de 2003.

(8)  Parte que deseja manter a confidencialidade da sua identidade.

(9)  A LDCOM comunicou à Comissão uma errata que foi enviada às Autoridades francesas em 16 de Junho de 2003.

(10)  As Autoridades francesas enviaram uma versão corrigida de um dos anexos, por correio electrónico, em 30 de Julho de 2003.

(11)  2003/S 103-091487.

(12)  Parte que deseja manter a confidencialidade da sua identidade.

(13)  Que contém uma consulta efectuada pelo Sr. Sureau.

(14)  Que contém três relatórios elaborados por três peritos nomeados pela FT (C.D. Ehlermann, Y. Galmot e Sir Studzinski do banco HSBC).

(15)  Esta carta contém estudos cujos autores desejam manter o anonimato. Trata-se de um estudo económico, um estudo sobre o direito inglês, um estudo sobre o direito americano e um estudo sobre o direito francês relativos à força vinculativa das declarações do Estado.

(16)  Que contém os relatórios de peritos descritos no ponto 4.13.

(17)  O Estado continua a deter a maioria do capital da FT. Ver considerando 60.

(18)  Pontos 9 a 12 da decisão de início do procedimento. Segundo o relatório de 2003, o Estado accionista, a FT conta 240 000 colaboradores em 39 países.

(19)  Audição de Thierry Breton, Presidente da FT, perante a comissão de inquérito sobre a gestão das empresas públicas, sessão de 4 de Junho de 2003.

(20)  NERA: «O rácio de endividamento é definido como a relação entre a dívida a longo prazo e o capital total a longo prazo (dívida e capital)». («The debt ratio is defined as the ratio of long term debt to total long term capital (debt and equity)»).

(21)  NERA: «A relação entre a dívida e o capital social corresponde à relação entre a dívida a longo prazo e o capital». («The debt-equity ratio is calculated as the ratio of long-term debt to equity»).

(22)  NERA: «O “times-interest-earned ratio” ou “interest cover” indica em que medida os juros são cobertos pelo resultado antes de juros e impostos mais amortizações (EBIT). Esta medida indica o nível de adequação do cash flow gerado pela empresa e a sua capacidade de fazer face ao pagamento dos juros». («The “times-interest-earned ratio” or “interest cover” measures the extent to which interest is covered by earnings before interest and taxes (EBIT) plus depreciation. The measure gives a level of the adequacy of cash flow generation and the consequent comfort a company enjoys in meeting its interest payments»).

(23)  NERA: «Os cálculos baseiam-se nos dados fornecidos pela FT. As estimativas abrangem os juros e o capital ligados aos empréstimos obrigacionistas e aos títulos de tesouraria (os juros sobre os títulos de tesouraria foram calculados entre 25 de Julho e 31 de Dezembro de 2003 devido à inexistência de dados anteriores».) («Calculations based on data supplied by France Télécom. Figures include bond and commercial paper interest and principal (interest on commercial paper was computed from 25 July 2002 to 31 December 2003 due to data unavailability for previous dates)»).

(24)  «Os “credit ratings” são utilizados pelos investidores como indicadores da probabilidade de obter um reembolso em conformidade com as condições aplicáveis ao seu investimento. Com efeito, as notações de risco de crédito com “qualidade de investimento” (categorias internacionalmente compreendidas entre “AAA” e “BBB” para uma situação a longo prazo e “F1” — “F3” para uma situação a curto prazo) indicam uma probabilidade relativamente baixa de incumprimento, enquanto as notações dos níveis “especulativos” ou “que não têm qualidade de investimento” (internacionalmente entre “BB” e “D” para uma situação a longo prazo e “B — D” para uma situação a curto prazo) podem indicar uma elevada probabilidade de incumprimento ou que um incumprimento já se verificou» (sítio Internet da Fitchs Rating: http://www.fitchratings.com/). («Credit ratings are used by investors as indications of the likelihood of repayment in accordance with the terms on which they invested. Thus, the use of credit ratings defines their function: “investment grade” ratings (international long-term “AAA” — “BBB” categories; short-term “F1” — “F3”) indicate a relatively low probability of default, while those in the “speculative” or “non-investment grade” categories (international long-term “BB” — “D”; short-term “B” — “D”) may signal a higher probability of default or that a default has already occurred» (sítio internet da Fitchs Rating: http://www.fitchratings.com/).).

(25)  Moody’s: «Moody's places France Télécom and Orange's long-term debt ratings on review for downgrade — Approximately EUR60 billion of Debt Securities Affected… The France Télécom ratings under review for possible downgrade relate to the following: Convertible global bonds, Euro MTNs, Eurobonds, Floating Rate Euro MTNs, Floating Rate French Franc Bonds, French Bonds, Swiss Franc Bonds, its issuer rating and bank loan rating…. Any resulting rating action should not exceed more than one notch».

(26)  «A perspectiva da dívida BBB+ a longo prazo da France Télécom passou a negativa; a notação A-2 foi confirmada… Esta decisão vem na sequência da notícia segundo a qual a autoridade regulamentadora da bolsa alemã vai investigar um possível acordo entre a France Télécom, o accionista maioritário — Gerhard Schmid — da Mobilcom AG, na qual a France Télécom detém 28,5 %, e um consórcio de bancos europeus, relativamente às condições de uma alteração de controlo na Mobilcom». («France Télécom's Long-Term“BBB+” Rating Placed on CreditWatch Negative; A-2 Rating Affirmed… The action follows news that the German stock-exchange regulatory authority will investigate a possible agreement between France Télécom, the main shareholder — Gerhard Schmid — of France Télécom's 28,5 % -owned German associate Mobilcom AG, and a consortium of European banks regarding the conditions for a change in control of Mobilcom».)

(27)  «Moody's Investors Service has today placed the Prime-2 short-term rating of France Télécom (FT) on review for possible downgrade as a result of the rating agency's decision to expand the scope of the ongoing review of FT. The ongoing review for downgrade of the Baa1 long-term debt ratings of both FT and Orange plc will continue. Although Moody's has revised its guidance, indicating that a downgrade of up to two notches is now possible for the long-term ratings, the rating agency expects the ratings to remain investment grade. The review of FT's Prime-2 rating reflects Moody's increasing concerns about FT's ability to execute its debt reduction strategy. The rating agency noted that FT's slow progress in finalising asset sales, coupled with continuing deterioration in capital market conditions in this sector, could further limit FT's ability to improve its financial flexibility and meet its debt reduction targets».

(28)  «Standard & Poor's said today that the ratings on France Télécom (BBB+/Watch Neg/A-2) remain unchanged, including the group's short-term corporate credit rating. In its CreditWatch placement of France Télécom's long-term ratings on March 28, 2002, Standard & Poor's indicated that any long-term rating downgrade would be limited to one notch and that its short-term ratings were affirmed. This indication is still valid today».

(29)  «[…] Despite expectations that FT's EBITDA will grow to around €14 billion in 2002, FT's substantial interest and capex requirements means the company is not expected to generate material free cashflow for deleveraging in the near term. FT is dependant upon asset disposals and its treasury stock to make any significant inroads into reducing its debt:

Moody's regard FT's ability to reduce debt within a relatively short period as having become increasingly constrained by the fall in its equity value, which reduces the potential value of the treasury stock FT holds, reducing the probability of conversion of numerous convertible bonds and potentially implying a lower realizable value for expected non-core asset disposals, although Moody's acknowledges that it is possible this may change. Additionally, the positive impact of expected asset disposals is expected to be partly offset by various contingent liabilities adversely impacting upon FT;

The negative outlook attached to the Baa3 rating reflects the execution risks associated with FT's high debt refinancing needs of this highly leveraged company. Although Moody's does not have any immediate liquidity concerns, the rating agency notes that FT faces around €15 billion of total long-term debt maturities in 2003»;

(30)  «Standard & Poor's said today that it has lowered its long- and short-term corporate credit ratings on France Télécom (FT) to triple-“B”/“A-3” from triple-“B”-plus/“A-2”. The downgrade primarily reflects Standard & Poor's expectations that FT will acquire the 71,5 % stake it does not already own in German wireless operator Mobilcom, as well as FT's inability to reduce debt sufficiently and rapidly enough to maintain credit measures consistent with the previous ratings. Standard & Poor's also lowered to triple-“B” from triple-“B”-plus its long-term corporate credit rating on Orange S.A., FT's majority-owned wireless subsidiary. The long-term ratings on both companies remain on CreditWatch with negative implications, where they were placed on March 28, 2002, reflecting FT's challenging refinancing needs, including €15 billion of financial obligations in 2003».

(31)  A Fitch baixou a nota da FT em 5 de Julho de 2002, e a S & P em 12 de Julho de 2002. No comunicado de imprensa de 12 de Julho, a S & P afirmava que: «A FT poderia encontrar algumas dificuldades para refinanciar a sua dívida obrigacionista com vencimento em 2003». («FT could face certain difficulties refinancing its debt obligations coming due in 2003».)

(32)  Audição de V. de la Bachelerie, auditor da FT, perante a comissão de inquérito acima referida: «Por lei, com efeito, devemos desencadear o procedimento de alerta logo que surjam determinadas condições e indicadores. Este procedimento não era aplicável antes de meados de 2002, data em que se tornou evidente o sinal dado pelo mercado: a descida da nota da France Télécom. No âmbito da nossa missão de auditor, fomos obrigados a tratar a questão em comité de auditoria e em Conselho de Administração, exigindo que fosse apresentado aos membros do Conselho de Administração um plano de liquidez a curto prazo, para fazer face à “barreira à liquidez”. De salientar que este problema surgiu tardiamente, na medida em que a empresa tinha, até essa data, os meios necessários para se refinanciar e tinha aliás realizado financiamentos importantes, nomeadamente “jumbos”. Por conseguinte, quando surgiu a “barreira à liquidez” com a descida da notação, solicitámos uma actualização das previsões de tesouraria. Por ocasião das contas semestrais, adoptadas no início de Setembro de 2002 e concluídas no conselho de 12 de Setembro de 2002, procedeu-se a uma análise da situação da liquidez a curto prazo — em termos de liquidez, a visibilidade é apreciada, com efeito, a curto prazo, ou seja, a menos de um ano. A situação, nessa altura crítica, foi oficializada nas notas anexas aos mapas financeiros de 30 de Junho de 2002».

