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Document 62015CJ0508

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 21 de dezembro de 2016.
Sidika Ucar e Recep Kilic contra Land Berlin.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Verwaltungsgericht Berlin.
Reenvio prejudicial — Acordo de associação CEE‑Turquia — Decisão n.o 1/80 — Artigo 7.o, primeiro parágrafo — Direito de residência dos membros da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro — Requisitos — Desnecessidade de integração do trabalhador turco no mercado regular de trabalho durante os três primeiros anos de residência do membro da família.
Processos apensos C-508/15 e C-509/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:986

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

21 de dezembro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Acordo de associação CEE‑Turquia — Decisão n.o 1/80 — Artigo 7.o, primeiro parágrafo — Direito de residência dos membros da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro — Requisitos — Desnecessidade de integração do trabalhador turco no mercado regular de trabalho durante os três primeiros anos de residência do membro da família»

Nos processos apensos C‑508/15 e C‑509/15,

que têm por objeto pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha), por decisões de 9 de julho de 2015, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 24 de setembro de 2015, nos processos

Sidika Ucar (C‑508/15),

Recep Kilic (C‑509/15)

contra

Land Berlin,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: R. Silva de Lapuerta (relatora), presidente de secção, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev, C. G. Fernlund e S. Rodin, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de S. Ucar, por P. Meyer, C. Rosenkranz e M. Wilken, Rechtsanwälte,

em representação do Land Berlin, por M. Wehner, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por D. Martin e T. Maxian Rusche, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 15 de setembro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80 do Conselho de Associação, de 19 de setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da Associação, em anexo ao Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia, assinado, em 12 de setembro de 1963, em Ancara, pela República da Turquia, por um lado, e pelos Estados‑Membros da CEE e a Comunidade, por outro, e que foi concluído, aprovado e confirmado, em nome desta, pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de dezembro de 1963 (JO 1964, 217, p. 3685; EE 11 F1 p. 18; a seguir «acordo de associação»).

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de dois litígios que opõem Sidika Ucar (processo C‑508/15) e Recep Kilic (processo C‑509/15) ao Land Berlin (Land de Berlim, Alemanha) a respeito do indeferimento pelo Ausländerbehörde Berlin (Serviço de Estrangeiros de Berlim, a seguir «Serviço de Estrangeiros») do Landesamt für Bürger‑ und Ordnungsangelegenheiten (Serviço do Land para os processos relativos aos cidadãos e ordem pública, Alemanha) dos respetivos pedidos de prorrogação das suas autorizações de residência na Alemanha, e, quanto a R. Kilic, a respeito da decisão do Serviço de Estrangeiros que, além disso, ordenava a sua expulsão do território desse Estado‑Membro.

Quadro jurídico

Direito da União

Acordo de associação

3

Por força do seu artigo 2.o, n.o 1, o acordo de associação tem por objeto promover o reforço contínuo e equilibrado das relações comerciais e económicas entre as partes contratantes, tendo em plena consideração a necessidade de assegurar o desenvolvimento acelerado da economia da Turquia e o aumento do nível do emprego e das condições de vida do povo turco.

4

Para este efeito, o acordo de associação comporta uma fase preparatória, que permite à República da Turquia reforçar a sua economia com o auxílio da Comunidade (artigo 3.o), uma fase transitória, durante a qual se asseguram o estabelecimento progressivo de uma união aduaneira e a aproximação das políticas económicas (artigo 4.o), e uma fase definitiva que assenta na união aduaneira e implica o reforço da coordenação das políticas económicas das partes contratantes (artigo 5.o).

5

Nos termos do artigo 12.o do acordo de associação, inserido no título II do mesmo, com a epígrafe «Realização da fase transitória»:

«As Partes Contratantes acordam em inspirar‑se nos artigos [45.°, 46.° e 47.° TFUE] na realização progressiva entre si da livre circulação de trabalhadores.»

Protocolo adicional

6

O Protocolo adicional, que foi assinado em 23 de novembro de 1970, em Bruxelas, e concluído, aprovado e confirmado, em nome da Comunidade, pelo Regulamento (CEE) n.o 2760/72 do Conselho, de 19 de dezembro de 1972 (JO 1972, L 293, p. 1; EE 11 F1 p. 213; a seguir «protocolo adicional»), adotou, nos termos do seu artigo 1.o, as condições, as modalidades e o calendário de realização da fase transitória referida no artigo 4.o do acordo de associação.

7

Em conformidade com o seu artigo 62.o, o protocolo adicional faz parte integrante do referido acordo.

8

O protocolo adicional contém um título II, sob a epígrafe «Circulação de pessoas e de serviços», cujo capítulo I é consagrado aos trabalhadores.

