EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62017TJ0741

Acórdão do Tribunal Geral (Terceira Secção) de 10 de setembro de 2019.
Trasys International EEIG e Axianseu - Digital Solutions SA contra Agência Europeia para a Segurança da Aviação.
Contratos públicos de serviços — Procedimento de concurso — Serviços de gestão de infraestruturas e aplicações informáticas — Rejeição da proposta de um proponente e adjudicação do contrato a outros proponentes — Dever de fundamentação — Apreciação da existência de propostas anormalmente baixas — Características e vantagens relativas das propostas selecionadas — Pedido de fundamentação por parte de um proponente que não se encontre numa situação de exclusão e cuja proposta seja conforme com os documentos do concurso.
Processo T-741/17.

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2019:572

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

10 de setembro de 2019 ( *1 )

«Contratos públicos de serviços — Procedimento de concurso — Serviços de gestão de infraestruturas e aplicações informáticas — Rejeição da proposta de um proponente e adjudicação do contrato a outros proponentes — Dever de fundamentação — Apreciação da existência de propostas anormalmente baixas — Características e vantagens relativas das propostas selecionadas — Pedido de fundamentação por parte de um proponente que não se encontre numa situação de exclusão e cuja proposta seja conforme com os documentos do concurso»

No processo T‑741/17,

TRASYS International EEIG, com sede em Bruxelas (Bélgica),

Axianseu — Digital Solutions SA, com sede em Lisboa (Portugal),

representados por L. Masson e G. Tilman, advogados,

recorrentes,

contra

Agência Europeia para a Segurança da Aviação (AESA), representada por S. Rostren, E. Tellado Vásquez e H. Köppen, na qualidade de agentes, assistidos por V. Ost, M. Vanderstraeten e F. Tulkens, advogados,

recorrida,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão da AESA, de 28 de agosto de 2017, que rejeitou a proposta apresentada pelo consórcio formado pelos recorrentes no âmbito do concurso EASA.2017.HVP.08, relativo a um contrato público para a prestação de serviços de gestão de infraestruturas e aplicações informáticas em Colónia (Alemanha), e adjudicou o contrato em cascata a três outros proponentes,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção),

composto por: S. Frimodt Nielsen, presidente, I. S. Forrester (relator) e E. Perillo, juízes,

secretário: L. Ramette, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 11 de abril de 2019,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes e contexto do litígio

1

Por anúncio de concurso de 5 de abril de 2017, publicado no Suplemento do Jornal Oficial da União Europeia de 15 de abril de 2017 (JO 2017, S 075‑144229), com a referência EASA.2017.HVP.08 (a seguir «anúncio de concurso»), a Agência Europeia para a Segurança da Aviação (AESA) lançou um concurso relativo a um contrato público para a prestação de serviços de gestão de infraestruturas e aplicações informáticas em Colónia (Alemanha).

2

O anúncio de concurso tinha por objeto a celebração de um ou mais contratos‑quadro para a prestação de serviços de gestão de infraestruturas e aplicações informáticas. Os contratos‑quadro estabeleciam um sistema de cascata. Assim, a AESA começou por enviar as suas encomendas ao operador classificado em primeiro lugar, depois ao operador classificado em segundo lugar e, por último, ao proponente classificado em terceiro lugar.

3

Em 31 de maio de 2017, os recorrentes, o TRASYS International EEIG (a seguir «Trasys»), um agrupamento europeu de interesse económico, e a Axianseu — Digital Solutions SA (anteriormente, Novabase IMS — Infrastructures & Management Services SA), uma sociedade de direito português, apresentaram uma proposta conjunta sob a forma de um consórcio dirigido pelo Trasys. Sete outros proponentes apresentaram propostas em resposta ao anúncio de concurso.

4

O caderno de encargos enunciava que o contrato‑quadro era adjudicado com base na proposta economicamente mais vantajosa segundo o princípio da melhor relação qualidade‑preço, contando a qualidade técnica e o preço, cada um, 50 % na avaliação das propostas apresentadas, desde que o ou os proponentes selecionados satisfizessem certos critérios mínimos em matéria de elegibilidade, não exclusão, capacidade e conformidade da proposta.

5

Em 13 de julho de 2017, no âmbito da análise das propostas recebidas e com base numa comparação das tarifas propostas pelos diferentes proponentes, a AESA enviou a quatro deles (o Atos, o Icarus, o e‑KARE e o UniSystems) pedidos de justificação a respeito, nomeadamente, do preço aparentemente anormalmente baixo que propunham. Na sequência das respostas enviadas por esses proponentes aos pedidos de justificação, a AESA solicitou, em 18 de agosto de 2017, informações complementares a cada um dos proponentes em causa que tinham completado as suas respostas. Os recorrentes não foram informados desta correspondência.

6

Por decisão de 28 de agosto de 2017 (a seguir «decisão impugnada»), a AESA rejeitou a proposta apresentada pelo consórcio dos recorrentes no âmbito do concurso EASA.2017.HVP.08 e adjudicou o contrato‑quadro, num sistema de cascata, aos três proponentes seguintes: o Icarus, classificado em primeiro lugar, o Atos, classificado em segundo lugar, e o UniSystems, classificado em terceiro lugar.

7

Por carta de 28 de agosto de 2017, a AESA informou o Trasys de que a avaliação da proposta do consórcio formado pelos recorrentes, classificada em quinto lugar, não tinha permitido concluir que esta proposta era a economicamente mais vantajosa. Com efeito, resultava de um quadro comparativo entre o primeiro adjudicatário e o consórcio dos recorrentes, que figura nessa carta, que a «pontuação técnica» do primeiro adjudicatário era de 82, enquanto a dos recorrentes era de 91, o que dava uma «pontuação técnica ponderada» de 41 para o primeiro adjudicatário e de 45,5 para os recorrentes. A «pontuação financeira ponderada» era de 48,8 para o primeiro adjudicatário e de apenas 29,64 para os recorrentes, o que dava uma «pontuação total» de 89,80 para o primeiro adjudicatário e de 75,14 para os recorrentes. A AESA convidou o Trasys a solicitar informações adicionais, se assim o desejasse.

8

Por mensagem de correio eletrónico de 31 de agosto de 2017, o Trasys pediu à AESA que lhe fornecesse o relatório de avaliação detalhado.