(33)  O texto das declarações do Governo francês é reproduzido infra, no considerando 204.

(34)  Goldman Sachs: «A FT esteve prestes a ser colocada no nível especulativo pela Moody’s e pela S & P». («FT was on the brink of “junk” status with both Moody’s and S & P’s».)

(35)  Off Watch; Outlook Stable; Teleconf 3:30PM BST Today, Standard & Poor’s Ratings direct, (12 de Julho de 2002).

(36)  Audição de Thierry Breton, Presidente da FT, na comissão dos assuntos económicos da Assembleia Nacional, de 11 de Dezembro de 2002: «Referiu que o plano de financiamento adoptado não tinha sido cumprido e que a situação se tinha agravado no início de 2001, de tal modo que era previsível para o Verão de 2003 uma crise de liquidez… Thierry Breton declarou que, face a uma ameaça de cessação dos pagamentos, a empresa tinha ficado em estado de choque… devido à importância do seu endividamento, uma vez que tinha de encontrar a liquidez necessária para reembolsar 15 mil milhões de euros em 2003 e em 2004 e 20 mil milhões de euros em 2005».

(37)  Senado, 21 de Novembro de 2002, parecer apresentado em nome da comissão dos assuntos económicos e do plano (1) sobre o projecto da lei de finanças para 2003, adoptado pela Assembleia Nacional.

(38)  Estes dados foram extraídos do anexo à carta das Autoridades francesas de 3 de Dezembro de 2002. Contudo, na página 25 dessa carta, as Autoridades francesas estimam em 15 mil milhões de euros as dívidas obrigacionistas pendentes em 2003. Esta diferença deve-se à estimativa da dívida obrigacionista com vencimento até ao final de 2004, avaliada em 18,8 mil milhões de euros no anexo 2 e em 23,9 mil milhões de euros na página 20 da referida carta.

(39)  Ver o relatório elaborado em nome da comissão de inquérito sobre a gestão das empresas públicas para melhorar o sistema de tomada de decisão, registado na presidência da Assembleia Nacional em 3 de Julho de 2003 (a seguir «relatório da comissão de inquérito» ou, de forma resumida, «comissão de inquérito»): «A comissão pretendeu analisar com precisão a estratégia e os aspectos processuais das aquisições internacionais realizadas pela France Télécom e pela EDF, tendo em conta as suas graves consequências para as contas destas duas empresas (no que se refere à France Télécom, os prejuízos atribuíveis às provisões e amortizações excepcionais relacionadas com as aquisições para o período 1998-2002 elevam-se a 28,5 mil milhões de euros para 2001 e 2002). Trata-se praticamente dos mesmos elementos: precipitação nas aquisições de grande envergadura (num ano, entre 1999 e 2000, a France Télécom consagrou-lhes 65 mil milhões de euros), atenção insuficiente aos riscos económicos, políticos ou geopolíticos, modalidades de financiamento particularmente imprudentes… Neste clima de incerteza, de urgência e de dúvida, a empresa lançou-se, a partir de 1999, num crescimento externo ambicioso e desordenado, privilegiando o acesso aos mercados do Reino Unido e da Alemanha».

Ver igualmente o comunicado de imprensa do Ministro da Economia e Finanças de 5 de Dezembro de 2002: «… a empresa tem hoje de fazer face hoje a uma estrutura financeira desequilibrada, e a necessidades de fundos próprios e de refinanciamento a médio prazo. Esta situação resulta do fracasso dos investimentos anteriores, mal conduzidos e realizados no auge da “bolha” financeira e, em termos mais gerais, da viragem dos mercados. O facto de a France Télécom não poder financiar o seu desenvolvimento de outra forma a não ser o endividamento agravou esta situação».

(40)  «Segundo as informações comunicadas pelas Autoridades francesas, este nível de endividamento explicar-se-ia pelo facto de a FT ter realizado, a partir de 1999, um desenvolvimento externo muito importante que financiou exclusivamente através da contracção de empréstimos, sem recorrer, como os seus concorrentes, aos mecanismos de aumento de capital ou de troca de acções, devido à obrigação jurídica segundo a qual o capital da FT deve ser maioritariamente detido pelo Estado. Por outro lado, as Autoridades francesas invocaram igualmente a viragem dos mercados que impediu a realização dos sucessivos planos relativos à dívida… Assim durante 2000, a empresa financiou significativamente as suas aquisições nos mercados obrigacionistas e bancários: o total das emissões de empréstimo a longo prazo da FT atingiu 59 mil milhões de euros em 2000-2001, e a linha de crédito “15 mil milhões de euros” constitui apenas o refinanciamento parcial de um financiamento bancário de aquisição efectuado em meados de 2000, num montante de 30 mil milhões de euros…» (pontos 20 e 21 da decisão de início do procedimento).

(41)  Comunicado de imprensa da FT de 5 de Dezembro de 2002, p. 2. Ver igualmente audição de Thierry Breton, Presidente da FT, na comissão dos assuntos económicos em 11 de Dezembro de 2002: «durante 2000 foram efectuadas aquisições num montante total de 106 mil milhões de euros (aquisição da Orange PLC, NTL, Equant e TPSA)».

(42)  Audição de Thierry Breton, Presidente da FT, na comissão dos assuntos económicos acima referida: «No total, afirmou Thierry Breton, relativamente a cerca de 100 mil milhões de euros de aquisições, 75 foram utilizados para o desenvolvimento da estratégia no sector da telefonia móvel, 10 mil milhões foram investidos na TPSA, 11,2 mil milhões na Mobilcom e 9 mil milhões na NTL». Ver igualmente o relatório de Goldman Sachs, de 26 de Setembro de 2002, que esclarece que a dívida tinha sido «acumulada através de uma série de transacções em 2000, principalmente a aquisição da Orange e a empresa comum Mobilcom» («amassed through a series of transactions in 2000, mainly the acquisition of Orange and the Mobilcom joint venture»).

(43)  Comissão de inquérito acima referida: «No caso da Orange, que contribuiu de forma decisiva para a explosão do endividamento do grupo».

Relatório de informação do Senado n.o 274, junto à acta da sessão de 21 de Fevereiro de 2002: «Em 29 de Maio de 2000, a France Télécom e o grupo Vodafone concluíram um acordo através do qual a France Télécom devia adquirir, junto da Mannesmann, a totalidade das acções que constituem o capital da Orange plc, operador de telecomunicações móveis britânico. Este acordo foi executado em 22 de Agosto de 2000 através da aquisição, pela France Télécom, de 664 743 658 acções da Orange contra o pagamento, em numerário, de 21,5 mil milhões de euros e da transferência, da Vodafone para a France Télécom, de 544 559 931 acções da Orange, remunerada através da emissão de 129 201 742 acções da France Télécom ao preço unitário de 140,2 euros, abstendo-se a Vodafone de utilizar os direitos de voto que acompanham estas acções. Simultaneamente, a France Télécom concedeu à Vodafone uma série de opções de venda relativamente às acções da France Télécom que foram emitidas em seu favor e a Vodafone concedeu à France Télécom uma opção de compra sobre a totalidade ou parte das suas acções France Télécom. A France Télécom readquiriu imediatamente à Vodafone 15 355 531 acções da France Télécom ao preço de emissão, de tal forma que a Vodafone detém apenas 9,9 % do capital da France Télécom… Na sequência da introdução na bolsa da Orange SA, em 13 de Fevereiro de 2001, a Vodafone e a France Télécom chegaram a um acordo, em 28 de Fevereiro de 2001, sobre as modalidades de venda, à France Télécom, dos 113,85 milhões de acções da France Télécom ainda detidas pela Vodafone. Este acordo determina de forma global as modalidades de execução das opções de venda e de compra das acções da France Télécom detidas pela Vodafone e estabelece em cerca de 11,63 mil milhões de euros o preço total destas acções… A terceira fracção poderá ser objecto de um complemento… O complemento poderá atingir um montante de cerca de 1,5 mil milhões de euros… Com base neste acordo, o custo de aquisição total da Orange plc eleva-se a 35 472 milhões de euros».

Ver igualmente o relatório da comissão de inquérito acima referida: «A compra de 43,2 mil milhões de euros (que passaram a 35,4 mil milhões de euros em Fevereiro de 2001) foi financiada, a 50 %, em numerário (21,5 mil milhões de euros) e a 50 % através de troca de acções (18,1 mil milhões de euros). Contudo, relativamente a este último ponto, a France Télécom comprometeu-se a readquirir estas acções à cotação mínima de 104 euros. Não existiam dúvidas de que o vendedor exigiria a realização destas opções de aquisição… Devido à queda da bolsa a partir do Outono de 2000, o risco de que o grupo francês se visse obrigado a pagar 100 % da Orange em numerário concretizou-se, com dois pagamentos à Vodafone de 6,631 mil milhões de euros e de 4,973 mil milhões de euros em Março de 2001 e de 2002».

(44)  Comissão de inquérito: «Foi nestas circunstâncias difíceis que surgiu o projecto de entrada no capital da Mobilcom… Parece óbvio que a aquisição de uma participação de um montante muito elevado não foi objecto de uma reflexão verdadeiramente aprofundada, apesar de implicar riscos consideráveis… Em Março de 2000, a France Télécom investiu assim 3,7 mil milhões de euros para adquirir 28,5 % do capital, valorizando o operador em 80 vezes o seu EBITDA (contra uma valorização da bolsa da ordem de 65 vezes o EBITDA antes dos rumores relativos à operação), ou seja um prémio de 570 milhões de euros. A France Télécom tinha de proceder a esta injecção de capital, que assumia inicialmente a forma de um empréstimo com garantia irrevogável, mesmo que não obtivesse a licença UMTS.

