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Document 52014DC0554
REPORT FROM THE COMMISSION TO THE EUROPEAN PARLIAMENT AND THE COUNCIL on the implementation of Council Framework Decision 2008/919/JHA of 28 November 2008 amending Framework Decision 2002/475/JHA on combating terrorism
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre a aplicação da Decisão-Quadro 2008/919/JAI do Conselho, de 28 de novembro de 2008, que altera a Decisão-Quadro 2002/475/JAI relativa à luta contra o terrorismo
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre a aplicação da Decisão-Quadro 2008/919/JAI do Conselho, de 28 de novembro de 2008, que altera a Decisão-Quadro 2002/475/JAI relativa à luta contra o terrorismo
/* COM/2014/0554 final */
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre a aplicação da Decisão-Quadro 2008/919/JAI do Conselho, de 28 de novembro de 2008, que altera a Decisão-Quadro 2002/475/JAI relativa à luta contra o terrorismo /* COM/2014/0554 final */
ÍNDICE 1............ Introdução. 3 1.1......... Contexto. 3 1.2......... Elementos principais e finalidade
da Decisão-Quadro de 2008. 3 1.3......... Âmbito do relatório de
aplicação. 4 2............ Transposição pelos
Estados-Membros. 5 2.1......... Criminalização das novas
infrações de incitamento público, recrutamento e treino para o terrorismo 5 2.1.1...... Incitamento público. 5 2.1.2...... Recrutamento para o
terrorismo. 6 2.1.3...... Treino para o terrorismo. 8 2.2......... Infrações acessórias. 9 2.2.1...... Cumplicidade. 9 2.2.2...... Tentativa. 9 2.3......... Penas aplicáveis às
pessoas singulares. 10 3............ Observações finais. 10 RELATÓRIO
DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre a
aplicação da Decisão-Quadro 2008/919/JAI do Conselho, de 28 de novembro de
2008, que altera a Decisão-Quadro 2002/475/JAI relativa à luta contra o
terrorismo
1.
Introdução
1.1.
Contexto
A
Decisão-Quadro 2002/475/JAI relativa à luta contra o terrorismo (DQ 2002[1])
serviu de base para a aproximação das disposições de direito penal relativas a
infrações terroristas.
Em resposta à evolução das ameaças de radicalização, recrutamento e terrorismo,
a Decisão‑Quadro 2008/919/JAI (DQ 2008[2])
veio introduzir novos tipos de infrações: incitamento público, recrutamento e
treino para o terrorismo. Estes tipos de infrações já haviam sido introduzidos
na Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção do Terrorismo, de 2005.
Além disso, as Nações Unidas exortaram os Estados a explorarem vias e meios
para combater o incitamento à prática de atos terroristas, bem como as
manifestações de terrorismo na internet[3].
Os Estados-Membros
deveriam ter adotado e notificado as medidas de execução até 9 de dezembro de
2010. A Comissão devia elaborar um relatório com base nessas informações.
O Conselho deveria depois ter verificado, até 9 de dezembro de 2011, se os
Estados-Membros tomaram as medidas necessárias para dar cumprimento à DQ 2008[4].
A partir de 1 de dezembro de 2014, a Comissão terá competência para verificar o
cumprimento por parte dos Estados-Membros e para iniciar procedimentos de
infração, se necessário.
1.2.
Elementos principais e finalidade da Decisão-Quadro
de 2008
A DQ 2008
estabeleceu três novas infrações ligadas ao terrorismo, a saber, o «incitamento
público à prática de infrações terroristas», o «recrutamento para o terrorismo»
e o «treino para o terrorismo»[5].
Os Estados-Membros devem passar a criminalizar a cumplicidade na prática das
novas infrações[6].
A criminalização da tentativa de recrutamento e de treino para o terrorismo é
facultativa[7].
A DQ 2008 visa reduzir
a difusão de mensagens e material que possam incitar as pessoas a cometer
atentados terroristas[8]
e adaptar a legislação em vigor à evolução do modus operandi de
ativistas e apoiantes do terrorismo. Este inclui, nomeadamente, a substituição
de grupos estruturados e hierarquizados por células semiautónomas ou agentes
isolados e a utilização crescente da internet para inspirar e mobilizar,
instruir e formar redes terroristas locais e indivíduos isolados[9].