9

O artigo 36.o do protocolo adicional, que faz parte deste capítulo I, prevê que a livre circulação de trabalhadores entre os Estados‑Membros da Comunidade e a Turquia será realizada gradualmente, em conformidade com os princípios enunciados no artigo 12.o do acordo de associação, entre o final do décimo segundo ano e do vigésimo segundo ano após a entrada em vigor do referido acordo e que o Conselho de Associação decidirá as modalidades necessárias para tal efeito.

Decisão n.o 1/80

10

Em 19 de setembro de 1980, o Conselho de Associação adotou a Decisão n.o 1/80. Os artigos 6.°, 7.° e 14.° dessa decisão figuram na secção 1, que se refere às questões relacionadas com o emprego e a livre circulação de trabalhadores, do seu capítulo II, com a epígrafe «Disposições sociais».

11

O artigo 6.o, n.o 1, de referida decisão tem a seguinte redação:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 7.o relativamente ao livre acesso ao emprego dos membros da sua família, o trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro:

tem direito nesse Estado‑Membro, após um ano de emprego regular, à renovação da sua autorização de trabalho para a mesma entidade patronal, se dispuser de um emprego;

tem direito nesse Estado‑Membro, após três anos de emprego regular e sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados‑Membros da Comunidade, a responder, dentro da mesma profissão, a outra oferta de emprego de uma entidade patronal de sua escolha, feita em condições normais e registada nos serviços de emprego desse Estado‑Membro;

beneficia nesse Estado‑Membro, após quatro anos de emprego regular, do livre acesso a qualquer atividade assalariada da sua escolha.»

12

O artigo 7.o, primeiro parágrafo, da mesma decisão dispõe:

«Os membros da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado‑Membro que tenham sido autorizados a reunir‑se‑lhe:

têm o direito de responder — sem prejuízo da prioridade que pode ser concedida aos trabalhadores dos Estados‑Membros da Comunidade — a qualquer oferta de emprego, desde que residam regularmente nesse Estado‑Membro há pelo menos três anos;

beneficiam nesse Estado‑Membro do livre acesso a qualquer atividade assalariada de sua escolha, desde que aí residam regularmente há pelo menos cinco anos.»

13

O artigo 14.o, n.o 1, da Decisão n.o 1/80 dispõe o seguinte:

«As disposições da presente secção são aplicadas sem prejuízo das limitações justificadas por razões de ordem pública, de segurança e de saúde públicas.»

Direito alemão

14

Decorre da decisão de reenvio no processo C‑509/15 que, no mês de maio de 1997, a concessão de uma autorização de residência em território alemão e, em abril de 1999, a prorrogação de uma tal autorização regiam‑se, por um lado, pela Gesetz über die Einreise und den Aufenthalt von Ausländern im Bundesgebiet (Lei relativa à entrada e residência de estrangeiros no território federal), de 9 de julho de 1990 (BGB1. 1990 I, p. 1354, a seguir «AuslG»), na sua versão de 29 de outubro de 1997 (BGB1. 1997 I, p. 2584), e, por outro, pelo Verordnung zur Durchführung des Ausländergesetzes (Regulamento de execução da AuslG).

15

Nos termos do § 7, n.o 2, da AuslG, na sua versão de 29 de outubro de 1997:

«A autorização de residência deve, em regra, ser recusada, se

[…]

2.

a subsistência do próprio estrangeiro não estiver assegurada […] pela sua atividade remunerada, pelo património ou outros recursos próprios […]»

16

Sob a epígrafe «Reagrupamento familiar de estrangeiros», o § 17 da AuslG, na sua versão de 29 de outubro de 1997, dispunha:

«(1)   Pode ser emitida e prorrogada uma autorização de residência a um membro da família de um estrangeiro, com o objetivo de proteger o casamento e a família consagrado no artigo 6.o da [Grundgesetz (Lei Fundamental)], para a constituição e garantia da vida em comum com o estrangeiro no território da República Federal.

(2)   A autorização de residência só pode ser emitida com o objetivo referido no n.o 1, se

1.

o estrangeiro for titular de uma autorização de residência ou residir legalmente no país,

2.

dispuser de uma habitação suficiente e

3.

estiver assegurada a subsistência do membro da família pela atividade remunerada do próprio estrangeiro, pelo património ou outros recursos próprios; para evitar dificuldades especiais, a autorização de residência pode ser emitida se a subsistência da família também estiver assegurada pela atividade remunerada própria de membros da família legalmente residentes ou tolerados no território da República Federal ou por um membro da família devedor de prestação de alimentos.»

