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Document 62018TJ0108
Judgment of the General Court (Tenth Chamber, Extended Composition) of 24 February 2021.#Universität Koblenz-Landau v Education, Audiovisual and Culture Executive Agency.#Arbitration clause – Tempus IV Programmes – Grant agreements – Contractual nature of the dispute – Reclassification of the action – Eligible costs – Systemic and recurrent irregularities – Full repayment of amounts paid – Proportionality – Right to be heard – Obligation to state reasons – Article 41 of the Charter of Fundamental Rights.#Case T-108/18.
Acórdão do Tribunal Geral (Décima Secção alargada) de 24 de fevereiro de 2021.
Universität Koblenz-Landau contra "Agência de Execução relativa à Educação, ao Audiovisual e à Cultura".
Cláusula compromissória — Programas Tempus IV — Convenções de subvenção — Natureza contratual do litígio — Requalificação do recurso — Custos elegíveis — Irregularidades sistémicas e recorrentes — Reembolso integral dos montantes pagos — Proporcionalidade — Direito de ser ouvido — Dever de fundamentação — Artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais.
Processo T-108/18.
Acórdão do Tribunal Geral (Décima Secção alargada) de 24 de fevereiro de 2021.
Universität Koblenz-Landau contra "Agência de Execução relativa à Educação, ao Audiovisual e à Cultura".
Cláusula compromissória — Programas Tempus IV — Convenções de subvenção — Natureza contratual do litígio — Requalificação do recurso — Custos elegíveis — Irregularidades sistémicas e recorrentes — Reembolso integral dos montantes pagos — Proporcionalidade — Direito de ser ouvido — Dever de fundamentação — Artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais.
Processo T-108/18.
Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section
ECLI identifier: ECLI:EU:T:2021:104
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Décima Secção alargada)
24 de fevereiro de 2021 ( *1 )
«Cláusula compromissória — Programas Tempus IV — Convenções de subvenção — Natureza contratual do litígio — Requalificação do recurso — Custos elegíveis — Irregularidades sistémicas e recorrentes — Reembolso integral dos montantes pagos — Proporcionalidade — Direito de ser ouvido — Dever de fundamentação — Artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais»
No processo T‑108/18,
Universität Koblenz‑Landau, com sede em Mogúncia (Alemanha), representada por C. von der Lühe e I. Felder, advogados,
recorrente,
contra
Agência de Execução relativa à Educação, ao Audiovisual e à Cultura (EACEA), representada por H. Monet, na qualidade de agente, assistido por R. van der Hout e C. Wagner, advogados,
recorrida,
que tem por objeto, a título principal, um pedido, baseado no artigo 263.o TFUE, destinado à anulação das cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 da EACEA, relativas aos montantes pagos à recorrente no âmbito das convenções de subvenção celebradas para a execução de três projetos no domínio do ensino superior, e, a título subsidiário, um pedido, baseado no artigo 272.o TFUE, destinado a obter a declaração de que o direito à recuperação reclamada não existe,
O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção alargada),
composto por: S. Papasavvas, presidente, A. Kornezov (relator), E. Buttigieg, K. Kowalik‑Bańczyk e G. Hesse, juízes,
secretário: L. Ramette, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 16 de setembro de 2020,
profere o presente
Acórdão ( 1 )
Antecedentes do litígio
1 |
A recorrente, a Universität Koblenz‑Landau, é um estabelecimento de ensino superior alemão de direito público. |
2 |
Em 2008 e 2010, no âmbito dos programas de cooperação da União Europeia com países terceiros, destinados a modernizar os sistemas de ensino superior desses países, denominados Tempus IV, a recorrente assinou as três convenções de subvenção seguintes:
[Omissis] |
19 |
Por carta de 21 de dezembro de 2017 (a seguir «carta de 21 de dezembro de 2017»), a EACEA informou a recorrente de que tinha decidido recuperar o montante de 756381,89 euros a título da convenção Ecesis. No que respeita às convenções Diusas e Deque, informou a recorrente da sua intenção de apenas pedir o reembolso dos montantes que esta tinha recebido no âmbito dessas convenções como beneficiária final, excluindo, assim, os montantes por ela transferidos a cobeneficiários, cujo valor ainda tinha de comunicar à EACEA. A EACEA precisou que, se não obtivesse informações sobre os montantes pagos aos cobeneficiários a título dessas duas convenções, reclamaria o reembolso integral desses montantes ou o reembolso de um montante «mais elevado». |
20 |
Por carta de 7 de fevereiro de 2018 (a seguir «carta de 7 de fevereiro de 2018»), por um lado, a EACEA constatou que a recorrente não tinha fornecido as informações necessárias para determinar o valor dos montantes que lhe tinham sido pagos ao abrigo das convenções Diusas e Deque e que haviam sido posteriormente transferidos para outras entidades cobeneficiárias. Por outro lado, a EACEA indicou que ela própria tinha contactado essas entidades e recebido de algumas delas as informações solicitadas. Com base nas informações assim recolhidas, a EACEA fixou o montante a reembolsar em 695919,31 euros, para a convenção Diusas, e em 343525,10 euros, para a convenção Deque. A EACEA convidou a recorrente a apresentar‑lhe, sendo caso disso, as suas observações no prazo de quinze dias de calendário, precisando que, na falta dessas observações, procederia à recuperação dos montantes acima mencionados. |
