COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 20.5.2020
COM(2020) 380 final
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030
Trazer a natureza de volta às nossas vidas
1.Biodiversidade — necessidade de ação urgente
Das grandes florestas húmidas do mundo aos pequenos parques e jardins, da baleia-azul aos fungos microscópicos, a biodiversidade é a extraordinária variedade de vida na Terra. Nós, seres humanos, somos parte integrante desta teia vital e totalmente dependentes dela: dá-nos os alimentos que comemos, filtra a água que bebemos e fornece o ar que respiramos. A natureza é tão importante para o nosso bem-estar mental e físico como para tornar a nossa sociedade capaz de fazer face às alterações globais, às ameaças sanitárias e às catástrofes. Precisamos de natureza nas nossas vidas.
As sociedades saudáveis e resilientes só podem existir se for concedido à natureza o espaço de que ela necessita. A recente pandemia de COVID-19 torna ainda mais urgente a necessidade de proteger e restaurar a natureza. A pandemia está a aumentar a sensibilização para a ligação entre a nossa própria saúde e a saúde dos ecossistemas. Está a demonstrar a necessidade de cadeias de abastecimento e padrões de consumo sustentáveis, que não excedam os limites do planeta, refletindo o facto de o risco de aparecimento e propagação de doenças infecciosas aumentar à medida que a natureza é destruída
. Por isso, a proteção e a restauração da biodiversidade e o bom funcionamento dos ecossistemas são fundamentais para reforçar a nossa resiliência e prevenir o aparecimento e a propagação de futuras doenças.
Investir na proteção e restauração da natureza também será decisivo para a recuperação económica europeia da crise da COVID-19. Ao relançar a economia, é crucial evitar que se volte a cair em velhos hábitos prejudiciais e se fique preso a eles. O Pacto Ecológico Europeu, a estratégia de crescimento da UE, traçará o rumo da nossa recuperação, assegurando que a economia serve as pessoas e a sociedade e devolve à natureza mais do que dela retira. O interesse económico da biodiversidade é inegável. A indústria e as empresas recorrem a genes, espécies e serviços ecossistémicos como fatores de produção essenciais para a produção, nomeadamente de medicamentos. Mais de metade do PIB mundial depende da natureza e dos serviços por ela prestados, estando muito dependentes dela três dos maiores setores económicos: a construção, a agricultura e a produção de alimentos e bebidas
.
A conservação da biodiversidade tem potenciais benefícios económicos diretos para muitos setores da economia. Por exemplo, a conservação das unidades populacionais marinhas poderia aumentar os lucros anuais da indústria dos produtos do mar em mais de 49 mil milhões de EUR, ao passo que a proteção das zonas húmidas costeiras poderia poupar à indústria dos seguros cerca de 50 mil milhões de EUR por ano, pela redução das perdas relativas a danos causados por inundações
. Estima-se que a relação custo‑benefício global de um programa mundial eficaz para a conservação da natureza selvagem remanescente em todo o mundo seja de, pelo menos, 1 para 100
. O investimento em capital natural, nomeadamente na restauração de habitats ricos em carbono e numa agricultura compatível com o clima, é reconhecido como uma das cinco mais importantes políticas de recuperação orçamental, que proporciona multiplicadores económicos elevados e um impacto positivo no clima
. Será importante que a UE tire partido deste potencial para garantir a prosperidade, a sustentabilidade e a resiliência na recuperação.
A biodiversidade é também crucial para salvaguardar a segurança alimentar da UE e a nível mundial. A perda de biodiversidade ameaça os nossos sistemas alimentares
, colocando em risco a segurança alimentar e a nutrição. A biodiversidade também está na base de regimes alimentares saudáveis e nutritivos e melhora os meios de subsistência rurais e a produtividade agrícola
. Por exemplo, mais de 75 % dos tipos de culturas alimentares mundiais dependem da polinização animal
.
Apesar deste imperativo moral, económico e ambiental, a natureza encontra-se numa situação de crise. As cinco principais causas diretas da perda de biodiversidade
— alterações na utilização das terras e do mar, sobre-exploração, alterações climáticas, poluição e espécies exóticas invasoras — estão a provocar o rápido desaparecimento da natureza. Vemos as mudanças na nossa vida quotidiana: quarteirões de betão a surgir em espaços verdes, a natureza selvagem a desaparecer à frente dos nossos olhos e mais espécies em risco de extinção do que em qualquer outro momento da história da humanidade. Nas últimas quatro décadas, as populações mundiais de espécies selvagens diminuíram 60 % em resultado das atividades humanas
. Quase três quartos da superfície da Terra foram alterados
, reduzindo a natureza a espaços cada vez mais pequenos do planeta.
A crise da biodiversidade e a crise climática estão intrinsecamente ligadas. Ao mesmo tempo que as alterações climáticas aceleram a destruição do mundo natural através de secas, inundações e incêndios florestais, a perda de natureza e a sua utilização insustentável são, por sua vez, os principais fatores de alterações climáticas. Mas, tal como as crises, também as soluções estão ligadas. A natureza é um aliado vital na luta contra as alterações climáticas
. A natureza regula o clima. As soluções baseadas na natureza
— como a proteção e a restauração de zonas húmidas, turfeiras e ecossistemas costeiros e a gestão sustentável de zonas marinhas, florestas, prados e solos agrícolas — serão cruciais para a redução das emissões e a adaptação às alterações climáticas. A plantação de árvores e a implantação de infraestruturas verdes ajudar-nos-ão a arrefecer as zonas urbanas e a atenuar o impacto das catástrofes naturais.
A perda de biodiversidade e o colapso dos ecossistemas estão entre as maiores ameaças que a humanidade enfrenta na próxima década
. Ameaçam igualmente os alicerces da nossa economia e os custos da inação são elevados e deverão aumentar
. Estima-se que, entre 1997 e 2011, o mundo tenha perdido 3,5 a 18,5 biliões de EUR por ano em serviços ecossistémicos devido a alterações da cobertura do solo e 5,5 a 10,5 biliões de EUR por ano em resultado da degradação dos solos. Em concreto, a perda de biodiversidade resulta na redução do rendimento das culturas e das capturas de peixe, em maiores perdas económicas decorrentes de inundações e outras catástrofes e na perda de novas fontes potenciais de medicamentos
.
A UE está preparada para mostrar ambição para reverter a perda de biodiversidade, liderar o mundo através de exemplos e ações, bem como contribuir para alcançar um acordo conducente à adoção de um quadro mundial de transformação para o período pós-2020 na 15.ª sessão da Conferência das Partes na Convenção sobre a Diversidade Biológica. Tal deverá assentar na ambição geral de assegurar que, até 2050, todos os ecossistemas mundiais sejam restaurados, resilientes e adequadamente protegidos. A humanidade deve comprometer-se com o princípio dos ganhos líquidos, de modo a devolver à natureza mais do que dela retira. Neste contexto, deve empenhar-se em impedir a extinção de espécies provocada pelo ser humano, pelo menos quando evitável.
A presente estratégia define a forma como a Europa pode contribuir para essa realidade. O objetivo intermédio consiste em assegurar que a biodiversidade da Europa entra no caminho da recuperação até 2030, para benefício das pessoas, do planeta, do clima e da nossa economia, em conformidade com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e com os objetivos do Acordo de Paris sobre as Alterações Climáticas. Aborda os cinco principais fatores de perda de biodiversidade, estabelece um quadro de governação reforçado para colmatar as lacunas remanescentes, assegura a plena aplicação da legislação da UE e reúne todos os esforços em curso. Esta estratégia denota um espírito empreendedor e de incentivo à ação. Reflete o facto de que a proteção e a restauração da natureza requerem mais do que simples regulamentação. Exigirão a ação dos cidadãos, das empresas, dos parceiros sociais e da comunidade da investigação e do conhecimento, bem como parcerias sólidas entre os níveis local, regional, nacional e europeu. Esta estratégia está em consonância com as ambições e o compromisso assumidos nas orientações políticas da presidente von der Leyen e no Pacto Ecológico Europeu.
Adotada durante a pandemia de COVID-19, esta estratégia será também um elemento central do plano de recuperação da UE. Será crucial para prevenir e reforçar a resiliência a futuros surtos de zoonoses e proporcionar oportunidades imediatas de negócio e de investimento para restaurar a economia da UE.
Todas as novas iniciativas e propostas serão apoiadas pelos instrumentos para «legislar melhor» da Comissão. Com base em consultas públicas e na identificação dos impactos ambientais, sociais e económicos, as avaliações de impacto contribuirão para assegurar que todas as iniciativas atinjam os seus objetivos da forma mais eficaz e menos onerosa e estejam à altura de um juramento ecológico de «não prejudicar».
2.Proteger e restaurar a natureza na União Europeia
A UE dispõe de quadros jurídicos, estratégias e planos de ação para proteger a natureza e restaurar os habitats e as espécies. Porém, a proteção tem sido incompleta, a restauração de pequena escala e a aplicação e a fiscalização da legislação insuficientes
.