17

Em conformidade com o disposto no § 96, n.o 4, da AuslG, na sua versão de 29 de outubro de 19997, em derrogação do § 17, n.o 2, pontos 2 e 3 e do § 8, n.o 1, pontos 1 e 2, será emitida aos cidadãos turcos de idade inferior a 16 anos que, antes de 15 de janeiro de 1997, foram dispensados do requisito da autorização de residência e permaneçam regularmente no território federal uma autorização de residência nos termos do § 17, n.o 1.

18

Nos termos do § 28, n.o 4, do Regulamento de execução da AuslG, até 30 de junho de 1998, deve ser emitida oficiosamente uma autorização de residência, nos termos das disposições legais aplicáveis, aos cidadãos turcos de idade inferior a 16 anos que estejam na posse de um passaporte nacional ou de um documento de identificação de menores que o substitua, desde que tenham sido autorizados a entrar no país, residam regularmente no território federal desde essa altura e desde que pelo menos um dos progenitores possua uma autorização de residência e tenha sido cumprida a obrigação de declaração ou de registo.

19

Decorre da decisão de reenvio no processo C‑508/15 que a concessão de uma autorização de residência no mês de novembro de 2001 e os pedidos de prorrogação de uma tal autorização apresentados nos anos de 2002 e 2004 se regiam pelas disposições da AuslG, com a redação que lhe foi dada pelas leis de 16 de fevereiro de 2001 (BGB1. 2001 I, p. 266) e 9 de janeiro de 2002 (BGBl. 2002 I, p. 361). Sob a epígrafe «Reagrupamento dos cônjuges», o § 18 da AuslG, assim alterado, previa:

«(1)   Nos termos do § 17, deve ser emitida uma autorização de residência ao cônjuge de um estrangeiro quando este

[…]

3.

Possui uma autorização de residência, o casamento já existia no momento da entrada do estrangeiro e foi declarado quando este pediu pela primeira vez a autorização de residência […]

[…]

(2)   a autorização de residência pode ser emitida em derrogação do parágrafo (1), n.o 3.»

20

Por último, decorre das decisões de reenvio que, no que respeita aos processos principais, as disposições nacionais aplicáveis à prorrogação de uma autorização de residência no ano de 2006, à concessão de uma autorização de residência nos termos do acordo de associação, bem como à expulsão, eram a Gesetz über den Aufenthalt, die Erwerbstätigkeit und die Integration von Ausländern im Bundesgebiet (Lei da residência, emprego e integração de estrangeiros no território federal), de 30 de julho de 2004 (BGBl 2004 I, p. 1950), bem como a versão desse mesmo diploma publicada em 25 de fevereiro de 2008 (BGBl 2008 I, p. 162, a seguir «AufenthG»).

21

O § 4, n.o 5, da AufenthG dispunha:

«Um estrangeiro que, em aplicação do acordo de associação […], disponha de um direito de residência tem a obrigação de provar a existência desse direito, demonstrando que é titular de um título de residência, se não possuir uma autorização de estabelecimento ou um título de residência permanente CE. A autorização de residência é emitida a requerimento do interessado.»

22

Sob a epígrafe «Condições gerais de emissão», o § 5 da AufenthG tinha a seguinte redação:

«(1)   A emissão de um título de residência pressupõe geralmente que:

1.

a subsistência esteja assegurada.

[…]»

23

O § 8 da AufenthG, sob a epígrafe «Prorrogação da autorização de residência», previa:

«(1) Aplicam‑se à prorrogação da autorização de residência as mesmas disposições que se aplicam à sua emissão.

[…]»

24

Nos termos do § 11, n.o 1, da AufenthG:

«Um estrangeiro que tenha sido expulso, repatriado ou afastado não pode entrar de novo no território federal e nele permanecer. Não lhe será concedido nenhum título de residência, ainda que estejam preenchidos os requisitos para tal nos termos da presente lei […]»

25

O § 27 da AufenthG, relativo ao princípio do reagrupamento familiar, dispunha:

«(1)   A autorização de residência para permitir a união da vida familiar no território federal a membros da família de estrangeiros (reagrupamento familiar) é concedida e prorrogada a título de proteção do casamento e da família, nos termos do artigo 6.o da [Grundgesetz (Lei Fundamental)].

[…]»

26

Sob a epígrafe «Reagrupamento dos cônjuges», o § 30 da AufenthG previa:

«(1)   Deve ser concedida uma autorização de residência ao cônjuge de um estrangeiro, quando o estrangeiro:

1.

seja titular de uma autorização de estabelecimento.

[…]»

27

O § 53 da AufenthG dispõe:

«Um estrangeiro é expulso quando,

1.