21 |
A 13 de fevereiro de 2018, a EACEA enviou à recorrente uma nota de débito no montante de 756381,89 euros, a título da convenção Ecesis (a seguir «nota de débito»). |
22 |
O montante total reclamado a título das três convenções ascendia, assim, a 1795826,30 euros. |
Tramitação processual
23 |
Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de fevereiro de 2018, a recorrente interpôs o presente recurso. O processo foi dirigido contra a «Comissão […], representada pela EACEA». |
24 |
Em conformidade com a decisão do presidente do Tribunal Geral de 28 de março de 2018, o presente recurso foi considerado interposto contra a EACEA e a Comissão. |
25 |
Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de maio de 2018, a Comissão suscitou uma exceção de inadmissibilidade, nos termos do artigo 130.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, na parte em que o recurso era dirigido contra si. A recorrente apresentou as suas observações sobre esta exceção em 18 de junho de 2018. |
26 |
Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de junho de 2018, a EACEA entregou a contestação. |
27 |
Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de agosto de 2018, a recorrente entregou a réplica. |
28 |
Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de setembro de 2018, a EACEA entregou a tréplica. |
29 |
Por carta de 8 de outubro de 2018, o Tribunal Geral convidou a Comissão, em aplicação do artigo 89.o, n.o 3, alínea d), do Regulamento de Processo, a apresentar determinados documentos. A Comissão satisfez este pedido no prazo fixado. |
30 |
Por carta que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de novembro de 2018, a recorrente apresentou as suas observações sobre os documentos apresentados pela Comissão. |
31 |
Na sequência de pedidos da recorrente, o processo foi suspenso duas vezes, por decisões de 28 de fevereiro e 11 de junho de 2019, com o fundamento de que a recorrente e a EACEA tinham encetado discussões com vista a chegar a um eventual acordo amigável. |
32 |
Por decisão de 5 de setembro de 2019, foi indeferido um terceiro pedido de suspensão do processo. |
33 |
Por Despacho de 23 de outubro de 2019, Universität Koblenz‑Landau/Comissão e EACEA (T‑108/18, não publicado, EU:T:2019:768), o Tribunal Geral declarou o recurso inadmissível na parte em que era dirigido contra a Comissão e condenou a recorrente nas despesas desta instância. |
34 |
Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, por decisão do presidente do Tribunal Geral de 24 de outubro de 2019, nos termos do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, o presente processo foi reatribuído à Décima Secção. |
35 |
Nos termos do artigo 106.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a EACEA apresentou, em 6 de novembro de 2019, um pedido destinado a ser ouvida numa audiência de alegações. |
36 |
Por decisão de 11 de março de 2020, o Tribunal Geral decidiu, em aplicação do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo à Décima Secção funcionando em formação alargada de cinco juízes. |
37 |
No âmbito de medidas de organização do processo de 12 de março e 27 de maio de 2020, adotadas nos termos do artigo 89.o, n.o 3, alíneas a) e d), do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral colocou questões às partes, que lhes responderam no prazo fixado. |
38 |
Mediante proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral do processo. |
39 |
Em 16 de setembro de 2020, foram ouvidas as alegações das partes e as respostas destas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência, no termo da qual foi encerrada a fase oral do processo. |
40 |
Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de fevereiro de 2021, a recorrente solicitou a reabertura da fase oral do processo, a título do artigo 113.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, baseando‑se num despacho do Ministério Público de Coblença de 28 de dezembro de 2020, que lhe foi notificado em 28 de janeiro de 2021. Por Decisão de 4 de fevereiro de 2021, o presidente da Décima Secção alargada do Tribunal Geral indeferiu este pedido, o que foi comunicado às partes por cartas da Secretaria de 5 de fevereiro de 2021. |
Pedidos
41 |
A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
|
42 |
Na réplica, a recorrente conclui pedindo, a título subsidiário, que o Tribunal Geral se digne requalificar o presente recurso como recurso interposto com fundamento no artigo 272.o TFUE e declarar que o crédito de 756381,89 euros exigido a título da convenção Ecesis e o de 1039444,41 euros exigido a título das convenções de subvenção Diusas e Deque não existem. |
43 |