9

Em 1 de setembro de 2017, a AESA comunicou aos recorrentes os nomes e a posição dos proponentes selecionados, bem como um excerto do relatório de avaliação, que consistia num quadro que comparava as pontuações do primeiro adjudicatário e do consórcio dos recorrentes quanto à avaliação técnica.

10

Por carta de 6 de setembro de 2017, os recorrentes contestaram o resultado do procedimento de concurso. Em especial, pediram à AESA que suspendesse a assinatura do contrato‑quadro e lhes permitisse o acesso a uma decisão fundamentada no que respeita à adjudicação, acompanhada, sendo caso disso, de uma cópia do relatório de avaliação das propostas. Os recorrentes indicavam, assim, que os preços dos proponentes selecionados só podiam ser anormalmente baixos, tendo em conta, nomeadamente, o facto de que os serviços deveriam ser prestados em Colónia.

11

Por carta de 15 de setembro de 2017, a AESA informou os recorrentes de que se recusava a suspender a assinatura do contrato‑quadro e declarou que, durante o procedimento de avaliação, tinham sido pedidos, designadamente aos três proponentes selecionados, esclarecimentos sobre os preços propostos e que esses esclarecimentos tinham sido considerados suficientes pela comissão de avaliação. A AESA juntou a esta carta os quadros de avaliação técnica dos três proponentes selecionados, com algumas passagens obscurecidas.

12

No mesmo dia, o Trasys apresentou uma queixa no Provedor de Justiça Europeu, registada com a referência 1633/2017/MDC.

13

Em 25 de setembro de 2017, o consórcio dos recorrentes, reiterando o pedido de suspensão da assinatura do contrato, invocando as exigências do dever de fundamentação estabelecidas pela jurisprudência e especificando as suas dúvidas quanto aos preços anormalmente baixos de pelo menos dois proponentes, pediu à AESA a apresentação dos documentos com os quais esta tinha interrogado os proponentes e as respostas dadas por estes últimos, bem como o documento contendo o raciocínio que tinha levado a AESA a aceitar as justificações apresentadas pelos proponentes interrogados.

14

Em 17 de outubro de 2017, a AESA enviou aos recorrentes uma cópia da decisão impugnada, bem como do relatório de avaliação e das correspondências em que tinha pedido esclarecimentos aos proponentes. Nessas cópias, estavam ocultadas grandes partes que continham os elementos cuja divulgação a AESA considerava que poderia afetar a vida privada ou os interesses comerciais legítimos dos proponentes em causa. No que respeita às respostas aos pedidos de justificação, a AESA explicou aos recorrentes que, em caso de dúvida sobre a natureza potencialmente confidencial de um documento, tinha a obrigação de solicitar o acordo dos proponentes em causa.

15

Em 30 de outubro de 2017, os recorrentes apresentaram a sua petição na Secretaria do Tribunal Geral e intentaram o presente recurso.

16

Em 7 de novembro de 2017, após contactos com os quatro proponentes visados pelos pedidos de justificação da entidade adjudicante sobre a questão dos preços anormalmente baixos, a saber, o Atos, o e‑Kare, o Icarus e o UniSystems, que invocaram segredos comerciais e dados pessoais, a AESA informou os recorrentes da sua recusa em lhes divulgar os documentos pedidos.

17

Por carta de 4 de dezembro de 2017, a pedido do Provedor de Justiça, ao qual o Trasys tinha dirigido a sua queixa, a AESA forneceu informações adicionais indicando que, durante o processo de avaliação, tinham surgido dúvidas quanto à questão dos preços anormalmente baixos propostos por quatro proponentes, como os preços diários para certos perfis específicos que se afiguravam substancialmente inferiores aos preços atuais de mercado para um serviço equivalente, e que tinham sido efetuados dois contactos para esclarecer esta questão relativamente a esses proponentes. A AESA explicou ao Provedor de Justiça que, além de algumas questões específicas que tinham sido submetidas, tinham sido pedidas provas aos proponentes de que os seus preços estavam em conformidade com as leis ambientais, sociais e laborais aplicáveis e que os serviços seriam prestados a preços comparáveis aos contidos nas propostas. A AESA mencionou igualmente que todos os proponentes tinham respondido, apresentando elementos de prova tais como, nomeadamente, recibos de pagamento, faturas e referências de contratos de prestação de serviços num ambiente semelhante. Aliás, todos os proponentes confirmaram respeitar as leis nacionais em matéria laboral e de segurança social durante a vigência total do contrato, fornecendo à AESA cálculos a título de prova, que esta apresentou ao Provedor de Justiça num anexo confidencial. A AESA explicou que a comissão de avaliação tinha aceitado os preços contidos nas propostas financeiras, tendo em conta as declarações dos proponentes, bem como a documentação e as fórmulas de cálculo de custos apresentadas em apoio das declarações, uma vez que não havia elementos suficientemente fortes nem provas com base nas quais as três propostas classificadas nas primeiras posições pudessem ter sido rejeitadas. A AESA mencionou também que tinha considerado cuidadosamente a carta do Trasys de 6 de setembro de 2017, mas que tinha concluído que esta se baseava em presunções e não apresentava provas suficientes.

18

Nas suas comunicações com o Provedor de Justiça, a AESA alegou que tinha enviado aos recorrentes toda a documentação solicitada. No entanto, a AESA não precisou ao Provedor de Justiça que os documentos enviados aos recorrentes não continham os detalhes da verificação que tinha efetuado quanto à possibilidade da existência de preços anormalmente baixos nem que esses documentos estavam, por razões de confidencialidade, ocultados.

19

Paralelamente, num anexo confidencial, a AESA transmitiu ao Provedor de Justiça documentos confidenciais como prova.

20

Por carta de 4 de fevereiro de 2018, a AESA informou o Provedor de Justiça sobre o processo pendente no Tribunal Geral. No entanto, o Provedor de Justiça decidiu, argumentando que o objeto do recurso no Tribunal Geral não era idêntico ao da queixa que lhe foi submetida pelo Trasys, uma vez que esta se limitava a solicitar à AESA uma melhor resposta às suas questões quanto à conformidade das propostas dos adjudicatários com o direito laboral nacional e da União Europeia. Neste contexto, em 1 de junho de 2018, o Provedor de Justiça encerrou o processo, concluindo que a questão estava resolvida, uma vez que a AESA tinha melhorado as suas respostas iniciais, ao fornecer ao Trasys uma resposta aprofundada, adequada e mais completa.