As disposições em vigor destinadas a dar cumprimento à DQ 2002 foram
consideradas insuficientes, visto que não eram necessariamente criminalizadas
certas condutas como, por exemplo, a difusão de mensagens de incitamento
público que efetivamente não incitam determinada pessoa a cometer uma infração
terrorista, a difusão de mensagens que incentivam as pessoas a tornarem-se
terroristas sem referência a uma infração terrorista concreta, ou a divulgação
de técnicas terroristas na internet que não se destinam a apoiar as atividades
de um grupo terrorista específico. A DQ 2008 foi concebida para colmatar esta
lacuna, promover o cumprimento e melhorar a cooperação policial e judiciária. O
artigo 2.º da DQ 2008 esclarece que não tem por efeito impor aos
Estados-Membros a obrigação de tomarem medidas contrárias aos princípios
fundamentais relativos à liberdade de expressão. O artigo 3.º, n.º 1,
recorda aos Estados-Membros a necessidade de assegurar que a criminalização
seja proporcionada aos objetivos legítimos visados e necessários numa sociedade
democrática, excluindo todas as formas de arbitrariedade e discriminação.
Estas disposições refletem as garantias previstas no artigo 12.º da
Convenção do Conselho da Europa. Além disso, as novas infrações não incluem de
forma alguma a divulgação de material com objetivos científicos, académicos ou
jornalísticos ou a manifestação de posições polémicas ou controversas em
debates públicos acerca de questões políticas delicadas, que são garantidos pelo
direito à liberdade de expressão.
1.3.
Âmbito do relatório de aplicação
A descrição e a análise
apresentadas no presente relatório baseiam-se sobretudo nas informações
fornecidas pelos Estados-Membros, complementadas por informações publicamente
disponíveis e resultados de um estudo externo. O relatório incide
sobre as medidas tomadas pelos Estados-Membros até agora para introduzir as
novas infrações, incluindo as infrações acessórias e respetivas penas[10].
Avalia se os Estados-Membros aplicaram a DQ 2008 dentro do prazo fixado, se
observaram os requisitos de clareza e certeza jurídica e se alcançaram os
objetivos da DQ 2008. O âmbito e o potencial de êxito das ações penais
relativas a estas infrações também dependem da aplicação correta das
disposições da DQ 2002 que não foram alteradas. Embora o presente relatório não
(re)avalie o cumprimento destas disposições[11],
chama a atenção para as conclusões de relatórios de aplicação anteriores e para
as deficiência ou lacunas neles identificadas[12]. Se
não forem colmatadas, essas lacunas ou deficiências afetarão o âmbito das novas
infrações de incitamento público, recrutamento e treino para o terrorismo.
2.
Transposição pelos Estados-Membros
2.1.
Criminalização das novas infrações de incitamento
público, recrutamento e treino para o terrorismo
A maioria dos
Estados-Membros criminalizou o incitamento público, o recrutamento e o treino
para o terrorismo, embora, em alguns casos, o âmbito de aplicação dessas
disposições seja mais limitado do que o previsto na DQ 2008. A maioria dos Estados-Membros
teve de adotar disposições específicas, uma vez que o ato preparatório ou não
consumado não havia sido explicitamente criminalizado e não cabia no âmbito de
aplicação das disposições gerais relativas à participação e tentativa. Na
sequência da adoção da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção do
Terrorismo de 2005, vários Estados-Membros haviam já adotado medidas para
criminalizar as três novas infrações (DK, EE, IT, LV, MT, FI e UK)[13].