Tiver sido definitivamente condenado pela prática de um ou mais crimes dolosos, em pena privativa de liberdade ou em pena por delinquência juvenil de, pelo menos, três anos, ou se, pela prática de crimes dolosos cometidos num período de cinco anos, tiver sido definitivamente condenado em penas privativas de liberdade ou em penas por delinquência juvenil com a duração total de, pelo menos, três anos, ou se, na última condenação definitiva, lhe tiver sido aplicada medida de segurança.

2.

Tiver sido definitivamente condenado pela prática de um crime doloso previsto na lei relativa aos estupefacientes […] em pena por delinquência juvenil de, pelo menos, dois anos ou em pena privativa de liberdade definitiva e a pena não tiver sido suspensa […]»

28

Segundo o § 55 da AufenthG:

«(1)   Um estrangeiro pode ser expulso do território nacional quando a sua permanência constituir uma ameaça para a segurança e a ordem públicas ou quando afetar outros interesses relevantes da República Federal da Alemanha.

(2)   Um estrangeiro pode ser expulso nos termos do n.o 1, em especial quando

[…]

2.

tiver cometido uma infração de disposições legais que não seja apenas isolada ou de gravidade menor ou não tiver respeitado as decisões e atos judiciais ou administrativos […]»

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Processo C‑508/15

29

S. Ucar é uma cidadã turca que, no ano de 1977, casou com Ö. Ucar, também cidadão turco. Os cônjuges viviam na Turquia. Entre 1978 e 1986, nasceram quatro filhos dessa união. O casal divorciou‑se em 1991.

30

No mesmo ano, Ö. Ucar casou‑se com uma cidadã alemã, passando, desde então, a viver com ela na Alemanha. Durante o ano de 1996, foi‑lhe concedida uma autorização de residência de duração ilimitada pelas autoridades desse Estado‑Membro. O casal divorciou‑se em 1999.

31

Em setembro de 2000, S. Ucar voltou a casar‑se com o seu ex‑marido, Ö. Ucar. Em novembro de 2001, S. Ucar, acompanhada do mais novo dos filhos comuns do casal, entrou em território alemão com um visto para efeitos de reagrupamento familiar com o seu cônjuge. O Serviço de Estrangeiros emitiu‑lhe em 27 de novembro de 2001 uma autorização de residência relativa ao casal, válida até 26 de novembro de 2002. Ö. Ucar tinha um contrato de trabalho como padeiro desde maio de 2000. No final de 2001, Ö. Ucar deixou este emprego e, a partir do início do ano de 2002, passou a exercer uma atividade independente.

32

No procedimento para prorrogação da sua autorização de residência, para provar que a sua subsistência estava assegurada, S. Ucar referiu‑se aos rendimentos do seu cônjuge provenientes da sua atividade empresarial. Num primeiro momento, em 28 de novembro de 2002, a sua autorização de residência foi prorrogada por dois anos, depois, de novo, em 29 de novembro de 2004, até 28 de novembro de 2006, sempre à luz da prova de rendimentos relativa à atividade profissional do seu cônjuge. Em outubro de 2005, S. Ucar cessou a sua atividade independente e, em seguida, recomeçou a trabalhar como padeiro ao abrigo de um contrato de trabalho, exercendo esta atividade ininterruptamente entre 1 de novembro de 2005 e dezembro de 2011.

33

Em 21 de novembro de 2006, o Serviço de Estrangeiros concedeu a S. Ucar uma autorização de residência para efeitos de reagrupamento familiar, mencionando que o seu marido tinha voltado a exercer uma atividade por conta de outrem desde novembro de 2005. A autorização de residência foi em seguida prorrogada várias vezes, da última vez até 12 de dezembro de 2013.

34

Em 16 de agosto de 2013, S. Ucar requereu a emissão de uma autorização de residência com base num direito de residência nos termos do disposto no acordo de associação e em conformidade com o disposto no § 4, n.o 5, da AufenthG. Fundamentou o pedido alegando que preenchia os requisitos previstos no artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, tendo em conta a atividade por conta de outrem continuada do seu marido desde novembro de 2005.

35

Por decisão de 6 de maio de 2014, o Serviço de Estrangeiros recusou prorrogar uma vez mais a autorização de residência de cônjuge de que S. Ucar beneficiava, com base no facto de a sua subsistência não estar garantida. Por outro lado, considerando que não havia adquirido o direito de residência ao abrigo do acordo de associação, o Serviço de Estrangeiros também não lhe concedeu autorização de residência, com fundamento das disposições conjugadas do § 4, n.o 5, da AufenthG e do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80.