Além disso, no âmbito de um acordo de cooperação de que o vosso relator tomou conhecimento, a France Télécom comprometia-se a fornecer à Mobilcom, sem limites, o apoio financeiro necessário à participação no mecanismo de licitação e ao desenvolvimento da actividade UMTS na Alemanha… Em contrapartida destes compromissos, os riscos assumidos pela Mobilcom eram consideráveis. O plano de actividades elaborado em apoio da operação parece ter sido muito imperfeito. No que se refere em primeiro lugar ao desenvolvimento da UMTS, o preço das licenças foi avaliado em 2 ou 3 mil milhões de euros, embora as licitações britânicas realizadas em Março e Abril de 2000 tivessem evidenciado a inflação das licenças. Em Agosto de 2000, as licenças alemãs atingiram 8,4 mil milhões de euros, sem que a France Télécom tenha pensado em se libertar, quando ela própria tinha investido dois meses antes 43 mil milhões de euros na aquisição da Orange [sublinhado nosso]… Com efeito, foi preciso esperar pelo Verão de 2002 para que fossem lançadas duas missões de auditoria sobre as perspectivas do operador alemão, que revelaram a extrema fragilidade da empresa, a fraca qualidade da sua base de clientela e a impossibilidade manifesta de rendibilizar o investimento».

(45)  Comissão de inquérito: «Recorde-se além disso que, paralelamente a esta procura de importantes tomadas de participação [NTL, Mobilcom, Orange], a France Télécom prosseguiu igualmente aquisições oportunistas, que eram apenas secundárias relativamente à sua estratégia internacional. Apesar de muitas vezes estas aquisições apresentarem um verdadeiro interesse industrial, aumentavam inutilmente a exposição do operador aos riscos industriais e oneravam os seus compromissos financeiros… Mais uma vez, mesmo que o investimento pudesse parecer sedutor, é legítimo questionar o seu volume (7,69 mil milhões de euros, a que se devem acrescentar 1,5 mil milhões de euros relativos à opção de aquisição concedida ao parceiro e um programa de investimento de 6,7 mil milhões de euros durante 7 anos, que deveria contudo ser na sua grande maioria autofinanciado), num momento em que, principalmente devido à aquisição da Orange, as capacidades de financiamento do grupo se encontravam em larga medida saturadas (com um endividamento superior a 2,7 vezes os fundos próprios) e em que surgiam sinais evidentes de uma crise da bolsa… Que concluir assim das declarações que Michel Bon proferiu, perante a vossa comissão, sobre esta operação: “Teria sido preferível interrompê-la, mas os dados estavam lançados…”».

O exemplo da TPSA é esclarecedor. O operador francês candidatou-se à aquisição do operador histórico polaco aquando da sua privatização em Setembro de 1999.

(46)  Comissão de inquérito: «Em Julho [1999], a France Télécom quis aproveitar a oportunidade de penetrar no mercado britânico, tornando-se o accionista de referência da NTL. É um facto que as justificações industriais do projecto eram sólidas… No total, o operador francês assumiu compromissos de 8,122 mil milhões de euros num investimento que, logo que a aquisição da Orange passou a ser uma hipótese concreta perdeu praticamente todo o interesse estratégico, e relativamente ao qual, além disso, apenas exerceria um controlo minoritário. É espantosa a ligeireza com que a direcção da empresa parece ter analisado esta situação».

(47)  «O Ministério da Economia, Finanças e Indústria desmente as informações segundo as quais Thierry BRETON teria aceite a presidência da France Télécom em substituição de Michel BON». Comunicado de imprensa do Ministro da Economia e Finanças de 12 de Setembro de 2002, comité técnico paritário ministerial.

(48)  Comunicado de imprensa do ministro da economia e finanças, 13 de Setembro de 2002, situação financeira da France Télécom.

(49)  «A Moody’s altera a perspectiva da France Télécom e da Orange de negativa para estável e confirma a notação de Baa3 para a dívida a longo prazo e de prime-3 para a dívida a curto prazo». (Moody’s changes France Télécom and Orange’s outlook to stable from negative and affirms the Baa3 long-term debt ratings and prime-3 short-term rating), Moody’S investors services, 13 de Setembro de 2002. A parte pertinente do comunicado de imprensa referia o seguinte: «A confiança da Moody’s foi reforçada com a declaração do Governo que, mais uma vez, confirmou o seu forte apoio à France Télécom. Embora a Moody’s continue preocupada relativamente ao nível global do risco financeiro e, mais especificamente, à situação frágil da France Télécom em matéria de liquidez, esta agência está mais confiante quanto ao facto de o Governo francês apoiar a France Télécom, caso a empresa se veja confrontada com dificuldades no reembolso da sua dívida». («Moody's have taken increased comfort from the governments statement, which once again confirmed their strong support for FT. Whilst Moody's concerns regarding the overall level of financial risk and particularly FT's weak liquidity position remain, Moody's has grown more comfortable with expectation that the French government will act in a supportive manner, if FT started to encounter difficulties with its debt repayment schedule».) (sublinhado nosso)

(50)  Comunicado de imprensa do Ministro da Economia e Finanças, quarta-feira 2 de Outubro de 2002, France Télécom.

(51)  Comunicado de imprensa da FT de 5 de Dezembro de 2002, p. 1.

(52)  P. 27 da carta das Autoridades francesas de 3 de Dezembro de 2002.

(53)  Comunicado de imprensa do Ministro da Economia e Finanças de 4 de Dezembro de 2002, apoio do Estado ao plano de acção aprovado pelo Conselho de Administração da France Télécom.

(54)  Ver igualmente o relatório anual da France Télécom relativo a 2002: «Por outro lado, a France Télécom emitiu em 29 de Julho de 2002 um empréstimo obrigacionista, obrigatoriamente reembolsável em acções ST Microelectronics à taxa de 6,75 %, num montante de 442 milhões de euros, cuja data de vencimento é 6 de Agosto de 2005. As taxas obtidas são indexadas em função das taxas do mercado monetário, acrescidas de uma margem».

(55)  AFP de 13 de Janeiro de 2003: «A France Télécom acaba de lançar uma nova etapa do seu plano de refinanciamento através do mercado obrigacionista, com um empréstimo de 3 mil milhões de euros […]. As condições da operação serão conhecidas antes do final da semana».

Segundo um artigo do Financial Times de 15 de Janeiro de 2003: «A FT vai hoje dissipar as dúvidas dos investidores relativamente à sua situação de tesouraria, introduzindo 5,5 mil milhões de euros no mercado obrigacionista. […] Disporá assim da quantia necessária para honrar a sua dívida de 15 mil milhões de euros, que vence este ano […]. A FT deve igualmente fazer face a uma dívida de 35 mil milhões de euros em 2004 e 2005». («FT will today settle investor doubt about its cash flow situation in 2003 by raising €5.5 billion in the bond market. […] It would now have all the cash it needs to honor €15 billion of debts that falls due for repayment this year […] FT also faces €35 billion of debt repayments in 2004 and 2005».)

(56)  Research France Télécom, STANDARD & POOR’S RATINGSDIRECT, 17 de Dezembro de 2002: «Desde Julho de 2002, o apoio do Estado francês constituiu um factor determinante para a notação do grupo, mantendo-o no nível de investimento». («Since July 2002, support from the French state has been a key rating factor, underpinning the group’s investment-grade status».) (sublinhado nosso). Esta afirmação vem na sequência da proferida em 5 de Dezembro: «Os serviços de notação da Standard & Poor’s afirmaram hoje que confirmariam a notação da FT de BBB- a longo prazo e de A-3 a curto prazo. Desde Julho de 2002, a Standard & Poor’s indicou que o apoio previsto do accionista que detém 56 % da FT, o Estado francês, constitui inequivocamente um factor que veio apoiar a qualidade de investimento do grupo. O anúncio hoje efectuado pelo Estado, segundo o qual iria conceder imediatamente um adiantamento de accionista de 9 mil milhões de euros para auxiliar a FT a fazer face às suas obrigações para 2003 foi considerado pela Standard & Poor’s uma prova sólida do seu apoio». («Standard & Poor’s rating services said today that it has affirmed its BBB- long term and A-3 short term corporate credit ratings [on FT] … Since July 2002 Standard & Poor’s has indicated that expected support from FT’s 56 % shareholder, the French State, is a likely factor underpinning the group investments–grade status. The French State’s announcement today that it will immediately grant a 9€ billion shareholder loan to help FT face its 2003 debt obligations is viewed by Standard & Poor’s as strong evidence of this support».) (Standard & Poor’s, 5 de Dezembro de 2002) (sublinhado nosso)

(57)  Research France Télécom, STANDARD & POOR’S RATINGSDIRECT, 17 de Dezembro de 2002: «The state's December 2002 announcement that it will grant a €9 billion shareholder loan, coupled with its commitment to subscribe to a €15 billion capital increase, underscores this support and provides significant credit protection for FT's debtholders. Although the rights issue's timing has not been specified yet, FT and the state's targets in this respect meet Standard & Poor's expectations for the ratings. While market conditions may challenge the operation, the state's commitment to subscribe to the equity injection — so as to at least maintain its stake — strongly mitigates execution risks».

(58)  Este elemento constinua a ser muito importante para a S & P em 17 de Dezembro de 2002. É também fundamental para a Moody’s em Fevereiro de 2003. Na análise dos elementos fundamentais da empresa esta agência considera, (1) o facto de a FT ser o maior operador francês de telefonia fixa e móvel, (2) a possibilidade de privatização da empresa « FT's path from Governement Entity to Private Corporation»; (3) — na secção «Governement seen As Supportive» — o facto de que: «O Governo francês afirmou constantemente o seu apoio à France Télécom e a sua intenção de fornecer, se necessário, um apoio financeiro para minorar os potenciais problemas de liquidez. Este apoio traduziu-se na colocação à disposição, pelo ERAP, de uma linha de crédito de 9 mil milhões de euros a favor da France Télécom durante um período de 18 meses, que incluía juros, mas que era exclusivamente reembolsável em acções da France Télécom. A Moody’s integra o apoio do Estado na sua notação Baa3». («The French government has consistently stated its support for FT and its willingness to provide financial support if required, thereby addressing potential liquidity concerns. (sublinhado nosso) This support has been evidenced by ERAP’s providing a €9 billion loan facility to FT, which pays cash interest, but is only repayable in FT's equity, upon maturity in 18 months time […]. Moody’s factors governement support into the Baaa3 rating».) (sublinhado nosso); (4) — na secção «risks/weaknesses» — o facto de que: «o risco financeiro associado ao considerável endividamento da France Télécom não corresponde à sua qualidade de investimento (o que é compensado por bons resultados de exploração e pelo apoio implícito do Governo francês». («the financial risk of the highly leveraged FT is not commensurate with investment grade (compensated by strong operational performance/implicit support of French government)».) (sublinhado nosso)

No entanto, após o aumento de capital, este elemento deixou de ser tomado em consideração e a notação baseia-se claramente nos dados financeiros da FT. Por exemplo, a S & P escreve em 14 de Maio de 2003«On May 14, 2003, S & P raise its long and short term corporate credit ratings on […] FT to BBB from BBB- […]. The action follows FT’s recent €15 billion rights issue and S & P review of the new management’s business strategy for the group as well as the debt-reduction potential arising from its plan to boost cash flow generation during the next three years».

