31991D0153

91/153/CEE: Decisão da Comissão, de 11 de Janeiro de 1991, relativa a um processo de aplicação do artigo 85º do Tratado CEE (IV/31.624 - Vichy) (Apenas faz fé o texto em língua francesa)

Jornal Oficial nº L 075 de 21/03/1991 p. 0057 - 0063


DECISÃO DA COMISSÃO de 11 de Janeiro de 1991 relativa a um processo de aplicação do artigo 85o do Tratado CEE (IV/31.624 - Vichy) (Apenas faz fé o texto em língua francesa) (91/153/CEE)

A COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS,

Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia,

Tendo em conta o Regulamento no 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 85o e 86o do Tratado (1), com a última redacção que lhe foi dada pelo Acto de Adesão de Espanha e de Portugal, e, especialmente, os seus artigos 4o e 6o e o no 6 do seu artigo 15o,

Tendo em conta a notificação, efectuada em 29 de Agosto de 1989 pela Société d'hygiène dermatologique de Vichy, dos acordos em que se baseia o sistema de distribuição selectiva dos produtos cosméticos Vichy em França, bem como o sistema de venda exclusiva em farmácias praticado nos outros Estados-membros da Comunidade,

Após audição das empresas interessadas, nos termos do no 1 do artigo 19o do Regulamento no 17 e do disposto no Regulamento no 99/63/CEE da Comissão (2),

Considerando o seguinte:

I. OS FACTOS

A. O objecto da decisão

(1) Por carta de 26 de Julho de 1985, os Laboratoires d'application dermatologique de Vichy e Cie, filial francesa da Société d'hygiène dermatologique de Vichy (adiante denominados Vichy), notificaram à Comissão um sistema de distribuição exclusiva dos produtos cosméticos Vichy em farmácia com laboratório próprio limitado a França. Nesse sistema, a autorização para ser distribuidor dos produtos Vichy estava subordinada à condição de ser farmacêutico com laboratório próprio. Na altura, o Conselho da Concorrência francês começava a examinar estes sistemas de distribuição exclusiva praticados pelos laboratórios. Essa notificação caducou em seguida, dado que o sistema de distribuição em França foi alterado devido a uma decisão do Conselho da Concorrência (3), confirmada pela Cour d'appel de Paris (4) e pela Cour de cassation (5). As autoridades francesas aplicaram o direito nacional e o direito europeu da concorrência e verificaram que a distribuição exclusiva em farmácia constituía uma infracção ao no 1 do artigo 85o do Tratado CEE. Todavia, os produtores podem, em França, exigir que o vendedor de produtos cosméticos nos pontos de venda situados fora de uma farmácia tenha a qualificação profissional de diplomado em farmácia.

(2) Este sistema de distribuição alterado em relação a França foi objecto de uma notificação da Vichy de 29 de Agosto de 1989. Simultaneamente, uma primeira notificação do sistema de distribuição para os outros Estados-membros (com excepção da Dinamarca, onde os produtos Vichy não são distribuídos) foi enviada à Comissão. Esta notificação continua a prever, fora de França, a distribuição exclusiva em farmácias com laboratório próprio.

(3) A presente decisão apenas se refere ao sistema de distribuição exclusiva em farmácia com laboratório próprio, desde que exija mais do que uma qualificação profissional de diplomado em farmácia. O sistema de distribuição selectiva praticado em França, bem como outras cláusulas, não constituem objecto da presente decisão. A Comissão reserva-se o direito de os examinar posteriormente numa decisão definitiva. Trata-se, nomeadamente, da localização dos pontos de venda, da apresentação dos produtos, da presença de marcas semelhantes, da disponibilidade da gama e da armazenagem, da colocação à disposição das facturas em caso de venda a outros distribuidores e das condições de concessão de descontos anuais.