36

Com efeito, segundo o Serviço de Estrangeiros, para a aquisição do direito de residência com base nessas disposições, é necessário, por um lado, que o membro da família que possibilitou o reagrupamento familiar já estivesse integrado no mercado regular de trabalho no momento em que foi concedida a primeira autorização de residência para reagrupamento familiar e, por outro, que a qualidade de trabalhador do reagrupante se tenha mantido durante os três anos que se seguiram à emissão da referida autorização. Por conseguinte, para este efeito, não basta que o reagrupante adquira posteriormente a qualidade de trabalhador e conserve essa qualidade durante três anos. Por último, o Serviço de Estrangeiros considerou que uma prorrogação da autorização de residência não pode ser considerada uma autorização de reagrupamento familiar na aceção do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, uma vez que, quando entrou em território alemão durante o ano de 2001, S. Ucar tinha já sido autorizada a reunir‑se com o seu marido, atendendo à sua qualidade de trabalhador turco.

37

S. Ucar interpôs recurso da decisão de 6 de maio de 2014 do Serviço de Estrangeiros perante o órgão jurisdicional de reenvio, o Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha).

38

No âmbito do referido recurso, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se quanto ao âmbito do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80.

39

Nestas condições, o Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 7.o, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.o 1/80 ser interpretado no sentido de que os pressupostos de facto também estão preenchidos se, antes dos três anos de residência regular do membro da família com o trabalhador turco integrado no mercado de trabalho regular, tiver decorrido um período de tempo em que o titular originário do direito, após o reagrupamento autorizado do membro da família na aceção desta disposição, deixou de estar integrado no mercado de trabalho regular do Estado‑Membro?

2)

Deve o artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80 ser interpretado no sentido de que a prorrogação de um título de residência deve ser entendida como autorização de reagrupamento familiar com um trabalhador turco integrado no mercado de trabalho regular, prevista nesta disposição, quando o membro da família em causa vive ininterruptamente com o trabalhador turco desde o seu reagrupamento autorizado nos termos desta disposição, mas este último, depois de um abandono temporário do mercado de trabalho regular no Estado‑Membro, só no momento da prorrogação do título de residência voltou a estar integrado nesse mercado?»

Processo C‑509/15

40

R. Kilic é um cidadão turco, nascido na Turquia, em 11 de novembro de 1993, durante as férias de seus pais, de nacionalidade turca, que já então viviam na Alemanha. Entrou na Alemanha em 16 de abril de 1994. Nesta data, o seu pai estava desempregado há mais de um ano. Também a sua mãe, que o criou sozinha, após a separação dos cônjuges em maio de 1996 e até aos seus 14 anos de idade, não estava integrada no mercado de trabalho. Depois de, em janeiro de 1997, passar a ser obrigatória a autorização de residência para todos os nacionais turcos com idade inferior a 16 anos, foi emitida a R. Kilic, em 5 de maio de 1997, uma autorização de residência válida até 5 de maio de 1999. Em 30 de junho de 1998, a sua mãe começou a trabalhar por conta de outrem, atividade que exerceu de modo quase ininterrupto até ao mês de abril de 2003, data a partir da qual a deixou de exercer durante vários anos, por razões de gravidez e maternidade.

41

Em 23 de abril de 1999, o Serviço de Estrangeiros prorrogou por um ano a autorização de residência de R. Kilic. Há que salientar que nessa ocasião foi apresentada uma declaração do empregador da sua mãe. Apesar da referência, pelas autoridades alemãs, à circunstância de a mãe receber prestações sociais, tal não impediu a prorrogação da autorização de residência de R. Kilic no quadro jurídico então vigente. Essa autorização de residência foi depois prorrogada várias vezes por prazos fixos, a última vez até 10 de novembro de 2011. Desde então R. Kilic possui certificados provisórios.

42

R. Kilic cometeu várias vezes infrações penais. Pela última, foi condenado por sentença de 11 de junho de 2013 do Amtsgericht Tiergarten (Tribunal Distrital de Tiergaten, Alemanha) a uma pena privativa da liberdade de três anos e três meses, por delinquência juvenil e tráfico de estupefacientes. Foram tomadas em consideração nessa sentença várias condenações anteriores, entre as quais condenações por ofensa à integridade física, ameaças, extorsão, perseguição e dano.

43

Antes das suas detenções, R. Kilic teve um percurso escolar caótico, tendo todavia obtido, em 17 de junho de 2011, na prisão, um certificado de estudos gerais com formação profissionalizante.

44

Por decisão de 24 de julho de 2014, o Serviço de Estrangeiros, por um lado, indeferiu o pedido de prorrogação da autorização de residência de R. Kilic e, por outro, com base nas disposições conjugadas do § 53, pontos 1 e 2, e do § 55 da AufenthG, ordenou a sua expulsão do território alemão.