Tramitação processual e pedidos das partes

21

Por petição entregue na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de outubro de 2017, os recorrentes interpuseram o presente recurso.

22

A AESA entregou a sua contestação na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de março de 2018.

23

Por Despacho de 22 de novembro de 2018, com base no artigo 103.o, n.o 1, do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral ordenou à AESA que apresentasse a versão confidencial completa do relatório de avaliação, dos pedidos de justificação de preços e das cartas de resposta aos pedidos de justificação de preços. O Tribunal indicou igualmente que esses documentos não seriam comunicados às outras partes nessa fase. A AESA apresentou os documentos solicitados no prazo fixado.

24

Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas orais feitas pelo Tribunal Geral na audiência de 11 de abril de 2019 e no âmbito de uma medida de organização do processo que precedeu a realização da audiência.

25

No final da audiência, o Tribunal Geral concedeu às partes um prazo para que pudessem negociar um acordo suscetível de pôr termo à instância. Em 2 de maio de 2019, a AESA informou o Tribunal de que as partes não tinham chegado a acordo no prazo fixado, o que levou ao encerramento da fase oral do processo.

26

Os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar a AESA nas despesas.

27

A AESA conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

declarar o recurso inadmissível na parte em que é interposto contra a «decisão tácita de não adjudicar os diferentes contratos‑quadro aos recorrentes»;

negar provimento ao recurso;

condenar os recorrentes nas despesas.

Questão de direito

28

Os recorrentes invocam um fundamento único, relativo à insuficiência de fundamentação da decisão impugnada no que respeita a um aspeto essencial. Assim, criticam a AESA por não ter precisado, de forma juridicamente suficiente, os fundamentos que a levaram a considerar que os preços propostos pelos três adjudicatários selecionados não eram anormalmente baixos. A este respeito, os recorrentes baseiam‑se, em especial, em estatísticas públicas e na comparação das pontuações técnicas dos adjudicatários com as suas.

Quanto ao objeto do litígio

29

A AESA alega que, na parte em que se refere à «decisão tácita de não adjudicar os diferentes contratos‑quadro aos recorrentes», o recurso é inadmissível. Com efeito, admitindo que o Tribunal Geral decide anular por insuficiência de fundamentação a decisão impugnada, na medida em que esta adjudica os contratos‑quadro aos três proponentes selecionados, caberia então à AESA tomar as medidas necessárias à execução desse acórdão nos termos do artigo 266.o TFUE. O Tribunal não pode substituir pela sua apreciação a apreciação da AESA, impondo‑lhe que adjudique um dos contratos‑quadro aos recorrentes.

30

Esta alegação deve ser rejeitada. Resulta da petição que, com os seus pedidos, os recorrentes não pretendem que o contrato lhes seja adjudicado, mas apenas que a decisão impugnada, que adjudica esse contrato a três outros proponentes e, portanto, decide tacitamente não o adjudicar aos recorrentes, seja anulada.

31

Não se contesta que os recorrentes têm um interesse real em obter a anulação da decisão impugnada. Com efeito, já foi declarado que recorrentes cujas propostas tinham sido rejeitadas tinham interesse em pedir a anulação de uma decisão de adjudicação impugnada a fim de obter, em aplicação da obrigação que decorre do artigo 266.o TFUE, a reposição adequada da sua situação, que poderá, se for caso disso, assumir a forma de uma compensação pecuniária adequada do prejuízo sofrido (v., a este respeito, Acórdão de 29 de outubro de 2015, Direct Way e Direct Way Worldwide/Parlamento, T‑126/13, EU:T:2015:819, n.o 44).

32

Nas circunstâncias do caso em apreço, importa referir que a decisão impugnada, que contém em anexo o relatório de avaliação, inclui, por um lado, uma parte relativa à adjudicação do contrato de prestação serviços aos três proponentes classificados segundo o sistema de cascata e, por outro, tacita mas necessariamente, uma parte relativa à rejeição da proposta do consórcio dos recorrentes, que não ficou classificada nos três primeiros lugares no termo da avaliação das propostas, mas que figura em cada fase dessa avaliação. Na realidade, estas duas partes constituem uma única e mesma decisão (v., a este respeito, Acórdão de 4 de fevereiro de 2016, PRIMA/Comissão, T‑722/14, não publicado, EU:T:2016:61, n.o 16 e jurisprudência referida).

33

Portanto, há que considerar que o recurso tem por objeto a anulação da decisão impugnada na medida em que adjudica o contrato controvertido a três proponentes diferentes dos recorrentes e, ao fazê‑lo, rejeita a proposta apresentada por estes últimos relativamente a esse contrato. Por conseguinte, a exceção de inadmissibilidade suscitada pela AESA deve ser julgada improcedente.

Quanto ao mérito

34

A título preliminar, há que observar que, ao se limitar a um único fundamento relativo à insuficiência de fundamentação quanto à questão de saber se os preços das propostas selecionadas não eram anormalmente baixos, os recorrentes não apresentam outra argumentação relativa, por exemplo, segundo a AESA, ao acesso a documentos cuja confidencialidade é alegada ou à existência de um erro manifesto de apreciação cometido pela entidade adjudicante no procedimento de adjudicação do contrato público.

Quanto à apreciação da existência de propostas anormalmente baixas e ao dever de fundamentação

35

A título preliminar, há que recordar que a entidade adjudicante dispõe de um amplo poder de apreciação quanto aos elementos a ter em consideração para tomar a decisão de adjudicar um contrato mediante concurso. Este amplo poder de apreciação é‑lhe reconhecido ao longo de todo o procedimento de adjudicação do contrato, incluindo no que se refere à escolha e à avaliação dos critérios de adjudicação (v. Acórdão de 26 de janeiro de 2017, TV1/Comissão, T‑700/14, não publicado, EU:T:2017:35, n.o 44 e jurisprudência referida).

36

Importa igualmente salientar que, quando o autor do ato dispõe de um amplo poder de apreciação, o respeito das garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos procedimentos administrativos reveste uma importância ainda mais fundamental. Entre essas garantias, figura, nomeadamente, a obrigação de o autor do ato fundamentar de forma suficiente as suas decisões. Só assim o juiz da União está em condições de verificar se estão reunidos os elementos de facto e de direito de que depende o exercício do seu poder de apreciação (v. Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 36 e jurisprudência referida). Ora, a inobservância de formalidades essenciais em relação a uma decisão deve conduzir à sua anulação (v., neste sentido, Acórdão de 30 de março de 1995, Parlamento/Conselho, C‑65/93, EU:C:1995:91, n.o 21).

