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Document 62014CJ0274

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 21 de janeiro de 2020.
Processo instaurado por Banco de Santander SA.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Económico-Administrativo Central.
Reenvio prejudicial — Artigo 267.o TFUE — Conceito de “órgão jurisdicional nacional” — Critérios — Independência do organismo nacional em causa — Inamovibilidade dos membros — Inadmissibilidade do pedido de decisão prejudicial.
Processo C-274/14.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:17

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

21 de janeiro de 2020 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigo 267.o TFUE — Conceito de “órgão jurisdicional nacional” — Critérios — Independência do organismo nacional em causa — Inamovibilidade dos membros — Inadmissibilidade do pedido de decisão prejudicial»

No processo C‑274/14,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Económico‑Administrativo Central (Tribunal Económico e Administrativo Central, Espanha), por Decisão de 2 de abril de 2014, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 5 de junho de 2014, no processo instaurado por

Banco de Santander SA,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, A. Arabadjiev, A. Prechal (relatora), M. Vilaras, P. G. Xuereb, L. S. Rossi e I. Jarukaitis, presidentes de secção, E. Juhász, M. Ilešič, J. Malenovský, L. Bay Larsen, T. von Danwitz, C. Lycourgos e N. Piçarra, juízes,

advogado‑geral: G. Hogan,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 2 de julho de 2019,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Banco de Santander SA, por J. L. Buendía Sierra, E. Abad Valdenebro, R. Calvo Salinero e J. M. Panero Rivas, abogados,

em representação do Governo espanhol, inicialmente por A. Sampol Pucurull e A. Rubio González, e em seguida por S. Centeno Huerta e A. Rubio González, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por R. Lyal, B. Stromsky, C. Urraca Caviedes e P. Němečková, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 1 de outubro de 2019,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 1.o, n.o 2, da Decisão 2011/5/CE da Comissão, de 28 de outubro de 2009, relativa à amortização para efeitos fiscais da diferença relativamente ao valor do património (financial goodwill), em caso de aquisição de participações em empresas estrangeiras Processo C 45/07 (ex NN 51/07, ex CP 9/07) aplicada pela Espanha (JO 2011, L 7, p. 48), a validade da Decisão da Comissão, de 17 de julho de 2013, que dá início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, relativa ao auxílio estatal SA.35550 (13/C) (ex 13/NN) (ex 12/CP) – Amortização para efeitos fiscais relativamente ao valor do património (financial goodwill) em caso de aquisições de participações em empresas estrangeiras (JO 2013, C 258, p. 8), e a validade da Decisão (UE) 2015/314 da Comissão, de 15 de outubro de 2014, relativa ao auxílio estatal SA.35550 (13/C) (ex 13/NN) (ex 12/CP) concedido pela Espanha — Regime de amortização fiscal do goodwill financeiro em caso de aquisição de participações em empresas estrangeiras (JO 2015, L 56, p. 38).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um processo instaurado pelo Banco de Santander SA contra um aviso de liquidação emitido pela Inspección Financiera (Inspeção das Finanças, Espanha) a respeito da dedução do goodwill resultante da aquisição, por parte deste banco, da totalidade das participações sociais de uma sociedade holding de direito alemão que detinha participações em sociedades estabelecidas na União Europeia.

Quadro jurídico

Direito da União

Decisão 2011/5

3

Como resulta, em substância, dos considerandos 4 a 6 da Decisão 2011/5, por Decisão de 10 de outubro de 2007, publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 21 de dezembro de 2007, a Comissão Europeia, na sequência de várias questões escritas submetidas em 2005 e 2006 por membros do Parlamento Europeu, bem como de uma denúncia de um operador privado em 2007, deu início ao procedimento de investigação, então previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE, do regime espanhol de amortização fiscal em benefício das empresas espanholas com uma participação significativa em empresas estrangeiras, previsto no artigo 12.o, n.o 5, da Ley 43/1995, reguladora del Impuesto de Sociedades (Lei 43/1995 do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas), de 27 de dezembro de 1995 (BOE n.o 310, de 28 de dezembro de 1995, p. 37072), retomado no Real Decreto Legislativo 4/2004 por el se aprueba el texto refundido de la Ley del Impuesto sobre Sociedades (Real Decreto Legislativo 4/2004 que Aprova o Texto Revisto da Lei do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas), de 5 de março de 2004 (BOE n.o 61, de 11 de março de 2004, p. 10951, a seguir «TRLIS»).

4

A medida prevista no artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2002, prevê que, em caso de aquisição de participações numa «empresa estrangeira» por parte de uma empresa sujeita a tributação em Espanha, sempre que essa aquisição de participações for de, pelo menos, 5% e a participação em causa for mantida por um período ininterrupto mínimo de, pelo menos, um ano, o goodwill financeiro daí resultante, registado na contabilidade da empresa residente como ativo incorpóreo distinto, pode ser deduzido, sob forma de amortização, da matéria coletável do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas de que a empresa em causa seja devedora. É possível proceder a esta amortização, em prestações iguais, durante os vinte anos seguintes à aquisição da participação.

5

No artigo 1.o, n.o 1, da Decisão 2011/5, a Comissão declarou o regime fiscal em causa incompatível com o mercado comum.

