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Document 62021CJ0664

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 2 de março de 2023.
    Nec Plus Ultra Cosmetics AG contra Republika Slovenija.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Vrhovno sodišče Republike Slovenije.
    Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 138.o, n.o 1, — Isenções relacionadas com as operações intracomunitárias — Entrega de bens — Princípios da neutralidade fiscal, da eficácia e da proporcionalidade — Cumprimento dos requisitos substanciais — Prazo de apresentação das provas.
    Processo C-664/21.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:142

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

    2 de março de 2023 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 138.o, n.o 1, — Isenções relacionadas com as operações intracomunitárias — Entrega de bens — Princípios da neutralidade fiscal, da eficácia e da proporcionalidade — Cumprimento dos requisitos substanciais — Prazo de apresentação das provas»

    No processo C‑664/21,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Vrhovno sodišče (Supremo Tribunal, Eslovénia), por Decisão de 13 de outubro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 5 de novembro de 2021, no processo

    Nec Plus Ultra Cosmetics AG

    contra

    Republika Slovenija

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

    composto por: D. Gratsias, presidente de secção, I. Jarukaitis e Z. Csehi (relator), juízes,

    advogado‑geral: P. Pikamäe,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Nec Plus Ultra Cosmetics AG, por I. Kranjec, odvetnik,

    em representação da Comissão Europeia, por J. Jokubauskaitė e B. Rous Demiri, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 131.o e 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1), bem como dos princípios da neutralidade fiscal, da eficácia e da proporcionalidade.

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Nec Plus Ultra Cosmetics AG (a seguir «Nec») à Republika Slovenija (República da Eslovénia), representada pelo Ministrstvo za finance (Ministério das Finanças, Eslovénia), a respeito de uma liquidação adicional do imposto sobre o valor acrescentado (IVA).

    Quadro jurídico

    Direito da União

    3

    O artigo 131.o da Diretiva 2006/112, única disposição do capítulo 1 do seu título IX, intitulado «Isenções», dispõe:

    «As isenções previstas nos Capítulos 2 a 9 aplicam‑se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados‑Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.»

    4

    O artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva, que se insere no capítulo 4 do seu título IX, tem a seguinte redação:

    «Os Estados‑Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respetivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.»

    Direito esloveno

    5

    O artigo 46.o, n.o 1, da zakon o davku na dodano vrednost (Lei relativa ao Imposto sobre o Valor Acrescentado), de 4 de fevereiro de 2011 (Uradni list RS, n.o 13/11), na sua versão aplicável à data dos factos no processo principal, previa:

    «Estão isentas de IVA:

    1.

    As entregas de bens expedidos ou transportados pelo vendedor, ou pela pessoa que recebe a mercadoria, ou por outra pessoa por conta de uma ou outra das pessoas anteriormente referidas, provenientes do território esloveno para outro Estado‑Membro, quando sejam efetuadas a favor de outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, agindo nessa qualidade nesse outro Estado‑Membro.»

    6

    O artigo 140.o da zakon o davčnem postopku (Lei relativa ao Processo Tributário) (Uradni list RS, n.o 13/11) (a seguir «ZDavP‑2») dispõe:

    «(1)   No prazo de dez dias a contar da conclusão da inspeção fiscal, a autoridade tributária lavra um auto de notícia, que notifica em seguida ao sujeito passivo. O auto expõe a situação de facto verificada, que compreende todos os factos e as circunstâncias pertinentes para a decisão. O auto notifica o sujeito passivo do imposto da possibilidade de apresentar novos factos e elementos de prova que serão tomados em consideração, nos termos do n.o 2 do presente artigo. O sujeito passivo pode apresentar observações sobre o auto no prazo máximo de 20 dias após a notificação deste último, devendo o sujeito passivo ser informado dessa faculdade no próprio auto. O prazo para apresentar observações é prorrogado mediante pedido apresentado pelo sujeito passivo do imposto antes do termo desse prazo, desde que haja motivos justificados para a prorrogação. A prorrogação do prazo é objeto de decisão. Não são permitidas outras prorrogações do prazo.