Para colocar a biodiversidade na via da recuperação até 2030, temos de intensificar a proteção e a restauração da natureza. Tal deve ser feito mediante a melhoria e o alargamento da nossa rede de áreas protegidas e o desenvolvimento de um ambicioso Plano da UE de Restauração da Natureza.
2.1.Uma rede coerente de áreas protegidas
A biodiversidade prospera mais em áreas protegidas. No entanto, a atual rede de áreas legalmente protegidas, incluindo as que beneficiam de proteção estrita, não é suficientemente ampla para salvaguardar a biodiversidade. Os dados disponíveis mostram que as metas definidas no âmbito da Convenção sobre a Diversidade Biológica são insuficientes para proteger e restaurar adequadamente a natureza
. Exige-se um esforço mundial e a própria UE precisa de fazer mais e melhor pela natureza e construir uma rede transeuropeia de natureza verdadeiramente coerente.
O alargamento das áreas protegidas é também um imperativo económico. Os estudos sobre os sistemas marinhos estimam que cada euro investido em áreas marinhas protegidas geraria um retorno de, pelo menos, 3 EUR
. Do mesmo modo, o balanço de qualidade das Diretivas Natureza
demonstrou que os benefícios da rede Natura 2000 são avaliados entre 200 e 300 mil milhões de EUR por ano. Espera-se que as necessidades de investimento da rede apoiem cerca de 500 000 postos de trabalho adicionais
.
Para o bem do nosso ambiente e da nossa economia e para apoiar a recuperação da UE da crise da COVID-19, precisamos de proteger mais a natureza. Neste espírito, pelo menos 30 % das terras e 30 % dos mares devem ser protegidos na UE. Trata-se de um aumento mínimo de 4 % em terra e de 19 % no mar, em comparação com os dias de hoje
. O objetivo está em plena consonância com o que está a ser proposto
no âmbito do quadro mundial para a biodiversidade pós-2020 (ver a secção 4).
Neste contexto, deve ser dada especial atenção às zonas de grande valor ou potencial em termos de biodiversidade. Estas são as mais vulneráveis às alterações climáticas e devem beneficiar de cuidados especiais sob a forma de proteção estrita
. Atualmente, apenas 3 % das zonas terrestres e menos de 1 % das marinhas beneficiam de proteção estrita na UE. Precisamos de fazer melhor para proteger estas zonas. Neste espírito, pelo menos um terço das áreas protegidas — representando 10 % das terras e 10 % dos mares da UE — deve ser estritamente protegido. Tal está também em conformidade com a ambição mundial proposta.
No âmbito desta ênfase na proteção estrita, será crucial definir, cartografar, monitorizar e conferir proteção estrita a todas as florestas primárias e seculares que subsistem na UE. Será igualmente importante defender o mesmo a nível mundial e assegurar que as ações da UE não resultem em desflorestação noutras regiões do mundo. As florestas primárias e seculares são os ecossistemas florestais que mais carbono removem da atmosfera, ao mesmo tempo que armazenam reservas de carbono em quantidades significativas. Tendo em conta as variações previstas nas zonas de vegetação, é igualmente conveniente proteger estritamente superfícies significativas de outros ecossistemas ricos em carbono, como as turfeiras, os prados, as zonas húmidas, os mangais e as pradarias de ervas marinhas.
Os Estados-Membros serão responsáveis pela designação das novas áreas protegidas e estritamente protegidas
. As designações devem contribuir para completar a rede Natura 2000 ou ser enquadradas em regimes de proteção nacionais. Será obrigatório definir claramente objetivos e medidas de conservação para todas as áreas protegidas. A Comissão, trabalhando em colaboração com os Estados-Membros e a Agência Europeia do Ambiente, apresentará em 2020 critérios e orientações para a identificação e a designação de novas áreas, incluindo uma definição de proteção estrita, bem como para o planeamento adequado da gestão. Ao fazê-lo, indicará o modo como outras medidas eficazes de conservação por zona e a ecologização das cidades podem contribuir para as metas.
As metas dizem respeito à UE no seu conjunto e podem ser repartidas de acordo com as regiões biogeográficas e as bacias marítimas da UE ou a um nível mais local. Cada Estado-Membro terá de realizar a sua quota-parte do esforço com base em critérios ecológicos objetivos, reconhecendo que cada país tem níveis quantitativos e qualitativos diferentes de biodiversidade. Será dada especial atenção à proteção e recuperação dos ecossistemas tropicais e subtropicais marinhos e terrestres nas regiões ultraperiféricas da UE, dado o seu valor excecionalmente elevado em termos de biodiversidade.
Além disso, a fim de dispor de uma rede transeuropeia de natureza verdadeiramente coerente e resiliente, será importante criar corredores ecológicos para prevenir o isolamento genético, permitir a migração das espécies e manter e melhorar a saúde dos ecossistemas. Neste contexto, é oportuno promover e apoiar os investimentos em infraestruturas verdes e azuis
e a cooperação transfronteiras entre os Estados-Membros, nomeadamente por meio da cooperação territorial europeia.
A Comissão procurará acordar com os Estados-Membros, até ao final de 2021, os critérios e orientações para as novas designações. Os Estados-Membros terão então de demonstrar, até ao final de 2023, progressos significativos na designação legal de novas áreas protegidas e na integração de corredores ecológicos. Nesta base, a Comissão avaliará, até 2024, se a UE está no bom caminho para cumprir as suas metas para 2030 ou se são necessárias medidas mais fortes, nomeadamente legislação da UE.
Por último, os países e territórios ultramarinos acolhem importantes pontos críticos de biodiversidade, que não são regidos pelas normas ambientais da UE. A Comissão incentiva os Estados-Membros em causa a considerar a promoção de normas iguais ou equivalentes nesses países e territórios.
Proteção da natureza: principais compromissos até 2030
1.Proteger legalmente um mínimo de 30 % da superfície terrestre e 30 % da zona marítima da UE e integrar corredores ecológicos, como parte de uma verdadeira rede transeuropeia de natureza.
2.Conferir proteção estrita a, pelo menos, um terço das áreas protegidas da UE, incluindo a todas as florestas primárias e seculares que subsistem na UE.
3.Gerir eficazmente todas as áreas protegidas, definindo objetivos e medidas de conservação claros, e efetuando a monitorização dos mesmos de forma adequada.
2.2.Um Plano da UE de Restauração da Natureza: recuperar os ecossistemas em terra e no mar
A proteção da natureza que nos resta não será suficiente para a trazer de volta às nossas vidas. Para reverter a perda de biodiversidade, exige-se mais ambição na restauração da natureza. Com um novo Plano da UE de Restauração da Natureza, a Europa assume a liderança.
O plano contribuirá para melhorar a saúde das atuais e futuras áreas protegidas e repor a diversidade e a resiliência de todas as paisagens e ecossistemas. Tal significa reduzir as pressões sobre os habitats e as espécies e assegurar a sustentabilidade de toda a utilização dos ecossistemas. Significa também apoiar a recuperação da natureza, limitar a impermeabilização dos solos e a expansão urbana e combater a poluição e as espécies exóticas invasoras. O plano criará empregos, reconciliará as atividades económicas com a expansão da natureza e contribuirá para assegurar a produtividade e o valor a longo prazo do nosso capital natural.
2.2.1.Reforçar o quadro jurídico da UE relativo à restauração da natureza
A restauração da natureza já faz parte, em certa medida, do exigido aos Estados‑Membros na legislação da UE em vigor
. No entanto, importantes lacunas regulamentares e de aplicação entravam o progresso. Por exemplo, não é obrigatório que os Estados-Membros tenham planos de restauração da biodiversidade. Nem sempre existem metas e calendários claros e vinculativos nem definições e critérios aplicáveis à restauração e à utilização sustentável dos ecossistemas. Também não é obrigatório cartografar, monitorar e avaliar, de forma extensiva, os serviços ecossistémicos, a saúde desses ecossistemas e os esforços de restauração dos mesmos. Estas questões são exacerbadas pelas lacunas na aplicação que impedem a realização dos objetivos da legislação em vigor
. É necessário apoiar a aplicação da legislação e fazê-la cumprir de forma mais rigorosa. Esta estratégia apresenta duas vertentes de ação que visam assegurar o arranque da restauração da natureza em terra e no mar, conduzindo ao aumento da resiliência da UE e contribuindo, enquanto solução fundamental baseada na natureza, para a atenuação das alterações climáticas e adaptação às mesmas:
·Em primeiro lugar, e sob reserva de uma avaliação de impacto, a Comissão apresentará, em 2021, uma proposta de metas da UE de restauração da natureza, juridicamente vinculativas, a fim de recuperar os ecossistemas degradados, em especial aqueles com maior potencial para capturar e armazenar carbono, prevenir o impacto das catástrofes naturais e reduzir o impacto das mesmas. A proposta enunciará as condições subjacentes à concretização das metas, bem como as medidas mais eficazes para as alcançar. A avaliação de impacto analisará igualmente a possibilidade de estabelecer uma metodologia a nível da UE para cartografar e avaliar ecossistemas e alcançar boas condições para os mesmos, de modo a que possam gerar benefícios, como a regulação do clima e da água, a saúde dos solos, a polinização, a prevenção de catástrofes e a proteção contra as mesmas.