45

Segundo o Serviço de Estrangeiros, R. Kilic não beneficiava de uma proteção de residência nos termos do acordo de associação. Com efeito, não tinha adquirido nenhum direito ao abrigo do artigo 7.o da Decisão n.o 1/80, porque os seus pais não tinham estado integrados no mercado de trabalho regular durante os primeiros três anos seguintes à entrada de R. Kilic em território alemão.

46

Além disso, considerando, por um lado, à luz das infrações penais graves e numerosas cometidas pelo interessado, que era de esperar que pudesse vir a praticar outros atos censuráveis no futuro e, por outro, que ameaçava de modo significativo interesses fundamentais da sociedade, o Serviço de Estrangeiros considerou que existia uma ameaça séria à segurança e à ordem públicas e decidiu por isso ordenar a expulsão de R. Kilic. Com efeito, segundo aquele serviço, a ponderação do contexto factual e jurídico justificavam uma tal medida, uma vez que o interesse público desta última prevalecia claramente sobre o interesse de R. Kilic a ver preservada a sua ligação pessoal, pouco significativa, com a República Federal da Alemanha e à manutenção da sua residência no território deste Estado‑Membro.

47

Em 1 de setembro de 2014, R. Kilic, que fora libertado em 27 de maio de 2015, interpôs recurso da decisão do Serviço de Estrangeiros de 24 de julho de 2014 junto do órgão jurisdicional de reenvio, alegando que havia adquirido um direito de residência nos termos do artigo 7.o da Decisão n.o 1/80, uma vez que a sua mãe havia estado integrada no mercado regular de trabalho durante mais de três anos desde 30 de junho de 1998. Assim, segundo R. Kilic, a proteção contra a expulsão que lhe confere o artigo 14.o dessa decisão não foi suficientemente tomada em conta na ponderação dos interesses em presença.

48

Nestas circunstâncias, o Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Pode entender‑se como autorização de reagrupamento familiar, na aceção do artigo 7.o da Decisão n.o 1/80[,]a prorrogação da autorização de residência concedida ao membro da família, após a concessão do reagrupamento familiar com titulares originais do direito que não estavam integrados no mercado de trabalho, numa data em que o titular originário do direito em cuja residência o membro da família tem a sua residência regular passa a ser um trabalhador por conta de outrem?»

49

Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2015, os processos C‑508/15 e C‑509/15 foram apensados para efeitos das fases escrita e oral e do acórdão.

Quanto às questões prejudiciais

Observações preliminares

50

Os presentes processos apensos dizem respeito a dois cidadãos turcos, S. Ucar e R. Kilic, que, na sua qualidade de membros de um agregado familiar, a saber, respetivamente, cônjuge e filho, de um cidadão também turco que reside legalmente na Alemanha, se instalaram neste Estado‑Membro, onde residiram legalmente durante mais de dez anos, e que lhes viram ser indeferida a prorrogação das suas autorizações de residência pelas autoridades alemãs.

51

A título preliminar, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, instituído pelo artigo 267.o TFUE, compete a este dar ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido e que, nesta ótica, compete ao Tribunal de Justiça, se necessário, reformular as questões que lhe foram submetidas (acórdão de 8 de dezembro de 2011, Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, C‑157/10, EU:C:2011:813, n.o 18).

52

No caso em apreço, atendendo às circunstâncias factuais que se verificam nos dois litígios nos processos principais, afigura‑se que a primeira questão submetida no âmbito do processo C‑508/15 é igualmente relevante no âmbito do processo C‑509/15, de tal modo que, com vista a dar ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que lhe permita decidir este último litígio, importa examinar a primeira questão submetida no âmbito do processo C‑508/15 em função das circunstâncias factuais que se verificam nos dois litígios nos processos principais.

Quanto à primeira questão no processo C‑508/15

53

Com a sua primeira questão no processo C‑508/15, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 7.o, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.o 1/80 deve ser interpretado no sentido de que essa disposição confere um direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento ao membro da família de um trabalhador turco que foi autorizado a entrar nesse Estado‑Membro ao abrigo do reagrupamento familiar e que, desde a sua entrada no território do referido Estado‑Membro, coabitou com esse trabalhador turco, apesar de o período de três anos durante o qual este último esteve integrado no mercado regular de trabalho não se ter seguido imediatamente à chegada do membro da família em causa ao Estado‑Membro de acolhimento, sendo antes posterior àquela.