(59)  JO C 288 de 9.10.1999, p. 2.

(60)  Decisão 2001/89/CE da Comissão, de 23 de Junho de 1999, relativa à aprovação condicional do auxílio concedido pela França ao Crédit Foncier de France (JO L 34 de 3.2.2001, p. 36).

(61)  A BT menciona, na página 25 das suas observações de 22 de Janeiro de 2003, um acórdão do Tribunal de Cassação, Câmara Comercial, de 9 de Julho de 2002, n.o 1414 FP-P.

(62)  Nota do Sr. Sureau de 14 de Janeiro de 2004.

(63)  Cujo autor deseja manter a confidencialidade da sua identidade.

(64)  Carta da Direcção do Orçamento, de 22 de Julho de 2003, intitulada «Recenseamento dos dispositivos de garantia implícita ou explícita concedida pelo Estado».

(65)  A BT faz igualmente referência, nas suas observações de 11 de Abril de 2003, p. 14, ao facto de o Estado, para realizar a operação de apoio, ter recorrido ao ERAP e à legislação que lhe é aplicável, por exemplo, a lei relativa à alteração do seu estatuto ou à concessão de uma garantia explícita.

(66)  A BT faz referência à decisão 2000/536/CE da Comissão, de 2 de Junho de 1999, relativa ao auxílio estatal concedido pela Itália à Seleco SpA (JO L 227 de 7.9.2000, p. 24).

(67)  JO C 71 de 11.3.2000, p. 14.

(68)  Ver Comissão das Finanças, da Economia Geral e do Plano, acta n.o 26, sessão de 5 de Dezembro de 2002, audição de M. Thierry Breton, Presidente da France Télécom.

(69)  Decisão 2001/723/CE da Comissão, de 18 de Julho de 2001, relativa à recapitalização da companhia Alitalia (JO L 271 de 12.10.2001, p. 28).

(70)  Decisão 96/278/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1996, relativa à recapitalização da companhia Ibéria (JO L 104 de 27.7.1996, p. 25).

(71)  Este montante inclui três vantagens distintas: a subida da notação da FT aquando do recurso aos mercados obrigacionistas, as economias realizadas por não ter ocorrido uma deterioração da dívida, uma vez que esta estava baseada na notação, e as economias realizadas devido à escolha do calendário.

(72)  Decisão 98/490/CE da Comissão, de 20 de Maio de 1998, relativa aos auxílios concedidos pela França ao grupo Crédit Lyonnais, último parágrafo do ponto 8 (JO L 221 de 8.8.1998, p. 28).

(73)  «Algumas palavras do Estado, que vem recordar que o risco da FT é, em última instância, um risco “quase-soberano”». La Tribune de 3 de Fevereiro de 2003.

(74)  Ponto 17 das Orientações.

(75)  Agora designada Neuf Télécom.

(76)  A LDCOM faz referência a um relatório do Deutsche Bank, de 22 de Julho de 2002.

(77)  A LDCOM refere-se ao acórdão do Tribunal Internacional de Justiça, colectânea do Tribunal Internacional de Justiça de 1974, p. 267.

(78)  Comunicado de imprensa do Ministério das Finanças de 12 de Setembro de 2002.

(79)  Tribunal Comercial de Rouen, 10 de Março de 1981, Jurisdata 1982-00382, Soc. Chapelle Darblay.

(80)  Jurisclasseur commercial, redressement et liquidation judiciaires 1995, fascicule 3110.

(81)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 15 de Fevereiro de 2001, processo C-99-98, Áustria/Comissão, Col. p. I-1101. No caso em apreço, os artigos de imprensa não tinham força probatória uma vez que não provinham nem da empresa em causa nem do Governo.

(82)  Observações da LDCOM de 23 de Junho de 2003, p. 23.

(83)  Idem.

(84)  A LDCOM fornece a seguinte definição de spread: remuneração de um empréstimo contraído no mercado obrigacionista. Corresponde à diferença entre a taxa de juro paga por um emissor, em função das suas características, e a taxa de referência (obrigações do Estado no âmbito de empréstimos a longo prazo). O nível e a evolução dos spreads permitem, consequentemente, visualizar o risco que os mercados associam a um determinado emissor.

(85)  A LDCOM observa igualmente que o anúncio, no plano TOP, da criação de uma missão «mobilidade», com o objectivo de favorecer a afectação dos trabalhadores em toda a função pública, poderia conter elementos de auxílio.

(86)  A LDCOM propõe nomeadamente: a proibição de campanhas de reconquista de clientes nos mercados vocais, o estabelecimento de um limite máximo das despesas de marketing para os serviços vocais e os serviços Internet de elevado débito, a limitação dos meios de marketing colocados à disposição da Wanadoo.

(87)  A LDCOM propõe proibir o squeeze em termos de tempo ou de tarifas que afecta a desagregação, impor à Wanadoo uma obrigação de fornecimentos junto dos terceiros para a revenda Internet, aumentar a rendibilidade das redes alternativas através de uma subida das tarifas de interconexão de entrada e reservar aos concorrentes o benefício de subvenções públicas no âmbito do desenvolvimento de redes nas zonas de reduzida rendibilidade.

(88)  Na presente decisão são apenas retomadas as observações relacionadas com o controlo dos auxílios estatais.

(89)  Decreto n.o 2002-1409, de 2 de Dezembro de 2002, que altera o decreto n.o 65-1117, de 17 de Dezembro de 1967, relativo à organização administrativa e financeira do ERAP.

(90)  Artigo 80.o da lei n.o 2002-1576, de 30 de Dezembro de 2002, relativa à lei de finanças rectificativa para 2002.

(91)  A primeira nota é um estudo de Yves Galmot, de 7 de Junho de 2004, a segunda é um estudo de Claus-Dieter Ehlermann, de 1 de Junho de 2004, a terceira nota é um estudo de Michel Jeol acompanhado de uma nota de Pierre Kirch, de 11 de Junho de 2004. O relatório económico é um relatório do HSBC, de 2 de Junho de 2004.

(92)  As Autoridades francesas mencionaram nomeadamente emissões obrigacionistas, linhas de crédito, títulos de tesouraria, empréstimos a curto prazo, operações de titularização e produtos derivados.

(93)  Entre 26 de Julho de 2002 e a apresentação do plano Ambition 2005, ou seja, 4 de Dezembro de 2002, a FT emitiu um empréstimo obrigacionista de 70 milhões de euros em 26 de Julho de 2002 e uma fracção de 150 milhões de euros fungível com o empréstimo obrigacionista de 3,5 mil milhões de euros emitido em Março de 2001.

(94)  Segredos comerciais

(95)  Ver considerando 39.

(96)  Acórdãos do Tribunal de 16 de Maio de 2002, processo C-482/99, França/Comissão («Stardust»), Col. p. I-4397.

(97)  Observações das Autoridades francesas de 29 de Julho de 2003, p. 8. Nas suas observações de 4 de Abril de 2003, as Autoridades francesas indicam que a decisão de investir do accionista público remonta a 4 de Dezembro de 2002.

(98)  Acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 12 de Dezembro de 2000, processo T-296/97, Alitalia/Comissão, Col. p. I-3871.

(99)  Decisão da Comissão de 18 de Julho de 2001, C54/96 e N318/02 «Terceira parcela do auxílio à reestruturação a favor da transportadora Alitalia, aprovado pela Comissão em 18 de Julho de 2001 e novo aumento de capital no montante de 1,4 mil milhões de euros» (JO C 239 de 4 de Outubro de 2002, p. 2).

(100)  Observações das Autoridades francesas de 29 de Julho de 2003, p. 27.

(101)  Ver p. 8 das observações das Autoridades francesas de 29 de Julho de 2003.

(102)  Ver p. 9 das observações das Autoridades francesas de 29 de Julho de 2003.

(103)  “em função das condições de mercado” encontra-se em itálico nas observações das Autoridades francesas de 29 de Julho de 2003, p. 8.

(104)  Ver p. 9 das observações das Autoridades francesas de 29 de Julho de 2003.

(105)  Idem p. 9.

(106)  JO L 83 de 27.3.1999, p. 1. Regulamento alterado pelo acto de adesão de 2003.

(107)  Acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 12 de Dezembro de 1996, processo T-358/94, Compagnie nationale Air France/Comissão, Col. p. II-2109. Ver igualmente Decisão 94/662/CE da Comissão, de 27 de Julho de 1994, relativa à subscrição, pela CDC-Participations, de obrigações emitidas pela Air France (JO L 258 de 6.10.1994, p. 26).

(108)  O princípio da confiança legítima constitui um princípio geral do direito comunitário, consagrado por jurisprudência constante. Ver nomeadamente acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 29 de Abril de 2004, processos apensos T-236/01, T-239/01, T-244/01, T-245/01, T-246/01, T-251/01 e T-252/01, Eléctrodos de grafite, ainda não publicado, ponto 152. Ver igualmente os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância, de 9 de Julho de 2003, nos processos T-220/00, Cheil Jedang Corp./Comissão, ainda não publicado, ponto 33, T-223/00, Kyowa Hakko Kogyo Co. Ltd/Comissão, ainda não publicado, ponto 38 e T-224/00, Archer Daniels Midland Company/Comissão, ainda não publicado, ponto 62.