·Neste contexto, a Comissão solicitará aos Estados-Membros que aumentem o nível de aplicação da legislação em vigor dentro de prazos claros e apoiá-los-á neste propósito. Solicitar-lhes-á, em especial, que impeçam qualquer deterioração do estado ou das tendências de conservação de todos os habitats e espécies protegidas
até 2030. Além disso, os Estados-Membros terão de assegurar que, pelo menos, 30 % das espécies e dos habitats que não se encontram atualmente em estado favorável alcançam essa categoria ou apresentam uma forte tendência positiva. Ainda em 2020, a Comissão e a Agência Europeia do Ambiente fornecerão orientações aos Estados-Membros sobre o modo de selecionar e hierarquizar as espécies e os habitats.
2.2.2.Trazer a natureza de volta às terras agrícolas
Enquanto guardiães do campo, os agricultores desempenham um papel vital na preservação da biodiversidade. São dos primeiros a sentir as consequências da perda de biodiversidade, mas também dos primeiros a colher os benefícios quando esta é restaurada. A biodiversidade dá-lhes condições para que nos forneçam alimentos seguros, sustentáveis, nutritivos e a preços acessíveis e proporciona-lhes os rendimentos de que necessitam para prosperar e desenvolver as suas atividades. Os agricultores europeus são uma parte essencial do futuro da UE e devem continuar a ser o polo económico e social de muitas comunidades em toda a União.
Ao mesmo tempo, certas práticas agrícolas constituem um motor fundamental de declínio da biodiversidade. É por esta razão que é importante trabalhar em colaboração com os agricultores no sentido de apoiar e incentivar a transição para práticas plenamente sustentáveis. A melhoria das condições e da diversidade dos ecossistemas agrícolas aumentará a resiliência do setor às alterações climáticas, aos riscos ambientais e aos choques socioeconómicos, criando novos postos de trabalho, por exemplo, na agricultura biológica, no turismo rural ou no lazer.
Para apoiar a sustentabilidade a longo prazo tanto da natureza como da agricultura, esta estratégia irá trabalhar em paralelo com a nova Estratégia do Prado ao Prato e a nova política agrícola comum (PAC), nomeadamente pela promoção de regimes ecológicos e de regimes de pagamentos baseados nos resultados. Ao aplicar as Estratégias de Biodiversidade e do Prado ao Prato, a Comissão acompanhará de perto os progressos e as melhorias em termos de segurança alimentar e de rendimento dos agricultores. A Comissão assegurará que os planos estratégicos da PAC sejam avaliados em função de critérios climáticos e ambientais sólidos e que os Estados-Membros estabeleçam valores nacionais explícitos para as metas pertinentes estabelecidas na presente estratégia, bem como na Estratégia do Prado ao Prato. Estes planos devem conduzir a práticas sustentáveis — como a agricultura de precisão, a agricultura biológica, a agroecologia, a agrossilvicultura e os prados permanentes de baixa intensidade — e a normas mais rigorosas em matéria de bem-estar dos animais.
As aves e os insetos presentes nas terras agrícolas, em especial os polinizadores, constituem indicadores-chave da saúde dos agroecossistemas e são vitais para a produção agrícola e a segurança alimentar. Há que reverter o seu declínio alarmante. Como estabelecido na Estratégia do Prado ao Prato, a Comissão tomará medidas para reduzir a utilização global e o risco dos pesticidas químicos em 50 % até 2030 e a utilização dos pesticidas mais perigosos em 50 % até 2030. Tal deve ser apoiado pela plena aplicação da iniciativa da UE relativa aos polinizadores
. Até ao final de 2020, a Comissão irá rever a iniciativa e propor medidas adicionais, caso se justifiquem. Para proporcionar espaço a animais e plantas selvagens, polinizadores e controladores naturais de pragas, é necessário reconverter rapidamente pelo menos 10 % da superfície agrícola em elementos paisagísticos de grande diversidade, nomeadamente faixas-tampão, terras em pousio permanente ou rotativo, sebes, árvores não produtivas, muros de socalcos e lagoas. Estes elementos contribuem para reforçar o sequestro de carbono, prevenir a erosão e o esgotamento dos solos, filtrar o ar e a água e apoiar a adaptação às alterações climáticas. Além disso, uma maior biodiversidade contribui muitas vezes para o aumento da produção agrícola. Os Estados-Membros terão de traduzir a meta da UE de 10 % para uma escala geográfica mais reduzida, a fim de assegurar a conectividade entre os habitats, em especial através dos instrumentos e planos estratégicos da PAC, em conformidade com a Estratégia do Prado ao Prato, e da aplicação da Diretiva Habitats. Os progressos no sentido do cumprimento do objetivo serão objeto de uma revisão permanente e, caso se justifique, de um ajustamento para atenuar o impacto indevido na biodiversidade, na segurança alimentar e na competitividade dos agricultores.
A agroecologia pode proporcionar alimentos saudáveis e, ao mesmo tempo, manter a produtividade, aumentar a fertilidade do solo e a biodiversidade e reduzir a pegada associada à produção alimentar. A agricultura biológica, em particular, tem um grande potencial tanto para os agricultores como para os consumidores. O setor cria postos de trabalho e atrai jovens agricultores. A agricultura biológica também proporciona entre 10 % e 20 % mais empregos por hectare do que as explorações convencionais e cria valor acrescentado para os produtos agrícolas
. Para tirar o máximo partido deste potencial, pelo menos 25 % das terras agrícolas da UE devem ser cultivadas em modo de produção biológico até 2030. Para além das medidas da PAC, a Comissão apresentará um plano de ação para a agricultura biológica, ajudando os Estados-Membros a estimular tanto a oferta como a procura de produtos biológicos. Assegurará também a confiança dos consumidores através de campanhas de promoção e de contratos públicos ecológicos. Na concretização das metas agroecológicas a nível da UE, definidas na presente estratégia e na Estratégia do Prado ao Prato, serão tidos em conta os diferentes pontos de partida e as diferenças em termos de progressos já realizados nos Estados-Membros.
Deve aumentar a adoção de medidas de apoio agroflorestal no âmbito do desenvolvimento rural, uma vez que estas têm um grande potencial para proporcionar múltiplos benefícios para a biodiversidade, as pessoas e o clima.
É também necessário reverter o declínio da diversidade genética, nomeadamente facilitando a utilização de variedades de culturas e raças tradicionais. Tal traria também benefícios para a saúde, graças a regimes alimentares mais variados e nutritivos. A Comissão está a ponderar a revisão das regras de comercialização das variedades de culturas tradicionais, a fim de contribuir para a conservação e utilização sustentável das mesmas. A Comissão tomará igualmente medidas para facilitar o registo de variedades de sementes, nomeadamente para a agricultura biológica, e para garantir um acesso mais fácil ao mercado para as variedades tradicionais e adaptadas às condições locais.
2.2.3.A questão da ocupação artificial do solo e a restauração dos ecossistemas dos solos
O solo é um dos ecossistemas mais complexos. Trata-se de um habitat de pleno direito, que alberga uma diversidade incrível de organismos que regulam e controlam serviços ecossistémicos essenciais, como a fertilidade do solo, o ciclo dos nutrientes e a regulação do clima. O solo é um recurso não renovável extremamente importante, vital para a saúde humana e da economia, bem como a produção de alimentos e de novos medicamentos.
Na UE, a degradação do solo está a ter consequências ambientais e económicas consideráveis. A má gestão das terras, como a desflorestação, o sobrepastoreio, as práticas agrícolas e silvícolas insustentáveis, as atividades de construção e a impermeabilização do solo são algumas das principais causas desta situação
. Apesar das recentes reduções do ritmo de impermeabilização dos solos, continua a verificar-se a perda de solos férteis para tipos de ocupação artificial do solo e para a expansão urbana
. Agravados pelas alterações climáticas, os efeitos da erosão e das perdas de carbono orgânico do solo estão a tornar-se cada vez mais evidentes. A desertificação é também uma ameaça crescente na UE
.
Por conseguinte, é fundamental intensificar os esforços para proteger a fertilidade, reduzir a erosão e aumentar a matéria orgânica dos solos. Tal deve ser feito através da adoção de práticas de gestão sustentável dos solos, nomeadamente no âmbito da PAC. Importa, igualmente, realizar progressos significativos na identificação de zonas com solos contaminados, na recuperação de solos degradados, na definição das condições adequadas ao seu bom estado ecológico, na introdução de objetivos de reabilitação e na melhoria da monitorização da qualidade do solo.