6

Nos termos do artigo 1.o, n.os 2 e 3, desta decisão:

«2.   Contudo, as reduções de impostos de que os beneficiários usufruíram em relação às aquisições intracomunitárias, por força do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, que estejam relacionadas com direitos detidos, direta ou indiretamente, em empresas estrangeiras que cumprissem as condições pertinentes do regime de auxílios em 21 de dezembro de 2007, com exceção da condição de deterem as participações há pelo menos um ano ininterruptamente, podem continuar a ser aplicadas em relação a todo o período de amortização estabelecido pelo regime de auxílios.

3.   As reduções de impostos de que os beneficiários usufruíram em relação às aquisições intracomunitárias, por força do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, que estejam relacionadas com uma obrigação irrevogável, assumida antes de 21 de dezembro de 2007, de manutenção dos referidos direitos, sempre que o contrato preveja uma condição suspensiva associada ao facto de a operação em causa estar sujeita à autorização obrigatória de uma autoridade reguladora e sempre que a operação tenha sido notificada antes de 21 de dezembro de 2007, podem continuar a ser aplicadas em relação a todo o período de amortização estabelecido pelo regime de auxílios no que respeita à parte dos direitos detidos na data de levantamento da condição suspensiva.»

7

O artigo 4.o da referida decisão exige ao Reino de Espanha que recupere os auxílios concedidos ao abrigo do regime fiscal em causa, com exceção dos que cumpram as condições descritas no artigo 1.o, n.o 2, da mesma decisão.

Decisão 2011/282/UE

8

Através da Decisão 2011/5, a Comissão encerrou o procedimento no que respeita às aquisições de participações por parte de empresas espanholas em empresas estabelecidas na União. Essa instituição manteve, todavia, aberto o procedimento no que se refere a tais aquisições de participações em empresas estabelecidas fora da União.

9

No artigo 1.o, n.o 1, da Decisão 2011/282/UE da Comissão, de 12 de janeiro de 2011, relativa à amortização para efeitos fiscais do goodwill financeiro, em caso de aquisição de participações em empresas estrangeiras n.o C 45/07 (ex NN 51/07, ex CP 9/07) aplicada pela Espanha (JO 2011, L 135, p. 1), essa instituição declarou o regime em causa, que consiste na concessão de um benefício fiscal às empresas sujeitas a tributação em Espanha que permite que estas últimas amortizem o goodwill financeiro resultante da aquisição de participações em empresas estabelecidas fora da União, incompatível com o mercado interno.

10

O artigo 1.o, n.os 2 a 5, desta decisão prevê determinadas hipóteses em que, quando adquirem participações fora da União, os beneficiários de deduções fiscais a título do regime fiscal em causa podem continuar a aplicar essas deduções durante todo o período de amortização previsto por esse regime.

11

O artigo 4.o da referida decisão exige ao Reino de Espanha que recupere os auxílios concedidos ao abrigo do regime fiscal em causa.

Decisão 2015/314

12

Por Decisão da Comissão, de 17 de julho de 2013, que deu início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, relativa ao auxílio estatal SA.35550 (13/C) (ex 13/NN) (ex 12/CP) — Amortização para efeitos fiscais relativamente ao valor do património (financial goodwill em caso de aquisições de participações em empresas estrangeiras, essa instituição decidiu examinar a conformidade com o direito da União da nova interpretação administrativa do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, adotada pela Dirección General de Tributos (Direção‑Geral dos Impostos, Espanha, a seguir«DGT») e pelo Tribunal Económico‑Administrativo Central (Tribunal Económico e Administrativo Central, Espanha, a seguir «TEAC»), que alargava o âmbito de aplicação do regime fiscal em causa às aquisições de participações indiretas.

13

Este processo terminou, em 14 de outubro de 2014, com a adoção de uma terceira decisão relativa ao regime fiscal em causa, ou seja, a Decisão 2015/314.

14

Através dessa decisão, a Comissão considerou que o regime fiscal em causa, na medida em que também passou a ser aplicável às aquisições de participações indiretas em sociedades não residentes através da aquisição de participações em sociedades holding não residentes, constitui, também ele, um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno que foi, além do mais, concedido em violação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE. Consequentemente, a Comissão ordenou às autoridades espanholas que recuperassem o auxílio concedido.

Direito espanhol

15

O TEAC, com sede em Madrid, conhece das reclamações contra decisões de certas autoridades fiscais centrais em primeira e em última instância. É também o órgão de recurso das decisões dos outros Tribunales Económico‑Administrativos (Tribunais Económicos e Administrativos, a seguir «TEA»), a saber, os TEA regionais e os TEA locais, situados em Ceuta (Espanha) e em Melilla (Espanha).

16

A regulamentação espanhola que prevê o estatuto jurídico dos TEA consta da Ley 58/2003 General Tributaria (Lei 58/2003, relativa ao Código Geral dos Impostos), de 17 de dezembro de 2003 (BOE n.o 302, de 18 de dezembro de 2003, p. 44987), na redação que lhe foi dada pela Ley 34/2015, de 21 de setembro de 2015 (BOE n.o 227, de 22 de setembro de 2015, p. 83633) (a seguir «LGT»), em especial do capítulo IV desta lei, sob a epígrafe «Reclamações económico‑administrativas», que figura no título V desta, intitulado «Revisão por via administrativa».

17

O artigo 228.o da LGT dispõe:

«1.   A competência para decidir das reclamações económico‑administrativas pertence exclusivamente aos órgãos económico‑administrativos, que atuam de forma funcionalmente independente no exercício das suas funções.

2.   No domínio da competência do Estado, são órgãos económico‑administrativos:

a)

O [TEAC].

b)

Os [TEA] regionais e locais.

3.   A Secção Especial competente em matéria de unificação da jurisprudência também é considerada um órgão económico‑administrativo.