Além disso, a recorrente indicou que já não havia necessidade de apreciar o terceiro pedido apresentado na petição, na medida em que a EACEA tinha decidido suspender a recuperação dos montantes reclamados nas cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018, o que foi comunicado à recorrente por carta de 9 de abril de 2018, constante do anexo C.5 da contestação. A recorrente confirmou na audiência, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral a esse respeito, que tinha retirado o seu terceiro pedido, o que foi registado na ata da audiência. |
44 |
A EACEA conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
|
45 |
Na audiência, a EACEA declarou que renunciava ao direito de contestar a sua qualidade de recorrida e, por conseguinte, a admissibilidade do recurso na parte em que era dirigido contra ela, o que foi registado na ata da audiência. |
Questão de direito
Quanto à competência do Tribunal Geral e aos fundamentos de inadmissibilidade suscitados pela EACEA
[Omissis]
Quanto à requalificação do recurso como recurso interposto com fundamento no artigo 272.o TFUE
[Omissis]
65 |
Decorre das considerações anteriores que, por um lado, o presente recurso, interposto inicialmente com fundamento no artigo 263.o TFUE, deve ser requalificado como recurso interposto com fundamento no artigo 272.o TFUE e que, por outro, o Tribunal Geral é competente para decidir deste recurso, em conformidade com o artigo 272.o TFUE e as cláusulas compromissórias contidas no artigo I.8 da convenção Ecesis e no artigo I.9 das convenções Diusas e Deque. |
Quanto ao mérito
66 |
A recorrente invoca quatro fundamentos de recurso, relativos, o primeiro, a uma violação do direito de ser ouvido, o segundo, a uma «aplicação errada do direito europeu», o terceiro, a uma falta de fundamentação e, o quarto, a uma violação do princípio da proporcionalidade. |
67 |
Convém começar por examinar o primeiro e terceiro fundamentos, a seguir, o segundo fundamento e, por último, o quarto fundamento. |
Quanto ao primeiro e terceiro fundamentos, relativos, respetivamente, o primeiro, a uma violação do direito de ser ouvido e, o terceiro, a uma falta de fundamentação
– Quanto à invocabilidade do direito de ser ouvido e do dever de fundamentação no âmbito de um litígio de natureza contratual
68 |
A EACEA alega que o direito de ser ouvido e o dever de fundamentação não podem ser utilmente invocados no âmbito de um litígio de natureza contratual. Por conseguinte, a EACEA entende que não tinha nem a obrigação de ouvir a recorrente antes de lhe enviar as cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 8 de fevereiro de 2018 e a nota de débito, nem o dever de fundamentar estes documentos. |
69 |
Esta objeção deve ser rejeitada. |
70 |
A este propósito, importa salientar que o direito de ser ouvido e o dever de fundamentação, invocados pela recorrente no seu primeiro e terceiro fundamentos, estão consagrados no artigo 41.o, n.o 2, alíneas a) e c), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), nos termos do qual as instituições, os órgãos e os organismos da União são, por um lado, obrigados a respeitar o direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de ser tomada qualquer medida individual a seu respeito que a afete desfavoravelmente e, por outro, obrigados a fundamentar as suas decisões. |
71 |
Assim, o Tribunal Geral já teve ocasião de declarar que a Carta, que faz parte do direito primário, prevê, no seu artigo 51.o, n.o 1, sem exceção, que as suas disposições «têm por destinatários as instituições e [os] órgãos da União, na observância do princípio da subsidiariedade», e que, portanto, os direitos fundamentais se destinam a reger o exercício das competências atribuídas às instituições da União, inclusive num quadro contratual (Acórdãos de 3 de maio de 2018, Sigma Orionis/Comissão, T‑48/16, EU:T:2018:245, n.os 101 e 102, e de 3 de maio de 2018, Sigma Orionis/REA, T‑47/16, não publicado, EU:T:2018:247, n.os 79 e 80; v., também, por analogia, Acórdão de 13 de maio de 2020, Talanton/Comissão, T‑195/18, não publicado, pendente de recurso no Tribunal de Justiça, EU:T:2020:194, n.o 73). |
72 |
De igual modo, segundo o Tribunal de Justiça, quando as instituições, os órgãos ou os organismos da União executam um contrato, continuam sujeitos às obrigações que lhes incumbem por força da Carta e dos princípios gerais do direito da União (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 86). |
73 |
O Tribunal de Justiça sublinhou igualmente que, se as partes decidirem, no contrato, através de uma cláusula compromissória, atribuir ao juiz da União competência para conhecer dos litígios relativos a esse contrato, este juiz será competente, independentemente do direito aplicável estipulado no referido contrato, para apreciar as eventuais violações da Carta e dos princípios gerais do direito da União (Acórdão de 16 de julho de 2020, Inclusion Alliance for Europe/Comissão, C‑378/16 P, EU:C:2020:575, n.o 81). |
74 |