Para abordar estas questões de forma abrangente e ajudar a cumprir os compromissos da UE e internacionais relativos à neutralidade em termos de degradação do solo, a Comissão atualizará a Estratégia temática da UE de Proteção do Solo
em 2021. O plano de ação para a poluição zero no ar, na água e no solo, que a Comissão adotará em 2021, também examinará estas questões. A impermeabilização dos solos e a reabilitação dos espaços abandonados contaminados serão abordados na próxima estratégia para a sustentabilidade do ambiente construído. Uma missão no domínio da saúde dos solos e alimentação, no âmbito do programa Horizonte Europa
, terá por objetivo desenvolver soluções para restaurar a saúde e as funções do solo.
2.2.4.Aumentar a quantidade de florestas e melhorar a saúde e resiliência destas
As florestas são extremamente importantes para a biodiversidade, a regulação do clima e da água, o fornecimento de alimentos, medicamentos e matérias, o sequestro e armazenamento de carbono, a estabilização do solo e a purificação do ar e da água. São também um espaço natural para fins recreativos e de aprendizagem sobre a natureza. Os silvicultores têm um papel fundamental a desempenhar para assegurar uma gestão sustentável das florestas e restaurar e manter a biodiversidade nas florestas.
Para além de conferir proteção estrita a todas as florestas primárias e seculares que subsistem no seu território, a UE deve aumentar a quantidade, a qualidade e a resiliência das suas florestas, nomeadamente contra incêndios, secas, pragas e outras ameaças suscetíveis de aumentar com as alterações climáticas. Para manter as suas funções tanto em prol da biodiversidade como do clima, todas as florestas precisam de ser preservadas em boa saúde. Florestas mais resilientes podem apoiar uma economia mais resiliente e desempenhar um papel importante no fornecimento de matérias, produtos e serviços, que são essenciais para a bioeconomia circular.
Para que tal aconteça, a Comissão irá propor, em 2021, uma estratégia da UE para as florestas em consonância com as nossas ambições mais amplas em matéria de biodiversidade e de neutralidade climática. Essa estratégia incluirá um roteiro para a plantação de, pelo menos, 3 mil milhões de novas árvores na UE até 2030, em pleno respeito dos princípios ecológicos. Tal criará boas oportunidades de emprego relacionadas com a recolha e o cultivo de sementes, a plantação de plântulas e a garantia do seu desenvolvimento. A plantação de árvores é particularmente benéfica nas cidades, enquanto nas zonas rurais pode ser muito útil na agrossilvicultura, como elemento paisagístico e para favorecer o sequestro de carbono. Ao mesmo tempo, a Comissão continuará a trabalhar em colaboração com os Estados-Membros para assegurar que a UE está suficientemente equipada para prevenir e dar resposta aos grandes incêndios florestais, que podem infligir danos significativos à biodiversidade florestal.
A florestação, a reflorestação e a plantação de árvores para apoiar a biodiversidade e a recuperação dos ecossistemas serão promovidas através dos planos estratégicos da PAC e dos fundos da política de coesão. A nova plataforma europeia de ecologização urbana
facilitará também a plantação de árvores nas zonas urbanas, nomeadamente no âmbito do programa LIFE.
A percentagem de zonas florestais abrangidas por planos de gestão deve incluir todas as florestas geridas pelo Estado e um número crescente de florestas privadas, devendo continuar a ser empregues e desenvolvidas práticas favoráveis à biodiversidade, como a silvicultura mais próxima da natureza. Em apoio a esta medida, a Comissão elaborará orientações relativas à florestação e reflorestação favoráveis à biodiversidade e às práticas silvícolas mais próximas da natureza. Tal será feito em paralelo com a nova estratégia da UE para as florestas.
A fim de obter uma melhor imagem da saúde das florestas europeias, a Comissão trabalhará em colaboração com outros fornecedores de dados para desenvolver o Sistema de Informação Florestal para a Europa. Tal contribuirá para a elaboração de avaliações atualizadas do estado das florestas europeias e estabelecerá a ligação entre todas as plataformas Web de dados florestais da UE. Este aspeto será igualmente apresentado no âmbito da estratégia da UE para as florestas.
2.2.5.Soluções mutuamente vantajosas para a produção de energia
A descarbonização do sistema energético é fundamental para a neutralidade climática, bem como para a recuperação da UE da crise da COVID-19 e a prosperidade a longo prazo. O recurso a energia proveniente de fontes renováveis e de origem mais sustentável será essencial para combater as alterações climáticas e a perda de biodiversidade. A UE dará prioridade a soluções como a energia oceânica, a energia eólica marítima, que também favorece a regeneração de unidades populacionais de peixes, os parques solares, que proporcionam uma cobertura do solo favorável à biodiversidade, e a bioenergia sustentável.
Para atenuar os riscos climáticos e ambientais criados pela utilização crescente de determinadas fontes de bioenergia, a revisão da Diretiva Energias Renováveis
inclui critérios de sustentabilidade reforçados. Promove igualmente a transição para biocombustíveis avançados, baseados em resíduos, incluindo os resíduos não reutilizáveis e não recicláveis. Esta abordagem deve ser mantida para todas as formas de bioenergia. A utilização de árvores inteiras e de culturas destinadas à alimentação humana ou animal, produzidas na UE ou importadas, para a produção de energia deve ser minimizada.
Para compreender e controlar melhor os riscos potenciais para o clima e a biodiversidade, a Comissão está a avaliar a oferta e procura de biomassa à escala mundial e da UE e a respetiva sustentabilidade
. Como parte da sua ambição acrescida de proteger e restaurar os ecossistemas florestais, a Comissão publicará, até ao final de 2020, os resultados deste trabalho sobre a utilização da biomassa florestal para a produção de energia. Os serviços da Comissão utilizarão essa informação como contributo para os seus trabalhos, incluindo o reexame e, caso se justifique, a revisão, planeadas para 2021, do nível de ambição da Diretiva Energias Renováveis, do Sistema de Comércio de Licenças de Emissão e do Regulamento LULUCF (uso do solo, alteração do uso do solo e florestas).
Em conformidade com a Diretiva Energias Renováveis, a Comissão irá também desenvolver, em 2021, orientações operacionais sobre os novos critérios de sustentabilidade aplicáveis à biomassa florestal para fins energéticos
. Irá igualmente rever, até 2021, os dados sobre biocombustíveis com elevado risco de alteração indireta do uso do solo e definir uma trajetória para a sua eliminação gradual até 2030.
O objetivo principal é assegurar a consonância do quadro regulamentar da UE no domínio da bioenergia com a ambição acrescida estabelecida no Pacto Ecológico Europeu.
2.2.6.Restabelecer o bom estado ambiental dos ecossistemas marinhos
Os ecossistemas marinhos restaurados e devidamente protegidos acarretam substanciais benefícios sociais, económicos e para a saúde das comunidades costeiras e da UE no seu conjunto. A necessidade de uma ação mais forte é tanto mais imperiosa quanto a perda de biodiversidade dos ecossistemas marinhos e costeiros é fortemente agravada pelo aquecimento global
.
A consecução do bom estado ambiental dos ecossistemas marinhos, nomeadamente por meio de áreas de proteção estrita, deve incluir a restauração de ecossistemas ricos em carbono, bem como importantes zonas de desova e reprodução de peixes. Algumas das atuais utilizações do mar põem em perigo a segurança alimentar, os meios de subsistência dos pescadores e os setores das pescas e dos produtos do mar. As capturas de recursos marinhos devem ser sustentáveis e não pode haver tolerância para práticas ilegais. A este respeito, é essencial a plena aplicação da política comum das pescas da UE, a Diretiva-Quadro Estratégia Marinha e as Diretivas Aves e Habitats.
A aplicação de uma abordagem de gestão baseada nos ecossistemas ao abrigo da legislação da UE
reduzirá os impactos adversos da pesca, da extração e de outras atividades humanas, em especial nas espécies sensíveis e nos habitats dos fundos marinhos. Para apoiar este objetivo, os planos nacionais de ordenamento do espaço marítimo, que os Estados-Membros têm de apresentar em 2021, devem procurar abranger todos os setores e atividades marítimas, bem como medidas de gestão da conservação por zona
. A Comissão irá também propor, até 2021, um novo plano de ação para a conservação dos recursos pesqueiros e a proteção dos ecossistemas marinhos. Quando se justifique, serão introduzidas medidas para limitar a utilização das artes de pesca mais nocivas para a biodiversidade, incluindo no fundo do mar. Analisará igualmente a forma de conciliar a utilização de artes de pesca em contacto com o fundo com metas de biodiversidade, dado que essa é agora a atividade mais prejudicial para o fundo do mar. Tal deve ser feito de forma equitativa e justa para todos. O Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas deve igualmente apoiar a transição para técnicas de pesca mais seletivas e menos prejudiciais.