37

Por outro lado, para examinar se a AESA cumpriu o seu dever de fundamentação quanto à apreciação da existência de propostas anormalmente baixas, importa identificar os elementos exigidos a este respeito pela jurisprudência.

38

Estes elementos referem‑se, em primeiro lugar, ao conteúdo da fundamentação, em segundo lugar, ao prazo no qual a fundamentação deve ser apresentada ao proponente interessado e, em terceiro lugar, ao alcance da fundamentação exigida.

39

Em primeiro lugar, quanto ao conteúdo da fundamentação, importa recordar que a apreciação da existência de propostas anormalmente baixas constitui um dos fatores que a entidade adjudicante deve verificar nos termos do artigo 151.o do Regulamento Delegado (UE) n.o 1268/2012 da Comissão, de 29 de outubro de 2012, sobre as normas de execução do Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União (JO 2012, L 362, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento Delegado (UE) 2015/2462 da Comissão, de 30 de outubro de 2015 (JO 2015, L 342, p. 7) (a seguir «Regulamento de Execução»).

40

A este respeito, há que salientar que o conceito de «proposta anormalmente baixa» não é definido pelas disposições do Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União e que revoga o Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho (JO 2012, L 298, p. 1), conforme alterado, pela última vez, pelo Regulamento (UE, Euratom) 2015/1929 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de outubro de 2015 (JO 2015, L 286, p. 1) (a seguir «Regulamento Financeiro»), nem pelas disposições do Regulamento de Execução. No entanto, foi declarado que o caráter anormalmente baixo de uma proposta devia ser apreciado tendo em conta a composição da proposta e a prestação em causa (Acórdão de 28 de janeiro de 2016, Agriconsulting Europe/Comissão, T‑570/13, EU:T:2016:40, n.o 55).

41

Nos termos do artigo 276.o, n.o 4, do Regulamento de Execução, no caso de propostas anormalmente baixas, a comissão de avaliação solicita as precisões que considere oportunas em matéria de composição da proposta.

42

O dever da entidade adjudicante de verificar a seriedade de uma proposta resulta da existência prévia de dúvidas quanto à sua fiabilidade, tendo o artigo 276.o, n.o 4, do Regulamento de Execução por objeto principal permitir a um proponente não ser afastado do procedimento de concurso sem que tenha tido a possibilidade de justificar o conteúdo da sua proposta que se revele anormalmente baixa. Só quanto existam tais dúvidas é que a comissão de avaliação está obrigada a pedir as precisões que considere oportunas em matéria de composição da proposta antes de, eventualmente, a rejeitar. Em contrapartida, se uma proposta não se afigurar anormalmente baixa nos termos do artigo 151.o, n.o 1, do Regulamento de Execução, o artigo 276.o, n.o 4, deste regulamento não se aplica (v., por analogia, Acórdão de 26 de janeiro de 2017, TV1/Comissão, T‑700/14, não publicado, EU:T:2017:35, n.o 40 e jurisprudência referida).

43

Tais dúvidas podem existir, designadamente, se se afigurar incerto, por um lado, que uma proposta respeite a legislação do país em que os serviços devam ser executados, em matéria de remuneração do pessoal, de contribuições para o regime de segurança social, de respeito das normas de segurança e de saúde no trabalho e de venda com prejuízo, e, por outro, que o preço proposto abranja todos os custos induzidos pelos aspetos técnicos da proposta (Acórdão de 8 de outubro de 2015, Secolux/Comissão, T‑90/14, não publicado, EU:T:2015:772, n.o 62). O mesmo se aplica quando o preço indicado numa proposta apresentada é consideravelmente inferior ao das outras propostas apresentadas ou ao preço habitual do mercado (v., neste sentido, Acórdão de 4 de julho de 2017, European Dynamics Luxembourg e o./Agência Ferroviária da União Europeia, T‑392/15, EU:T:2017:462, n.o 88).

44

Resulta do que precede que a apreciação, pela entidade adjudicante, da existência de propostas anormalmente baixas é efetuada em duas fases (Acórdão de 4 de julho de 2017, European Dynamics Luxembourg e o./Agência Ferroviária da União Europeia, T‑392/15, EU:T:2017:462, n.o 87).

45

Numa primeira fase, a entidade adjudicante deve apreciar se o preço ou custo constante na proposta se «afigur[a]» anormalmente baixo (v. artigo 151.o, n.o 1, do Regulamento de Execução). A utilização do verbo «afigurar» no Regulamento de Execução implica que a entidade adjudicante proceda a uma apreciação prima facie do caráter anormalmente baixo de uma proposta. Por conseguinte, o Regulamento de Execução não exige à entidade adjudicante que proceda oficiosamente a uma análise detalhada da composição de cada proposta para estabelecer que ela não constitui uma proposta anormalmente baixa. Assim, numa primeira fase, a entidade adjudicante deve unicamente determinar se as propostas apresentadas contêm um indício suscetível de despertar suspeitas de que possam ser anormalmente baixas (v., por analogia, Acórdão de 4 de julho de 2017, European Dynamics Luxembourg e o./Agência Ferroviária da União Europeia, T‑392/15, EU:T:2017:462, n.o 88, que se refere à antiga redação do artigo 151.o do Regulamento de Execução, cuja substância não mudou na versão do Regulamento de Execução aplicável ao caso em apreço).

46

Numa segunda fase, se existirem indícios suscetíveis de despertar suspeitas de que uma proposta possa ser anormalmente baixa, a entidade adjudicante deve proceder à verificação da composição da proposta para ter a certeza de que esta não é anormalmente baixa. Quando procede a essa verificação, a entidade adjudicante está obrigada a dar ao proponente que apresentou a referida proposta a possibilidade de expor as razões pelas quais considera que a sua proposta não é anormalmente baixa. Em seguida, a entidade adjudicante deve apreciar as explicações dadas e determinar se a proposta em questão apresenta um caráter anormalmente baixo, caso em que tem a obrigação de a rejeitar (Acórdão de 4 de Julho de 2017, European Dynamics Luxembourg e o./Agência Ferroviária da União Europeia, T‑392/15, EU:T:2017:462, n.o 89).