Além disso, cabe salientar que as instituições, os órgãos e os organismos da União não são inteiramente comparáveis a partes contratantes privadas, quando atuam num quadro contratual. Assim, por um lado, as subvenções por eles concedidas provêm dos fundos públicos da União, de modo que, ao concederem essas subvenções, as instituições, os órgãos e os organismos da União continuam sujeitos, nomeadamente, às exigências orçamentais decorrentes do artigo 317.o TFUE e às regras financeiras previstas a esse respeito pelo regulamento financeiro aplicável. Por outro lado, na presença de um contrato que contenha, como acontece no presente caso, uma cláusula compromissória que atribui competência ao juiz da União, a Comissão dispõe, nomeadamente, de prerrogativas exorbitantes de direito comum que lhe permitem formalizar a constituição de um crédito contratual adotando unilateralmente, com fundamento no artigo 72.o, n.o 2, do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho, de 25 de junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO 2002, L 248, p. 1), ou no artigo 79.o, n.o 2, do Regulamento n.o 966/2012, uma decisão que constitui um título executivo nos termos do artigo 299.o TFUE, cujos efeitos e força vinculativa emanam das referidas disposições (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.os 68 a 70 e 73). Além disso, cabe referir que, nos termos do artigo 108.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1605/2002 e do artigo 121.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 966/2012, uma subvenção pode ser concedida quer através de uma convenção escrita quer através de uma decisão da Comissão notificada ao beneficiário. Assim, o legislador da União previu que uma subvenção podia ser concedida tanto por via contratual como por via administrativa. Ora, as instituições, os órgãos e os organismos da União não podem, ao seu critério, eximir‑se às suas obrigações decorrentes do direito primário, incluindo da Carta, em função da sua opção por concederem subvenções através de uma convenção em vez de uma decisão. |
75 |
Consequentemente, a objeção da EACEA relativa à invocabilidade do direito de ser ouvido e do dever de fundamentação em litígios de natureza contratual deve ser rejeitada. |
– Quanto ao direito de ser ouvido
[Omissis]
78 |
Em primeiro lugar, há que verificar se a EACEA garantiu à recorrente a possibilidade de dar a conhecer, de forma útil e eficaz, o seu ponto de vista, antes de lhe comunicar as cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 e a nota de débito de 13 de fevereiro de 2018. |
79 |
Com efeito, o Tribunal de Justiça já teve ocasião de declarar que as instituições, os órgãos e os organismos da União são obrigados, em conformidade, nomeadamente, com as exigências do princípio da boa administração, a respeitar o princípio do contraditório no âmbito de um processo de auditoria como o previsto no artigo II.19 das convenções controvertidas. As instituições, os órgãos e os organismos da União devem recolher todas as informações relevantes, nomeadamente aquelas que a outra parte no contrato puder fornecer, antes de tomarem a decisão de proceder à recuperação de fundos, de emitirem uma nota de débito, de rescindirem um contrato ou de se recusarem a fazer mais pagamentos à outra parte no contrato (v., neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2015, EMA/Comissão, C‑100/14 P, não publicado, EU:C:2015:382, n.o 123). |
80 |
A este respeito, primeiro, o Tribunal Geral constata que o projeto de relatório de auditoria foi comunicado à recorrente e que a EACEA convidou esta última a apresentar a sua posição sobre as conclusões dos auditores, o que a mesma fez efetivamente, em pormenor, nas suas cartas de29 de setembro e 11 de novembro de 2016 (v. n.os 10 e 11, supra). Em particular, o projeto de relatório de auditoria referia‑se ao caráter potencialmente sistémico e recorrente das irregularidades constatadas. Nas cartas acima mencionadas, a recorrente tomou posição sobre todas as conclusões que figuravam no projeto de relatório de auditoria. |
81 |
Segundo, por carta de 26 de julho de 2017, a EACEA comunicou à recorrente o relatório final de auditoria e o relatório final do OLAF. O primeiro mencionava as observações e os elementos de prova apresentados pela recorrente nas suas cartas de 29 de setembro e 11 de novembro de 2016, em relação a cada uma das 35 conclusões financeiras (Financial Audit Findings) e das 7 conclusões relativas à gestão (Management Audit Findings), explicando, de cada vez, as apreciações feitas pelos auditores a esse respeito. |
82 |
Terceiro, na sua carta de 26 de julho de 2017, a EACEA indicou que, em razão da gravidade das irregularidades constatadas, bem como do seu caráter sistémico e recorrente, previa a recuperação da totalidade dos montantes pagos à recorrente ao abrigo das convenções controvertidas. A recorrente foi convidada a apresentar as suas observações sobre a recuperação prevista, no prazo de 60 dias. |
83 |
A recorrente respondeu a esse convite por carta de 25 de setembro de 2017 e voltou a apresentar documentos. |
84 |