    (2)   Nas suas observações sobre o auto referido no n.o 1 do presente artigo, o sujeito passivo pode apresentar novos factos e elementos de prova, mas deve expor as razões pelas quais não os apresentou antes da elaboração do auto. A autoridade tributária lavra um auto complementar no prazo de 30 dias a contar da receção das observações, quando estas incidam sobre o montante da obrigação fiscal. Os novos factos e elementos de prova apenas são tomados em consideração se já existissem antes da emissão do auto e se, por um motivo justificado, o sujeito passivo não os tivesse podido invocar ou apresentar antes da emissão do auto. O n.o 1 do presente artigo aplica‑se à notificação e apresentação de observações sobre o auto complementar.»

    7

    Nos termos do artigo 141.o, n.o 1, da ZDavP‑2:

    «Após a conclusão da inspeção fiscal, a autoridade tributária emite uma nota de liquidação na aceção do artigo 84.o da presente lei ou uma decisão que declara irregularidades que não incidem sobre o montante da obrigação tributária.»

    8

    O artigo 238.o, n.o 3, da zakon o splošnem upravnem postopku (Lei Geral do Procedimento Administrativo) (Uradni list RS, n.o 24/06) prevê:

    «No seu recurso administrativo, o recorrente pode invocar novos factos e novos elementos de prova, mas deve expor as razões pelas quais não os invocou perante o órgão de primeira instância. Os factos novos e os elementos de prova novos só podem ser tomados em consideração como fundamentos do recurso se já existissem no momento da decisão de primeira instância e se, por um motivo justificado, a parte não os tivesse podido invocar ou apresentar em sede de discussão do litígio.»

    9

    O artigo 52.o da zakon o upravnem sporu (Lei do Contencioso Administrativo) (Uradni list RS, n.o 105/06) dispõe:

    «No recurso contencioso, o recorrente pode invocar novos factos e novos elementos de prova, mas deve expor as razões pelas quais não os invocou no decurso do procedimento de adoção do ato administrativo. Os factos novos e os elementos de prova novos só podem ser tomados em consideração como fundamentos do recurso se já existissem no momento da decisão de primeira instância no procedimento de adoção do ato administrativo e se, por um motivo justificado, a parte não os tivesse podido invocar ou apresentar durante o procedimento de adoção do ato administrativo.»

    Litígio no processo principal e questão prejudicial

    10

    A recorrente no processo principal, a NEC, é uma sociedade com sede na Suíça. Em 2017 forneceu produtos cosméticos a um cliente estabelecido na Croácia e, num caso, a um cliente estabelecido na Roménia. Segundo as afirmações da NEC, estas mercadorias, que se encontravam num entreposto na Eslovénia, foram recebidas por um comprador na Croácia ou por um terceiro, agindo por conta do comprador, e transportadas da Eslovénia para outro Estado‑Membro, de modo que as entregas em questão beneficiaram da isenção do pagamento do IVA prevista para a entrega de bens no território da União pelo artigo 46.o, n.o 1, da ZDDV‑1.

    11

    No âmbito de um procedimento de inspeção fiscal do IVA devido relativamente ao ano de 2017, a Finančna Uprava Republike Slovenije (Administração Fiscal da República da Eslovénia, a seguir «Autoridade Tributária de primeira instância») verificou junto da NEC os documentos comprovativos e os documentos relativos às entregas de bens e às prestações de serviços efetuadas noutros Estados‑Membros. Por Decisão de 14 de fevereiro de 2019, a referida autoridade convidou a recorrente a apresentar todos os documentos relativos às entregas em causa.

    12

    Em resposta a esta decisão, a NEC apresentou faturas e cópias de guias de remessa que demonstravam a existência de transportes de bens da Eslovénia para outro Estado‑Membro. As notas de entrega e outros documentos mencionados nas guias de remessa não tinham, nesta fase, sido apresentados à Autoridade Tributária de primeira instância, tendo a NEC indicado que não tinha todos os documentos e estava a tentar obtê‑los.