Apenas um pequeno número de Estados-Membros alegou que as disposições gerais
vigentes cobririam os comportamentos em questão. Na sua maioria,
os Estados-Membros transpuseram a DQ 2008 mediante a alteração ou introdução de
disposições nos respetivos códigos penais, enquanto um número mais restrito
adotou ou alterou legislação especial de combate ao terrorismo (IE, CY, PT,
RO, SE, UK) ou recorreu a diplomas já em vigor, como a lei da imprensa de
1881 (FR)[14]. Dos
Estados-Membros que deviam adotar novas medidas, só poucos o fizeram dentro do
prazo fixado (DE, ES, CY, NL, SI, SK, SE). Os outros Estados-Membros
transpuseram a DQ 2008 apenas em 2011 (BG, CZ, AT, PL, PT), 2012 (FR,
LU, RO) ou 2013 (BE, HR, LT, HU). Dois Estados-Membros ainda não
adotaram a legislação de transposição necessária (IE, EL)[15].
2.1.1.
Incitamento público
O
artigo 3.º, n.º 1, alínea a), da DQ 2002, última redação, define o incitamento
público à prática de infrações terroristas como a «(...) distribuição, ou a
difusão por qualquer outro modo, de uma mensagem ao público destinada a incitar
à prática de qualquer das infrações enumeradas nas alíneas a) a h) do n.º 1 do
artigo 1.º, sempre que tal conduta, ainda que não promova diretamente a prática
de infrações terroristas, provoque o perigo de uma ou mais dessas infrações
poderem ser cometidas». Menos de metade dos
Estados-Membros adotaram disposições específicas que criminalizam
explicitamente a difusão de mensagens de incitamento público à prática de
infrações terroristas, numa redação próxima da DQ 2008 (BE, DE, IE,
ES, HR, CY, LU, RO, SI, FI, UK).
Os restantes Estados-Membros optaram por ter por base disposições que
criminalizam em termos mais gerais a «provocação» (BG, DK, MT, PL, PT, SK,
SE), o «incitamento» (EE, FR, IT, LV, LT, HU) ou a facilitação ou
apoio de infrações terroristas (CZ, NL, AT, PL). Ter por base
disposições que dizem respeito, em termos mais gerais, ao incitamento público
ou à provocação, em vez de ter por base a mera intenção de incitamento à
prática de infrações terroristas, como exige a DQ 2008, pode implicar que só o
«incitamento direto» seja criminalizado[16],
e não o «incitamento indireto», que pode ser causa de um mero perigo de que uma
ou mais dessas infrações possam ser cometidas (BG, EE, FR em que a
disposição se limita explicitamente ao incitamento direto, IT, LT, HU, MT).
O «incitamento indireto» pode ainda ser abrangido pelas disposições nacionais
que abrangem o comportamento preparatório ou facilitador (como parece ser o
caso de CZ, EE, NL, AT, PL, PT), o comportamento que
provoca apenas o perigo de prática de uma infração terrorista (como parece ser
o caso de LV, AT, SK) independentemente da prática da
infração ou da sua tentativa (CZ, SE) ou são aplicadas pelos
tribunais nacionais a comportamentos que podem ser qualificados como
incitamento indireto (como parece ser o caso de DK). Alguns Estados-Membros
clarificam explicitamente que o incitamento público é punível independentemente
de alguém ter sido efetivamente incentivado (por exemplo, UK) ou de a
infração terrorista ter sido efetivamente cometida (por exemplo, IE, CY,
LU) e também nos casos em que o comportamento incentiva as infrações
terroristas em geral (UK). Alguns Estados-Membros
criminalizam não só o incitamento à prática de infrações terroristas, mas
também o incitamento à preparação e instigação dessas infrações (UK) ou
o incitamento a dar ou receber treino (RO). Alguns Estados-Membros
criminalizam não só o ato de difusão, mas também o ato de obter ou possuir
material destinado a fins de propaganda terrorista (DE, UK).
Embora a maioria dos Estados-Membros criminalize apenas o comportamento
intencional, em pelo menos um Estado-Membro (UK) o comportamento
imprudente também é criminalizado. Por último, alguns Estados-Membros
introduziram infrações mais específicas, como a difusão pública de propaganda
terrorista, para além da incitação ao terrorismo (UK), exaltação,
promoção ou aprovação públicas do terrorismo (DK, ES, LT, AT,
SI, SK) ou a humilhação e o desprezo por vítimas de terrorismo (ES,
LT). Por outro lado, em alguns casos, nem todas as infrações terroristas
previstas no artigo 1.º da DQ 2002 parecem ser contempladas (DE).