Nestas circunstâncias, por carta de 21 de dezembro de 2017, a EACEA indicou, inter alia, no que respeita às convenções Diusas e Deque, a sua intenção de reclamar o reembolso de um montante correspondente àquele que a recorrente tinha recebido enquanto beneficiária final e que, devido ao facto de a recorrente não ter fornecido as informações necessárias que lhe permitiam estabelecer a realidade desse montante, não tinha outra alternativa senão determiná‑lo com base nas informações disponíveis. A EACEA informou igualmente a recorrente da sua decisão de recuperar o montante total por ela pago ao abrigo da convenção Ecesis, nos termos da qual a recorrente era a única beneficiária. |
85 |
Por carta de 7 de fevereiro de 2018, a EACEA fixou os montantes a recuperar a título das convenções Diusas e Deque com base nas informações que ela própria pôde recolher junto de certos cobeneficiários. |
86 |
Nestas circunstâncias, cabe constatar que a recorrente teve a possibilidade de dar a conhecer o seu ponto de vista, de forma útil e eficaz, e em numerosas ocasiões, antes de lhe serem comunicadas as cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018, bem como a nota de débito, tanto no que diz respeito à natureza e à extensão das irregularidades constatadas como no que diz respeito aos montantes a recuperar. |
87 |
Em segundo lugar, a recorrente alega, contudo, que lhe era impossível apresentar os originais de certas faturas, como solicitado pela EACEA na sua carta de 26 de julho de 2017, visto que, nesse momento, já não as tinha em sua posse, pois essas faturas tinham sido apreendidas no âmbito de um processo de investigação criminal em curso, conduzido pelo Ministério Público de Coblença. |
88 |
A este respeito, cabe salientar que, em princípio, a impossibilidade objetiva e comprovada, por razões não imputáveis ao interessado, de apresentar determinados documentos a pedido da EACEA pode, em certos casos, privar totalmente essa pessoa de dar a conhecer, de forma útil e eficaz, o seu ponto de vista sobre os factos objeto desses documentos, quando a não apresentação dos mesmos tenha tido impacto na determinação dos montantes objeto dos pedidos de reembolso. |
89 |
Esse não é, contudo, o caso vertente. Com efeito, embora não seja contestado que a recorrente se encontrava na impossibilidade objetiva e comprovada, por razões que não lhe são imputáveis, de apresentar as faturas originais solicitadas pela EACEA na sua carta de 26 de julho de 2017, o facto é que essa circunstância não teve nenhum impacto na determinação dos montantes objeto dos pedidos de reembolso contidos nas cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 e na nota de débito de 13 de fevereiro de 2018. |
90 |
Com efeito, por um lado, os autos revelam que a apreensão dos documentos pelo Ministério Público de Coblença ocorreu em 22 de junho de 2017, ao passo que tanto a auditoria como a investigação do OLAF tinham sido efetuadas no período de 2014 a 2016, ou seja, antes da apreensão em causa, pelo que tanto os auditores como o OLAF puderam consultar o conteúdo das faturas em causa e tirar daí as conclusões adequadas, como a recorrente admite, de resto, nas suas observações em resposta à medida de organização do processo adotada pelo Tribunal Geral em 27 de maio de 2020. De igual modo, essa apreensão ocorreu após a comunicação à recorrente do projeto de relatório de auditoria, em 22 de abril de 2016, que já continha as conclusões essenciais relativas à gestão das convenções controvertidas. Decorre do referido relatório, em particular, que as conclusões dos auditores se baseiam num exame de quase todos os custos reclamados no âmbito das convenções controvertidas (v. n.o 7, supra). Além disso, por cartas de 29 de setembro e 11 de novembro de 2016, ou seja, sempre muito antes da apreensão em causa, a recorrente apresentou as suas observações sobre as conclusões contidas no projeto de relatório de auditoria, de modo que pôde, nesse momento, consultar toda a documentação relevante na sua posse, incluindo as faturas objeto da apreensão subsequente, e, assim, fazer valer a sua posição plenamente informada. |
91 |
Por outro lado, é verdade que a EACEA solicitou a apresentação de certas faturas originais na sua carta de 26 de julho de 2017. No entanto, na sua carta de 21 de dezembro de 2017, a EACEA registou o facto de que a recorrente não estava na posse das faturas originais solicitadas e que, portanto, lhe era impossível apresentá‑las. Contudo, não retirou conclusões a este respeito. Com efeito, nenhum elemento nessa carta ou na carta de 7 de fevereiro de 2018 revela que a não apresentação das referidas faturas tenha tido qualquer impacto na determinação dos montantes objeto dos pedidos de reembolso contidos nas cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 e na nota de débito de 13 de fevereiro de 2018. Como explica a EACEA na sua resposta a uma questão colocada no âmbito da medida de organização do processo de 12 de março de 2020 e na audiência, sem ser contrariada a esse respeito pela recorrente, algumas das numerosas irregularidades detetadas nos relatórios finais de auditoria e do OLAF prendiam-se, nomeadamente, com incoerências relativas ao conteúdo das faturas (v. n.o 15, supra) e não com o facto de estas não serem originais. |
92 |