O bom estado das unidades populacionais de peixes é fundamental para a prosperidade a longo prazo dos pescadores e para a biodiversidade e a saúde dos nossos oceanos. Por isso, é deveras importante manter ou reduzir a mortalidade por pesca para valores iguais ou inferiores aos níveis de rendimento máximo sustentável. Tal contribuirá para que todas as unidades populacionais apresentem um perfil equilibrado em termos de idades e tamanhos.
Importa igualmente eliminar as capturas acessórias de espécies ameaçadas de extinção, ou reduzi-las para níveis que permitam a recuperação total. O mesmo se deve verificar em relação às espécies que se encontram em mau estado de conservação ou que não se encontram em bom estado ambiental. Além disso, a captura acessória de outras espécies
tem de ser eliminada ou, se tal não for possível, reduzida ao mínimo, de modo a que não ameace o estado de conservação dessas espécies. Para tal, é necessário intensificar a recolha de dados sobre capturas acessórias de todas as espécies sensíveis.
Além disso, há que estabelecer medidas de gestão das pescas em todas as áreas marinhas protegidas, de acordo com objetivos de conservação claramente definidos e com base nos melhores pareceres científicos disponíveis.
2.2.7.Restauração dos ecossistemas de água doce
O quadro jurídico da UE no domínio da água é ambicioso, mas a sua aplicação está atrasada e a fiscalização deve ser intensificada
. São necessários maiores esforços para restaurar os ecossistemas de água doce e as funções naturais dos rios, a fim de alcançar os objetivos da Diretiva-Quadro da Água. Tal pode ser feito através da remoção ou do ajustamento de obstáculos que impeçam a passagem de peixes em migração e da melhoria do fluxo de água e sedimentos. Para tornar isto uma realidade, será restabelecido o curso natural de rios, numa extensão de, pelo menos, 25 000 km até 2030
, por meio da remoção de obstáculos essencialmente obsoletos e da restauração das planícies aluviais e zonas húmidas. Em 2021, a Comissão, em consulta com todas as autoridades competentes, disponibilizará orientações técnicas e apoio aos Estados‑Membros com vista à identificação de sítios e à mobilização de financiamento
. As autoridades dos Estados-Membros devem rever as licenças de captação e represamento de águas, de modo a estabelecer fluxos ecológicos que permitam alcançar o bom estado ou potencial de todas as águas de superfície e o bom estado de todas as águas subterrâneas, o mais tardar até 2027, em conformidade com a Diretiva-Quadro Água
. Para o efeito, até 2023, a Comissão prestará apoio técnico em relação às medidas a tomar pelos Estados-Membros.
De um modo geral, os grandes investimentos na restauração de rios e planícies aluviais
podem dar um impulso económico importante ao setor da regeneração ambiental e às atividades socioeconómicas locais, como o turismo e o lazer. Ao mesmo tempo, estes investimentos podem melhorar a regulação da água, a proteção contra as inundações, os habitats dos berçários de peixes e a remoção da poluição por nutrientes.
2.2.8.Ecologização das zonas urbanas e periurbanas
Os espaços verdes urbanos, desde parques e jardins até coberturas ajardinadas e hortas urbanas, proporcionam um vasto leque de benefícios para as pessoas, bem como oportunidades para as empresas e um refúgio para a natureza. Reduzem a poluição atmosférica, hídrica e sonora, oferecem proteção contra inundações, secas e ondas de calor e mantêm uma ligação entre o ser humano e a natureza
.
Os recentes confinamentos devidos à pandemia de COVID-19 mostraram-nos o valor dos espaços verdes urbanos para o nosso bem-estar físico e mental. Embora a proteção de alguns espaços verdes urbanos tenha aumentado
, os espaços verdes perdem com frequência na concorrência pelo solo, uma vez que a percentagem da população que vive em zonas urbanas continua a aumentar.
A presente estratégia visa reverter estas tendências e travar a perda de ecossistemas verdes urbanos. A promoção de ecossistemas saudáveis, de infraestruturas verdes e de soluções baseadas na natureza deve ser sistematicamente integrada no planeamento urbano, nomeadamente em espaços públicos, infraestruturas e na conceção de edifícios e áreas circundantes.
Para trazer a natureza de volta às cidades e recompensar a ação da comunidade, a Comissão apela às cidades europeias de, pelo menos, 20 000 habitantes para que elaborem planos de ecologização urbana ambiciosos até ao final de 2021. Estes devem incluir medidas de criação de bosques, parques e jardins com acesso público e ricos em biodiversidade, hortas urbanas, coberturas ajardinadas e jardins verticais, ruas arborizadas, prados urbanos e sebes urbanas. Devem também contribuir para melhorar as ligações entre os espaços verdes, eliminar a utilização de pesticidas e limitar o desbaste excessivo dos espaços verdes urbanos e outras práticas nocivas para a biodiversidade. Tais planos poderiam mobilizar instrumentos políticos, regulamentares e financeiros.
Para facilitar este trabalho, a Comissão estabelecerá, em 2021, uma plataforma de ecologização urbana da UE, ao abrigo de um novo Acordo Cidade Verde
com as cidades e os autarcas, em estreita coordenação com o Pacto de Autarcas europeu. Os planos de ecologização urbana terão um papel central na escolha da Capital Verde Europeia de 2023 e na atribuição do prémio Folha Verde Europeia de 2022.
A Comissão apoiará os Estados-Membros e os órgãos de poder local e regional por meio de orientações técnicas e ajudas à mobilização de financiamento e ao reforço das capacidades. Refletirá igualmente estes objetivos no âmbito do Pacto Europeu para o Clima.
2.2.9.Reduzir a poluição
A poluição é um fator principal de perda de biodiversidade e tem um impacto negativo na nossa saúde e no ambiente. Embora a UE disponha de um quadro jurídico robusto para reduzir a poluição, são ainda necessários maiores esforços neste domínio. A biodiversidade é afetada pela libertação de nutrientes, pesticidas químicos, produtos farmacêuticos, produtos químicos perigosos, águas residuais urbanas e industriais e outros resíduos, incluindo lixo e plásticos. Há que reduzir todas estas pressões.
No âmbito da ambição da Comissão de poluição zero para um ambiente isento de substâncias tóxicas, será apresentada uma nova estratégia da UE para os produtos químicos num contexto de sustentabilidade, juntamente com um plano de ação para a poluição zero no ar, na água e no solo.
A Comissão promoverá também o objetivo de eliminar a poluição resultante dos fluxos de azoto e de fósforo provenientes dos fertilizantes, reduzindo as perdas de nutrientes em, pelo menos, 50 %, assegurando, em simultâneo, que não ocorre degradação da fertilidade do solo. Tal resultará na redução da utilização de fertilizantes em, pelo menos, 20 %. Este objetivo será alcançado mediante a aplicação e a fiscalização integral da legislação ambiental e climática pertinente, identificando, com os Estados-Membros, as reduções da carga de nutrientes necessárias para atingir estes objetivos, pondo em prática uma fertilização equilibrada e exercendo uma gestão sustentável dos nutrientes, incluindo uma melhor gestão do azoto e do fósforo ao longo de todo o seu ciclo de vida. Par tal, a Comissão trabalhará em colaboração com os Estados-Membros com vista à elaboração de um plano de ação para a gestão integrada dos nutrientes em 2022. A Estratégia do Prado ao Prato abordará a redução da utilização e do risco dos pesticidas e apoiará a aplicação mais generalizada da proteção integrada
. Nesse contexto, será reforçada a avaliação dos riscos ambientais dos pesticidas. A pressão dos plásticos é abordada, nomeadamente, por meio da execução da Estratégia Europeia para os Plásticos
e do novo Plano de Ação para a Economia Circular
.
A Comissão irá desenvolver um conjunto de indicadores para a redução progressiva da poluição e estabelecerá bases de referência para ajudar a monitorizar os progressos. As pressões do lixo marinho e do ruído submarino são abordadas no âmbito da Diretiva‑Quadro Estratégia Marinha.
2.2.10.Combater as espécies exóticas invasoras
As espécies exóticas invasoras podem prejudicar significativamente os esforços para proteger e restaurar a natureza. Além de infligirem danos importantes à natureza e à economia, muitas espécies exóticas invasoras também facilitam o surto e a propagação de doenças infecciosas, representando uma ameaça para os seres humanos e a vida selvagem
. A taxa de libertação de espécies exóticas invasoras aumentou nos últimos anos. Das 1 872 espécies atualmente consideradas ameaçadas na Europa, 354 sofrem a ameaça de espécies exóticas invasoras. Sem medidas de controlo eficazes, a taxa de invasão e os riscos que esta acarreta para a natureza e para a nossa saúde continuarão a aumentar.