B. As partes implicadas

(4) A Société d'hygiène dermatologique de Vichy (Vichy) é uma filial a 100 % do grupo L'Oréal. Em 1987, o volume de negócios da L'Oréal foi de cerca de 3,4 mil milhões de ecus, contribuindo a Vichy com um volume de negócios de 116,5 milhões de ecus.

(5) Os distribuidores autorizados da Vichy são:

- os farmacêuticos com laboratório próprio que tenham relações contratuais (seja por contratos de distribuição escritos, seja pela utilização permanente de condições gerais de venda) com os agentes gerais da Vichy ou os grossistas-distribuidores,

- os grossistas-distribuidores ligados por contratos de venda por grosso (cartas-convenção) ou pelas condições gerais de venda.

C. Os produtos

(6) Os produtos cosméticos Vichy constituem uma gama completa de produtos de tratamento do rosto e do corpo. A gama não inclui perfumes alcoolizados.

(7) Existe uma diferença entre cosmético e medicamento. Com efeito, a comercialização dos cosméticos não exige precauções suplementares para além das previstas pela legislação nacional e comunitária em matéria de controlo da inocuidade dos produtos cosméticos. Este controlo não pode ser assegurado pelo farmacêutico, visto que ele não conhece as fórmulas exactas de composição dos produtos.

(8) A Vichy não se opôs à verificação da Comissão de que a escolha da distribuição exclusiva em farmácia com laboratório próprio não assenta em qualquer especificidade técnica ou qualitativa superior dos produtos Vichy em comparação com os cosméticos distribuídos pela L'Oréal nos outros circuitos de distribuição, como a perfurmaria e a grande distribuição. Em comparação com os cosméticos vendidos em grande distribuição, a gama Vichy é mais completa e mais elaborada. No entanto, é menos que as gamas dos cosméticos de luxo vendidos em perfumaria.

D. Os preços

(9) De acordo com os dados comunicados pela Vichy em relação a 1988, os preços médios de venda aos retalhistas diferem de Estado-membro para Estado-membro, de [ . . . ] francos franceses (6) (Portugal) ou [ . . . ] francos franceses (Gra-Bretanha) a [ . . . ] francos franceses (Alemanha) ou [ . . . ] francos franceses (Países Baixos), o que corresponde a uma diferença de 2 para 3 ou de 100 para 171. Até à data da notificação, os agentes gerais da Vichy aconselhavam aos farmacêuticos com laboratório próprio preços de venda aos consumidores. Estes preços eram geralmente o dobro do preço médio de venda aos retalhistas.

E. Os sistemas de distribuição da Vichy

(10) A coerência do sistema de exclusividade é assegurada por uma espécie de « cláusula de protecção da rede de distribuição », que obriga os distribuidores a venderem apenas a distribuidores autorizados ou a distribuidores que aceitem, mediante compromisso escrito, sujeitar-se à mesma obrigação. Esta cláusula encontra-se quer em contratos individuais de distribuição (Alemanha) e em cartas-convenção celebradas com grossistas (Bélgica, Luxemburgo) quer nas condições gerais de venda que figuram no verso das facturas, das notas de encomenda e nas listas de preços (outros Estados-membros). Quanto a vendas cruzadas no interior da rede, a « cláusula CEE », incluída nos contratos, e as condições gerais apenas permitem aos farmacêuticos ceder os produtos a outros farmacêuticos noutros Estados-membros.

F. O mercado dos cosméticos

(11) Os produtos cosméticos incluem os produtos de beleza e de higiene pessoal, os produtos capilares e a perfumaria com teor de álcool. Estes produtos são vendidos em quatro circuitos de distribuição diferentes:

- a grande distribuição (supermercados, drogarias, grandes superfícies),

- a distribuição selectiva (perfumarias e grandes armazéns de luxo),

- a farmácia com laboratório próprio,

- a venda directa (nomeadamente a venda por correspondência).