47

No caso em apreço, está demonstrada a existência de dúvidas quanto aos preços propostos por vários proponentes. Por um lado, a própria AESA tinha dúvidas sobre esta questão, as quais levaram a entidade adjudicante a interrogar os proponentes em causa, incluindo os três proponentes selecionados, em 13 de julho e 18 de agosto de 2017. Por outro lado, depois de terem sido informados do resultado do concurso, os recorrentes comunicaram à AESA, em 6 e 25 de setembro de 2017, as suas próprias dúvidas e indícios quanto à existência de propostas anormalmente baixas. Por diversas vezes, logo que puderam, os recorrentes pediram igualmente à AESA que apresentasse uma fundamentação explícita sobre a sua apreciação quanto à existência de propostas anormalmente baixas a título da avaliação e da adjudicação do contrato controvertido.

48

Não se pode deixar de declarar que, ao pedir a comunicação dos fundamentos pelos quais a comissão de avaliação tinha entendido que as propostas dos proponentes selecionados não eram anormalmente baixas, os recorrentes pretendiam que a entidade adjudicante expusesse as características e as vantagens dessas propostas (v., neste sentido, Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 46 e jurisprudência referida). Importa recordar que o consórcio dos recorrentes não se encontrava numa situação de exclusão, que a sua proposta era conforme com os documentos do concurso e que esta proposta não foi selecionada, porquanto não foi considerada a economicamente mais vantajosa. Constata‑se igualmente que, no âmbito de avaliação das propostas sob o seu aspeto técnico, a proposta do consórcio dos recorrentes ficou em primeiro lugar, com 91 pontos em 100. No entanto, no termo da avaliação e tendo em conta o resultado da avaliação das propostas sob o aspeto financeiro, a proposta do consórcio dos recorrentes ficou classificada na quinta posição entre os seis proponentes classificados.

49

Deve igualmente recordar‑se que, em presença de indícios suscetíveis de despertar uma suspeita quanto à existência de propostas anormalmente baixas, a entidade adjudicante deve levar ao conhecimento do proponente excluído, que apresente um pedido expresso, os fundamentos que permitem compreender por que razão a proposta que selecionou não lhe pareceu anormalmente baixa (v., neste sentido, Acórdão de 4 de julho de 2017, European Dynamics Luxembourg e o./Agência Ferroviária da União Europeia, T‑392/15, EU:T:2017:462, n.o 93).

50

Por outras palavras, em tal situação, a apreciação da existência de propostas anormalmente baixas figura entre as características e as vantagens relativas das propostas selecionadas a respeito das quais, em conformidade com o artigo 113.o, n.o 3, alínea a), do Regulamento Financeiro, a entidade adjudicante deve comunicar as informações pertinentes se tal lhe for expressamente pedido por um proponente que não se encontre numa situação de exclusão e cuja proposta seja conforme com os documentos do concurso.

51

Em segundo lugar, quanto ao prazo em que a fundamentação deve ser apresentada, a jurisprudência precisou que devia, em princípio, ser comunicada ao interessado ao mesmo tempo que a decisão que o afeta (Acórdãos de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.o 149, e de 19 de julho de 2012, Alliance One International e Standard Commercial Tobacco/Comissão, C‑628/10 P e C‑14/11 P, EU:C:2012:479, n.o 74).

52

No entanto, para examinar a suficiência da fundamentação, podem ser tomadas em consideração informações comunicadas num momento posterior, desde que se limitem a fornecer mais detalhes sobre a fundamentação inicial e assentem em elementos de facto e de direito existentes à data da referida decisão (v. Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 38 e jurisprudência referida).

53

Todavia, a questão de saber se o dever de fundamentação foi respeitado deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que o recorrente dispunha, o mais tardar, no momento da interposição do recurso (v. Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 37 e jurisprudência referida). Por conseguinte, a falta de fundamentação não pode ser sanada pelo facto de o interessado tomar conhecimento dos fundamentos da decisão no decurso do processo perante os órgãos jurisdicionais da União (Acórdãos de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.o 149, e de 19 de julho de 2012, Alliance One International e Standard Commercial Tobacco/Comissão, C‑628/10 P e C‑14/11 P, EU:C:2012:479, n.o 74).

54

As explicações prestadas, pela primeira vez, a posteriori perante o juiz só podem ser tomadas em consideração em circunstâncias excecionais (v., neste sentido, Acórdão de 20 de maio de 2009, VIP Car Solutions/Parlamento, T‑89/07, EU:T:2009:163, n.o 76 e jurisprudência referida).

55

No caso em apreço, na falta de circunstâncias excecionais, os elementos de informação que permitem examinar a fundamentação da decisão impugnada no que respeita à apreciação da existência de propostas anormalmente baixas são, portanto, os que foram comunicados aos recorrentes pela AESA, o mais tardar, no momento da interposição do recurso, em 30 de outubro de 2017.

56

Em terceiro lugar, importa ter em conta os critérios que a jurisprudência estabeleceu quanto ao alcance da fundamentação exigida, designadamente no que respeita à apreciação da existência de propostas anormalmente baixas.

57

No que se refere à fundamentação das decisões individuais, o dever previsto no artigo 296.o TFUE tem por finalidade, além de permitir uma fiscalização jurisdicional, revelar de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do ato, de modo a permitir aos interessados conhecerem as justificações da medida tomada e fornecer‑lhes indicações suficientes para saber se a decisão enferma eventualmente de um vício que permita contestar a sua validade (v. Acórdãos de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.os 147 e 148 e jurisprudência referida, e de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 115 e jurisprudência referida).

58

Além disso, na medida em que a fundamentação deve ter em conta, nomeadamente, o interesse que os destinatários do ato podem ter em obter explicações, esse interesse manifesta‑se, por exemplo, nos argumentos invocados perante a entidade adjudicante pelos interessados (v., neste sentido, Acórdão de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.os 150 a 161).

59

Como sublinha a AESA, a exigência de fundamentação deve igualmente ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários do ato ou outras pessoas direta e individualmente interessadas no mesmo podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada não só à luz do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa (Acórdãos de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.o 150, e de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 116).

60

Genericamente, no que respeita aos contratos públicos celebrados pelas instituições da União, por um lado, o artigo 113.o, n.o 2, do Regulamento Financeiro dispõe que a entidade adjudicante comunica aos proponentes cujas propostas tenham sido rejeitados os fundamentos da decisão correspondente. Por outro lado, nos termos do artigo 113.o, n.o 3, a entidade adjudicante informa cada um dos proponentes que não se encontre numa situação de exclusão, cuja proposta seja conforme com os documentos do concurso e que apresente um pedido por escrito, as características e as vantagens relativas da proposta selecionada e o nome do adjudicatário. A este respeito, o artigo 161.o, n.o 2, do Regulamento de Execução precisa que «[a] entidade adjudicante comunica as informações previstas no artigo 113.o, n.o 3, do Regulamento Financeiro o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de 15 dias a contar da data de receção de um pedido por escrito».