[…]»

18

O artigo 237.o, n.o 3, da LGT prevê regras em matéria de pedidos de decisão prejudicial que podem ser submetidos pelos TEA ao Tribunal de Justiça, nomeadamente a suspensão do processo enquanto se aguarda uma resposta do Tribunal de Justiça a uma questão prejudicial.

19

O artigo 243.o da LGT, sob a epígrafe «Recurso extraordinário para a unificação da jurisprudência», dispõe:

«1.   Das decisões em matéria fiscal proferidas pelo [TEAC] cabe recurso extraordinário para a uniformização da jurisprudência a apresentar pelo diretor‑geral dos Impostos do Ministério da Economia e das Finanças, quando este diretor‑geral não concordar com o conteúdo das referidas decisões.

[…]

2.   A competência para conhecer deste recurso caberá à Secção Especial para a uniformização de jurisprudência. Esta Secção Especial será composta pelo presidente do [TEAC], que presidirá, por três membros desse tribunal, pelo diretor‑geral dos Impostos do Ministério da Economia e das Finanças, pelo diretor‑geral da Agência Estatal da Administração Fiscal, pelo diretor‑geral ou pelo diretor do departamento da Agência Estatal da Administração Fiscal de que dependa funcionalmente o órgão que tenha emitido o ato a que se refere a resolução objeto do recurso e pelo presidente do Conselho para a Defesa dos Contribuintes.

[…]

3.   A decisão sobre o recurso será tomada por maioria dos membros da Secção Especial. Em caso de empate, o presidente terá sempre voto de qualidade.

4.   A decisão sobre o recurso deverá ser emitida no prazo de seis meses e respeitar a situação jurídica específica respeitante à decisão recorrida, estabelecendo a jurisprudência aplicável.

5.   A jurisprudência estabelecida por tais decisões de recurso é vinculativa para os [TEA], para os órgãos fiscais das comunidades autónomas e das cidades com estatuto de autonomia e para a restante Administração Fiscal do Estado e das comunidades autónomas e das cidades com estatuto de autonomia.»

20

Outras regras aplicáveis aos TEA constam do Real Decreto 520/2005 por el que se aprueba el Reglamento general de desarrollo de la Ley 58/2003, de 17 de diciembre, General Tributaria, en materia de revisión en Vía Administrativa (Real Decreto 520/2005 que Aprova o Regulamento Geral de Execução da Lei 58/2003, de 17 de dezembro, que Aprova o Código Geral dos Impostos, em Matéria de Revisão e de Recurso Administrativo), de 13 de maio de 2015 (BOE n.o 126, de 27 de maio de 2005, p. 17835) (a seguir «Real Decreto 520/2005»).

21

O artigo 29.o, n.os 2 e 9, do Real Decreto 520/2005 dispõe:

«2.   O presidente [do TEAC] será nomeado e destituído por real decreto, adotado em Conselho de Ministros, sob proposta do ministro da Economia e das Finanças, entre os funcionários com reconhecida reputação e experiência profissional no domínio fiscal e terá o grau de diretor‑geral do Ministério da Economia e das Finanças.

Os membros [do TEAC] serão nomeados e destituídos por real decreto, adotado em Conselho de Ministros, sob proposta do ministro da Economia e das Finanças, entre os funcionários dos organismos indicados na lista dos postos de trabalho e terão o grau de diretor‑geral adjunto do Ministério da Economia e das Finanças.

[…]

9.   Todos os membros do Plenário ou das Secções, bem como os órgãos unipessoais [do TEAC], exercem as funções que lhes são legalmente atribuídas e as demais funções que lhes possam vir a ser atribuídas pelo presidente com total independência e sob a sua responsabilidade.»

22

Nos termos do artigo 30.o, n.os 2 e 12, do Real Decreto 520/2005:

«2.   O presidente, os presidentes da secção descentralizada, os presidentes de secção e os membros [dos TEA regionais e locais] serão nomeados e destituídos por despacho do ministro da Economia e das Finanças entre funcionários das entidades indicadas na lista dos postos de trabalho. […]

[…]

12.   Todos os membros do Plenário ou das Secções, bem como os órgãos unipessoais [dos TEA regionais e locais], exercerão as funções que lhes são legalmente atribuídas e as outras funções que lhes podem vir a ser confiadas pelo presidente do tribunal ou pelo presidente da secção descentralizada com total independência e sob a sua responsabilidade.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

23

Em maio de 2002, o Banco de Santander Central Hispano SA (a seguir «BSCH»), sociedade dominante do grupo de consolidação fiscal 17/89, adquiriu 100 % das participações sociais da AKB Holding GmbH (a seguir «AKB»), sociedade de direito alemão.

24

Esta aquisição, cujo preço ascendia a 1099999999 euros, quando o valor contabilístico da AKB estava avaliado em 183909000 euros, gerou um goodwill financeiro de 916091000 euros (a seguir «goodwill em causa»).

25

Enquanto sociedade holding, a AKB detinha participações nas seguintes sociedades, todas estabelecidas na União: AKB Datensysteme GmbH, AKB Autobörse AG, AKB Leasing GmbH, AKB Versicherungsdienst GmbH, AKB Privat und Handelsbank Aktien AG, AKB Vermögensverwaltung GmbH e AKB Marketing Services sp. z o.o.