Os produtos cosméticos são vendidos sob múltiplas marcas. Em geral, cada marca é reservada a um circuito de distribuição bem determinado. As marcas vendidas em farmácia não se encontram no circuito da perfumaria ou da grande distribuição. Existem produtores que oferecem uma grande variedade de produtos, como a sociedade L'Oréal, que seleccionam circuitos de acordo com o prestígio das marcas que têm. A Vichy observou que os produtos novos e inovadores são geralmente distribuídos em primeiro lugar nas farmácias e, seguidamente, uma vez generalizados nos hábitos do consumidor, são difundidos a uma escala muito maior (sob outras marcas) na grande distribuição e na perfumaria de luxo. O prazo desta passagem pela farmácia parece diferenciar-se fortemente de um produto para outro e ser cada vez mais reduzido.

(12) De acordo com um estudo encomendado pela Comissão (7), a segmentação em circuitos de distribuição corresponde a uma disparidade dos preços médios relativos a determinados produtos. Assim, é frequente que um produto destinado a um determinado uso seja vendido em grande distribuição sob uma marca A ao preço de 100, proposto na farmácia sob uma marca B ao preço de 150 a 200 e vendido na perfumaria sob uma marca C ao preço de 300 a 400.

(13) Em percentagem da venda total de cosméticos, as vendas em farmácia representavam, em 1987, 4,8 % na Alemanha, 9 % em França, 16,5 % em Itália e 44,1 % (sendo 33 % Boots) no Reino Unido. As estatísticas fornecidas pela Vichy demonstram uma ligeira descida do circuito farmacêutico relativamente a França. Em contrapartida, a parte do mercado do circuito farmacêutico aumentou mais que o mercado total na Alemanha.

(14) A parte de mercado detida pela Vichy nas vendas em farmácia é de [ . . . ] % em França, de [ . . . ] % na Alemanha, de [ . . . ] % na Itália e de [ . . . ] % no Reino Unido.

G. A regulamentação nacional relativa às farmácias e aos produtos farmacêuticos

(15) A posse de um diploma em farmácia constitui a única qualificação profissional pessoal necessária para o estabelecimento como farmacêutico com laboratório próprio. Em oito Estados-membros (Bélgica, França, Itália, Espanha, Grécia, Luxemburgo, Portugal e Dinamarca), o estabelecimento de laboratório próprio está limitado, de forma a que o número de farmácias com laboratório próprio esteja ligado a um certo número de habitantes e/ou seja respeitada uma certa distância geográfica de um laboratório a outro. Na Alemanha, na Irlanda, no Reino Unido e nos Países Baixos, o direito de um diplomado abrir uma farmácia não está sujeito a restrições de carácter quantitativo. No Reino Unido e na Irlanda, não existe monopólio absoluto de distribuição de medicamentos. Muitos medicamentos são vendidos em postos de venda situados fora de farmácia (por exemplo, grandes armazéns).

(16) Em todos os Estados-membros, os farmacêuticos têm o direito de vender produtos farmacêuticos. Em cinco Estados-membros (Bélgica, Alemanha, Itália, França e Portugal) existe uma lista taxativa dos produtos parafarmacêuticos, enquanto nos outros Estados-membros os farmacêuticos são livres de vender produtos que não medicamentos dentro dos limites da ética profissional.

Na maior parte dos Estados-membros, existem regras deontológicas ou de ética profissional que impõem aos farmacêuticos o respeito pelas restrições da concorrência comercial. Algumas restrições, como a proibição de efectuar publicidade fora do laboratório, de anunciar campanhas de preços reduzidos ou de ofertas de descontos são, com ligeiras diferenças de Estado-membro para Estado-membro, igualmente válidas para os produtos parafarmacêuticos.