    13

    Em 1 de abril de 2019, a Autoridade Tributária de primeira instância lavrou um auto de notícia relativo ao procedimento de inspeção fiscal e notificou‑o à NEC. Nas suas observações sobre o auto, apresentadas no prazo fixado para esse efeito, a NEC apresentou cópias de orçamentos e de notas de entrega, segundo os quais os bens em causa tinham sido entregues num Estado‑Membro diferente da Eslovénia. Além disso, a NEC justificou a apresentação tardia dessas provas, alegando que o seu gabinete de Hamburgo (Alemanha), que era responsável pelas entregas na Croácia, tinha cessado as suas atividades em agosto de 2018 e não lhe tinha enviado toda a documentação necessária no prazo fixado.

    14

    Em 30 de maio de 2019, a Autoridade Tributária de primeira instância adotou uma nota de liquidação, que encerrou o procedimento administrativo de primeira instância, através da qual exigiu à NEC o pagamento de um montante complementar de IVA relativo ao ano de 2017. Para este efeito, constatou que a NEC não tinha demonstrado, através de faturas e de guias de remessa, que os bens em causa tinham efetivamente sido transportados para outro Estado‑Membro que não a Eslovénia. Considerou, portanto, que as condições de isenção do IVA sobre as entregas em causa não estavam preenchidas. Neste contexto, não teve em conta, devido à sua apresentação tardia e em aplicação do artigo 140.o, n.o 2, da ZDavP‑2, os elementos de prova apresentados na sequência da emissão do auto.

    15

    A reclamação apresentada pela NEC contra a nota de liquidação foi indeferida pelo Ministério das Finanças, agindo na qualidade de Autoridade Tributária de segunda instância, que confirmou a análise feita pela Autoridade Tributária de primeira instância. Do mesmo modo, o recurso interposto pela NEC contra a decisão deste ministério foi julgado improcedente por acórdão do Upravno sodišče (Tribunal Administrativo, Eslovénia), por motivos semelhantes aos decorrentes das decisões das autoridades fiscais.

    16

    Em seguida, a NEC pediu autorização para interpor recurso dessa decisão no Vrhovno sodišče (Supremo Tribunal, Eslovénia), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Por Decisão de 18 de novembro de 2020, este deu provimento parcial a esse pedido, nomeadamente para resolver uma questão jurídica, que considerava importante, e que era a de saber se a caducidade prevista no artigo 140.o, n.o 2, da ZDavP‑2, que incide sobre a produção de prova num processo fiscal após a emissão de um auto de inspeção fiscal, pode prevalecer sobre o princípio da neutralidade do sistema do IVA.

    17

    O Vrhovno sodišče (Supremo Tribunal) salienta que a Diretiva 2006/112 não fixa a data em que um fornecedor de bens deixa de poder apresentar provas no âmbito de um procedimento administrativo ou de um processo judicial, para demonstrar que estão preenchidas as condições da isenção de IVA prevista no artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva. Salienta igualmente que o artigo 131.o da referida diretiva prevê unicamente que as isenções previstas nos capítulos 2 a 9 da mesma diretiva se aplicam nas condições fixadas pelos Estados‑Membros.

    18

    Neste contexto, esse órgão jurisdicional faz referência, nomeadamente, ao processo que deu origem ao Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing (C‑294/20, EU:C:2021:723), no qual o Tribunal de Justiça abordou uma questão semelhante. No entanto, o quadro factual e regulamentar existente neste processo não é substancialmente comparável ao do litígio no processo principal. Por conseguinte, o referido órgão jurisdicional interroga‑se sobre se a solução adotada nesse acórdão também pode ser aplicada neste litígio.

    19

    A este respeito, considera que, no litígio de que é chamado a conhecer, o princípio da segurança jurídica está suficientemente protegido pelos prazos de caducidade previstos para a interposição de um recurso após a adoção da nota de liquidação e pelo regime aplicável à tomada em consideração de novos factos e elementos de prova no âmbito do procedimento administrativo de reclamação e do processo contencioso administrativo.