26

Em dezembro de 2002, o BSCH cedeu as ações da AKB, cujo preço de aquisição tinha estado na origem do goodwill em causa, à Holneth BV, sociedade de direito neerlandês, e à Santander Consumer Finance SA (a seguir «SCF»), sociedade de direito espanhol, sendo que estas sociedades também pertenciam ao grupo de consolidação fiscal 17/89.

27

Tendo em conta o goodwill em causa, o grupo de consolidação fiscal 17/89 procedeu, ao abrigo do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, a deduções nas suas declarações de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas nos exercícios de 2002 e 2003.

28

Assim, no exercício de 2002, o BSCH e a SCF fizeram deduções de 27482730 euros e de 1631395 euros, respetivamente. No exercício de 2003, a SCF solicitou uma dedução de 45804550 euros.

29

Quanto ao exercício de 2002, na sequência de um controlo fiscal, encerrado por auto de 21 de dezembro de 2006, a Inspeção das Finanças, no aviso de liquidação de 7 de março de 2007, aceitou a dedução efetuada pelo BSCH no montante de 20262374 euros, mas levou a cabo uma regularização de 7215356 euros. No que respeita à SCF, a dedução de 1631395 euros foi aceite na íntegra.

30

Por aviso de liquidação de 22 de julho de 2010, a Inspeção das Finanças rejeitou a totalidade da dedução do goodwill solicitada pela SCF a título do exercício de 2003.

31

Em 16 de agosto de 2010, o Banco de Santander apresentou uma reclamação contra esse aviso de liquidação no TEAC alegando que, não obstante o seu caráter indireto, pelo facto de a aquisição que estava na sua origem dizer respeito a uma sociedade holding, o goodwill em causa era dedutível do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas por força dos próprios termos do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS.

32

Tendo em conta a nova interpretação do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS adotada pela DGT e pelo TEAC, visada no n.o 12 do presente acórdão, no caso em apreço coloca‑se a questão de saber se, em aplicação da Decisão 2011/5, que é a primeira decisão da Comissão relativa ao regime fiscal em causa, há que proceder à recuperação, como auxílio ilegal e incompatível com o mercado interno, da dedução fiscal correspondente à amortização do goodwill em causa, realizada antes de 21 de dezembro de 2007, na sequência da aquisição de uma sociedade holding não residente.

33

Tendo em conta que as disposições conjugadas do artigo 1.o, n.o 2, e do artigo 4.o, n.o 1, da Decisão 2011/5 excluem a obrigação de recuperação, devido à confiança legítima adquirida, das aquisições anteriores a 21 de dezembro de 2007, e que a aquisição em causa no processo principal ocorreu antes dessa data, é indispensável, para resolver o litígio no processo principal, responder à questão de saber se essas disposições da Decisão 2011/5 devem ser interpretadas no sentido de que também se aplicam à aquisição de participações indiretas, nomeadamente à aquisição de uma sociedade holding não residente, como a que está em causa no processo principal.

34

A este respeito, o TEAC considerou que a interpretação administrativa que anteriormente se opunha à aplicação da dedução fiscal a aquisições de participações indiretas não constitui uma fonte de direito.

35

Com efeito, nem a DGT nem o TEAC pertencem ao poder legislativo ou judicial. As interpretações adotadas por estes organismos não são definitivas, uma vez que estão sujeitas à fiscalização dos órgãos jurisdicionais. Por outro lado, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) ainda não se pronunciou sobre a aplicabilidade do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS às aquisições de participações indiretas.

36

Nestas condições, o TEAC decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o n.o 2 do artigo 1.o da Decisão [2011/5] ser interpretado no sentido de se considerar aplicável a confiança legítima, nele reconhecida e nos termos em que a delimita, à dedução da amortização para efeitos fiscais do goodwill financeiro (financial goodwill) do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, relativamente às aquisições indiretas de participações em sociedades não residentes efetuadas através da aquisição direta de uma sociedade holding não residente?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, deve a [decisão de abertura do procedimento que conduziu à adoção da Decisão 2015/314], mediante a qual é decidida a abertura do procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, [TFUE] por violação do próprio artigo 108.o [TFUE] e do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do [artigo 108.o TFUE (JO 1999, L 83, p. 1)], ser considerada nula?»

37

Por Decisão de 8 de janeiro de 2015, que entrou no Tribunal de Justiça em 27 de janeiro de 2015, o TEAC entendeu que devia reformular as questões prejudiciais em razão da superveniência de factos novos.

38

Tratava‑se, por um lado, da adoção, em 15 de outubro de 2014, da Decisão 2015/314 e, por outro, dos Acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia de 7 de novembro de 2014, Autogrill España/Comissão (T‑219/10, EU:T:2014:939), e [de 7 de novembro de 2014,] Banco Santander e Santusa/Comissão (T‑399/11, EU:T:2014:938), através dos quais este anulou os artigos 1.o, n.o 1, e os artigos 4.o, respetivamente, das Decisões 2011/5 e 2011/282.

39

O TEAC considerou que, na sequência destes novos desenvolvimentos, já não havia que submeter questões ao Tribunal de Justiça a respeito da interpretação da Decisão 2011/5, uma vez que a questão essencial para a solução do litígio no processo principal passou a ser a de saber se a anulação desta decisão pelo Tribunal Geral implica a invalidade da Decisão 2015/314, que alarga a proibição da dedução prevista no artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, como prevista pelas Decisões 2011/5 e 2011/282, às aquisições de participações indiretas em sociedades não residentes.