II. APRECIAÇÃO PROVISÓRIA EM RELAÇÃO AO No 1 DO ARTIGO 85o DO TRATADO CEE

Tendo em conta os dados actualmente disponíveis, a Comissão não procede a uma apreciação definitiva do acordo notificado, mas, após exame provisório, chegou às seguintes conclusões:

(17) Os contratos de distribuição celebrados entre os agentes gerais da Vichy e os grossistas-distribuidores ou os farmacêuticos retalhistas constituem acordos entre empresas na acepção do no 1 do artigo 85o O mesmo se passa em relação às condições gerais de venda sistematicamente reproduzidas no verso das facturas, nas notas de encomenda e nas listas de preços. A utilização repetida desses documentos implica que os distribuidores da Vichy os aprovaram e aceitaram implicitamente e que constituem assim um acordo geral pré-estabelecido aplicável às diversas encomendas individuais (acórdão do Tribunal de Justiça, de 11 de Janeiro de 1990, proferido no processo C-277/87 Sandoz, décimo segundo fundamento). Os contratos de distribuição bem como as condições gerais de venda contêm uma cláusula estipulando que a autorização para ser distribuidor dos produtos Vichy está sujeita à qualidade de farmacêutico com laboratório próprio e que, por consequência, os distribuidores são obrigados a vender apenas a farmacêuticos com laboratório próprio.

(18) O acordo em causa tem por efeito e por objectivo restringir a concorrência no mercado comum:

a) No sistema de distribuição selectiva em causa, a selecção do revendedor baseada na qualidade de farmacêutico com laboratório próprio não corresponde aos critérios que o Tribunal de Justiça considera conformes ao no 1 do artigo 85o em numerosos processos (8) e, em especial, para os produtos cosméticos, no processo L'Oréal/De nieuwe Amck (9). Ao subordinar a autorização dos distribuidores à qualidade de « farmacêuticos com laboratório próprio », a Vichy não utiliza um critério objectivo de carácter qualitativo para definir a qualificação profissional do revendedor ou do seu pessoal. O diploma em farmácia certifica que o diplomado é considerado como tendo os conhecimentos profissionais necessários em farmacologia, em biologia, em toxicologia e em dermatologia para gerir uma farmácia com laboratório próprio. No entanto, a Vichy não se contenta com essa qualificação profissional para satisfazer as necessidades de aconselhamento que a Vichy pretende prestar aos seus clientes;

b) O critério de selecção de « farmacêutico com laboratório próprio » acrescenta ao elemento de qualificação profissional um elemento suplementar de limitação do número dos revendedores potenciais de maneira quantitativa e não qualitativa.

Apesar de o número de farmacêuticos com laboratório próprio ser bastante elevado na maior parte dos Estados-membros, existe em 8 dos 12 Estados-membros um numerus clausus quantitativo relativo ao estabelecimento de farmacêuticos. No processo Binon/AMP [ver nota de pé-de-página (8)], o Tribunal de Justiça considerou como quantitativo o critério de selecção dos revendedores baseado no número mínimo de habitantes por postos de venda. O mesmo se passa se a selecção é feita de forma indirecta mediante restrições ao estabelecimento;

c) Contrariamente ao que a Vichy pretendeu na audição, a escolha do produtor para determinar de que forma os seus produtos são distribuídos deve continuar sujeita a uma proporcionalidade entre as propriedades do produto e os critérios de selecção impostos pelo produtor, condição exigida pelo Tribunal de Justiça no processo L'Oréal (10).

Mesmo se se considerasse o critério de « farmacêutico com laboratório próprio » como critério objectivo de carácter qualitativo, deve reconhecer-se que o critério imposto ultrapassa o que é necessário para preservar a qualidade do produto e assegurar a sua boa utilização.

A regulamentação nacional e comunitária em matéria de produtos cosméticos garante que os produtos não apresentam perigo para a saúde dos consumidores e que a comercialização não exige precauções suplementares como as que existem em relação aos medicamentos. Segundo a Vichy, a gama dos seus produtos cosméticos é mais completa e mais elaborada do que os cosméticos vendidos em grande distribuição, ainda que não exista uma diferença real e objectiva em termos de qualidade ou de natureza técnica.