2.1.2.
Recrutamento para o terrorismo
O recrutamento para o
terrorismo é definido no artigo 3.º, n.º 1, alínea b), última
redação, como «a solicitação a outra pessoa para a prática de qualquer das
infrações enumeradas nas alíneas a) a h) do n.º 1 do artigo 1.º ou no n.º 2 do
artigo 2.º (...)». A maior parte dos
Estados-Membros adotou disposições específicas que criminalizam o ato de
solicitação a outra pessoa para a prática de infrações terroristas e a
participação em atividades de grupos terroristas. O recrutamento para a prática
de infrações terroristas (na aceção do artigo 1.º da DQ 2002) e o
recrutamento para grupos terroristas (na aceção do artigo 2.º da DQ 2002)
são previstos numa única disposição em menos de metade dos Estados-Membros (BE,
CZ, DK, ES, HU, LT, LU, HU, NL, SI, FI). Vários outros Estados‑Membros
dispõem de disposições distintas para as duas formas de recrutamento (DE,
FR, AT, UK). Em alguns Estados-Membros, só o recrutamento para a prática de
infrações terroristas parece ser punível e não o recrutamento para participar
nas atividades de grupos terroristas, como previsto no artigo 2.º, n.º 2, da DQ
2002 (BG, EE, IE, MT, PT, RO, SK, SE, sendo
duvidoso em CY e LV se a referência a atos terroristas abrange
também a participação em grupos terroristas). Dos Estados-Membros que
introduziram novas disposições específicas para abranger as novas infrações,
poucos utilizaram o termo «solicitar» na definição de recrutamento (HR, LU,
SK «requerer», MT: «solicitar» ou «recrutar»). A maioria dos
Estados-Membros parece ter optado pelo termo «recrutar» (BE, BG, DE, EE, IE,
IT, ES, LV, LT, MT: «solicitar» ou «recrutar», PT,
RO, SI: «conscrição», FI) ou outros termos como «procurar
aliciar» (SE), «incitar» e «provocar» (NL), «instigação» (HU)
ou «encorajamento» (CY). Alguns Estados‑Membros alegam que o termo
«recrutamento» exigiria algum tipo de plano intencional ou um quadro
institucional mínimo a que a pessoa recrutada adere (PT).
Esta situação pode suscitar dúvidas quanto à questão de saber se o incentivo de
um «lobo solitário» para a prática de atos terroristas se encontra efetivamente
criminalizado pelas disposições nacionais. Embora a maioria dos
Estados-Membros se refira ao recrutamento (ou sinónimos) em termos gerais,
alguns especificam com mais pormenor o comportamento punível (em FR a
definição inclui a oferta de presentes ou outros benefícios para ameaçar ou
pressionar alguém a perpetrar uma infração terrorista). Esta pormenorização pode
limitar indevidamente o âmbito de aplicação da disposição, dado que poderá
excluir outras formas de encorajamento. Poucos Estados-Membros
indicam explicitamente que o recrutamento é punível mesmo que a pessoa não
aceite cometer a infração terrorista (CY, LU). Alguns Estados-Membros
invocam disposições vigentes gerais que abrangem diversas formas de
participação em infrações terroristas (por exemplo, CZ, AT), a
facilitação da prática de infrações terroristas (por exemplo, PL), o
apoio a grupos terroristas (por exemplo, CZ, DE, AT), o
incitamento à prática de infrações terroristas ou a pertencer a um grupo
proscrito (por exemplo, UK), a tentativa de participação, a conspiração
(DE, FR: «association de malfaiteurs») ou outras atividades
preparatórias (por exemplo, HU, UK). Um risco potencial é que as
disposições relativas ao apoio de organizações terroristas ou a participação em
conspirações não abranjam o recrutamento de «lobos solitários» (por exemplo, CZ,
DE, FR, UK). Isto pode constituir um problema, se nenhuma outra disposição
criminalizar este comportamento. O recurso a disposições gerais pode igualmente
suscitar dúvidas quanto à efetiva criminalização das infrações não consumadas,
o que dependerá da interpretação e aplicação de conceitos como a facilitação ou
os atos preparatórios de infrações terroristas. Embora em alguns casos
o recrutamento não pareça abranger todas as infrações enumeradas no artigo 1.º,
n.º 1, alínea a), da DQ 2002 (IT), outros Estados-Membros criminalizam
não só o recrutamento para a prática de infrações terroristas mas também o
recrutamento para facilitar (DK), preparar (FI) ou participar (LT,
SI, SK) em infrações terroristas. Em alguns Estados-Membros, a
definição de recrutamento estende-se ao financiamento do terrorismo (DK).