40

Nestas condições, o TEAC decidiu reformular as questões prejudiciais da seguinte forma:

«1)

A Decisão [2015/314] é nula por falta de suporte fáctico e jurídico ao abrigo dos [A]córdãos do Tribunal Geral da União Europeia de 7 de novembro de 2014, Autogrill España/Comissão (T‑219/10, EU:T:2014:939)[,] e [de 7 de novembro de 2014,] Banco Santander e Santusa/Comissão (T‑399/11, EU:T:2014:938), que anularam, respetivamente, o artigo 1.o, n.o 1[,] e o artigo 4.o [da Decisão 2011/5 e da Decisão 2011/282]?

2)

A Decisão [2015/314] é nula por ter ficado privada de fundamentação devido aos Acórdãos do Tribunal Geral da União Europeia de 7 de novembro de 2014, Autogrill España/Comissão (T‑219/10, EU:T:2014:939)[,] e [de 7 de novembro de 2014,] Banco Santander e Santusa/Comissão (T‑399/11, EU:T:2014:938), que anularam, respetivamente, o artigo 1.o, n.o 1[,] e o artigo 4.o [da Decisão 2011/5 e da Decisão 2011/282]?

3)

Subsidiariamente, em caso de resposta negativa às questões anteriores[:]

A Decisão [2015/314] é nula por a nova interpretação administrativa do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS estar plenamente incluída no âmbito de aplicação [da Decisão 2011/5 e da Decisão 2011/282]?»

41

Por Decisão de 8 de junho de 2017, entrada no Tribunal de Justiça em 6 de julho de 2017, o TEAC considerou que devia reformular uma segunda vez as questões prejudiciais devido à superveniência de um facto novo, concretamente o Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/World Duty Free Group e o. (C‑20/15 P e C‑21/15 P, EU:C:2016:981), através do qual o Tribunal de Justiça anulou os Acórdãos do Tribunal Geral de 7 de novembro de 2014, Autogrill España/Comissão (T‑219/10, EU:T:2014:939), e de 7 de novembro de 2014, Banco Santander e Santusa/Comissão (T‑399/11, EU:T:2014:938), e remeteu os processos T‑219/10 e T‑399/11 para o Tribunal Geral.

42

Atendendo a esse facto novo, o TEAC considerou que havia que manter tanto as questões submetidas no âmbito do pedido de decisão prejudicial inicial, relativas à interpretação do contexto de aplicação do artigo 1.o, n.o 2, da Decisão 2011/5, como as submetidas no contexto da primeira reformulação das questões prejudiciais relativas, por seu turno, à validade da Decisão 2015/314.

43

Na sequência da segunda reformulação, as questões prejudiciais têm agora a seguinte redação:

«1)

No caso de se confirmar a validade da [Decisão 2011/5]:

a)

Deve o n.o 2 do artigo 1.o da [Decisão 2011/5] ser interpretado no sentido de se considerar aplicável a confiança legítima, nele reconhecida e nos termos em que a delimita, à dedução da amortização para efeitos fiscais do goodwill financeiro (financial goodwill) do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS, relativamente às aquisições indiretas de participações em sociedades não residentes efetuadas através da aquisição direta de uma sociedade holding não residente?

b)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, a [decisão de abertura do procedimento que conduziu à adoção da Decisão 2015/314] é nula?

2)

No caso de, no processo T‑219/10, o artigo 1.o da [Decisão 2011/5] ser anulado:

a)

A [Decisão 2015/314] é nula por deixar de ter suporte fáctico e jurídico?

b)

A [Decisão 2015/314] é nula por ter ficado privada de fundamentação?

c)

Subsidiariamente, em caso de resposta negativa às [questões] anteriores[:]

A Decisão [2015/314] é nula por a nova interpretação administrativa do artigo 12.o, n.o 5, do TRLIS estar plenamente incluída no âmbito da [Decisão 2011/5 e da Decisão 2011/282]?»

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Por Acórdão do Tribunal Geral de 15 de novembro de 2018, World Duty Free Group/Comissão (T‑219/10 RENV, EU:T:2018:784), foi negado provimento ao recurso de anulação interposto pela World Duty Free Group da Decisão 2011/5.

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Em 25 de janeiro de 2019, essa sociedade interpôs recurso do acórdão do Tribunal Geral destinado à anulação desse acórdão e da Decisão 2011/5. Esse recurso está pendente no Tribunal de Justiça (processo C‑51/19 P).

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Outros recursos de decisões do Tribunal Geral com o mesmo objeto ou que têm por objeto outros acórdãos do Tribunal Geral que negaram provimento aos recursos de anulação da Decisão 2011/282 também estão pendentes no Tribunal de Justiça.

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Além disso, vários recursos de anulação da Decisão 2015/314 estão atualmente pendentes no Tribunal Geral.

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O presente processo foi objeto de várias decisões sucessivas de suspensão da instância. As mesmas foram tomadas, no essencial, pelo facto de o TEAC, depois de, por duas vezes, ter reformulado as questões prejudiciais, pretender agora interrogar o Tribunal de Justiça quer sobre as eventuais repercussões da invalidade da Decisão 2011/5 na validade da Decisão 2015/314, caso o juiz da União declare a Decisão 2011/5 inválida, quer sobre a interpretação da Decisão 2011/5, a fim de determinar o seu âmbito de aplicação, caso o juiz da União confirme a validade dessa decisão.

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Ora, até hoje, a questão da validade da Decisão 2011/5 continua pendente nos órgãos jurisdicionais da União.