A preocupação da Vichy em oferecer aos seus clientes um conselho idêntico ao previsto para a utilização de medicamentos não pode assim ser considerado como uma necessidade decorrente das propriedades do produto, mas sim como uma estratégia de comercialização destinada a criar e conservar uma imagem de marca que beneficie da reputação da farmácia em termos de saúde e de segurança.

A este respeito, convém assinalar que as marcas de alta gama da L'Oréal vendidas em perfumaria de luxo, não por vendedores titulares de diplomas científicos mas com a qualificação profissional de esteticista, incluem gamas ainda mais completas e elaboradas do que a da Vichy;

d) A Vichy não conseguiu demonstrar de forma plausível que a qualificação profissional de farmacêutico com laboratório próprio é superior à do diplomado em farmácia, no que diz respeito aos conhecimentos necessários para prestar um conselho qualificado aos compradores de cosméticos. De acordo com a Vichy, o farmacêutico com laboratório próprio teria uma competência superior à do diplomado em farmácia, já que beneficia de uma reciclagem permanente dos seus conhecimentos no domínio da saúde graças à sua actividade principal de venda de medicamentos, à metodologia científica e à experiência adquirida nos contactos permanentes e pessoais com os clientes. Partindo do mesmo nível de conhecimentos profissionais baseados no diploma, não existem razões evidentes para negar o interesse do farmacêutico assalariado em se reciclar no domínio dos conhecimentos necessários para o aconselhamento científico a prestar aos consumidores de cosméticos. O farmacêutico assalariado terá, pelo contrário, a vantagem de poder concentrar-se e especializar-se em problemas dermatológicos e de cosmética. A experiência profissional e o contacto com os clientes devem ser adquiridos da mesma forma pelo farmacêutico que inicia a sua actividade num laboratório e pelo diplomado que começa a vender cosméticos num estabelecimento comercial.

A influência da deontologia que a Vichy alegou durante a audição tem pouca ou nenhuma relevância em termos de conhecimentos profissionais;

e) A Vichy apresentou toda uma série de argumentos relativos às vantagens da farmácia em comparação com os outros circuitos de distribuição, como por exemplo o ambiente, que garante uma imagem de seriedade e de confidencialidade, a organização material dos laboratórios (gama completa em armazém ou entrega rápida), a ausência de possibilidade de manipulação dos produtos, a possibilidade de retirada imediata de produtos em caso de necessidade e o carácter da farmácia como lugar de diálogo e não lugar de passagem. Contudo, estas vantagens não derivam da qualificação profissional do farmacêutico, mas sim das características da farmácia em termos de instituição e de comércio. Consequentemente, estes argumentos baseiam-se em critérios de natureza quantitativa;

f) A distinção entre a qualificação profissional certificada pelo diploma e a posição de « farmacéutico com laboratório próprio », que inclui elementos suplementares, não constitui um critério de apreciação artificial, como a Vichy pretende. Pelo contrário, esta distinção é fundamental para o sistema de distribuição que a Vichy e outros produtores de cosméticos efectuam em França.

Dado que o critério de selecção aplicado pela Vichy não é conforme com os critérios enunciados pelo Tribunal de Justiça, os acordos que excluem qualquer forma de comercialização fora do circuito farmacêutico têm por objecto e por efeito restringir a concorrência.

(19) O acordo em causa restringe a concorrência e afecta o comércio entre os Estados-membros de uma forma considerável. Sem uma restrição deste tipo, deve esperar-se um crescimento importante das trocas comerciais entre Estados-membros como resultado do aumento do número de postos de venda e das diferenças dos preços médios de venda aos retalhistas, que variam até 30 % de um Estado-membro para outro. Os outros revendedores que não os farmacêuticos terão mais recursos e conhecimentos para utilizar as diferenças de preços entre Estados-membros a fim de efectuarem importações paralelas, nomeadamente quando se especializam na venda de cosméticos.