Em certos Estados-Membros, qualquer pessoa que esteja ciente de que a sua
atividade promove infrações terroristas pode ser punida (FI). Por
último, alguns países também criminalizam o facto de alguém se deixar recrutar
(por exemplo, DK).
2.1.3.
Treino para o terrorismo
O
«treino para o terrorismo» é definido no artigo 3.º, n.º 1, alínea c), como «a
instrução dada sobre o fabrico ou a utilização de explosivos, armas de fogo ou
outras armas e substâncias nocivas ou perigosas, ou sobre outros métodos e
técnicas específicos, para efeitos da prática de qualquer das infrações
enumeradas nas alíneas a) a h) do n.º 1 do artigo 1.º, sabendo que os
conhecimentos ministrados se destinam a ser utilizados para essa
finalidade».
A maioria dos
Estados-Membros adotou disposições que criminalizam explicitamente a instrução
em matéria de métodos e técnicas para efeitos da prática de infrações
terroristas, com uma redação muito próxima da DQ 2008 (BE, DE, IE,
HR, IT, CY, LU, MT, AT, PT, RO, SI,
SK, FI, SE, UK). Alguns
Estados-Membros optaram por expressões mais gerais como «treino para perpetrar
infrações terroristas» (BG, DK, EE, ES, LV) ou
«transmissão de informações, conhecimentos e técnicas para perpetrar infrações
terroristas» (LT, NL), sem referir as instruções específicas previstas
no artigo 3.º da DQ 2008 (ainda que, em alguns casos, existam clarificações
adicionais em notas explicativas da lei, como na DK). Se os
Estados-Membros dispuserem apenas de disposições gerais sobre participação,
preparação, facilitação ou apoio de infrações terroristas (CZ, HU, PL),
não é claro se o direito nacional criminaliza o treino nos casos em que não
tenha sido perpetrada nem tentada nenhuma infração terrorista. A criminalização
dependerá, em última análise, da interpretação e aplicação destes conceitos no
direito nacional. Além disso, não é claro se o conceito de conspiração (como a «association
de malfaiteurs» em FR) abrange a mera divulgação de material de
treino, sem ligações comprovadas a grupos terroristas. A maioria dos
Estados-Membros criminaliza tanto a instrução como o treino (por exemplo, BE,
DK também refere «ensinar», IE, IT, MT, AT, PT,
RO, UK), ao passo que outros preveem apenas o treino (BG, EE,
ES, LV, FI) ou qualquer forma de instrução (DE, HR e CY: «dar
orientações», LU, NL: «transmitir informações» e «ensinar», SI, SK:
«transmitir técnicas», SE). O termo «treino» pode ser interpretado no
sentido de implicar a existência de uma relação de qualquer tipo entre um
formador e um formando, mas o termo «instrução» abrange também a difusão de
material de autoformação (por exemplo, IT, AT). Algumas
disposições nacionais incluem esclarecimentos adicionais, por exemplo que o
treino é punível se for dado a uma ou mais pessoas (BG, UK) ou em
geral (UK), ou que as técnicas podem ser utilizadas para atos de
terrorismo já especificados ou infrações terroristas em geral (UK), ou
que o treino é punível mesmo que o formando não chegue a cometer nem a
participar num atentado terrorista (DK, LU). O dolo é, em
regra, necessário para que os atos constituam infrações, mas em alguns Estados‑Membros
são suficientes a consciência de que o treino dado incentiva as pessoas a
cometer infrações terroristas (FI) ou a negligência (UK,
relativamente à participação em campos de treino). Noutros casos, parece haver
uma presunção de dolo, cabendo ao arguido o ónus de provar que o treino ou as
instruções eram dados ou recebidos de forma lícita
(IE, UK). Embora, em
alguns Estados-Membros, as infrações terroristas para as quais foi dado treino
não incluam todas as infrações enumeradas no artigo 1.º, n.º 1, da DQ 2002 (por
exemplo, DE, IT), noutros Estados-Membros há requisitos
adicionais, nomeadamente que o treino é criminalizado também se for relativo ao
financiamento do terrorismo (DK) ou quando as técnicas serão utilizadas
por uma organização terrorista (CY). Em alguns Estados-Membros, o treino
é punível não só se for dado com a intenção de praticar uma infração terrorista
mas também com a intenção de participar nesses atos (SI) ou de cometer
crimes com o objetivo de preparar ou facilitar um crime terrorista (FI, NL,
UK) ou apoiar a prática ou preparação, por outros, de atos terroristas (UK).