    20

    Nestas circunstâncias, o Vrhovno sodišče (Supremo Tribunal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «As disposições da Diretiva IVA, nomeadamente o artigo 131.o, o artigo 138.o, n.o 1, bem como os princípios do direito da União, em particular os princípios da neutralidade fiscal, da efetividade e da proporcionalidade, opõem‑se a uma legislação nacional que proíbe a apresentação e a tomada em consideração de novos elementos de prova destinados a demonstrar o preenchimento dos requisitos substanciais do artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva IVA no procedimento administrativo de primeira instância, mais concretamente nas observações apresentadas sobre o auto de inspeção fiscal emitido antes da emissão de uma nota de liquidação fiscal?»

    Quanto à questão prejudicial

    21

    Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 131.o e 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, lidos em conjugação com os princípios da neutralidade fiscal, da efetividade e da proporcionalidade, se opõem a uma legislação nacional que proíbe a apresentação e a tomada em consideração de novos elementos de prova que demonstrem o preenchimento dos requisitos substanciais previstos no artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva, durante o procedimento administrativo que conduziu à adoção da nota de liquidação, em particular após as operações de inspeção fiscal, mas antes da adoção dessa nota.

    22

    Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de direito a dedução do IVA que o sistema comum do IVA deve garantir a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente dos respetivos fins ou resultados, desde que essas atividades estejam, em princípio, elas próprias sujeitas a IVA [v., neste sentido, Acórdão de 18 de novembro de 2020, Comissão/Alemanha (Reembolso de IVA — Faturas), C‑371/19, não publicado, EU:C:2020:936, n.o 77].

    23

    O Tribunal de Justiça decidiu, reiteradamente, que o direito a dedução e, consequentemente, ao reembolso faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Este direito é exercido imediatamente sobre todos os impostos que oneraram as operações efetuadas a montante [Acórdão de 18 de novembro de 2020, Comissão/Alemanha (Reembolso de IVA — Faturas), C‑371/19, não publicado, EU:C:2020:936, n.o 79 e jurisprudência referida].

    24

    Ainda em matéria de direito a dedução do IVA, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução ou o reembolso do IVA pago a montante seja concedido se os requisitos substanciais tiverem sido cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. No entanto, isto pode não ser assim, se a violação desses requisitos formais tiver o efeito de impedir a produção da prova inquestionável de que os requisitos substanciais foram cumpridos [Acórdão de 18 de novembro de 2020, Comissão/Alemanha (Reembolso de IVA — Faturas), C‑371/19, não publicado, EU:C:2020:936, n.os 80 e 81 e jurisprudência referida].

    25

    Estas considerações são igualmente válidas no que respeita às regras que determinam as operações tributáveis em IVA, e mais particularmente às relativas à isenção de tais operações como as que figuram nos artigos 131.o e 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, relativas à isenção das entregas intracomunitárias.

    26

    A este respeito, o artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 prevê que os Estados‑Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respetivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

    27

    Como resulta da decisão de reenvio, o litígio no processo principal não diz respeito à violação de requisitos formais que impedem a prova de que os requisitos substanciais do direito à isenção do IVA nas entregas de bens em causa foram cumpridos, mas à data em que essa prova pode ser apresentada.

    28

    A este propósito importa lembrar que o Tribunal de Justiça decidiu, no que respeita às disposições da Oitava Diretiva 79/1072/CEE do Conselho, de 6 de dezembro de 1979, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Regras sobre o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado aos sujeitos passivos não estabelecidos no território do país (JO 1979, L 331, p. 11, a seguir «Oitava Diretiva IVA»), atinentes ao direito ao reembolso do IVA, que não obstam a uma legislação nacional por força da qual o direito ao reembolso do IVA pode ser recusado quando um sujeito passivo não fornece, sem justificação razoável e não obstante os pedidos de informação que lhe foram dirigidos, os documentos que permitam demonstrar que estão preenchidos os requisitos substanciais para obter esse reembolso, antes de a Administração Tributária adotar a sua decisão. Todavia, estas mesmas disposições não obstam a que os Estados‑Membros admitam a apresentação desses elementos de prova após essa decisão (Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 58).