54

A título preliminar, há que recordar o disposto no artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, que consagra, em termos claros, precisos e incondicionais, o direito de os membros da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho no Estado‑Membro de acolhimento que foram autorizados a reunir‑se‑lhe a responder, sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados‑Membros, a qualquer oferta de trabalho quando tenham residido regularmente nesse Estado‑Membro desde há pelo menos três anos (primeiro travessão), bem como o direito de livre acesso a qualquer atividade assalariada de sua escolha no Estado‑Membro em cujo território tenham residido regularmente há pelo menos cinco anos (segundo travessão) (acórdão de 17 de abril de 1997, Kadiman, C‑351/95, EU:C:1997:205, n.o 27).

55

Assim, nos termos desta disposição, os membros da família de um trabalhador turco beneficiam, sem prejuízo do preenchimento dos requisitos aí previstos, de um direito próprio de acesso ao mercado de trabalho no Estado‑Membro de acolhimento. A esse propósito, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente julgado que os direitos que o referido artigo 7.o, primeiro parágrafo, concede aos membros da família de um trabalhador turco, no plano do emprego no Estado‑Membro em causa, implicam necessariamente, sob pena de privar de qualquer efeito o direito de aceder ao mercado de trabalho e de exercer efetivamente uma atividade assalariada, a existência de um direito correlativo de residência do interessado (acórdão de 19 de julho de 2012, Dülger, C‑451/11, EU:C:2012:504, n.o 28 e jurisprudência referida).

56

Resulta da redação desta disposição que a aquisição dos direitos nela previstos está sujeita a três requisitos cumulativos, a saber, que a pessoa em causa seja membro da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho do Estado‑Membro de acolhimento, que essa pessoa tenha sido autorizada pelas instâncias competentes desse Estado a reunir‑se ao referido trabalhador e que essa pessoa tenha residido legalmente nesse Estado‑Membro durante pelo menos três ou cinco anos (v., neste sentido, acórdão de 19 de julho de 2012, Dülger, C‑451/11, EU:C:2012:504, n.o 29).

57

No que se refere, antes de mais, ao requisito relativo à integração do trabalhador turco no mercado regular de trabalho do Estado‑Membro de acolhimento, o Tribunal de Justiça declarou que este requisito relaciona‑se com o conceito de «integração no mercado regular de trabalho», sendo, por conseguinte, o seu âmbito idêntico ao que esse conceito reveste no âmbito do artigo 6.o, n.o 1, da Decisão n.o 1/80, a saber, designando o conjunto dos trabalhadores que cumpriram as prescrições legais e regulamentares do Estado‑Membro de acolhimento e que têm, assim, o direito de exercer uma atividade profissional no seu território (v., neste sentido, acórdão de 18 de dezembro de 2008, Altun, C‑337/07, EU:C:2008:744, n.os 22, 23 e 28).

58

Em seguida, no que respeita ao requisito que impõe que o membro da família em causa tenha sido autorizado a reunir‑se ao trabalhador turco, o Tribunal de Justiça precisou que este requisito visa excluir do âmbito de aplicação do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80 os membros da família do trabalhador turco que entraram no território do Estado‑Membro de acolhimento e aí residem em infração à regulamentação desse Estado‑Membro (v., neste sentido, acórdão de 11 de novembro de 2004, Cetinkaya, C‑467/02, EU:C:2004:708, n.o 23).

59

Neste contexto, o Tribunal de Justiça declarou que esta disposição abrange a situação de um cidadão turco que, na qualidade de membro da família de um trabalhador turco que está ou esteve integrado no mercado regular de trabalho do Estado‑Membro de acolhimento, foi autorizado a aí se reunir ao referido trabalhador ao abrigo do reagrupamento familiar ou nasceu e sempre residiu nesse Estado (acórdão de 18 de julho de 2007, Derin, C‑325/05, EU:C:2007:442, n.o 48 e jurisprudência referida).

60

Por último, no que se refere ao requisito de residência, o artigo 7.o, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.o 1/80 impõe ao membro da família de um trabalhador turco a obrigação de residir junto deste, de forma ininterrupta, durante um período de pelo menos três anos (acórdão de 18 de dezembro de 2008, Altun, C‑337/07, EU:C:2008:744, n.o 30).

61

Com efeito, decorre de jurisprudência assente do Tribunal de Justiça que esta disposição exige que o reagrupamento familiar, que justificou a entrada do membro da família no território do Estado‑Membro de acolhimento, se manifeste durante um certo tempo através da coabitação efetiva em comunhão doméstica com o trabalhador e que tal deve suceder sempre que o interessado não preencha, ele próprio, as condições para aceder ao mercado de trabalho nesse Estado (v., designadamente, acórdão de 16 de março de 2000, Ergat, C‑329/97, EU:C:2000:133, n.o 36).