Além disso, vários Estados-Membros criminalizam o ato de receber treino ou
instrução, também referido como «treino passivo» (BE, DK, DE,
IE, NL, AT, RO, UK). Alguns Estados-Membros
adotaram disposições específicas suplementares que criminalizam a participação
em campos de treino (por exemplo, UK).
2.2.
Infrações acessórias
2.2.1.
Cumplicidade
O
artigo 4.º, n.º 1, da DQ 2002, última redação, impõe que os
Estados-Membros tomem as medidas necessárias para que a cumplicidade na prática
das novas infrações definidas no artigo 3.º seja punível. Quase todos os
Estados-Membros criminalizaram a cumplicidade na prática das novas infrações.
Na maior parte dos Estados-Membros, as disposições gerais em matéria de
cumplicidade são imediatamente aplicáveis às novas infrações. Apenas CY
declarou explicitamente nas disposições aplicáveis que a cumplicidade na
prática das novas infrações não constitui um crime.
2.2.2.
Tentativa
O
artigo 4.º, n.º 4, da DQ 2002, última redação, confere aos
Estados-Membros a possibilidade de criminalizar a tentativa de treino ou de
recrutamento para o terrorismo. Na maioria dos Estados-Membros, as regras
gerais em matéria de tentativa aplicam-se a todas as infrações, sem qualquer
distinção nem qualificação, pelo que essas regras também se aplicam às novas
infrações terroristas. Em consequência, a maioria dos Estados-Membros
criminalizou a tentativa de recrutar e treinar pessoas para efeitos terroristas
e a tentativa de incitamento público (BE, BG, CZ, EE,
ES, HU, LV, LT, MT, NL, AT, PL). Em alguns Estados‑Membros,
porém, a jurisprudência parece inclinar-se para considerar que as disposições
gerais sobre a tentativa não se aplicam a infrações não consumadas (por ex., IT). Em determinados
Estados-Membros, a tentativa só é punível no caso de crimes graves, com uma
moldura penal mínima, e não no caso de infrações menos graves. Embora em certos
Estados-Membros as três novas infrações sejam classificadas como crimes (DK,
HR, PT), noutros não o são. Sendo assim, a tentativa não é
penalmente punível (DE; pouco provável
na SI). Noutros
Estados-Membros, a tentativa é punível se isso for especificamente previsto.
Alguns Estados-Membros criminalizaram explicitamente a tentativa de cometer
qualquer uma das três infrações (IE, SE, UK). Alguns
criminalizaram apenas a tentativa de treinar e recrutar uma pessoa para efeitos
terroristas (LU, SK, FI) e outros não criminalizam a tentativa (CY:
exclui explicitamente a punibilidade da tentativa de prática das três novas
infrações, RO).
2.3.
Penas aplicáveis às pessoas singulares
O nível das
penas varia significativamente consoante os Estados-Membros[17].