(109)  Acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1996, processos apensos C-329/93, C-62/95, C63/95, Alemanha/Comissão, Col. p. I-5151, pontos 28 e 32.

(110)  Na decisão de início do procedimento, a Comissão tinha com efeito indicado que estas declarações podiam constituir elementos a tomar em consideração. No ponto 70 desta decisão, a Comissão formulou uma afirmação de ordem geral: «Convém igualmente acrescentar que o anúncio feito pelo Estado, no sentido de assumir um compromisso, poderia já incluir a afectação de recursos estatais desde que tal compromisso fosse irrevogável e criasse, desta forma, um efeito de expectativa e de confiança no mercado, reflectido no aumento do valor das acções da FT e na reacção positiva das agências de notação». Seguidamente a Comissão relacionou esta afirmação com os factos indicados na notificação afirmando que «... O anúncio do compromisso do Estado, juntamente com a aparente colocação à disposição do montante do adiantamento conduzem a Comissão a sublinhar que se poderia, com efeito, considerar que o auxílio tinha sido concedido antes mesmo da assinatura de uma eventual convenção entre a FT e o ERAP relativa à colocação à disposição da linha de crédito» e precisou numa nota de pé-de-página que «Relativamente a este ponto, recorda-se que a partir do mês de Julho de 2002, e mais especificamente a partir do mês de Setembro de 2002, o mercado tinha já sido tranquilizado devido ao apoio do Estado a favor da FT» (nota de pé-de-página 40). Desta forma, na altura em que foi dado início ao procedimento, a Comissão indicou que a sua investigação poderia abranger os acontecimentos de Julho e Setembro de 2002.

(111)  Ver acórdão do Tribunal de Justiça, de 17 de Junho de 1999, processo C-75/97, Bélgica/Comissão, Col. p. I-03671, ponto 25.

(112)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 15 de Julho de 1964, processo 6/64, Costa/E.N.E.L., Col. p. 1141.

(113)  Acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 13 de Junho de 2000, processos apensos T-204/97 e T-270/97, EPAC/Comissão, Col. p. II-2267.

(114)  Acórdão do Tribunal Justiça, de 14 de Novembro de 1984, processo C-323/82, Intermills/Comissão, Col. p. I-3809, ponto 31.

(115)  Acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 27 de Janeiro de 1998, processo T-67/94, Ladbroke/Comissão, Col. p. II-1, ponto 52.

(116)  Acórdão já citado, Air France.

(117)  Ver por exemplo «A Moody’s prevê que uma combinação desta linha de crédito e do que resta da linha de crédito do consórcio bancário, de 15 mil milhões de euros, bem como o fluxo de tesouraria disponível permitirão, actualmente, o reembolso da dívida de 15 mil milhões de euros a efectuar nos próximos 12 meses». («Moody’s now expects that a combination of this facility headroom under the existing EUR 15 billion syndicated facility and the free cash flow will enable debt maturities of EUR 15 billion to be repaid during the next 12 months.») (Moody’s, 9 de Dezembro de 2002)

(118)  Acórdão «Stardust» supra citado, ponto 36. Ver igualmente acórdãos do Tribunal de Justiça, de 15 de Março de 1994, C-387/92, Banco Exterior de Espanha, Col. p. I-877, ponto 14, e de 19 de Maio de 1999, C-6/97, Itália/Comissão, Col. p. I-2981, ponto 16.

(119)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 1 de Dezembro de 1998, processo C-200/97, Ecotrade, Col., p. I-7907, ponto 43 e acórdão do Tribunal de Primeira Instância, EPAC, supra citado, ponto 80.

(120)  Como a adopção da lei relativa à extensão do objecto social do ERAP ou a adopção da lei de finanças rectificativa que concede uma garantia estatal de 10 mil milhões de euros ao ERAP.

(121)  Ver, o ERAP «já colocou à disposição da FT um adiantamento de accionista que será consolidado na altura do reforço dos fundos próprios da empresa» (Comissão das Finanças, Assembleia Nacional, Acta n.o 28, audição do Ministro Alain Lambert). Ver igualmente, diapositivo 42 de «France Télécom presentation to investors of December 5th, 2002»: a linha de crédito do Estado francês (French state back-up facility) é descrita como estando imediatamente disponível (immediately available). O mercado ficou convencido de que o adiantamento tinha sido efectuado. Ver, por exemplo: «O anúncio do Estado, feito hoje, de que este iria conceder imediatamente um adiantamento de accionista de 9 mil milhões de euros…» («The French State’s announcement today that it will immediately grant 9€ shareholder loan …») (S & P, 5 de Dezembro de 2002); «Esta confirmação vem na sequência do anúncio da FT de que a linha de crédito de 9 mil milhões de euros tinha sido criada» («the confirmation follows FT’s announcements that EUR9 billion loan facility has been put in place via ERAP …».) (Moody’s, 9 de Dezembro de 2002).

(122)  Segundo as Autoridades francesas, este projecto teria sido enviado à FT em 20 de Dezembro. Contudo, o projecto não indica qualquer data.

(123)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 17 de Setembro de 1980, processo 730/79, Philip Morris, Col. p. 2671, ponto 11.

(124)  Acórdão do Tribunal de Justiça, de 7 de Março de 2002, processo C-310/99, Itália/Comissão, Col. p. I-2289.

(125)  A título de exemplo, a FT criou em Itália uma empresa comum com a Deutsche Telekom e a Enel.

(126)  A importância das declarações das Autoridades públicas para efeitos de aplicação do direito comunitário é na generalidade reconhecida. Recorde-se que, no que se refere ao facto de um Estado incentivar acções apresentadas num discurso oficial por um representante do Governo, mas realizadas por organismos (juridicamente) independentes (mas sob controlo estatal) e que provocam efeitos contrários ao Tratado, o Tribunal de Justiça decidiu: «[que] uma tal prática não escapa às interdições previstas pelo artigo 30.o do Tratado apenas por se basear em decisões com efeito obrigatório para as empresas. Com efeito, mesmo os actos de um governo de um Estado-Membro desprovidos de força vinculativa podem ser susceptíveis de influenciar o comportamento dos operadores e dos consumidores no território desse Estado e ter por efeito prejudicar os objectivos da Comunidade enunciados no artigo 2.o e desenvolvidos no artigo 3.o do Tratado» (Acórdão do Tribunal de 24 de Novembro de 1982, processo 249/81, Comissão/República da Irlanda, Col. p. 4005, ponto 28). Pode igualmente citar-se o recente acórdão do Tribunal de Justiça, de 13 de Dezembro de 2001, processo C-1/00, Comissão/França, Col. p. I-9989, em que o Tribunal sancionou um incumprimento (que consistia em não ter actuado em conformidade com uma decisão), materializado numa recusa inscrita num comunicado de imprensa. Mais especificamente, em matéria de auxílio, por exemplo, o Tribunal de Primeira Instância precisou que as promessas das Autoridades públicas são pertinentes no que se refere ao critério relativo à incitação (acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 14 de Maio de 2002, processo T-126/99, Graphischer Maschinenbau GmbH/Comissãon, Col. p. II-2427).

(127)  «Les Echos» n.o 18695, França, sexta-feira 12 de Julho de 2002, p. 2, entrevista France Télécom: «Tomaremos, oportunamente, as medidas adequadas».

(128)  Ver, a este respeito, o artigo do «Financial Times» de 12 de Maio de 2004.

(129)  A ligação entre estas declarações é revelada, por exemplo, na expressão «como já indicado» que figura no comunicado de imprensa de Outubro de 2002, que remete para as declarações de Julho e Setembro de 2002.

(130)  «3/Tendo em conta o plano de acção elaborado pelos dirigentes e as perspectivas de rendibilidade do investimento, o Estado participará no reforço dos fundos próprios de 15 mil milhões de euros proporcionalmente à sua participação no capital, ou seja, um investimento de 9 mil milhões de euros. O Estado accionista entende que, desta forma, age enquanto investidor prudente.

Caberá à France Télécom definir as modalidades e o calendário precisos do reforço dos seus fundos próprios. O Governo deseja que esta operação se desenrole tomando o mais possível em consideração a situação dos accionistas individuais e dos trabalhadores accionistas da empresa.

Para proporcionar à empresa a possibilidade de lançar uma operação de mercado no momento mais oportuno, o Estado está disposto a antecipar a sua participação no reforço dos fundos próprios, através de um adiantamento de accionista temporário, remunerado a condições de mercado, colocado à disposição da France Télécom».

(131)  Ver comunicado de imprensa da Moody’s, de 24 de Junho, acima citado.

(132)  Ver artigo 1181.o do Código Civil francês que prevê que: «A obrigação contraída sob condição suspensiva é a que depende quer de um acontecimento futuro e incerto, quer de um acontecimento que já se produziu mas que é ainda desconhecido das partes». A segunda definição não é, obviamente, pertinente no caso em apreço.

(133)  «nevertheless the state’s indication underpins FT’s investment grade credit quality». Além disso: «F. Mer excluiu qualquer privatização do grupo, tendo claramente afirmado um apoio inabalável do Estado, que detém 54,5 %, em caso de problema de financiamento. […] Um “trader” considerou que era a primeira vez que o Ministro das finanças se manifestava de forma tão clara sobre a France Télécom. […] Trata-se agora de saber que forma assumirá o apoio do Estado». Factiva, Reuters — 12 de Julho de 2002, «Bolsa — a FT dispara após as declarações de Mer.» E ainda: «O risco a curto prazo da FT foi reduzido pelo Governo francês, afirmou Guy Deslondes, analista na S & P durante uma conferência telefónica. […] A notação de sexta-feira toma em consideração o facto de a S & P estar confiante de que o Governo francês ajudará a FT a proceder ao seu refinanciamento, pelo menos no que se refere à dívida que vence em 2003. A estabilidade da perspectiva revela que a notação atingiu o seu nível mais baixo, acrescentou Deslondes». («FT’s short term risk has been mitigated by the French government said S & P analyst Guy Deslondes in a conference call. […] Friday’s rating action took into account S & P’s confidence that the French government will help FT refinance itself, at least for its 2003 obligations. The stable outlook shows that the rating has bottomed out, added Deslondes».) ‘France Télécom Avoids Liquidity Crisis Thanks To Gvt’. Factiva, Dow Jones Capital Market Report, 12 de Julho de 2002.