61

O artigo 113.o, n.os 2 e 3, do Regulamento Financeiro e o artigo 161.o, n.o 2, do Regulamento de Execução preveem, portanto, relativamente aos proponentes que preencham as condições enunciadas no artigo 113.o, n.o 3, do Regulamento Financeiro, uma fundamentação em duas fases.

62

Mais especificamente, no que respeita à apreciação da existência de propostas anormalmente baixas, há que salientar que exigir à entidade adjudicante que apresente os fundamentos pelos quais uma proposta não foi considerada anormalmente baixa não a obriga a revelar informações precisas sobre os aspetos técnicos e financeiros dessa proposta, como os preços oferecidos ou os recursos que o proponente selecionado propõe aplicar para prestar os serviços que disponibiliza. Para fornecer uma fundamentação suficiente deste aspeto da proposta selecionada, a entidade adjudicante deve expor o raciocínio no termo do qual concluiu, por um lado, que, pelas suas características sobretudo financeiras, tal proposta respeitava designadamente a legislação do país em que os serviços deviam ser executados, em matéria de remuneração do pessoal, de contribuições para o regime de segurança social e de respeito das normas de segurança e de saúde no trabalho e, por outro, que o preço proposto abrangia todos os custos induzidos pelos aspetos técnicos da proposta selecionada (v. Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Belgium e o./Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 49 e jurisprudência referida).

63

Do mesmo modo, não basta que a entidade adjudicante se limite a uma simples constatação, numa única frase, segundo a qual a proposta selecionada no âmbito do procedimento não é anormalmente baixa nem que se limite a salientar que se considerou não era esse o caso (v., neste sentido, Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.os 45 e 47 e jurisprudência referida). Uma entidade adjudicante não pode justificar o caráter não anormalmente baixo de uma proposta limitando‑se a referir que, na sequência dos esclarecimentos prestados pelo proponente em questão, se considerou que a referida proposta não era anormalmente baixa (v., neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 2013, European Dynamics Belgium e o./EMA, T‑638/11, não publicado, EU:T:2013:530, n.o 64).

64

Além disso, a jurisprudência precisou que não bastava apresentar quadros isolados ou dados numéricos e que, na falta de comentários explicativos sobre as propostas, os pontos atribuídos pela entidade adjudicante refletiam apenas o resultado da avaliação efetuada e não podiam traduzir a própria avaliação adotada pela entidade adjudicante ou um resumo sucinto desta. Segundo a jurisprudência, deve ser possível compreender como é que a entidade adjudicante chegou ao resultado em causa (v., neste sentido, Acórdão de 18 de julho de 2016, Argus Security Projects/Comissão, T‑266/14, não publicado, EU:T:2016:415, n.os 47 a 51).

65

Por conseguinte, em presença de dúvidas quanto à existência de propostas anormalmente baixas, a entidade adjudicante deve expor o raciocínio no termo do qual concluiu, por um lado, que, pelas suas características sobretudo financeiras, tais propostas respeitavam designadamente a legislação do país em que os serviços deviam ser executados, em matéria de remuneração do pessoal, de contribuições para o regime de segurança social e de respeito das normas de segurança e de saúde no trabalho e, por outro, que o preço proposto abrangia todos os custos induzidos pelos aspetos técnicos das propostas selecionadas (Acórdão de 15 de outubro de 2013, European Dynamics Belgium e o./EMA, T‑638/11, não publicado, EU:T:2013:530, n.o 68).

Quanto às informações comunicadas aos recorrentes sobre a apreciação da existência de propostas anormalmente baixas

66

É à luz das considerações enunciadas nos n.os 35 a 65 supra que deve ser examinado o fundamento único relativo à falta de fundamentação no que diz respeito à suspeita de que as propostas dos proponentes selecionados eram anormalmente baixas.

67

Durante os dois meses que decorreram entre o momento em que a entidade adjudicante informou os recorrentes, em 28 de agosto de 2017, de que a sua proposta não tinha sido selecionada no termo do procedimento de avaliação e a interposição do recurso, em 30 de outubro de 2017, os recorrentes pediram clara e reiteradamente que lhes fosse dado a conhecer o raciocínio que tinha permitido à entidade adjudicante considerar que as propostas apresentadas pelos três proponentes selecionados não eram anormalmente baixas.

68

Em primeiro lugar, há que declarar que a AESA não respondeu a título individual aos pedidos dos recorrentes, apesar de estes terem apresentado razões concretas em apoio das suas dúvidas, por referência, nomeadamente, às estatísticas sobre as tarifas diárias mínimas publicadas no PayScale, um sítio de Internet especializado em informações relativas a compensações salariais e remunerações, na sua carta de 6 de setembro de 2017, e a uma comparação das suas pontuações técnicas com as dos adjudicatários, na sua carta de 25 de setembro de 2017. De acordo com a jurisprudência referida nos n.os 63 a 65, supra, os recorrentes tinham o direito de receber explicações tendo em conta os argumentos invocados.

69

Se a AESA considerava que os pontos de comparação utilizados para os cálculos dos recorrentes não eram válidos, poderia tê‑lo referido (v., neste sentido, Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 51). Em todo o caso, a AESA não estava dispensada da sua obrigação de fornecer explicações.

70

Em segundo lugar, ao examinar as informações que a AESA efetivamente prestou aos recorrentes e que enumera na sua contestação para justificar que, desse modo, cumpriu o seu dever de fundamentação no que respeita à questão dos preços potencialmente anormalmente baixos, verifica‑se que essas informações não eram pertinentes ou estavam incompletas.