A pena mínima de prisão varia entre menos de um ano e 20 anos. De igual modo,
a pena máxima varia entre
2 e 25 anos ou prisão perpétua. As sanções pecuniárias podem ser uma pena
alternativa (DK, DE, IE, LU, NL, UK) ou uma pena adicional à prisão (BE,
IE, FR, LU, UK). Mais de metade
dos Estados-Membros preveem a mesma pena para as três novas infrações (BE,
BG, CZ, EE, IE, HR, LU, HU, MT, PL, SI, SK, SE). Nos Estados-Membros com
penas diferentes para as três novas infrações, as penas por incitamento público
são, em geral, mais leves do que para as outras duas infrações (DK, DE, ES,
IT, CY, LV, LT, PT, RO, FI, UK). Sempre que os
Estados-Membros criminalizam o facto de ser recrutado ou de receber treino ou
instruções, bem como o facto de recrutar e de dar treino ou instruções, na
maior parte dos casos é aplicada a mesma moldura penal (DK, DE, IE, NL, AT).
Noutros casos, a participação no treino é criminalizada com uma pena mais leve
do que a do ato de treinar (RO). De igual modo, se os Estados-Membros
criminalizam não apenas a difusão mas também o ato de obtenção ou posse de
propaganda terrorista, aplica-se a mesma pena a ambas as infrações (DE, UK).
Quando é feita uma distinção entre o incitamento e a apologia/exortação do
terrorismo, alguns Estados-Membros preveem penas mais leves para a apologia do
terrorismo (DK, ES), ao passo que outros Estados-Membros aplicam a mesma
pena (DK, AT, SI, SK, UK). Quando os Estados-Membros criminalizam o
treino e a instrução, na maior parte dos casos é aplicada a mesma pena a ambos.
Noutros Estados‑Membros, no entanto, a pena para a instrução é mais leve
do que a pena para o treino (AT). Vários Estados-Membros aplicam penas
diferentes consoante o recrutamento tenha sido feito em nome de um grupo
terrorista, caso em que podem ser aplicadas penas mais pesadas (DK, HU, AT).
3.
Observações finais
A maior parte
dos Estados-Membros adotou medidas destinadas a criminalizar o incitamento
público, o recrutamento e o treino para o terrorismo, nos termos da DQ 2008. A
Comissão assinala que dois Estados-Membros (IE e EL) ainda não
transpuseram a DQ 2008 e exorta-os a adotarem as medidas legislativas
necessárias sem demora. Embora a maior parte dos Estados-Membros cumpram
amplamente o disposto na DQ 2008, há uma série de problemas potenciais, em
especial no que diz respeito à criminalização ao abrigo das disposições
nacionais de «incitamento indireto» e recrutamento de «lobos solitários». Os
Estados‑Membros são convidados a fornecer à Comissão explicações e
informações complementares para que esta possa completar a sua avaliação. Os debates sobre
o impacto da legislação de luta contra o terrorismo nos direitos fundamentais
teve lugar principalmente em relação à adoção das medidas de execução da DQ
2002 e, em menor medida, em relação às novas infrações[18].
Embora as preocupações relacionadas com os direitos fundamentais possam ter um
papel na interpretação e aplicação das disposições nacionais que introduzem as
três novas infrações, não parecem tornar necessário limitar o âmbito de
aplicação das disposições aplicáveis nos termos do direito nacional[19].
A Comissão salienta
que as partes interessadas defendem o aumento dos intercâmbios de experiências
e práticas entre juízes e procuradores, bem como a necessidade de integrar os
esforços repressivos numa abordagem mais global que inclua a prevenção da
radicalização e o recrutamento para o terrorismo. A Comissão
incentiva os Estados-Membros a acompanharem e avaliarem a aplicação prática das
disposições de direito penal em matéria de terrorismo, tendo em consideração a
proteção dos direitos fundamentais e uma abordagem política mais alargada de
luta contra a radicalização e o recrutamento para o terrorismo. A Comissão
continuará a acompanhar a eficácia e o impacto da Decisão-Quadro relativa à
luta contra o terrorismo. [1] JO L 164 de 22.6.2002, p. 3-7. [2] JO L 330 de 9.12.2008, p. 21-23. [3] Cf. Resolução 1624 (2005) do Conselho de Segurança das
Nações Unidas, bem como a Estratégia Antiterrorista Mundial das Nações Unidas,
adotada em 2006. [4] Cf. artigo 3.º, n.os 1 e 2, da DQ
2008. [5] Cf. artigo 1.º, n.º 1, da DQ 2008, que altera o
artigo 3.º. As infrações relacionadas com atividades terroristas, definidas no
artigo 3.º da DQ 2002, incluíam apenas o roubo agravado, a extorsão e a
emissão de documentos administrativos falsos com vista à prática de infrações
terroristas. As novas infrações foram acrescentadas nas alíneas a) a c) do n.º
1 do artigo 3.º e as infrações anteriores figuram agora nas alíneas d) a f)
desse mesmo número. [6] Cf. artigo 1.º, n.º 2, da DQ 2008, que altera o
artigo 4.º da DQ 2002 (introduzindo um n.º 1). [7] Cf. artigo 1.º, n.º 2, da DQ 2008, que altera o
artigo 4.º da DQ 2002 da DQ 2002 (aditando um n.º 4). [8] Cf. considerando 7 da DQ 2008. [9] Cf. em especial os considerandos 4 e 5 da DQ 2008. Cf.