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Todavia, tendo em conta, nomeadamente, a jurisprudência do Tribunal de Justiça posterior ao presente pedido de decisão prejudicial e as dúvidas manifestadas pela Comissão quanto à qualificação do TEAC de «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267.o TFUE, e, por conseguinte, à admissibilidade desse pedido, há que retomar o presente processo para analisar a questão de saber se o TEAC é abrangido por essa qualificação.

Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

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Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para apreciar se o organismo de reenvio em causa tem a natureza de «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267.o TFUE, questão que deve ser decidida unicamente no âmbito do direito da União, o Tribunal de Justiça toma em consideração um conjunto de elementos, como a origem legal do organismo, a sua permanência, o caráter vinculativo da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação, pelo órgão, das regras de direito, bem como a sua independência (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de junho de 1966, Vaassen‑Göbbels, 61/65, EU:C:1966:39, p. 395; de 31 de maio de 2005, Syfait e o., C‑53/03, EU:C:2005:333, n.o 29; e de 16 de fevereiro de 2017, Margarit Panicello, C‑503/15, EU:C:2017:126, n.o 27 e jurisprudência aí referida).

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Os elementos que figuram nos autos submetidos ao Tribunal de Justiça não permitem pôr em causa que o TEAC, organismo de reenvio no presente processo, satisfaz os critérios relativos à sua origem legal, à sua permanência, ao caráter vinculativo da sua jurisdição, à natureza contraditória do seu processo e à aplicação, por esse organismo, de regras de direito.

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Em contrapartida, coloca‑se a questão de saber se o TEAC preenche o critério de independência.

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A este respeito, no n.o 39 do Acórdão de 21 de março de 2000, Gabalfrisa e o. (C‑110/98 a C‑147/98, EU:C:2000:145), o Tribunal de Justiça declarou que a legislação espanhola relativa aos TEA, como aplicável ao processo que deu origem a esse acórdão, garantia uma separação funcional entre, por um lado, os serviços da Administração Fiscal encarregados da gestão, da cobrança e da liquidação do imposto e, por outro, os TEA, os quais decidem das reclamações apresentadas contra as decisões tomadas pelos referidos serviços sem receberem qualquer instrução da Administração Fiscal. No n.o 40 do referido acórdão, o Tribunal de Justiça precisou que essas garantias conferiam aos TEA a qualidade de terceiro em relação aos serviços que adotaram a decisão que era objeto da reclamação e a independência necessária para poderem ser considerados órgãos jurisdicionais, na aceção do artigo 267.o TFUE.

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Ora, como também sustentou a Comissão nas suas observações escritas, estas considerações devem ser reapreciadas tendo em conta, nomeadamente, a jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça relativa, em particular, ao critério de independência que qualquer organismo nacional deve respeitar para ser qualificado de «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267.o TFUE.

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Neste contexto, cumpre sublinhar que a independência dos órgãos jurisdicionais nacionais é essencial para o bom funcionamento do sistema de cooperação judiciária que representa o mecanismo de reenvio prejudicial previsto no artigo 267.o TFUE, na medida em que, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, recordada no n.o 51 do presente acórdão, esse mecanismo só pode ser acionado por uma instância, encarregada de aplicar o direito da União, que satisfaça, designadamente, esse critério de independência (Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 43).

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De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o conceito de «independência» comporta duas vertentes. A primeira, de ordem externa, pressupõe que o organismo em causa exerça as suas funções com total autonomia, sem estar submetido a nenhum vínculo hierárquico ou de subordinação em relação a quem quer que seja e sem receber ordens ou instruções de qualquer origem, e esteja, assim, protegido contra intervenções ou pressões externas suscetíveis de afetar a independência de julgamento dos seus membros e influenciar as suas decisões (Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 44 e jurisprudência referida).

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Ainda no que diz respeito à vertente externa do conceito de «independência», importa recordar que a inamovibilidade dos membros da instância em causa constitui uma garantia inerente à independência dos juízes, na medida em que visa proteger a pessoa daqueles cuja função é julgar (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de setembro de 2006, Wilson, C‑506/04, EU:C:2006:587, n.o 51, e de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 45).

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O princípio da inamovibilidade, cuja importância decisiva importa sublinhar, exige, designadamente, que os juízes possam permanecer em funções enquanto não atingirem a idade obrigatória de aposentação ou até ao termo do seu mandato, quando este tiver uma duração determinada. Embora não tenha caráter absoluto, o referido princípio só pode sofrer exceções quando motivos legítimos e imperiosos o justifiquem, no respeito do princípio da proporcionalidade. Assim, é comummente aceite que os juízes possam ser destituídos se não estiverem aptos a continuar a exercer as suas funções em razão de uma incapacidade ou de falta grave, desde que sejam respeitados os procedimentos adequados [Acórdão de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal), C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 76].

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A garantia de inamovibilidade dos membros de um órgão jurisdicional exige, assim, que os casos de destituição dos membros desse organismo sejam previstos por uma regulamentação especial, através de disposições legais expressas que ofereçam garantias que ultrapassem as previstas pelas regras gerais do direito administrativo e do direito do trabalho aplicáveis em caso de destituição abusiva (v., neste sentido, Acórdão de 9 de outubro de 2014, TDC, C‑222/13, EU:C:2014:2265, n.os 32 e 35).

61

Por seu turno, a segunda vertente do conceito de «independência», que é de ordem interna, está ligada ao conceito de «imparcialidade» e visa o igual distanciamento em relação às partes no litígio e aos seus interesses respetivos, tendo em conta o objeto deste. Este aspeto exige o respeito pela objetividade e a inexistência de qualquer interesse na resolução do litígio que não seja a estrita aplicação da regra de direito [Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, Margarit Panicello, C‑503/15, EU:C:2017:126, n.o 38 e jurisprudência referida].