(134)  Acórdão supracitado do Tribunal de Primeira Instância, Compagnie nationale Air France. Ver igualmente Decisão 94/662/CE, supracitada.

(135)  Com efeito, a intervenção directa do Estado junto das agências de notação revela bem que estas declarações constituíam a expressão de uma vontade bem definida e fruto de reflexão. A agência Standard & Poor’s indica que: «o Estado francês — que detém 55 % da France Télécom — indicou claramente à Standard & Poor’s que actuaria enquanto investidor prudente e que tomaria as medidas adequadas caso a FT registasse dificuldades». («the French State — which owns 55 % of France Télécom — has clearly indicated to Standard & Poor’s that it will behave as an aware investor and would take appropriate steps if France Télécom were to face any difficulties».) France Télécom LT Rating cut to «BBB-»; Off Watch; Outlook Stable; Teleconf 3:30PM BST Today, Standard & Poor’s Ratings direct, (12 de Julho de 2002).

(136)  Ver declarações do anterior Presidente da FT, Michel Bon, publicadas na imprensa: artigo de «La Tribune», de 16 de Setembro de 2002, «… a baixa da notação impede os refinanciamentos previstos»; artigo do «Monde», de 16 de Setembro de 2002, «a descida, no final de Junho, da nota atribuída à dívida da FT pela agência de notação Moody’s […] impediu-nos o acesso ao mercado»; artigo do «Financial Times», de 16 de Setembro de 2002, «FT cannot continue to survive when no one wants to lend us money and, on the contrary, when everyone wants to be paid on the nail. In the current markets, the refinancing of our debt is simply out of question».

(137)  Foi mesmo referido que a empresa não poderia encontrar a liquidez necessária no mercado caso a sua notação descesse. Cf., por exemplo, ponto 9 do relatório supra citado de Goldman Sachs, de 22 de Julho de 2002: «Se estas obrigações passassem do nível de investimento do mercado de rendimento fixo para o nível especulativo, ou seja, de elevado rendimento, iriam inundar o actual mercado europeu das obrigações de elevado rendimento (…) [e] consideramos que seria difícil que os investidores europeus absorvessem a totalidade das obrigações da France Télécom». («If these bonds moved from the investment grade segment of the fixed income market, to “junk”, i.e. high yield, they would swamp the current European high yield market(…) [and] we believe it would be difficult for the existing European investor base alone to absorb all France Télécom bonds».)

(138)  Com efeito, segundo um autor francês: «Existe uma multiplicidade de mecanismos públicos que permitem assegurar aos empréstimos um nível de garantia equivalente ao de uma garantia formal de empréstimo: a sua característica comum consiste em agravar os riscos de incerteza relativamente ao montante dos compromissos assumidos pelo Estado até os tornar indefinidos e sem que tal implique que o Parlamento tenha exercido, relativamente a estes compromissos, o seu papel de fixação previsional das despesas públicas» (A DELION, Les Garanties D'emprunt des Collectivites Locales et de L’Etat, Petites Affiches, 17 de Junho de 1998, n.o 72, p. 19).

(139)  Ver Com, 28 de Março de 2000, D. 2000, cah. dr. aff. p. 210.

(140)  Através da noção de oponibilidade erga omnes que se basearia numa lei de 1985. Contudo, em primeiro lugar, a questão é distinta da relativa ao carácter obrigatório do compromisso e, em segundo lugar, não parece de forma alguma excepcional, uma vez que qualquer oponibilidade depende em última análise de uma disposição legislativa.

(141)  Com efeito, a obrigação pode ser definida como um título de investimento com juro fixo, através do qual o emissor se compromete a pagar ao mutuante um capital fixo, numa determinada data posterior, bem como a efectuar uma série de pagamentos de juros; por outras palavras, trata-se de uma promessa de pagar o capital mais os juros, em datas pré-fixadas.

(142)  Como a NERA revelou: «os economistas e os teóricos analisaram de forma aprofundada a importância e o valor da reputação. Em praticamente todas as relações económicas, existe um grau de incerteza quanto à natureza da outra parte. Contudo, na maioria dos casos, uma parte não intervém exclusivamente numa única transacção, mas sim numa série de transacções semelhantes durante um determinado período. É normal que uma ou as duas partes tentem estabelecer uma reputação, uma vez que tal poderá revelar-se benéfico numa fase posterior. […] Os economistas têm vindo a analisar de forma rigorosa, durante os últimos 25 anos, o fenómeno da aquisição de reputação e o número de publicações nas revistas especializadas é substancial. As aplicações desta noção de base em diferentes domínios são abundantes, mas limitar-nos-emos a três exemplos: as actividades dos bancos centrais, a organização industrial e os mercados da dívida soberana. (…) O estabelecimento da reputação é igualmente importante no domínio da contracção e concessão de empréstimos (a nível internacional). Uma entidade soberana, como qualquer devedor privado, que não cumpra a sua obrigação de reembolsar um empréstimo terá dificuldades, no futuro, em atrair novas fontes de crédito. Por este motivo, os Estados parecem por vezes preferir uma recessão económica, com todas as dificuldades que tal implica, a uma situação de incumprimento. Na mesma ordem de ideias, o Governo francês tem a reputação de honrar os compromissos que assume na gestão de numerosas empresas comerciais e actividades que se relacionam com a sua posição fiscal. Seria extremamente oneroso se, nestes domínios, a sua palavra não fosse digna de confiança».

(«economists and game theorists have studied extensively the importance and value of reputation. In almost any economic relationship there is some degree of uncertainty regarding the nature of the counter party. However, very often a party is involved in not a single but a whole series of similar transactions over a period of time. It is a common observation that one or both parties may seek to establish a reputation for themselves, as this may be beneficial later on». (David M. Kreps and Robert Wilson, Reputation and Imperfect Information, 27 JOURNAL OF ECONOMIC THEORY 253-279 (1982).

«Economists have studied the phenomenon of reputation acquisition rigorously over the past 25 years, and the list of publications in leading journals is sizeable. Applications of the basic notion to various fields abound, but we confine ourselves to three examples, i.e. central banking, industrial organization and sovereign debt markets. (…) The acquisition of reputation is also important in the area of (international) borrowing and lending. A sovereign entity, as well as a private debtor, that fails to pay back a loan will find it difficult to attract new funding in the future. That is why countries sometimes seem to prefer an economic downturn, with all its hardships, to a situation of default». (Jeremy Bulow and Kenneth Rogoff, Sovereign Debt: Is to Forgive to Forget?, 79 AMERICAN ECONOMIC REVIEW 43-50 (1989).

«In the same vein, the French government benefits from a reputation for honouring the commitment it makes regarding its management of many commercial enterprises, and matters affecting the fiscal position of the government. It would be very costly if its word could not be believed in these matters».)

(143)  Ver o relatório do Ministério da Economia e Finanças e da Indústria L’Etat actionnaire 2003: «Em 31 de Dezembro de 2002, data das últimas estatísticas disponíveis, o Estado controlava, directa ou indirectamente, 1 616 empresas, encontrando-se 97 numa posição cimeira. Estas empresas têm sede em França» http://www.paris-europlace.net/links/doc062197.htm.

(144)  Para mais informações sobre este ponto ver A gestão da dívida pública em França: objectivos, instrumentos e gestão dos riscos, por Christian Esters, Ecole Nationale d’Administration 2000: «Verifica-se que o mercado obrigacionista francês aumentou durante os anos 90. A percentagem das emissões do Tesouro no mercado obrigacionista aumentou consideravelmente entre 1989 e 1993 e tem permanecido desde essa data a um nível de cerca de 50 %, com excepção do ano de 1995, em que as restantes emissões obrigacionistas no mercado francês sofreram uma segunda descida consecutiva, de tal forma que a percentagem das emissões do Tesouro, apesar da sua estabilidade em valores absolutos, aumentou fortemente durante esse ano… O aumento a longo prazo da parte do Estado nos mercados obrigacionistas resulta da reforma da gestão da dívida pública em França a partir de 1986. Uma das reformas consistia, com efeito, numa alteração da estrutura da dívida: os títulos do Estado negociáveis vieram substituir a dívida não negociável, o que se traduziu num forte aumento da percentagem do Estado no mercado obrigacionista». http://www.ena.fr/tele/mcil99/master99esters.pdf

(145)  NERA: «The results of an event study analysing the effect on share and bond prices of the announcement on 12th July 2002. The study shows that there is a strong positive effect: as a result of the statement, market participants believed the cash flows that France Télécom would generate were going to be higher than they would have been otherwise. Moreover the effect is strongly statistically significant: it is not the result of random fluctuations in prices … The market believed that, as a result of the statement, the French Authorities would offer more support to France Télécom than they would do in the absence of any costs of non-performance».

(146)  Deutsche Bank France Télécom/Deutsche Telekom Debt Liquidity and possible solution, 22 de Julho de 2002, pp. 1, 3, 8.