    29

    O Tribunal de Justiça decidiu também que, uma vez que não é regulada pela Oitava Diretiva IVA, a instauração de medidas nacionais que recusem ter em conta os elementos de prova apresentados após a decisão que indefere um pedido de reembolso ter sido adotada cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro, por força do princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros, desde que, todavia, não sejam menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes de natureza interna (princípio da equivalência) e não tornem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 59).

    30

    Com este fundamento, o Tribunal de Justiça declarou que as disposições da Oitava Diretiva IVA e os princípios do direito da União, em especial o princípio da neutralidade fiscal, não obstam a que um pedido de reembolso do IVA seja indeferido quando o sujeito passivo não tenha apresentado à Administração Tributária competente, nos prazos estabelecidos, mesmo a pedido desta, todos os documentos e informações exigidos para provar o seu direito ao reembolso do IVA, independentemente de o sujeito passivo ter apresentado, por iniciativa própria, esses documentos e informações no âmbito da reclamação administrativa ou do recurso jurisdicional contra a decisão que indefere esse direito a reembolso, desde que os princípios da equivalência e da efetividade sejam respeitados (Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 63 e dispositivo).

    31

    Há que considerar que esta jurisprudência é aplicável, por analogia, às disposições da Diretiva 2006/112 relativas à isenção das entregas de bens expedidos ou transportados para fora do território de um Estado‑Membro mas na União, em especial ao artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva.

    32

    Por conseguinte, tendo em conta o artigo 131.o da Diretiva 2006/112, segundo o qual as isenções previstas nos capítulos 2 a 9 desta diretiva, das quais faz parte a isenção prevista no artigo 138.o, n.o 1, da mesma, se aplicam sem prejuízo de outras disposições do direito da União e nas condições fixadas pelos Estados‑Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso, a instauração de medidas nacionais que recusem ter em conta os elementos de prova apresentados, como no litígio no processo principal, no âmbito de uma liquidação adicional do IVA, cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro, por força do princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros, desde que, todavia, não sejam menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes de natureza interna (princípio da equivalência) e não tornem impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (v., por analogia, Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 59 e jurisprudência referida).

    33

    No que respeita, em primeiro lugar, ao princípio da efetividade, importa salientar que a possibilidade de apresentar provas suplementares, no quadro de um processo de liquidação adicional do IVA, sem nenhuma limitação no tempo iria contra o princípio da segurança jurídica, que exige que a situação fiscal do sujeito passivo, atentos os seus direitos e obrigações para com a Administração Tributária, não seja indefinidamente suscetível de ser posta em causa (v., por analogia, Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 60 e jurisprudência referida).

    34

    No entanto, há que salientar que a não tomada em consideração dos elementos de prova que demonstram que as condições para a isenção do IVA das entregas intracomunitárias de bens estão preenchidas conduz a uma situação em que o princípio da neutralidade fiscal, cuja importância para o sistema comum do IVA foi recordada nos n.os 28 a 30 do presente acórdão e que não pode, em princípio, ser limitado, é violado pelas atividades económicas em causa.

    35

    Daqui resulta que, embora o direito à isenção do IVA possa ser recusado em determinadas situações, nomeadamente devido à apresentação tardia, pelo operador económico em causa, dos elementos de prova necessários para demonstrar a existência desse direito após várias insistências infrutíferas da Administração Fiscal e quando o processo já se encontrava numa fase contenciosa, como no processo que deu origem ao Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing (C‑294/20, EU:C:2021:723), não deixa de ser verdade que, quando a Administração Fiscal recusa a um sujeito passivo o benefício da isenção do IVA numa fase inicial do procedimento de tributação, deve garantir o respeito estrito do princípio da neutralidade fiscal.