Na apreciação da natureza considerável da restrição da concorrência, bem como da afectação do comércio entre Estados-membros, é necessário tomar em consideração o efeito cumulativo que resulta da existência de sistemas paralelos de distribuição exclusiva em farmácia com laboratório próprio para todas as marcas de cosméticos vendidas no circuito framacêutico. A parte do mercado da dermofarmácia situa-se entre cerca de 5 % e 40 % do mercado total dos cosméticos. Pode verificar-se, portanto, que a restrição da concorrência e a afectação do comércio entre os Estados-membros têm uma natureza considerável, qualquer que seja a delimitação do mercado relevante.

(20) Após exame provisório, deve concluir-se que os acordos em causa infringem o disposto no no 1 do artigo 85o do Tratado CEE no que diz respeito à distribuição exclusiva em farmácia com laboratório próprio. Esta conclusão está em conformidade com o resultado do exame do no 1 do artigo 85o efectuado pela Cour d'appel de Paris (11), bem como com as considerações da Comissão na Decisão « APB » (12).

III. APRECIAÇÃO PROVISÓRIA EM RELAÇÃO DO No 3 DO ARTIGO 85o AO TRATADO CEE

(21) O exame do no 3 do artigo 85o deve incluir as vantagens que a Vichy alega serem específicas do circuito de distribuição através de farmácias, que são resumidas da seguinte forma:

a) Os farmacêuticos com laboratório próprio garantem a disponibilidade de um conjunto completo da gama, se não por um armazenamento completo, pelo menos por um aprovisionamento rápido das farmácias efectuado pelo serviço de distribuição de medicamentos mantido pelos grossistas farmacêuticos e pela entreajuda entre eles;

b) O papel do farmacêutico com laboratório próprio permite ao fabricante, que assume o risco de investir somas importantes no desenvolvimento de novos produtos, assegurar a colaboração do farmacêutico para ter êxito no lançamento desses produtos;

c) A passagem obrigatória dos produtos inovadores pela farmácia com laboratório próprio, utilizando o papel de educador desempenhado pelo farmacêutico, permite comercializar, logo que os hábitos de consumo estejam estabelecidos, produtos semelhantes sob outras marcas nos outros circuitos de distribuição, em especial em grande distribuição;

d) O lucro do consumidor resulta da possibilidade de escolha que lhe é oferecida entre o circuito farmacêutico e os outros circuitos, apresentando cada um deles vantagens diferentes;

e) A distribuição de produtos inovadores de cosmética não pode ser concebida, numa perspectiva de êxito tanto industrial como comercial, sem o complemento indispensável que constitui o aconselhamento no momento da escolha. Assim, a venda dos produtos Vichy é indissociável do conselho do farmacêutico com laboratório próprio.

(22) No estado actual do processo, a questão de saber se as vantagens decorrentes da qualificação profissional do farmacêutico (por exemplo, orientação do cliente, subida da informação até ao produtor) preenchem as condições para uma isenção não deve ainda ser decidida, dado o âmbito limitado da presente decisão.

(23) A avaliação dos argumentos da Vichy deve ter em consideração o facto de não estar em causa proibir a distribuição dos produtos Vichy em farmácias. Na medida em que o processo está limitado ao sistema de distribuição exclusiva em farmácias, a alternativa menos grave para a Vichy consiste em alargar, de forma limitada, o acesso à rede de distribuição. Com efeito, os farmacêuticos não serão minimamente impedidos de continuar a vender os produtos Vichy a título não exclusivo e a Vichy continua livre para impor critérios de selecção qualitativos para os postos de venda que não farmácias com laboratórios próprios, como o diploma em farmácia.

(24) As vantagens acima referidas, nas alíneas a) a e), não são de natureza a melhorar a produção.