Além disso, o facto de a recorrente não estar na posse das faturas originais solicitadas não era de molde a impedir a apresentação das informações necessárias para efeitos da discriminação, pedida pela EACEA, entre os montantes recebidos pela recorrente como beneficiária final das convenções Diusas e Deque e os montantes transferidos por ela para os cobeneficiários das referidas convenções. Com efeito, de acordo com a carta da EACEA de 26 de julho de 2017, essa discriminação devia ser feita com base em transferências ou extratos bancários, e não com base nas referidas faturas. |
93 |
Conclui‑se que a não apresentação dos originais das faturas solicitadas pela EACEA na sua carta de 26 de julho de 2017 não teve nenhum impacto na determinação dos montantes objeto dos pedidos de reembolso contidos nas cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 e na nota de débito. |
94 |
Por conseguinte, o primeiro fundamento do recurso, relativo a uma violação do direito de ser ouvido, deve ser julgado improcedente. |
– Quanto ao dever de fundamentação
[Omissis]
97 |
O alcance do dever de fundamentação deve ser apreciado em função das circunstâncias concretas, nomeadamente do conteúdo do ato, da natureza dos motivos invocados e do interesse que o destinatário pode ter em obter explicações, e importa, para apreciar se a fundamentação é suficiente, repô‑la no contexto factual e jurídico em que se inscreve a adoção do ato impugnado. Assim, um ato está suficientemente fundamentado quando ocorre num contexto conhecido do destinatário em causa, que lhe permite compreender o alcance da medida tomada a seu respeito (v., por analogia, Acórdãos de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba, C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.os 53 e 54 e jurisprudência referida; de 24 de outubro de 2011, P/Parlamento, T‑213/10 P, EU:T:2011:617, n.o 30; e de 27 de setembro de 2012, Applied Microengineering/Comissão, T‑387/09, EU:T:2012:501, n.os 64 a 67). |
98 |
No caso vertente, primeiro, o Tribunal Geral constata que as cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 identificam claramente o fundamento jurídico da recuperação em causa, a saber, o artigo II.19, n.os 3 e 5, das convenções controvertidas e o artigo 135.o, n.o 4, do Regulamento n.o 966/2012 (v. n.os 16 a 20, supra), e os montantes que a EACEA considerou que deviam ser recuperados. |
99 |
Segundo, a numerosa troca de correspondência entre as partes, que ocorreu a partir da comunicação do projeto de relatório de auditoria à recorrente por carta de 22 de abril de 2016 e recordada nos n.os 7 a 20, supra, contém informações suficientes e concordantes que permitiam à recorrente compreender as razões por que a EACEA decidiu reclamar o reembolso em causa e a forma como foram determinados os montantes a reembolsar. Em particular, como foi salientado nos n.os 80 e 81, supra, o relatório final de auditoria, em cujas conclusões a EACEA se apoia para efeitos da recuperação prevista, teve em conta todas as observações da recorrente e os elementos de prova que ela apresentou, examinou‑os e rejeitou‑os um a um, explicando, em cada ocasião, as razões por que essas observações ou esses elementos de prova não punham em causa as conclusões a que os auditores tinham chegado. |
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Terceiro, na sua carta de 21 de dezembro de 2017, a EACEA, por um lado, respondeu a todos os argumentos apresentados pela recorrente nas suas cartas de 9 de agosto e 25 de setembro de 2017 e, por outro, explicou claramente que os montantes a recuperar não tinham sido determinados com base nos custos considerados inelegíveis, mas com base na constatação de irregularidades graves, sistémicas e recorrentes que afetavam a execução das convenções controvertidas. |
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Conclui‑se que as cartas de 21 de dezembro de 2017 e de 7 de fevereiro de 2018 contêm fundamentação suficiente para permitir à recorrente compreender as razões por que a EACEA tinha decidido reclamar o reembolso dos montantes em causa e ao juiz da União exercer a sua fiscalização. |
102 |
Consequentemente, o terceiro fundamento do recurso, relativo a uma falta ou a uma insuficiência de fundamentação, deve ser julgado improcedente. |
Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma «aplicação errada do direito europeu»
[Omissis]
– Quanto à primeira alegação, relativa à inexistência de base legal que permita uma recuperação integral dos montantes pagos
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A recorrente entende que nem o artigo II.19, n.os 3 e 5, das convenções controvertidas nem o artigo 135.o, n.o 4, do Regulamento n.o 966/2012 permitem à EACEA proceder à recuperação integral dos montantes que lhe foram pagos ao abrigo das convenções controvertidas. |
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A EACEA contesta os argumentos da recorrente. |
106 |
No presente caso, o Tribunal Geral considera que, em conformidade com o artigo I.8, primeiro parágrafo, da convenção Ecesis, a concessão da subvenção em causa é regulada pelas disposições dessa convenção, pelas «regras comunitárias aplicáveis» e, a título subsidiário, pelo direito belga em matéria de concessão de subvenções. Quanto às convenções Diusas e Deque, segundo o artigo I.9 de cada uma delas, são reguladas pelas estipulações contratuais e pelas regras do direito da União aplicáveis. |