71

As informações que a AESA divulgou aos recorrentes não incidiam sobre a questão dos preços anormalmente baixos. Assim, as respostas de 1 e de 15 de setembro de 2017 aos pedidos dos recorrentes continham os nomes dos três adjudicatários, um excerto do relatório de avaliação e informações complementares relativas à avaliação técnica, bem como a confirmação geral de que não tinha sido detetada nenhuma irregularidade no procedimento de adjudicação. Os detalhes revelados respeitavam unicamente a aspetos técnicos. Além disso, a decisão impugnada, de que os recorrentes receberam uma cópia integral em 17 de outubro de 2017, não se refere aos preços. O relatório de avaliação, cuja cópia consta em anexo à decisão impugnada e para o qual esta remete, contém muitas passagens obscurecidas e não fornece informações sobre os preços e respetiva composição. Este relatório contém uma observação geral que indica que os avaliadores controlaram as propostas financeiras na perspetiva dos erros aritméticos. Também são referidas as pontuações financeiras, mas sem qualquer explicação, e é comunicado um anexo E com o texto de um «modelo de proposta financeira». O relatório de avaliação indica igualmente que foi oferecida aos proponentes cujas propostas necessitavam de uma clarificação a possibilidade de responder a esses pedidos de clarificação. O relatório remete, quanto a este aspeto, para o «anexo G» para uma síntese geral dos proponentes em causa e um resumo dos contactos e da correspondência.

72

O anexo G do relatório de avaliação e várias mensagens de correio eletrónico, cujas cópias parcialmente ocultadas foram enviadas aos recorrentes, abordam, com efeito, o assunto dos preços anormalmente baixos.

73

Os recorrentes receberam assim um formulário‑tipo com perguntas variadas, incluindo sobre preços, mas as respostas a esses formulários não foram disponibilizadas. Além disso, o anexo G contém observações segundo as quais os três adjudicatários apresentaram os esclarecimentos e as provas pedidas, entre os quais, o Atos e o Icarus após uma prorrogação do prazo até 26 de julho de 2017, ao passo que, em relação ao e‑KARE, tinham sido formulados novos pedidos de esclarecimentos nessa mesma data.

74

Todavia, a cópia do relatório de avaliação enviada aos recorrentes e os seus anexos são omissos quanto ao raciocínio que levou os avaliadores, à luz dos esclarecimentos solicitados e recebidos, a considerar que as propostas dos quatro consórcios mencionados não eram, apesar da sua suspeita inicial, anormalmente baixas.

75

A AESA também divulgou aos recorrentes as suas mensagens de correio eletrónico a pedir a justificação dos preços, enviadas aos proponentes em causa em julho e agosto de 2017. Todas as informações específicas estavam ocultadas. Estes documentos revelam o objeto dos pedidos de justificação, a saber, a tarifa de certos perfis, sem identificar os perfis problemáticos. Por outro lado, nas suas mensagens de correio eletrónico, a AESA pede provas recordando as categorias de provas admissíveis e refere aos proponentes a sua obrigação de provar o respeito das regras do direito social e laboral. Numa das suas mensagens de correio eletrónico dirigidas ao UniSystems, a AESA salienta a obrigação de o proponente confirmar que está em condições de aplicar os preços propostos durante toda a vigência do acordo‑quadro.

76

Embora estes documentos contenham informações um pouco mais circunstanciadas do que uma declaração lacónica, a divulgação destas informações dispersa não basta para cumprir o dever de fundamentação. Primeiro, estes documentos limitam‑se a fornecer algumas informações sobre o procedimento seguido pela AESA, mas não expõem o seu raciocínio quanto às características pertinentes dos preços. Assim, estas informações não permitem saber qual era o raciocínio da instituição autora do ato, de modo a permitir não só ao juiz exercer a sua fiscalização mas também aos interessados conhecerem as razões da medida adotada a fim de defenderem os seus direitos (Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 47).

77

Segundo, resulta da jurisprudência referida no n.o 64 supra que a entidade adjudicante é obrigada a acompanhar as informações comunicadas sob a forma de números ou quadros de comentários explicativos que permitam compreender como chegou ao resultado em causa e refletir a avaliação que adotou. O único comentário que os recorrentes receberam em tempo útil quanto à apreciação da questão dos preços potencialmente anormalmente baixos constava da carta de 15 de setembro de 2017, segundo a qual os esclarecimentos pedidos aos diferentes proponentes respeitavam a diversos assuntos e as respostas tinham sido avaliadas e aceites pela comissão de avaliação. Estas comunicações não bastam para cumprir as exigências de fundamentação estabelecidas pela jurisprudência.

78

A AESA alega que os documentos divulgados proporcionaram aos recorrentes um conhecimento suficiente do contexto. Invoca o Acórdão de 4 de julho de 2017, European Dynamics Luxembourg e o./Agência Ferroviária da União Europeia (T‑392/15, EU:T:2017:462, n.o 97), do qual resulta que o conhecimento do contexto é suscetível de permitir aos recorrentes contestar a justeza da decisão. Todavia, no caso em apreço, as informações parciais divulgadas aos recorrentes, mesmo combinadas de modo a permitirem um conhecimento do contexto em que a decisão impugnada foi adotada, não são suficientes. No processo que deu origem ao acórdão acima referido, a entidade adjudicante tinha considerado que as propostas selecionadas não continham qualquer indício suscetível de despertar suspeitas quanto ao seu caráter anormalmente baixo. No presente processo, a suspeita inicial de preços anormalmente baixos não é contestada. Os recorrentes estão interessados na razão pela qual a entidade adjudicante decidiu dissipar as suas dúvidas iniciais. A AESA podia ter explicado, sem infringir as suas obrigações de confidencialidade, de que modo os três proponentes selecionados a tinham convencido do caráter apropriado das suas propostas, tal como fez mais tarde no âmbito do processo perante o Provedor de Justiça.

79

Além disso, mesmo tendo em conta os excertos de certas mensagens de correio eletrónico e do relatório de avaliação, no caso em apreço, não resultava desses documentos divulgados nenhuma informação quanto à questão de saber se o preço proposto integrava todos os custos induzidos pelos aspetos técnicos da proposta selecionada, apesar de os recorrentes, na sua carta de 25 de setembro de 2017, terem expressamente recordado que, segundo a jurisprudência, uma fundamentação juridicamente suficiente quanto à questão dos preços anormalmente baixos devia necessariamente incluir esse elemento.

80

Em terceiro lugar, importa reconhecer que a informação prestada pela AESA no âmbito do processo no Provedor de Justiça contém um raciocínio mais aprofundado, o qual levou o Provedor de Justiça a encerrar o processo, considerando que o caso estava resolvido. Com efeito, se essa explicação tivesse sido comunicada em tempo útil aos recorrentes, o presente litígio poderia eventualmente ter sido evitado. Não obstante, as informações complementares fornecidas pela AESA não podem ser tomadas em consideração para fundamentar a decisão impugnada, uma vez que datam de 4 de dezembro de 2017, quando o recurso já tinha sido interposto em 30 de outubro de 2017.