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Assim, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o conceito de «independência», que é inerente à missão de julgar, implica, acima de tudo, que a instância em questão tenha a qualidade de terceiro em relação à autoridade que adotou a decisão que é objeto de recurso (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de março de 1993, Corbiau, C‑24/92, EU:C:1993:118, n.o 15, e de 9 de outubro de 2014, TDC, C‑222/13, EU:C:2014:2265, n.o 29 e jurisprudência referida).

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Estas garantias de independência e de imparcialidade postulam a existência de regras, designadamente no que respeita à composição da instância, à nomeação, à duração das funções, bem como às causas de abstenção, de impugnação da nomeação e de destituição dos seus membros, que permitem afastar qualquer dúvida legítima, no espírito dos particulares, quanto à impermeabilidade da referida instância em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto (Acórdão de 9 de outubro de 2014, TDC, C‑222/13, EU:C:2014:2265, n.o 32).

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No caso em apreço, há que declarar, em primeiro lugar, que, segundo a regulamentação nacional aplicável, nomeadamente o artigo 29.o, n.o 2, do Real Decreto 520/2005, o presidente e os membros do TEAC são nomeados por real decreto adotado em Conselho de Ministros, sob proposta do ministro da Economia e das Finanças, por tempo indeterminado. Segundo esta mesma disposição, tanto o presidente como os membros do TEAC podem ser destituídos de acordo com o mesmo procedimento, a saber, por real decreto adotado em Conselho de Ministros, sob proposta do ministro da Economia e das Finanças.

65

Quanto aos membros dos TEA regionais, há que salientar que, segundo o artigo 30.o, n.o 2, do Real Decreto 520/2005, os mesmos são nomeados pelo ministro da Economia e das Finanças, entre os funcionários que figuram numa lista, e podem ser destituídos por esse mesmo ministro.

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Ora, sendo embora certo que a legislação nacional aplicável prevê regras que regulam, nomeadamente, a abstenção e a impugnação da nomeação do presidente, bem como dos outros membros do TEAC, ou ainda, no que respeita ao presidente do TEAC, regras em matéria de conflitos de interesses, de incompatibilidades e de deveres de transparência, em contrapartida é pacífico que o regime de destituição do presidente e dos outros membros do TEAC não é determinado por uma regulamentação especial que conste de disposições legislativas expressas, como as que são aplicáveis aos membros do poder judicial. Os membros do TEAC, quanto a este último aspeto, apenas são abrangidos pelas regras gerais de direito administrativo e, em particular, pelo estatuto de base dos agentes da função pública, como confirmou o Governo espanhol na audiência no Tribunal de Justiça. Esta mesma conclusão impõe‑se relativamente aos membros dos TEA regionais e locais.

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Por conseguinte, a destituição do presidente e dos outros membros do TEAC, bem como dos membros dos outros TEA, não está limitada, como exige o princípio da inamovibilidade recordado no n.o 59 do presente acórdão, a determinadas hipóteses excecionais que traduzem motivos legítimos e imperiosos que justificam a adoção de tal medida, no respeito do princípio da proporcionalidade e dos procedimentos adequados, como a hipótese de uma incapacidade ou de um incumprimento grave que torne as pessoas em causa inaptas para prosseguirem as suas funções.

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Daqui resulta que a legislação nacional aplicável não garante que o presidente e os outros membros do TEAC estejam protegidos de pressões externas, diretas ou indiretas, suscetíveis de pôr em causa a sua independência.

69

Embora seja verdade que, nos termos do artigo 228.o, n.o 1, da LGT, os membros dos TEA exercem as suas competências «de forma funcionalmente independente» e que, em conformidade com o artigo 29.o, n.o 9, e com o artigo 30.o, n.o 12, do Real Decreto 520/2005, exercem «com total independência e sob a sua responsabilidade» as funções que lhes são legalmente atribuídas, não é menos verdade que a revogação ou anulação da sua nomeação não é acompanhada de garantias especiais. Ora, tal sistema não é suscetível de impedir eficazmente as pressões indevidas do poder executivo sobre os membros dos TEA (v., por analogia, Acórdão de 31 de maio de 2005, Syfait e o., C‑53/03, EU:C:2005:333, n.o 31).

70

Neste ponto, a situação dos membros dos TEA e, designadamente, do TEAC distingue‑se, por exemplo, da do organismo de reenvio no processo que deu origem ao Acórdão de 6 de outubro de 2015, Consorci Sanitari del Maresme (C‑203/14, EU:C:2015:664), no sentido de que, como resulta dos n.os 11 e 20 desse acórdão, os membros deste organismo gozam, ao contrário dos membros dos TEA, de uma garantia de inamovibilidade, durante o período do seu mandato, que só pode ser derrogada por causas expressamente enumeradas na lei.

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De igual modo, os TEA e, nomeadamente, o TEAC distinguem‑se do organismo de reenvio no processo que deu origem ao Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin (C‑396/14, EU:C:2016:347). Com efeito, como resulta dos n.os 29 a 31 desse acórdão, embora este organismo inclua membros peritos que não beneficiam da proteção especial reservada aos magistrados por uma disposição constitucional, é igualmente composto por magistrados que beneficiam, por sua vez, dessa proteção e que dispõem, em qualquer circunstância, da maioria dos votos e, por conseguinte, de um peso preponderante na tomada de decisão do referido organismo, o que é suscetível de garantir a sua independência.