107 |
Em primeiro lugar, no que diz respeito às disposições contratuais pertinentes, cabe sublinhar que, em conformidade com o artigo II.19, n.o 3, de cada uma dessas convenções, a EACEA tem o direito de efetuar controlos relativos à utilização das subvenções. De acordo com esta disposição, os resultados dos controlos podem dar lugar a decisões de recuperação. Do mesmo modo, o artigo II.19, n.o 5, das convenções precisa que o OLAF tem o direito de efetuar controlos que também podem conduzir a decisões de recuperação. |
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Estas cláusulas, cuja violação a recorrente invoca, não excluem, portanto, a possibilidade de a EACEA recuperar integralmente os montantes pagos a título das referidas convenções. Com efeito, essas cláusulas indicam que a EACEA pode proceder à «recuperação» das subvenções, sem qualquer limitação a este respeito. |
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Em segundo lugar, no que diz respeito às «regras da União aplicáveis» na aceção do artigo I.8, primeiro parágrafo, da convenção Ecesis e do artigo I.9 das Convenções Diusas e Deque, o Tribunal Geral sublinha que, no caso vertente, são aplicáveis rationae temporis, antes de mais, o Regulamento n.o 1605/2002, revogado com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2013 (artigo 212.o do Regulamento n.o 966/2012), e, seguidamente, o Regulamento n.o 966/2012, tendo este último sido revogado, por sua vez, com efeitos a 2 de agosto de 2018, pelo Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.o 1296/2013, (UE) n.o 1301/2013, (UE) n.o 1303/2013, (UE) n.o 1304/2013, (UE) n.o 1309/2013, (UE) n.o 1316/2013, (UE) n.o 223/2014 e (UE) n.o 283/2014, e a Decisão n.o 541/2014/UE, e revoga o Regulamento n.o 966/2012 (JO 2018, L 193, p. 1). Com efeito, nos termos do artigo 187.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1605/2002 e do artigo 212.o do Regulamento n.o 966/2012, o Regulamento n.o 1605/2002 aplicava‑se, regra geral, de 1 de janeiro de 2003 até 1 de janeiro de 2013, enquanto as convenções controvertidas foram celebradas, respetivamente, em 2008 e 2010 (v. n.o 2, supra). Além disso, o período de execução das convenções e, consequentemente, o período auditado foi o período de 15 de janeiro de 2009 a 14 de janeiro de 2011, para a convenção Ecesis, de 15 de outubro de 2010 a 14 de outubro de 2012, para a convenção Diusas, e de 15 de outubro de 2010 a 14 de outubro de 2013, para a convenção Deque. Conclui‑se, por um lado, que o Regulamento n.o 1605/2002 era aplicável rationae temporis às convenções Ecesis e Diusas e, por outro, que esse mesmo regulamento e o Regulamento n.o 966/2012 eram sucessivamente aplicáveis à convenção Deque. |
110 |
Nos termos do artigo 119.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1605/2002, «[e]m caso de desrespeito, pelo beneficiário, das suas obrigações legais ou convencionais, a subvenção será suspensa e reduzida ou suprimida nos casos previstos nas normas de execução, após ter sido dada ao beneficiário a oportunidade de formular as suas observações». A utilização da palavra «suprimida» alude, assim, à hipótese de uma recuperação de todos os montantes recebidos. |
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Quanto ao artigo 135.o, n.o 4, do Regulamento n.o 966/2012, tem a seguinte redação: «Se esses erros, irregularidades ou fraudes forem imputáveis ao beneficiário, ou em caso de incumprimento pelo beneficiário das obrigações que lhe são impostas por uma convenção ou decisão de subvenção, o gestor orçamental competente pode, além disso, reduzir a subvenção ou recuperar os montantes pagos indevidamente a título da convenção ou decisão de subvenção, proporcionalmente à gravidade desses erros, irregularidades ou fraudes ou do incumprimento das obrigações, desde que seja dada ao beneficiário a oportunidade de formular observações.» |
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Além disso, o artigo 135.o, n.o 5, do Regulamento 966/2012 prevê o seguinte: «Se os controlos ou as auditorias demonstrarem a existência de erros, irregularidades, fraudes ou incumprimento das obrigações de caráter sistémico ou recorrente, imputáveis ao beneficiário, com um impacto importante em várias subvenções que lhe tenham sido atribuídas nas mesmas condições, o gestor orçamental competente pode suspender a execução de todas as subvenções em causa ou, se for o caso, fazer cessar a vigência das convenções ou decisões de subvenção relativas a esse beneficiário, proporcionalmente à gravidade desses erros, irregularidades, fraudes ou incumprimento das obrigações, desde que seja dada ao beneficiário a oportunidade de formular observações. O gestor orçamental competente pode, além disso, no quadro de um procedimento contraditório, reduzir a subvenção ou recuperar os montantes indevidamente pagos no que respeita a todas as subvenções afetadas por erros, irregularidades, fraudes ou incumprimento das obrigações de caráter sistémico ou recorrente a que se refere o primeiro parágrafo, que possam ser objeto de uma auditoria nos termos das convenções ou decisões de subvenção.» |