81

Em quarto lugar, a AESA não pode subtrair‑se ao seu dever de fundamentação invocando a confidencialidade dos documentos.

82

Com efeito, o acesso aos documentos não é o único meio disponível para dar a conhecer as informações necessárias para se declarar o caráter suficiente da fundamentação jurídica. A pretensa confidencialidade de certos documentos não impede a entidade adjudicante de reformular de forma mais abstrata os fundamentos pelos quais tomou a decisão de não excluir os proponentes em causa do procedimento de adjudicação em razão dos preços anormalmente baixos.

83

É certo que, como evoca a AESA, o dever de apresentar uma fundamentação não permite a divulgação de informações confidenciais. No entanto, a AESA não alega que não era possível fornecer, mediante pedido expresso, uma fundamentação adequada parafraseando os detalhes confidenciais ou uma fundamentação mais esclarecedora e mais útil do que páginas obscurecidas. Se certos dados não podem ser divulgados, em princípio, é possível descrever, pelo menos, a natureza desses dados ou a categoria de que resultam, ou ainda fornecer percentagens que permitam comparar os preços em questão com índices de referência. Assim, a jurisprudência reconheceu como justificações que podem explicar uma diferença substancial de preços, por exemplo, as seguintes indicações: o recurso a subcontratação pelo recorrente em 35 % enquanto o adjudicatário tinha pessoal para todas as tarefas, o facto de o recorrente ser um novo operador no mercado que não conhecia os objetos das prestações e, por conseguinte, tinha aplicado uma margem mais elevada, bem como o esforço em matéria de preços realizado pelo adjudicatário, comparações estabelecidas com contratos semelhantes anteriores em matéria de preços e a qualidade (v., neste sentido, Acórdão de 8 de outubro de 2015, Secolux/Comissão, T‑90/14, não publicado, EU:T:2015:772, n.os 64 e 65).

84

Informações deste tipo não afetam a confidencialidade dos números comerciais, dos nomes das partes contratantes nos contratos anteriores nem de outros detalhes sensíveis. Com efeito, no presente processo, a própria AESA revelou, na sua carta de 28 de agosto de 2017, a «pontuação financeira ponderada» do primeiro adjudicatário. Portanto, se esta pontuação não figurava entre os dados que a AESA considerava confidenciais, coloca‑se a questão de saber por que razão a «pontuação financeira ponderada» dos adjudicatários classificados no segundo e terceiro lugares não tinha sido comunicada aos recorrentes. A AESA devia ter em conta tanto o princípio da transparência como a proteção dos interesses comerciais legítimos das empresas e da concorrência leal. Segundo a jurisprudência, estes objetivos devem ser conciliados um com o outro para assegurar uma aplicação coerente do Regulamento Financeiro e do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43) (v., neste sentido, Acórdão de 14 de dezembro de 2017, Evropaïki Dynamiki/Parlamento, T‑136/15, EU:T:2017:915, n.o 67 e jurisprudência referida).

85

No caso em apreço, nomeadamente, a AESA não alega que não teve a possibilidade de formular no prazo adequado, pelo menos, explicações comparáveis às que, a convite do Provedor de Justiça, acabou por prestar em 4 de dezembro de 2017 e que não considerava aparentemente confidenciais. Até essa data, a AESA não fez qualquer esforço para formular uma fundamentação que satisfizesse os critérios exigidos. Concentrou‑se inteiramente na divulgação e na confidencialidade dos documentos sem considerar necessário dar explicações.

86

Todavia, por carta de 4 de dezembro de 2017, a AESA expôs de forma coerente e mais circunstanciada o processo de avaliação. Explicou, nomeadamente, que as suas dúvidas iniciais relativas a determinadas tarifas diárias tinham sido dissipadas com a apresentação de fórmulas de cálculos, recibos de pagamento, faturas, referências de contratos relativos a serviços prestados num ambiente semelhante e declarações quanto ao respeito das leis aplicáveis. Além disso, nessa carta, a AESA explicou que os recorrentes, na sua carta de 6 de setembro de 2017, não tinham apresentado elementos suficientemente fortes nem provas com base nos quais as três propostas classificadas nos três primeiros lugares pudessem ter sido rejeitadas.

87

Daqui se conclui que, na sua resposta de 4 de dezembro de 2017, que o Provedor de Justiça considerou ser mais aprofundada, melhor e mais completa, a AESA fez prova de que era possível uma fundamentação mais completa sem recorrer a informações ou a detalhes protegidos. A questão de saber se esta fundamentação apresentada em 4 de dezembro de 2017 teria sido suficiente não é objeto do presente processo. Para determinar o erro processual requerido para a anulação da decisão impugnada, basta constatar que teria sido possível fornecer em tempo útil uma explicação adequada, mas que não o foi no prazo apropriado.

88

Em face do exposto, importa acolher o fundamento único, relativo à insuficiência de fundamentação da decisão impugnada no que diz respeito às razões que levaram a entidade adjudicante a considerar que as propostas selecionadas não eram anormalmente baixas. Consequentemente, há que declarar que o desrespeito pela AESA das formalidades essenciais que rodeiam a decisão impugnada deve acarretar a sua anulação, sem que seja necessário interrogar‑se sobre se a AESA considerou erradamente que as propostas selecionadas não eram anormalmente baixas (v., neste sentido, Acórdão de 2 de fevereiro de 2017, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑74/15, não publicado, EU:T:2017:55, n.o 53 e jurisprudência referida).

Quanto às despesas

89

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a AESA sido vencida, há que, em conformidade com os pedidos dos recorrentes, condená‑la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

decide:

 

1)

É anulada a Decisão da Agência Europeia para a Segurança da Aviação (AESA), de 28 de agosto de 2017, que rejeitou a proposta apresentada pelo consórcio formado pelo TRASYS International EEIG e pela Axianseu — Digital Solutions SA no âmbito do concurso EASA.2017.HVP.08, relativo a um contrato público para a prestação de serviços de gestão de infraestruturas e aplicações informáticas em Colónia (Alemanha), e adjudicou o contrato em cascata a três outros proponentes.

 

2)

A AESA é condenada nas despesas.

 

Frimodt Nielsen

Forrester

Perillo

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de setembro de 2019.

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.

Top