(147)  Relatório do Deutsche Bank, de 22 de Julho de 2002, intitulado ‘France Télécom/Deutsche Telekom Debt Liquidity and possible solution’ Em 12 de Julho de 2002, a S & P desceu a notação da France Télécom para BBB- … A agência já não prevê que a France Télécom atinja o seu objectivo de 3,5 × dívida líquida/EBITDA em 2003, mas atribuiu uma perspectiva estável à notação baixa de triplo B. Afigura-se que a perspectiva estável se baseia no seguinte: “o Estado francês — que detém 55 % da France Télécom — indicou claramente à Standard & Poor’s que actuaria enquanto investidor prudente e que tomaria as medidas adequadas caso a FT registasse dificuldades”. Salientemos que a S & P tinha inicialmente afirmado que não iria incluir o apoio extraordinário por parte do Governo francês na notação, quando desceu a notação da France Télécom para BBB em Junho. Desde então, a agência parece ter mudado de opinião, declarando que as conclusões do creditwatch status «seguem uma análise da liquidez da empresa durante o final de 2003 e uma revisão da participação potencial do Estado francês no mercado das telecomunicações francês» (p. 19). «A France Télécom beneficiou da crescente confiança que reinava no mercado quanto ao facto de o Governo apoiar, de qualquer forma, o crédito» (p. 20). «Não podemos ignorar que a FT é maioritariamente detida pelo Estado francês e que os recentes comentários do Ministro francês das Finanças tranquilizaram os investidores quanto ao facto de a liquidez estar garantida» (p. 54). «Contudo, como temos vindo a referir constantemente, consideramos que a empresa irá finalmente encontrar a liquidez de que necessita através do denominado “apoio implícito do Estado”». Tal poderá assumir a forma de empréstimos, em condições de mercado, fornecidos pelos bancos ou pelo Governo (p. 21). Contudo, «qual é o preço do mercado para, digamos, uma nova dívida de 10 mil milhões com um crédito BBB- ? Qual é o custo real de uma dívida de 10 mil milhões de euros para uma empresa que não atinge verdadeiramente o BBB- e que foi apenas notada desta forma devido ao apoio do Governo? …» Consideramos que não existe uma resposta certa para estas questões visto que, se a FT desenvolvesse as suas actividades num mundo real, não estaria, na nossa opinião, em condições de se refinanciar sem uma conversão da dívida em capital. (p. 33, ver, no mesmo contexto, p. 54). E ainda, «A imprensa refere que o Governo francês apoiaria a France Télécom, o que implica que aceita ser “o mutuante em última instância” da empresa. Esta declaração melhorou de forma significativa o preço das obrigações e das acções, tendo as acções aumentado 90 % e as obrigações 137pb em duas semanas, nomeadamente porque os especuladores cobriam a sua posição.» (p. 28). Salientemos que a S & P declarou durante a sua recente conferência telefónica sobre a deterioração do crédito da FT que, na generalidade, uma empresa que gera cash flow e que apresenta uma relação dívida/EBITDA igual a quatro, teria uma classificação BBB- em termos de crédito, ou seja, o último nível da categoria de investimento. A notação actual da FT, BBB-, parece basear-se mais na promessa de apoio do Governo para garantir a liquidez que nos elementos fundamentais da empresa. Segundo os cálculos do Deutsche Bank, a relação dívida/EBITDA da FT teria sido de 4,9 no segundo semestre de 2002 e de 5,20 em 31 de Dezembro de 2002. (‘… on July 12, 2002, S & P … downgraded France Télécom’s ratings to BBB- ... The agency no longer expects France Télécom to hit the 3,5 × net debt/EBITDA target by 2003, but did assign a “stable” outlook to the low triple B ratings. It seems that the stable outlook is anchored by “the French state … [which] has clearly indicated to Standard & Poor’s that it will behave as an aware investor and would take appropriate steps if France Télécom were to face any difficulties.” … Interestingly, S & P had initially said it was not incorporating any extraordinary support from the French government into its rating when it downgraded France Télécom’s ratings to BBB in June. Since then, the agency appears to have taken an about face in stating that the conclusions of the creditwatch status follows an analysis of the company’s liquidity position through the end of 2003 and a review of the French state’s potential involvement in the French Télécommunications market’ (p. 19); ‘France Télécom benefited from the market’s increased confidence that the French government will in one way or another support the credit’ (p. 20); ‘we cannot ignore the fact that FT is majority owned by the French State and recent comments from the French finance Ministry have reassured investor that liquidity will be provided’ (p. 54) ‘However, as we have consistently mentioned, we expect that the company will ultimately find all the liquidity it needs via the so-called “implicit government support”. This could take the form of banks or the government providing the necessary loans at market prices’ (p. 21). Contudo ‘what is the market price for, say, 10 bn of new debt to a BBB- credit? what is the real price for a Euro 10bn of debt to a company that is not really a BBB- credit, just treaded there because the government support? … we suspect there is no right answer to these questions, because if FT was operating in the real world, it would not be able to refinance without a debt for equity swap, in our view.’(p. 33, ver, na mesma linha, p. 54 ). E ainda ‘There have been reports in the press that the French government will stand behind France Télécom, implying that it is willing to be the “lender of last resort” to the company. These reports have resulted in a significant rally in both bonds and equity prices, with the equity rallying over 90 % and the bonds 137bp in two weeks, as nervous shorts covered position.’ (p. 28); ‘It is worth noting that S & P states on its recent conference call on its downgrade of FT’s credit that, in general, a company generating free cash flow with debt to EBITDA of four times would qualify as a BBB- credit, the last investment grade rating. FT current BBB- rating appears to be based largely on the promise of government support providing liquidity, rather than on fundamentals’ (p. 30).)

(148)  Ibid., «Bonds and convertibles suggest that the market is unsure of the weight of government support» (p. 3). Ver também p. 22.

(149)  O que indica que a agência não previa uma deterioração posterior.

(150)  France Télécom LT Rating cut to «BBB-»; Off Watch; Outlook Stable; Teleconf 3:30PM BST Today, Standard & Poor’s Ratings direct, (12 de Julho de 2002). Parece que a S & P faz mais referência às indicações fornecidas pelo Governo à própria agência, mas segundo a interpretação da Comissão relativamente a este processo, tendo em conta os elementos na sua posse, o conteúdo destas indicações incidia, em larga medida, sobre os mesmos compromissos que os assumidos nos anúncios efectuados publicamente.

(151)  Board meeting presentation, missão da France Télécom «Etat des lieux», Dezembro de 2002, p. 36.

(152)  Numa carta que acompanhava o protocolo financeiro concluído pelo banco […] em 12 de Setembro de 2002, relativa ao compromisso assumido por este banco no que se refere ao aumento previsto do capital da empresa, o representante do banco declara sem ambiguidades «Consideramos que a operação em análise seria difícil nas actuais condições e que uma reacção positiva dos mercados às declarações e comunicados que serão publicados no final da semana constituirá um dos elementos fundamentais para criar as condições necessárias à realização desta operação».

(153)  Ver formulário FT 20-F, Março de 2003, p. 15-16, «a descida de um nível da notação da dívida a longo prazo por parte da S & P e da Moody’s aumentaria automaticamente os encargos anuais com juros em cerca de 75 milhões de euros» («a decrease of one notch in its long term debt rating by S & P’s and Moody’s would automatically increase its annual interest expense by approximately € 75 million.»).

(154)  Uma cláusula de «step up» determina um aumento do cupão das obrigações e das taxas de juro sobre as linhas de crédito, em função da descida da notação.

(155)  Protocolos de acordo concluídos em 11 e 12 de Setembro de 2002 entre o Estado e os bancos (cláusula h).

(156)  Ver, a este respeito, a decisão Seleco acima citada, ponto 84. Ver igualmente as conclusões do Advogado-Geral M.L.A Geelhoed, de 27 de Setembro de 2001, nos processos apensos C-328/99 e C-399/00, Itália/Comissão, Col. 2003, p. I-4035, que precisam o seguinte: «É provável que estes investidores privados só tenham decidido intervir depois de os poderes públicos autorizarem novos auxílios. O facto de nessa altura os investidores privados também estarem dispostos a participar já não é relevante».

(157)  Ver ponto 3.1.1.

(158)  Ver observações da France Télécom, incluídas no relatório de C.D. Ehlermann, de 21 de Janeiro de 2004: «… durante o primeiro semestre de 2002, o mercado perdeu progressivamente confiança na capacidade de a FT fazer face ao seu endividamento, bem como na capacidade da equipa dirigente para encontrar uma solução para o problema (ponto 7) … uma vez conhecidos os números do primeiro semestre e perante a incapacidade da equipa dirigente para tranquilizar os mercados, o Estado francês interveio em Setembro de 2002 (ponto 8).»

(159)  A nomeação de um novo órgão de gestão e o lançamento de um estudo para a elaboração de um novo plano de actividades seriam as primeiras medidas a adoptar quando se pretende reconquistar a confiança do mercado (ver por exemplo o relatório HSBC supra citado, p. 6 «… a atitude normal de um investidor prudente face a uma situação deste tipo consiste em: (i) restabelecer a confiança no futuro da empresa, nomeando um órgão de gestão dotado de uma nova credibilidade». No mesmo sentido, ver o estudo do Deutsche Bank de 22 de Julho de 2002, supra citado, «se partirmos do princípio que se verificará uma alteração de direcção, o que será necessário para qualquer operação (…) Com uma nova direcção, a operação de aumento de capital poderá ser vendida ao mercado» («If we assume a management change which would be necessary for any deal ()… With a new management the equity story could then perhaps be sold to the markets» p. 33). Com efeito, durante a reunião realizada com a Comissão em 22 de Janeiro de 2003, as Autoridades francesas explicaram que o seu comportamento era comparável ao de um investidor prudente uma vez que, antes de agir, tinham esperado: a alteração da direcção, a verificação da situação financeira da empresa, a elaboração do plano TOP e o anúncio do apoio do Estado e da sua intenção de participar na operação de reforço dos fundos próprios da empresa e, finalmente, o restabeleccimento da confiança do mercado. A Comissão concorda com as Autoridades francesas quanto ao facto de esta ser a atitude que um investidor privado prudente adoptaria antes de assumir qualquer compromisso de apoio à empresa. Contudo, tal como foi demonstrado anteriormente, a Comissão concluiu que o Estado se comprometeu a apoiar a FT muito antes de ter envidado qualquer destas diligências.

(160)  Como foi referido anteriormente, as agências de notação desceram a notação da FT durante o mês de Junho e Julho de 2002 para o nível imediatamente superior ao de «junk bond», precisando no seu comunicado de imprensa que a notação seria ainda mais baixa se se baseasse exclusivamente nos elementos fundamentais da FT.

(161)  Ver estudo do Deutsche Bank de 22 de Julho de 2002, acima referido: «Na nossa opinião, a relação risco/remuneração actual não incita particularmente os investidores a participarem num aumento de capital». («in our view the risk reward balance is not currently very attractive for investor to participate in a capital increase».)