    36

    Assim, se numa situação em que a Administração Fiscal ainda não adotou uma nota de liquidação relativamente a um sujeito passivo na data em que este fornece elementos de prova adicionais que sustentam o direito que reivindica, a recusa de tomar em consideração esses elementos pode, é certo, ser oposta a esse sujeito passivo, mas deve basear‑se em circunstâncias particulares como, nomeadamente, a falta de qualquer justificação do atraso sofrido ou o facto de o atraso ter causado perdas de receitas fiscais.

    37

    Com efeito, a recusa de tomar em consideração elementos de prova numa data que se situa antes da adoção dessa nota de liquidação é suscetível de tornar excessivamente difícil o exercício dos direitos reconhecidos pela ordem jurídica da União, na medida em que essa recusa restringe a possibilidade de o sujeito passivo apresentar elementos de prova relativos ao preenchimento dos requisitos substanciais que permitem obter uma isenção do IVA. Uma legislação nacional que, nesta fase do procedimento de tributação, não permite ao sujeito passivo fornecer as provas ainda em falta para fundamentar o direito que reivindica, e que não tem em conta eventuais explicações sobre as razões pelas quais essas provas não foram fornecidas mais cedo afigura‑se dificilmente conciliável com o princípio da proporcionalidade e também com o princípio fundamental da neutralidade do IVA.

    38

    No caso em apreço, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, à luz das considerações precedentes, se a recusa de tomar em consideração esses elementos é ou não conforme com o princípio da efetividade.

    39

    Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio deve, nomeadamente, ter em conta o facto de que, segundo as suas próprias indicações, o auto da inspeção fiscal não encerrar o respetivo procedimento e constituir apenas um ato processual intermédio que visa unicamente informar o sujeito passivo da situação factual estabelecida pela Autoridade Tributária de primeira instância e da possibilidade de apresentar observações.

    40

    Quanto à observação da recorrente no processo principal, segundo a qual a República da Eslovénia tinha recentemente tomado medidas para alterar a legislação nacional em causa no processo principal, tendo esta alteração, em seu entender, nomeadamente por objetivo revogar a disposição que prevê que os novos factos e elementos de prova só são tidos em conta se existiam antes da emissão do auto, não podendo o sujeito passivo, razoavelmente, mencioná‑los e apresentá‑los antes dessa emissão, basta salientar que esta parte não alega de modo algum que o quadro jurídico aplicável ao litígio no processo principal será afetado.

    41

    Em segundo lugar, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se no caso em apreço o princípio da equivalência, que exige que as disposições processuais nacionais que regulam a isenção do IVA nas entregas intracomunitárias de bens não sejam menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes sujeitas ao direito interno, é respeitado (v., por analogia, Acórdão de 9 de setembro de 2021, GE Auto Service Leasing, C‑294/20, EU:C:2021:723, n.o 62 e jurisprudência referida).

    42

    Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que os artigos 131.o e 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, lidos em conjugação com os princípios da neutralidade fiscal, da efetividade e da proporcionalidade, não se opõem a uma legislação nacional que proíbe a apresentação e a tomada em consideração de novos elementos de prova que demonstrem o preenchimento dos requisitos substanciais previstos no artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva, durante o procedimento administrativo que conduziu à adoção da nota de liquidação, em particular após as operações de inspeção fiscal, mas antes da adoção dessa nota, desde que os princípios da equivalência e da efetividade sejam respeitados.

    Quanto às despesas

    43

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

     

    Os artigos 131.o e 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, lidos em conjugação com os princípios da neutralidade fiscal, da efetividade e da proporcionalidade,

     

    devem ser interpretados no sentido de que:

     

    não se opõem a uma legislação nacional que proíbe a apresentação e a tomada em consideração de novos elementos de prova que demonstrem o preenchimento dos requisitos substanciais previstos no artigo 138.o, n.o 1, desta diretiva, durante o procedimento administrativo que conduziu à adoção da nota de liquidação, em particular após as operações de inspeção fiscal, mas antes da adoção dessa nota, desde que os princípios da equivalência e da efetividade sejam respeitados.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: esloveno.

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