(25) Em primeiro lugar, a melhoria da distribuição referida no argumento da alínea a) não pode ser considerada como válida, dado que a organização eficaz do aprovisionamento do circuito farmacêutico não constitui uma consequência do acordo em causa. O serviço funciona para garantir o aprovisionamento da população em medicamentos. Além disso, a obrigação de oferecer a gama completa não constitui uma condição de autorização, e nem sequer figura nas condições gerais de venda. Mesmo fora da farmácia, estas vantagens de distribuição podem ser asseguradas por via de obrigações contratuais.

(26) O argumento referida na alínea b), a promoção do progresso técnico ou económico, não pode ser considerado, dado que a venda exclusiva corresponde ao interesse económico individual da Vichy de recuperar as despesas de investimento. Além disso, a Vichy não fica de forma alguma privada da colaboração do farmacêutico para ter êxito no lançamento dos produtos inovadores.

(27) O argumento da Vichy referido na alínea c), que também refere uma promoção do progresso técnico e económico, é contrariado pelo facto de a comercialização posterior fora do circuito farmacêutico se efectuar com outras marcas. Prima facie, esta situação reflecte mais um desejo do produtor em criar uma imagem de marca duradoura a nível das farmácias do que em preparar a comercialização no mercado geral.

(28) Os argumentos da Vichy relativos à melhoria da distribuição e à promoção do progresso técnico ou económico não podem ser considerados como permitindo reservar uma parte equitativa do lucro ao consumidor. O facto de a comercialização de produtos da mesma natureza se fazer sob marcas diferentes de um circuito para um outro não permite ao consumidor efectuar uma escolha objectiva. Sem a exclusividade em farmácia, a escolha do consumidor seria mais vasta, sem que fosse privado da possibilidade de comprar os produtos na farmácia caso desejasse obter os conselhos do farmacêutico.

(29) Além disso, convém salientar que a exclusividade em farmácia não parece ser indispensável para garantir as vantagens acima referidas [considerando (21), alíneas a) a e)]. Nada impede a Vichy de continuar a vender, numa base de não exclusividade, nas farmácias e de dispor assim dessas vantagens.

(30) Devido à influência da deontologia e da ética profissional dos farmacêuticos, o papel da concorrência intramarcas no interior do circuito farmacêutico continua limitado. A Vichy não conseguiu demonstrar que a concorrência intermarcas, quer no interior da rede em farmácia com laboratório próprio quer de um circuito de distribuição para outro, seria suficientemente forte para poder contrabalançar a ausência da concorrência intramarcas.

(31) Após exame provisório das condições previstas no no 3 do artigo 85o, deve assim concluir-se que o disposto no no 1 do mesmo artigo não pode ser declarado inaplicável ao acordo em causa.

IV. APLICAÇÃO DO No 6 DO ARTIGO 15o DO REGULAMENTO No 17

(32) No seu acórdão no início de 1988 (13), a Cour d'appel de Paris verificou que o Conselho de Concorrência tinha considerado a justo título que os acordos em causa, a saber, a exclusão de qualquer forma de comercialização que não a efectuada através de farmácias com laboratório próprio, estavam abrangidos pelo disposto no artigo 85o do Tratado CEE. Este acórdão foi confirmado pela Cour de Cassation.

A partir de Dezembro de 1988, a Vichy tinha conhecimento da instrução de um processo relativo a uma denúncia apresentada em 13 de Maio de 1988 pela empresa alemã Cosimex contra o seu sistema de distribuição exclusiva em farmácia.