também o mais recente relatório da Europol, de 2014, sobre a situação e as
tendências do terrorismo na UE, que salienta nomeadamente a utilização da
internet e das redes sociais como instrumentos de planeamento, financiamento,
recrutamento, comunicação, instrução, treino e propaganda que se pensa que terá
contribuído para a aceleração da (auto)radicalização entre os cidadãos da UE. [10] Cf. também considerando 11 da DQ 2008. [11] Na maioria dos casos, os Estados-Membros só forneceram
informações necessárias para avaliar a conformidade com a alteração dos
artigos 3.º e 4.º da decisão-quadro. [12] Cf. primeiro relatório de aplicação, de 8 de junho de 2004
[COM(2004) 409 final e SEC(2004) 688] e segundo relatório de aplicação, de 6 de
novembro de 2007 [COM(2007) 681 final e SEC(2007) 1463]. Resulta destes
relatórios de aplicação que existem deficiências no que respeita à aplicação
das disposições que preveem as principais infrações terroristas (cf.
artigo 1.º da DQ 2002), a responsabilidade das pessoas coletivas (cf.
artigos 7.º e 8.º da DQ 2002) e as regras de competência
(cf. artigos 9.º e 10.º da DQ 2002). [13] Todos os Estados-Membros (exceto CZ) assinaram a
Convenção. Alguns Estados-Membros ainda não a ratificaram (BE, CZ, IE, EL,
IT, LT, MT, PT, UK). [14] Para uma panorâmica pormenorizada das medidas legislativas
adotadas pelos Estados-Membros, ver o quadro 1 do documento de trabalho
dos serviços da Comissão [SWD(2014) xxx]. [15] O Governo irlandês enviou uma alteração da lei da justiça
penal [Criminal Justice (Terrorist Offences) Bill] de 2012 e informou a
Comissão da sua próxima apresentação ao Parlamento. A descrição referida no
presente relatório baseia-se nessa lei. O Governo grego informou a Comissão de
que está a preparar uma lei de ratificação da Convenção do Conselho da Europa
para a Prevenção do Terrorismo e um Protocolo que altera a Convenção Europeia
para a Eliminação do Terrorismo e legislação conexa, mas ainda não a enviou. [16] O «incitamento direto» refere-se a casos em que o
incitamento teve como resultado a prática, ou a tentativa de prática, de uma
infração terrorista e em que o incitamento se relacionava com uma infração
terrorista específica. [17] Para uma panorâmica pormenorizada das penas aplicáveis,
cf. quadro 2 do documento de trabalho dos serviços da Comissão. [18] Os debates incidiram, nomeadamente, sobre os problemas de
segurança jurídica, o respeito pelo princípio da proporcionalidade das penas
das infrações de caráter preparatório e o potencial conflito entre liberdade de
expressão e incitamento público. [19] Nas suas notificações à Comissão, os Estados-Membros não
invocaram os artigos 2.º ou 3.º da DQ 2008 para limitar o âmbito de
aplicação das novas infrações terroristas nem preocupações relacionadas com os
direitos fundamentais como motivo para não aplicar as novas infrações.