Há que reforçar igualmente a aplicação do regulamento da UE relativo às espécies exóticas invasoras
e de outros atos legislativos e acordos internacionais pertinentes. Procura-se assim minimizar e, sempre que possível, eliminar a introdução e o estabelecimento de espécies exóticas no ambiente da UE. O objetivo será gerir as espécies exóticas invasoras estabelecidas e diminuir em 50 % o número de espécies da Lista Vermelha que elas ameaçam
.
Plano da UE de Restauração da Natureza: principais compromissos até 2030
1.Metas juridicamente vinculativas da UE em matéria de restauração da natureza, a propor em 2021, objeto de uma avaliação de impacto. Até 2030, restauração de zonas significativas de ecossistemas degradados e ricos em carbono, ausência de sinais de deterioração das tendências e do estado de conservação de habitats e espécies e, pelo menos, 30 % deles alcançando um estado de conservação favorável ou, pelo menos, apresentando uma tendência positiva.
2.Reversão do declínio dos polinizadores.
3.Redução da utilização e do risco dos pesticidas químicos em 50 % e redução da utilização dos pesticidas mais perigosos em 50 %.
4.Pelo menos 10 % da superfície agrícola constituída por elementos paisagísticos de grande diversidade.
5.Pelo menos 25 % das terras agrícolas sob produção biológica e aumento significativo da adoção de práticas agroecológicas.
6.Plantação de 3 mil milhões de novas árvores na UE, em pleno respeito dos princípios ecológicos.
7.Progressos significativos na remediação de solos contaminados.
8.Restabelecimento do curso natural de rios, numa extensão de, pelo menos, 25 000 km.
9.Redução de 50 % no número de espécies da Lista Vermelha ameaçadas por espécies exóticas invasoras.
10.Redução de 50 % das perdas de nutrientes provenientes dos fertilizantes, resultando na redução em, pelo menos, 20 % da utilização de fertilizantes.
11.Ambiciosos planos de ecologização urbana nas cidades com, pelo menos, 20 000 habitantes.
12.Fim da utilização de pesticidas químicos em zonas sensíveis, como as zonas verdes urbanas da UE.
13.Redução substancial dos impactos negativos nas espécies e habitats sensíveis, nomeadamente no fundo marinho, em resultado de atividades de pesca e de extração, de modo a se alcançar um bom estado ambiental.
14.Fim das capturas acessórias de espécies, ou redução para níveis que permitam a recuperação e a conservação das espécies.
3.Permitir uma mudança transformadora
3.1.Um novo quadro de governação
Na UE, não existe atualmente um quadro de governação abrangente para orientar a aplicação dos compromissos assumidos a nível nacional, europeu ou internacional em matéria de biodiversidade. Para colmatar esta lacuna, a Comissão irá criar um novo quadro europeu de governação da biodiversidade, o que ajudará a elencar obrigações e compromissos e definirá um roteiro para orientar a sua execução.
A Comissão estabelecerá um mecanismo de acompanhamento e revisão deste novo quadro, que incluirá um conjunto claro de indicadores acordados e permitirá uma avaliação regular dos progressos e estabelecerá medidas corretivas, caso se justifiquem. Este mecanismo irá fornecer informação para o reexame da aplicação da política ambiental e contribuir para o Semestre Europeu.
O novo quadro de governação assegurará a corresponsabilidade e a coapropriação por parte de todos os intervenientes importantes no cumprimento dos compromissos da UE em matéria de biodiversidade. Apoiará o reforço das capacidades administrativas, a transparência, o diálogo entre as partes interessadas e a governação participativa a diferentes níveis.
A Comissão irá avaliar os progressos e a adequação desta abordagem em 2023 e ponderar se se justifica uma abordagem juridicamente vinculativa da governação.
3.2.Intensificar a aplicação e a fiscalização da legislação ambiental da UE
Toda a legislação em matéria de ambiente assenta numa aplicação e fiscalização adequadas. Nos últimos 30 anos, a UE criou um quadro legislativo robusto para proteger e restaurar o seu capital natural. No entanto, avaliações recentes mostram que, embora a legislação seja adequada à sua finalidade, a aplicação no terreno está atrasada
. Esta situação tem consequências dramáticas para a biodiversidade e acarreta um custo económico considerável
. A plena aplicação e fiscalização da legislação ambiental da UE está, por conseguinte, no centro desta estratégia, para a qual será necessário dar prioridade ao apoio político e aos recursos financeiros e humanos.
No que diz respeito às Diretivas Aves e Habitats, a execução centrar-se-á na conclusão da rede Natura 2000, na gestão eficaz de todos os sítios, nas disposições em matéria de proteção das espécies e nas espécies e habitats que apresentam tendências de declínio. A Comissão assegurará igualmente a aplicação e a fiscalização mais eficazes da legislação ambiental com impacto na biodiversidade
e, se for caso disso, o reexame e revisão dessa legislação.
A Comissão procurará melhorar a garantia de cumprimento, trabalhando em estreita colaboração com os Estados-Membros e as redes europeias de agências ambientais, inspetores, auditores, polícia, procuradores e juízes.
Além disso, a Comissão apoiará o papel da sociedade civil na vigilância do cumprimento e colaborará com os Estados-Membros para melhorar o acesso dos cidadãos e das ONG à justiça, nos tribunais nacionais, em questões de ambiente. Alargará também a legitimidade das ONG, propondo uma revisão do Regulamento de Aarhus
.
3.3.Tirar partido de uma abordagem integrada e que envolva a sociedade como um todo
3.3.1.Empresas em prol da biodiversidade
No espírito de parceria desta estratégia, todas as partes da economia e da sociedade terão de desempenhar o respetivo papel. A indústria e as empresas têm um impacto na natureza, mas produzem também as importantes inovações, parcerias e conhecimentos que podem ajudar a resolver o problema da perda de biodiversidade.
Para garantir que os interesses ambientais e sociais estão plenamente integrados nas estratégias empresariais, a Comissão apresentará, em 2021, uma nova iniciativa sobre o governo societário sustentável. Esta iniciativa, que pode assumir a forma de uma proposta legislativa, abordará, de forma proporcionada face à dimensão das empresas, os direitos humanos e os deveres ambientais de cuidado e de diligência, em todas as cadeias de valor económico
. Tal contribuirá para assegurar o pleno alinhamento dos interesses dos acionistas e das partes interessadas com os objetivos definidos na presente estratégia. Além disso, em 2020, a Comissão lançou uma revisão das obrigações de comunicação de informações impostas às empresas pela Diretiva Divulgação de Informações Não Financeiras
, com vista a melhorar a qualidade e o âmbito da divulgação de informações não financeiras, nomeadamente em aspetos ambientais como a biodiversidade.
Através das suas plataformas atuais
, a Comissão ajudará a construir um movimento europeu de empresas em prol da biodiversidade, inspirado em iniciativas recentes
e destinado a integrar o Pacto Europeu sobre o Clima. Será dada especial atenção às medidas que visam incentivar e eliminar os obstáculos à adoção de soluções baseadas na natureza, uma vez que estas podem conduzir a importantes oportunidades de negócio e de emprego em vários setores
e constituem a chave para a inovação relativa às necessidades económicas ou societais que dependem da natureza.
3.3.2.Investimentos, fixação de preços e fiscalidade
A luta contra a perda de biodiversidade e a recuperação dos ecossistemas exigirão investimentos públicos e privados significativos a nível nacional e europeu. Tal significa tirar o máximo partido de todos os programas e instrumentos de financiamento pertinentes da UE. A Comissão irá reforçar o seu quadro de compatibilidade com a biodiversidade
, nomeadamente utilizando, de forma adequada, os critérios estabelecidos no âmbito da taxonomia da UE, a fim de assegurar que o financiamento da UE apoia investimentos favoráveis à biodiversidade.
A fim de satisfazer as necessidades desta estratégia, nomeadamente as prioridades de investimento na rede Natura 2000 e em infraestruturas verdes, é necessário desbloquear pelo menos 20 mil milhões de EUR por ano
para despesas relacionadas com a natureza. Tal exigirá a mobilização de fundos privados e públicos a nível nacional e da UE
, nomeadamente através de uma série de programas no próximo orçamento de longo prazo da UE. Além disso, uma vez que a restauração da natureza dará um contributo importante para os objetivos em matéria de clima, uma parte significativa dos 25 % do orçamento da UE consagrados à ação climática serão investidos na biodiversidade e em soluções baseadas na natureza.