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Assim, nem o artigo 119.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1605/2002 nem o artigo 135.o, n.o 4, do Regulamento n.o 966/2012 impedem a recuperação integral de uma subvenção. Com efeito, basta salientar, por um lado, que esta última disposição exige expressamente que se tenha em conta a gravidade dos erros, irregularidades, fraudes ou incumprimentos das obrigações constatados. Assim, o facto de terem caráter sistémico ou recorrente é claramente um elemento a ter em conta para apreciar a gravidade das referidas irregularidades. Por conseguinte, quando a gravidade dos erros, irregularidades, fraudes ou incumprimentos das obrigações constatados for de tal ordem que ponha em risco todo o sistema de controlo e de gestão das convenções em causa e, portanto, todas as despesas reclamadas, então, a recuperação integral dos montantes pagos não pode ser considerada desproporcionada. |
114 |
Esta conclusão é corroborada, além disso, pelo artigo 135.o, n.o 5, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 966/2012, nos termos do qual, em caso de irregularidades sistémicas e recorrentes imputáveis ao beneficiário e com impacto material em várias subvenções, o gestor orçamental pode «recuperar os montantes indevidamente pagos» a título de todas as convenções afetadas por essas irregularidades. Esta disposição não exclui, portanto, a possibilidade de se proceder à recuperação integral de uma determinada subvenção, se a gravidade das irregularidades constatadas for tal que todos os montantes em causa devam ser considerados como indevidamente pagos. |
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Esta conclusão é igualmente conforme com o princípio de uma boa e sã gestão financeira dos recursos da União previsto no artigo 317.o TFUE. Assim, em caso de incumprimento das condições estabelecidas numa convenção de subvenção, as instituições, os órgãos ou os organismos da União são obrigados a recuperar a subvenção paga até aos montantes considerados não fiáveis ou não verificáveis. |
116 |
Além disso, o juiz da União já teve ocasião de declarar que, no sistema de concessão das contribuições financeiras da União, a utilização dessas contribuições está sujeita a regras que podem conduzir à restituição parcial ou total de uma contribuição já concedida (Acórdãos de 7 de julho de 2010, Comissão/Hellenic Ventures e o., T‑44/06, não publicado, EU:T:2010:284, n.o 85, e de 16 de dezembro de 2010, Comissão/Arci Nuova associazione comitato di Cagliari e Gessa, T‑259/09, não publicado, EU:T:2010:536, n.o 61). |
117 |
Conclui‑se, tendo em conta o exposto, que as estipulações contratuais e as disposições relevantes do Regulamento n.o 1605/2002 e do Regulamento n.o 966/2012, tal como interpretadas pelo juiz da União, não impedem, em princípio, a EACEA de proceder a uma recuperação integral dos montantes pagos à recorrente a título das convenções controvertidas. A questão de saber se essa recuperação é, no caso vertente, conforme com o princípio da proporcionalidade constitui o objeto do quarto fundamento do recurso e será, portanto, examinada a seguir. |
118 |
Por conseguinte, a primeira alegação do segundo fundamento deve ser julgada improcedente. |
– Quanto à segunda alegação, relativa à inexistência de irregularidades de caráter sistémico e recorrente
[Omissis]
139 |
Por último, a recorrente não pode deduzir nenhum argumento do facto de o artigo 135.o, n.o 4, do Regulamento n.o 966/2012 não se referir a irregularidades sistémicas e recorrentes ou de esses conceitos não estarem definidos nesse regulamento. Com efeito, basta sublinhar, por um lado, que esta disposição exige expressamente que se tome em consideração a gravidade das irregularidades constatadas. O facto de essas irregularidades terem caráter sistémico ou recorrente é, claramente, um elemento a ter em conta para apreciar a respetiva gravidade. Por outro lado, o facto de o Regulamento n.o 966/2012 utilizar esses conceitos, em particular no seu artigo 135.o, n.o 5, sem os definir expressamente, só pode permanecer sem impacto algum na recuperação prevista, uma vez que o teor desses conceitos decorre, sem possibilidade de dúvida, do seu significado habitual, segundo o qual as irregularidades sistémicas e recorrentes são as que se caracterizam pela sua repetibilidade e pelo facto de afetarem todo o sistema de controlo e de gestão, tais como as referidas nos n.os 124 a 131, supra. [Omissis] |
Quanto às despesas
165 |
Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos da EACEA. |
Pelos fundamentos expostos, O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção alargada) decide: |
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Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 24 de fevereiro de 2021. Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.
( 1 ) Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal considera útil.