(162)  Informação que a Comissão de inquérito acima citada considerou parcial. Ver nomeadamente: «O Estado surge, desta forma, como estando simultaneamente muito presente e como sendo demasiadas vezes ineficaz… O Estado tem dificuldades em transmitir às empresas públicas directivas claras… Por outro lado, os meios de controlo do Estado estão consideravelmente enfraquecidos devido às formas que assume o crescimento externo, ou seja, o desenvolvimento das filiais. Decisões fundamentais para os grupos públicos são tomadas a nível das filiais o que, devido à sua forte identidade (Orange ou Equant no caso da France Télécom) e às modalidades específicas da sua gestão (o número de representantes “directos” do Estado nos conselhos de administração é fraco ou nulo, sob reserva da participação do controlo de Estado), reduz um pouco mais os prazos e a qualidade da informação transmitida ao accionista público». Segundo a análise da comissão de inquérito, o desfuncionamento interno da FT foi acompanhado por um contorno da situação por parte do Estado accionista «O menos que se pode dizer é que, com efeito, entre 1999 e 2000, os serviços do Ministério das Finanças não foram adequadamente informados das grandes decisões estratégicas tomadas pelo operador… A direcção da France Télécom parece ter praticado, face ao seu accionista maioritário, uma informação “selectiva”, na melhor das hipóteses incompleta, na pior inexistente e, na maior parte dos casos, tardia e parcial», que apenas parece ter começado a melhorar em 2002 «Segundo os documentos fornecidos pelo Ministério das Finanças, o teor preciso do pacto de accionista só fora conhecido quando foi transmitido aos serviços do Ministério em 19 de Fevereiro de 2002… o Ministério das Finanças afirma que apenas dele teve conhecimento em Fevereiro de 2002, depois de Gerhard Schmid ter evocado a sua existência na imprensa, na sequência da carta dirigida em 18 de Abril de 2000 por Michel Bon à Mobilcom na qual a France Télécom se comprometia a colocar à disposição do operador alemão, até um montante de 10 mil milhões de euros, os meios financeiros necessários à criação da UMTS… Alguns compromissos não foram, pura e simplesmente, referidos pela France Télécom ao seu accionista maioritário… Foi apenas por ocasião da concretização desta opção, no início de 2002, que o Estado descobriu um compromisso de 950 milhões de euros.».

Ver igualmente algumas passagens da audição de Thierry Breton, Presidente da FT, na Comissão dos Assuntos Económicos em 11 de Dezembro de 2002 e, nomeadamente: «A Jean Arthuis, Presidente da Comissão das Finanças, que o interrogava sobre as responsabilidades do Estado accionista, nomeadamente em termos da sua missão de controlo, face à rápida deterioração da situação da France Télécom, Thierry Breton indicou que, apesar de progressos incontestáveis, o Estado não tinha ainda integrado completamente as regras de gestão modernas das empresas com cotação internacional, nem compreendido que as decisões pertenciam aos órgãos de gestão, sob controlo dos accionistas.»

Na introdução do seu relatório, a referida Comissão salienta que «… a “tutela” exercida sobre as empresas públicas é objecto de uma crítica dupla, aparentemente contraditória… O Estado accionista é simultaneamente informado de forma insuficiente ou tardia e não está manifestamente em condições de exercer um controlo eficaz sobre decisões estratégicas por vezes contestáveis… “Este luxo de precauções” e estes controlos por vezes “inúteis, por serem demasiados” conduzem na realidade, como salientou perante a vossa Comissão Francis Mer “a não (...) controlar” as empresas públicas. Com efeito, é forçoso concluir, como o fez Elie Cohen, que “tanto o Crédit Lyonnais como a France Télécom estavam sujeitos ao controlo do Estado, à tutela do Tesouro, ao controlo do Tribunal de Contas, ou seja, a uma série de controlos externos que, neste caso, não funcionaram”».

(163)  O que foi feito unicamente em Outubro, após a nomeação de Thierry Breton.

(164)  Ver observações da France Télécom, incluídas no relatório Ehlermann, de 21 de Janeiro de 2004, ponto 90.

(165)  Ver ponto 5 a) das Orientações.

(166)  Apenas são mencionados os critérios aplicáveis a uma empresa que desenvolve actividades no sector das telecomunicações.

(167)  Douste-Blazy, Presidente da Comissão de Inquérito: «Salientemos que a descida da notação financeira da empresa lhe encerrava o acesso ao mercado obrigacionista comprometendo, consequentemente, as suas capacidades de contrair empréstimos». A descida a que o Presidente faz referência foi a que ocorreu em Maio de 2002.

(168)  Sara Husband, High Yield Report, 1 de Julho de 2002.

(169)  Ver declarações do anterior Presidente da FT, M. Bon, publicadas na imprensa: artigo da «Tribune» de 16 de Setembro de 2002«… a baixa da notação impede os refinanciamentos previstos»; artigo do «Monde» de 16 de Setembro de 2002«a descida, ocorrida no final de Junho, da notação atribuída à dívida da FT pela agência de notação Moody’s […] impediu-nos o acesso ao mercado»; artigo do «Financial Times» de 16 de Setembro de 2002«FT cannot continue to survive when no one wants to lend us money and, on the contrary, when everyone wants to be paid on the nail. In the current markets, the refinancing of our debt is simply out of question».

(170)  Ver igualmente as afirmações das Autoridades francesas: «realizar um desendividamento líquido e uma reconstituição de fundos próprios [constitui] uma condição sine qua non do restabelecimento, a curto prazo, da credibilidade da empresa em termos de crédito…» p. 26 da carta das Autoridades francesas de 3 de Dezembro de 2002.

(171)  Comissão das Finanças, da Economia Geral e do Plano, acta n.o 26, sessão de 5 de Dezembro de 2002, audição de Thierry Breton, Presidente da France Télécom. Ver igualmente audição de Thierry Breton, Presidente da FT, na Comissão dos Assuntos Económicos, em 11 de Dezembro de 2002: «[Thierry Breton] Insistindo sobre a retoma da confiança, demonstrada nomeadamente pelo bom acolhimento consagrado à emissão obrigacionista de 1,5 mil milhões de euros lançada na véspera o que aconteceu pela primeira vez desde 2001».

(172)  […]s proposal for an exchange offer: «We provide below preliminary thoughts on such a transaction».

(173)  Ibid. Indicative pricing of a new 5-year transaction at 380 bp over Euribor and an estimated coupon at 8,5 %.

(174)  Ver carta das Autoridades francesas de 16 de Fevereiro de 2004.

(175)  Ver observações das Autoridades francesas de 4 de Dezembro de 2003, de 22 de Janeiro de 2004 e de 16 de Fevereiro de 2004.

(176)  As Autoridades francesas fizeram referência a 5 empréstimos obrigacionistas emitidos entre 26 de Julho de 2002 e 23 de Dezembro de 2002, num total de 220 milhões de euros no que se refere aos empréstimos obrigacionistas emitidos antes do anúncio do plano Ambition 2005 (5 de Dezembro de 2002), a que se vem juntar um montante de 442,2 milhões de euros correspondente à emissão de ORA.

(177)  No período anterior ao anúncio do plano Ambition 2005, ou seja até 5 de Dezembro de 2002.

(178)  A média eleva-se a 1,5 mil milhões de euros.

(179)  442,2 milhões de euros.

(180)  Estas emissões foram aliás realizadas em Dezembro de 2002 e em Janeiro de 2003.

(181)  Neste contexto será interessante recordar algumas passagens da audição perante a Comissão de Inquérito dos Comissários de Contas da FT:

«Edouard Salustro: Senhor deputado, será necessário recordar algo que o Senhor conhece melhor do que ninguém. Antes mesmo de expressar a sua opinião relativamente a um conjunto de informações financeiras, o auditor tem de determinar se a empresa está em condições de prosseguir as suas actividades, de forma viável em termos económicos. Trata-se da primeira questão, é um princípio de base que seguidamente se manifesta nas contas. Seguidamente, a questão deixa de se colocar, porque já foi respondida anteriormente.

Xavier de Roux: Assim, o senhor considerou que o prosseguimento das actividades era um dado adquirido.

Edouard Salustro: Não! Enfim, é claro!… Não estava lá!…

Vincent de La Bachelerie: Não era necessariamente um dado adquirido, e controlamos efectivamente…».

Ainda mais clara neste contexto surge a explicação de M. Bon, antigo Presidente da FT, perante a mesma Comissão de Inquérito:

«Ora, é um facto que o cenário negro nunca tinha sido aceite: o facto do acesso ao mercado dos capitais nos ter sido impedido. Nunca previmos esta possibilidade porque pensávamos que seria normal que a presença do Estado como accionista maioritário impediria o mercado de prever um incumprimento por parte da France Télécom, não sendo mesmo necessário que o Estado manifestasse o seu apoio. Esta opinião era partilhada por quase todos os intervenientes no mercado até ao dia em que uma das três agências de notação — uma única — decidiu que a France Télécom estava prestes a atingir uma situação de insolvência e reviu a sua notação impedindo, de um dia para o outro, qualquer acesso ao mercado… Quando, no mês de Junho, esta única agência de notação emitiu o seu parecer e que foi impedido o nosso acesso ao mercado, eu sabia que, uma vez que não podia voltar a contrair empréstimos, a France Télécom se encontraria em dificuldades de pagamento, um ano mais tarde, por volta do primeiro semestre de 2003».

No mesmo contexto, ver o relatório HSBC de 12 de Junho de 2004, p. 11: «na globalidade, a FT não era uma empresa em dificuldade uma vez que as suas actividades são sãs, mas tinha uma estrutura de financiamento inadaptada, registando uma insuficiência de fundos próprios, compromissos de refinanciamento da dívida demasiado curtos e uma crise de confiança dos mercados face às incertezas criadas por esta situação».

(182)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Novembro de 1987, processo 223/85, RSV/Comissão, Col., p. 4617.

(183)  Acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 1990, processo C-5/89, Comissão/Alemanha, Col. 1990, p. I-3437.