72

No que respeita, em segundo lugar, à exigência de independência, na perspetiva da sua segunda vertente, que é de ordem interna, referida no n.o 61 do presente acórdão, importa salientar que, na verdade, no Ministério da Economia e das Finanças existe uma separação funcional entre, por um lado, os serviços da Administração Fiscal encarregados da gestão, da cobrança e da liquidação do imposto e, por outro, os TEA, que decidem das reclamações apresentadas contra as decisões tomadas pelos referidos serviços.

73

No entanto, como também observou o advogado‑geral nos n.os 31 e 40 das suas conclusões, algumas características do processo de recurso extraordinário perante a Sala Especial para la Unificación de Doctrina (Secção Especial para Uniformização de Jurisprudência, Espanha), processo que se rege pelo artigo 243.o da LGT, contribuem para lançar a dúvida sobre o facto de o TEAC ter a qualidade de «terceiro» relativamente aos interesses em conflito.

74

Com efeito, cabe exclusivamente ao diretor‑geral dos Impostos do Ministério da Economia e das Finanças interpor um recurso extraordinário das decisões do TEAC com as quais não concorda. Ora, esse diretor‑geral faz, ele próprio, oficiosamente parte da formação composta por oito pessoas que é competente para conhecer desse recurso, tal como o diretor‑geral ou o diretor do departamento da Agência Estatal da Administração Fiscal a que pertence o órgão autor do ato visado pela decisão que é objeto do recurso extraordinário em causa. Assim, quer o diretor‑geral dos Impostos do Ministério da Economia e das Finanças, que interpôs o recurso extraordinário de uma decisão do TEAC, quer o diretor‑geral ou o diretor da Agência Estatal da Administração Fiscal do qual emana o ato visado por esta decisão têm assento na Secção Especial do TEAC que conhece desse recurso. Daí resulta uma confusão entre a qualidade de parte no processo de recurso extraordinário e a de membro do órgão competente para conhecer desse recurso.

75

De resto, a perspetiva da interposição desse recurso extraordinário pelo diretor‑geral dos Impostos do Ministério da Economia e das Finanças contra uma decisão do TEAC é suscetível de exercer pressão sobre este e de, assim, lançar dúvidas sobre a sua independência e a sua imparcialidade, não obstante o facto, invocado pelo Governo espanhol na audiência no Tribunal de Justiça, de resultar do artigo 243.o, n.o 4, da LGT que esse recurso extraordinário só produz efeitos para o futuro e não tem incidência nas decisões já adotadas pelo TEAC, incluindo a que é objeto do referido recurso.

76

Assim, estas características do recurso extraordinário para uniformização da jurisprudência que pode ser interposto contra as decisões do TEAC realçam as relações orgânicas e funcionais existentes entre este organismo e o Ministério da Economia e das Finanças, em particular o diretor‑geral dos Impostos desse ministério, bem como o diretor‑geral da direção de onde emanam as decisões impugnadas perante si. A existência dessas ligações opõe‑se a que seja reconhecida ao TEAC a qualidade de terceiro em relação a essa Administração (v., por analogia, Acórdão de 30 de maio de 2002, Schmid, C‑516/99, EU:C:2002:313, n.os 38 a 40).

77

Por conseguinte, o TEAC não cumpre a exigência de independência própria de um órgão jurisdicional, considerada na sua vertente interna.

78

Importa acrescentar, por um lado, que o facto de os TEA não constituírem «órgãos jurisdicionais», na aceção do artigo 267.o TFUE, não os dispensa da obrigação de garantir a aplicação do direito da União aquando da adoção das suas decisões e de não aplicar, se necessário, as disposições nacionais que se revelem contrárias a disposições do direito da União dotadas de um efeito direto, uma vez que tais obrigações vinculam, efetivamente, todas as autoridades nacionais competentes e não apenas as autoridades jurisdicionais (v., neste sentido, Acórdãos de 22 de junho de 1989, Costanzo, 103/88, EU:C:1989:256, n.os 30 a 33; de 14 de outubro de 2010, Fuß, C‑243/09, EU:C:2010:609, n.os 61 e 63; e de 4 de dezembro de 2018, Minister for Justice and Equality e Commissioner of An Garda Síochána, C‑378/17, EU:C:2018:979, n.os 36 e 38).

79

Por outro lado, o facto de existirem vias de recurso jurisdicionais perante a Audiencia Nacional (Audiência Nacional, Espanha) e perante o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) contra as decisões dos TEA tomadas na sequência do procedimento económico‑administrativo de reclamação permite garantir a efetividade do mecanismo de reenvio prejudicial previsto no artigo 267.o TFUE e a unidade de interpretação do direito da União, uma vez que tais órgãos jurisdicionais nacionais dispõem da faculdade ou, se for caso disso, são obrigados a submeter um pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça se for necessária uma decisão sobre a interpretação ou validade do direito da União (v., por analogia, Acórdão de 31 de janeiro de 2013, Belov, C‑394/11, EU:C:2013:48, n.o 52).

80

Tendo em conta as considerações precedentes, há que declarar que o pedido de decisão prejudicial apresentado pelo TEAC é inadmissível, uma vez que este organismo não pode ser qualificado de «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267.o TFUE.

Quanto às despesas

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Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o organismo de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

 

O pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Económico‑Administrativo Central (Tribunal Económico e Administrativo Central, Espanha), por Decisão de 2 de abril de 2014, é inadmissível.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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