No âmbito do programa InvestEU, será criada uma iniciativa específica para o capital natural e a economia circular, visando a mobilização de, pelo menos, 10 mil milhões de EUR nos próximos 10 anos, com base em financiamento misto público/privado. A natureza e a biodiversidade são também prioridades do Plano de Investimento do Pacto Ecológico Europeu. Para ajudar a desbloquear o investimento necessário, a UE deve proporcionar segurança a longo prazo aos investidores e ajudar a integrar a sustentabilidade no sistema financeiro. A taxonomia da UE para o financiamento sustentável ajudará a orientar o investimento para uma recuperação ecológica e a implantação de soluções baseadas na natureza. Em 2021, a Comissão adotará um ato delegado ao abrigo do Regulamento Taxonomia
, com vista a estabelecer uma classificação comum das atividades económicas que contribuem substancialmente para a proteção e a restauração da biodiversidade e dos ecossistemas. Esta medida será ainda apoiada por uma estratégia renovada de financiamento sustentável, a lançar durante este ano, a qual ajudará a garantir que o sistema financeiro contribui para atenuar os riscos atuais e futuros para a biodiversidade, refletindo melhor o modo como a perda de biodiversidade afeta o lucro das empresas e as perspetivas a longo prazo
.
A Comissão continuará a defender regimes fiscais e a fixação de preços que espelhem os custos ambientais, nomeadamente o custo da perda de biodiversidade. Esta abordagem deverá fomentar alterações nos regimes fiscais nacionais, no sentido da transferência da carga fiscal do trabalho para a poluição, para os recursos subvalorizados e para outras externalidades ambientais. Os princípios do «utilizador-pagador» e do «poluidor‑pagador» têm de ser aplicados para prevenir e corrigir a degradação ambiental.
O poder de compra das autoridades públicas, que representa 14 % do PIB da UE, pode funcionar como um poderoso motor de procura de produtos e serviços das empresas que investem em soluções baseadas na natureza ou para elas contribuem. Para explorar este potencial, ao propor legislação e orientações adicionais em matéria de contratos públicos ecológicos, a Comissão integrará critérios e requisitos de monitorização conducentes ao reforço das soluções baseadas na natureza.
3.3.3.Medir e integrar o valor da natureza
É imprescindível integrar melhor as questões da biodiversidade na tomada de decisões públicas e empresariais a todos os níveis. Com base nos trabalhos em curso
, a Comissão desenvolverá, em 2021, métodos, critérios e normas para descrever as características essenciais da biodiversidade, os seus serviços, valores e utilização sustentável.
Estes incluirão a medição da pegada ambiental de produtos e organizações, nomeadamente através de abordagens do ciclo de vida e da contabilidade do capital natural. Neste contexto, a Comissão apoiará o estabelecimento de uma iniciativa internacional em matéria de contabilidade do capital natural.
3.3.4.Melhorar os conhecimentos, a educação e as competências
A luta contra a perda de biodiversidade deve ser apoiada por uma ciência robusta. O investimento na investigação, na inovação e no intercâmbio de conhecimentos será fundamental para recolher os melhores dados e desenvolver as melhores soluções baseadas na natureza. A investigação e a inovação podem testar e desenvolver formas de dar prioridade às soluções «verdes» em detrimento das «cinzentas» e ajudar a Comissão a apoiar investimentos em soluções baseadas na natureza, por exemplo em zonas industriais ultrapassadas, com baixos rendimentos ou atingidas por catástrofes.
A nova Agenda de Competências desempenhará um papel fundamental na transição para uma economia verde e na luta contra a perda de biodiversidade, centrando-se na formação e requalificação da força de trabalho numa vasta gama de setores.
O futuro programa Horizonte Europa incluirá uma agenda estratégica de investigação a longo prazo para a biodiversidade, com um maior financiamento e com um mecanismo de política científica para opções de investigação destinadas a aumentar a taxa de cumprimento dos compromissos em matéria de biodiversidade. As missões do Horizonte Europa
contribuirão significativamente para colmatar as lacunas de conhecimento e encontrar soluções para melhorar a saúde dos ecossistemas e a contribuição destes para a saúde humana.
Paralelamente, a Comissão irá promover e facilitar as parcerias, incluindo uma parceria específica para a biodiversidade, a fim de fazer a ponte entre a ciência, a política e a prática e fazer com que as soluções baseadas na natureza se tornem uma realidade no terreno. A Comissão irá também estabelecer, em 2020, um novo centro de conhecimento para a biodiversidade, em estreita colaboração com a Agência Europeia do Ambiente. Este centro terá as seguintes competências: i) acompanhamento e avaliação dos progressos realizados pela UE e pelos seus parceiros, nomeadamente no que se refere à aplicação dos instrumentos internacionais relacionados com a biodiversidade; ii) promoção da cooperação e da parceria, nomeadamente entre cientistas do clima e da biodiversidade; iii) apoio à elaboração de políticas. Além disso, a Comissão reforçará o seu apoio à Plataforma Intergovernamental Científica e Política sobre a Biodiversidade e os Serviços Ecossistémicos.
A fim de contribuir para a integração curricular da biodiversidade e dos ecossistemas na escola, no ensino superior e na formação profissional, a Comissão irá propor, em 2021, uma recomendação do Conselho sobre o incentivo à cooperação no domínio da educação para a sustentabilidade ambiental. Esta medida proporcionará orientações destinadas às escolas e aos professores sobre a forma de cooperar e trocar experiências de vários Estados-Membros relativas ao ensino da biodiversidade. A Comissão fornecerá também materiais de apoio e facilitará o intercâmbio de boas práticas nas redes da UE de programas de formação de professores.
4.A União Europeia a favor de uma agenda mundial ambiciosa para a biodiversidade
A biodiversidade é uma prioridade da ação externa da UE e parte integrante dos esforços para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Será integrada em todos os compromissos bilaterais e multilaterais, através da «diplomacia do Pacto Ecológico» da UE e das futuras alianças verdes
. A Comissão trabalhará em estreita colaboração com o Parlamento Europeu e os Estados-Membros para assegurar um nível elevado de ambição da UE e mobilizar todos os esforços para o bem da biodiversidade mundial.
4.1.Aumentar o nível de ambição e compromisso a nível mundial
A proteção da biodiversidade é um desafio mundial e a próxima década será decisiva. Os esforços desenvolvidos a nível mundial no âmbito da Convenção das Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica têm sido, em grande medida, insuficientes. A natureza não é compatível com meias medidas ou falta de ambição.
Neste espírito, a UE está pronta a liderar todos os esforços — trabalhando com parceiros que partilham os mesmos valores, reunidos numa coligação de elevada ambição para a biodiversidade — para chegar a acordo sobre um novo quadro mundial ambicioso para o período pós-2020 na 15.ª sessão da Conferência das Partes na Convenção sobre a Diversidade Biológica, que se avizinha.
Pela presente estratégia, a Comissão propõe que a UE leve compromissos ambiciosos à mesa de negociações. A UE deve também apoiar os governos e as partes interessadas de todo o mundo, para que estes aumentem significativamente os seus níveis de ambição e as suas ações.
A Comissão propõe que a UE assegure que o quadro mundial para o período pós-2020 inclua, no mínimo, os seguintes elementos:
·Metas mundiais globais em matéria de biodiversidade para 2050, em consonância com a Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável e a visão de «viver em harmonia com a natureza». A ambição deve ser que, até 2050, todos os ecossistemas do mundo sejam restaurados, resilientes e adequadamente protegidos. A humanidade deve comprometer-se com o princípio dos ganhos líquidos, de modo a devolver à natureza mais do que dela retira. A comunidade internacional deve empenhar-se em impedir a extinção de espécies provocada pelo ser humano, pelo menos quando evitável.
·Metas mundiais ambiciosas para 2030, em consonância com os compromissos da UE definidos na presente estratégia. Essas metas devem abordar claramente os fatores determinantes da perda de biodiversidade e ser específicas, mensuráveis, exequíveis, pertinentes e calendarizadas.
·Um processo de aplicação, monitorização e revisão muito mais forte. As partes devem rever as suas estratégias e planos de ação nacionais em matéria de biodiversidade até ao final de 2021 ou, no mínimo, apresentar compromissos nacionais para os objetivos mais importantes. Deve haver um ciclo regular de revisão para analisar os progressos no sentido da consecução das metas, com capacidade de acelerar as ações, se necessário. Essas revisões devem basear-se em análises de lacunas e previsões independentes e assentes em dados científicos, com indicadores gerais comuns para todas as partes.
·Um quadro propiciador que permita concretizar a ambição em domínios como o financiamento, a capacidade, a investigação, a inovação e a tecnologia.
·Partilha justa e equitativa dos benefícios da utilização dos recursos genéticos associados à biodiversidade.
·Um princípio de igualdade, que inclua o respeito dos direitos dos povos indígenas e das comunidades locais e a sua participação plena e efetiva no processo. Deve haver uma abordagem inclusiva com a participação de todas as partes interessadas, nomeadamente as mulheres, os jovens, a sociedade civil, as autoridades locais, o setor privado, o meio académico e as instituições científicas.