Na Decisão « APB » de 14 de Dezembro de 1989 (14), a Comissão assinalou nos considerandos (28) e (29) que a exclusividade de venda em farmácia restringia a concorrência a nível da distribuição dos produtos parafarmacêuticos na Bélgica e impedia, por outro lado, que o acordo na sua versão notificada pudesse ser objecto de isenção ao abrigo do no 3 do artigo 85o

Após se ter conformado, em França, com o direito comunitário alargando a autorização dos distribuidores a titulares de um diploma em farmácia, a Vichy notificou, em Agosto de 1989, o novo sistema de distribuição para a França, ao mesmo tempo que, no que se refere aos outros Estados-membros (com excepção da Dinamarca), a Vichy notificou, pelo contrário, o sistema de distribuição sem qualquer alteração baseado na exclusividade em farmácia. No entanto, a Vichy não apresentou argumentos susceptíveis de justificar, nos termos do artigo 85o, a coexistência de dois sistemas de distribuição diferentes no interior do mercado comum.

Dada esta situação, a Comissão considera que a manutenção da distribuição exclusiva em farmácia em relação a 10 Estados-membros constitui uma infracção grave e manifesta ao artigo 85o A Comissão reserva-se o direito de tomar posteriormente uma decisão definitiva, após examinar pormenorizadamente o conjunto dos dois sistemas notificados pela Vichy.

Nestas condições, impõe-se uma comunicação da Comissão na acepção do no 6 do artigo 15o do Regulamento no 17. Nos termos do no 6 do artigo 15o, a presente decisão suspende, em relação à distribuição exclusiva em farmácias com laboratório próprio, a aplicação de coimas que resulta normalmente da notificação de um acordo,

ADOPTOU A PRESENTE DECISÃO:

Artigo 1o

A Comissão considera, na sequência de um exame provisório nos termos no 6 do artigo 15o do Regulamento no 17, no que diz respeito às disposições dos acordos celebrados entre a Société d'hygiène dermatologique de Vichy e os grossistas-distribuidores e farmacêuticos retalhistas, na medida em que esses acordos prevêem a distribuição exclusiva dos produtos cosméticos Vichy em farmácia com laboratório próprio, isto é, o facto de a aprovação de distribuidor autorizado dos produtos Vichy estar sujeita à qualidade de farmacêutico com laboratório próprio, que se encontram preenchidas as condições de aplicação do no 1 do artigo 85o do Tratado CEE e que não se justifica uma aplicação do no 3 do artigo 85o

Artigo 2o

A Société d'hygiène dermatologique de Vichy, 28, rue du Président Wilson, F-03201 Vichy, França, é a destinatária da presente decisão. Feito em Bruxelas, em 11 de Janeiro de 1991. Pela Comissão

Leon BRITTAN

Vice-Presidente

(1) JO no 13 de 21. 2. 1962, p. 204/62. (2) JO no 127 de 20. 8. 1963, p. 2268/63. (3) Decisão no 87-D 15 do Conselho da Concorrência de 9 de Junho de 1987. (4) Acórdão da Cour d'appel de Paris de 28 de Janeiro de 1988. (5) Acórdão da Cour de cassation de 25 de Abril de 1989. (6) No texto da presente decisão destinado a publicação, foi omitida alguma informação de acordo com as disposições do artigo 21o do Regulamento no 17 relativo à não divulgação dos segredos de negócios. (7) Os sistemas de distribuição selectiva na Comunidade do ponto de vista da política da concorrência. O caso dos perfumes e dos produtos cosméticos, André-Paul Weber, Ceressec 1988. (8) Processo 26/76 Metro I, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 1977, p. 1875; processo 253/78 Giry e Guerlain, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 1980, p. 2327; processo 99/79 Lancôme/Etos, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 1980, p. 2511; processos 25 e 26/84 Ford, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 1985, p. 2736; processo 75/84 Metro II, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 1986, p. 3021; processo 243/83 Binon/AMP, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 1985, p. 2015. (9) Processo 31/80 L'Oréal/De nieuwe Amck, « Colectânea da Jurisprudência do Tribunal » 180, p. 3775. (10) Ibidem. (11) Ver nota de pé-de-página (4). (12) JO no L 18 de 23. 1. 1990, p. 35. (13)

Ver nota de pé-de-página (4). (14) Ver nota de pé-de-página (12).