4.2.Recorrer à ação externa para promover a ambição da UE
4.2.1.Governação internacional dos oceanos
Em conformidade com a agenda de governação internacional dos oceanos
, a UE apoiará a conclusão, até ao final de 2020, de um instrumento internacional ambicioso e juridicamente vinculativo sobre a biodiversidade marinha das zonas situadas além da jurisdição nacional (BBNJ). Este instrumento deve definir procedimentos claros a nível mundial para identificar, designar e gerir eficazmente áreas marinhas protegidas ecologicamente representativas no alto mar. Deve ser ratificado e aplicado o mais rapidamente possível.
A UE deve também utilizar todas as suas capacidades diplomáticas e de sensibilização para ajudar a chegar a acordo sobre a designação de três vastas áreas marinhas protegidas nos mares do Sul
, duas das quais — na Antártida Oriental e no mar de Weddell — são copropostas da UE. Se assim for acordado, tal designação constituirá um dos maiores atos de proteção da natureza na história.
Prosseguirão os trabalhos com os países parceiros e as organizações regionais para pôr em prática medidas destinadas a proteger e a utilizar de forma sustentável espécies e ecossistemas marinhos sensíveis, nomeadamente em zonas situadas além da jurisdição nacional, com destaque para os pontos críticos da biodiversidade marinha. A UE deve continuar a apoiar os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento e outros países parceiros relevantes para que participem em reuniões das organizações e organismos regionais e mundiais e apliquem os compromissos e regulamentos internacionais pertinentes.
A UE aplicará uma tolerância zero à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada e combaterá a sobrepesca, nomeadamente nas negociações da Organização Mundial do Comércio sobre um acordo mundial para proibir os subsídios prejudiciais à pesca.
Nas negociações internacionais, a UE deve defender que os minerais das zonas do fundo marinho internacional não podem ser explorados antes de os efeitos da extração mineira marítima no meio marinho, na biodiversidade e nas atividades humanas terem sido suficientemente investigados, os riscos serem compreendidos e as tecnologias e práticas operacionais poderem demonstrar que não existem danos graves para o ambiente, em conformidade com o princípio da precaução
e tendo em conta o apelo do Parlamento Europeu
. Paralelamente, a UE continuará a financiar a investigação sobre o impacto das atividades mineiras marítimas e sobre tecnologias respeitadoras do ambiente. A UE deve igualmente defender uma maior transparência em organismos internacionais como a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos.
4.2.2.Política comercial
A política comercial apoiará ativamente a transição ecológica e fará parte dela. Neste espírito, a Comissão assegurará a plena aplicação e o cumprimento das disposições em matéria de biodiversidade em todos os acordos comerciais, nomeadamente por meio do responsável pelo comércio da UE. A Comissão avaliará melhor o impacto dos acordos comerciais na biodiversidade e, caso se justifique, estabelecerá medidas de acompanhamento para reforçar as disposições em matéria de biodiversidade dos acordos atuais e futuros. A Comissão apresentará também, em 2021, uma proposta legislativa e outras medidas destinadas a evitar ou minimizar a colocação de produtos associados à desflorestação ou à degradação das florestas no mercado da UE
, bem como a promover importações e cadeias de valor compatíveis com as florestas. A Comissão tomará uma série de medidas para combater o comércio ilegal de espécies selvagens. Este comércio contribui para o declínio ou a extinção de espécies inteiras, é o quarto mercado negro mais lucrativo do mundo e é considerado uma das causas subjacentes ao aparecimento de doenças zoonóticas. Desmantelar este comércio é uma obrigação humana, económica e ambiental.
Nesta perspetiva, a Comissão irá rever o Plano de Ação da UE contra o Tráfico de Animais Selvagens em 2021 e propor um novo reforço das regras do comércio de marfim da UE ainda este ano. Explorará uma possível revisão da Diretiva Criminalidade Ambiental, nomeadamente analisando a possibilidade de alargar o seu âmbito de aplicação e de introduzir disposições específicas relativas a tipos e níveis de sanções penais. Irá ponderar o reforço das capacidades de coordenação e de inquérito do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) para que este possa trabalhar em colaboração com os Estados-Membros e os países terceiros, a fim de impedir o comércio ilícito e a entrada de produtos ilícitos no mercado único.
A Comissão continuará a colaborar com os países parceiros para assegurar uma transição harmoniosa e justa, mobilizando, nomeadamente, a assistência no âmbito do comércio, a fim de assegurar que os parceiros colham os benefícios de um comércio compatível com a biodiversidade.
4.2.3.Cooperação internacional, política de vizinhança e mobilização de recursos
A realização de um quadro mundial ambicioso para a biodiversidade pós-2020 exigirá uma maior cooperação com os parceiros, um maior apoio e financiamento e a eliminação progressiva dos subsídios prejudiciais à biodiversidade. Na última década, a UE e os seus Estados-Membros mantiveram coletivamente o seu compromisso de duplicar os fluxos financeiros para os países em desenvolvimento destinados à ação em matéria de biodiversidade
. A UE está disposta a continuar a trabalhar em colaboração com os seus parceiros e a aumentar o seu apoio após 2020, o que fará parte do seu trabalho de conservação, restauro, utilização sustentável e integração da biodiversidade em todas as políticas de desenvolvimento e parceria. Além disso, ao integrar a coerência das políticas para o desenvolvimento sustentável em todas as suas políticas, a UE reduzirá a pressão sobre a biodiversidade em todo o mundo. Em todas as suas atividades de cooperação internacional, a UE deve promover práticas e ações sustentáveis no domínio da agricultura e das pescas, a fim de proteger e restaurar as florestas mundiais. Será também prestada especial atenção à gestão sustentável dos recursos hídricos, à recuperação de terrenos degradados e à proteção e restauração de zonas ricas em biodiversidade com elevado potencial de serviços ecossistémicos e de atenuação das alterações climáticas. Uma melhor proteção dos ecossistemas naturais, juntamente com esforços para reduzir o comércio e o consumo de espécies selvagens, ajudará também a prevenir e a reforçar a resiliência a futuras doenças e pandemias. A UE reforçará o seu apoio aos esforços mundiais para aplicar o conceito de Uma Só Saúde
, que reconhece a ligação intrínseca entre a saúde humana, a saúde animal e uma natureza resiliente e bem conservada.
A UE intensificará o apoio aos países parceiros de todo o mundo para alcançar as novas metas mundiais, combater a criminalidade ambiental e enfrentar os fatores de perda da biodiversidade. Em África, a UE lançará a iniciativa NaturAfrica, que visa a proteção da vida selvagem e dos principais ecossistemas, ao mesmo tempo que oferece às populações locais oportunidades em setores favoráveis ao ambiente. Serão desenvolvidos projetos semelhantes noutras regiões. A UE apoiará igualmente os países dos Balcãs Ocidentais e os países da Vizinhança da UE nos seus esforços para proteger a biodiversidade.
Em todo o seu trabalho, a UE irá reforçar as ligações entre a proteção da biodiversidade e os direitos humanos, o género, a saúde, a educação, a sensibilidade aos conflitos, a abordagem baseada nos direitos, a propriedade fundiária e o papel dos povos indígenas e das comunidades locais.
No âmbito dos seus esforços a nível mundial, a UE promoverá coligações a favor da biodiversidade com os parceiros e a sociedade civil em todo o mundo. Por exemplo, em março de 2020, a Comissão lançou a Coligação Mundial para a Biodiversidade, a qual reúne parques nacionais, aquários, jardins botânicos, jardins zoológicos e museus de história natural e ciência, a fim de contribuir para a sensibilização, a nível mundial, para a necessidade de proteger e fomentar a biodiversidade. A Comissão considerará a possibilidade de lançar ou aderir a outras coligações de elevada ambição, para ajudar a desenvolver o quadro para o período pós-2020.
5.Conclusões
A proteção e a restauração da biodiversidade são a única forma de preservar a qualidade e a continuidade da vida humana na Terra. Os compromissos propostos na presente estratégia abrem caminho a mudanças ambiciosas e necessárias, mudanças essas que garantirão o bem-estar e a prosperidade económica das gerações presentes e futuras, num ambiente saudável. A concretização destes compromissos terá em conta a diversidade de desafios nos vários setores, regiões e Estados-Membros. Reconhece a necessidade de assegurar a justiça social, a equidade e a inclusão, em conformidade com o Pilar Europeu dos Direitos Sociais. Exigirá ainda um sentido de responsabilidade e fortes esforços conjuntos da UE, dos seus Estados-Membros, das partes interessadas e dos cidadãos.
A Comissão convida o Parlamento Europeu e o Conselho a subscreverem a presente estratégia, na perspetiva da 15.ª sessão da Conferência das Partes na Convenção sobre a Diversidade Biológica. A fim de assegurar a plena apropriação política desta estratégia, a Comissão proporá que o ponto da situação seja sistematicamente incluído na ordem de trabalhos do Conselho e do Parlamento Europeu. A Comissão irá rever a estratégia até 2024, a fim de avaliar os progressos e a eventual necessidade de novas medidas para cumprir os seus objetivos.