62

A este respeito, o Tribunal de Justiça sublinhou que, para efeitos da aquisição, nos termos do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, do direito de acesso ao mercado de trabalho no Estado‑Membro de acolhimento pelo membro da família de um trabalhador turco, a condição da integração deste no mercado regular de trabalho tem de ter sido preenchida durante, pelo menos, o período de três anos de residência comum (acórdão de 18 de dezembro de 2008, Altun, C‑337/07, EU:C:2008:744, n.o 37).

63

No caso em apreço, é pacífico que tanto S. Ucar como R. Kilic foram autorizados a reunir‑se aos respetivos membros da família, todos cidadãos turcos, no Estado‑Membro de acolhimento e sempre coabitaram, respetivamente, com o seu marido e a sua mãe.

64

É também pacífico que o marido de S. Ucar e a mãe de R. Kilic exerceram uma atividade profissional por conta de outrem de forma ininterrupta por três anos, o que confere aos membros das suas famílias os direitos previstos no artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, não imediatamente após a chegada dos recorrentes no processo principal ao território do Estado‑Membro de acolhimento, mas posteriormente.

65

Por conseguinte, há que precisar se, para efeitos de aquisição de um direito de residência nos termos do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, o requisito da integração do trabalhador turco de referência no mercado regular de trabalho deve necessariamente estar preenchido tanto na própria data da chegada do membro da família em causa ao Estado‑Membro de acolhimento como durante os três ou cinco anos imediatamente seguintes a essa data, conforme considerou o Serviço de Estrangeiros e como alegou também o Governo alemão.

66

Há que sublinhar, em primeiro lugar, que um tal requisito não está expressamente previsto no artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80.

67

Em segundo lugar, há que interpretar o artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80 à luz do objetivo prosseguido por esta disposição e do sistema que institui.

68

A este respeito, importa recordar que o sistema de aquisição progressiva dos direitos previsto no artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80 prossegue um duplo objetivo. Numa primeira fase, antes do termo do período inicial de três anos, a referida disposição visa permitir a presença dos membros da família do trabalhador migrante junto de si, para assim favorecer, através do reagrupamento familiar, o emprego e a permanência do trabalhador turco já regularmente integrado no Estado‑Membro de acolhimento. A mesma disposição pretende reforçar, numa segunda fase, a inserção duradoura da família do trabalhador migrante turco no Estado‑Membro de acolhimento, atribuindo ao membro da família em causa, após três anos de residência legal, a possibilidade de também ele aceder ao mercado de trabalho. A finalidade essencial assim prosseguida é consolidar a posição do referido membro da família, que se encontra, nessa fase, já regularmente integrado no Estado‑Membro de acolhimento, dando‑lhe os meios de prover pessoalmente às suas necessidades no Estado em questão e, portanto, de consolidar uma situação autónoma em relação à do trabalhador migrante (acórdão de 19 de julho de 2012, Dülger, C‑451/11, EU:C:2012:504, n.os 38 a 40 e jurisprudência referida).

69

Além disso, à luz do objetivo geral prosseguido pela Decisão n.o 1/80, que consiste em melhorar, no domínio social, o regime de que beneficiam os trabalhadores turcos e os membros das suas famílias com vista à progressiva realização da livre circulação, o sistema estabelecido, em particular, pelo artigo 7.o, primeiro parágrafo, da mesma decisão destina‑se a criar condições favoráveis ao reagrupamento familiar no Estado‑Membro de acolhimento (acórdão de 29 de março de 2012, Kahveci, C‑7/10 e C‑9/10, EU:C:2012:180, n.o 34).

70

Ora, uma interpretação do artigo 7.o, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.o 1/80 como a proposta pelo Governo alemão, segundo a qual, em circunstâncias como as do processo principal, o simples facto de o período de três anos durante o qual o trabalhador turco de referência exerceu ininterruptamente uma atividade por conta de outrem não ocorrer imediatamente desde a data do reagrupamento familiar não permite que um cidadão turco, como S. Ucar ou R. Kilic, possa prevalecer‑se dos direitos que esta disposição lhe confere, é excessivamente restritiva à luz do objetivo prosseguido por esta disposição.

71

Além disso, há que salientar que os membros da família em causa que não preencham os requisitos enunciados no artigo 6.o, n.o 1, da Decisão n.o 1/80 não teriam em qualquer caso o direito de aceder ao mercado de trabalho no Estado‑Membro de acolhimento, de modo que não poderiam consolidar a sua posição nesse Estado‑Membro, e isto mesmo que tenham aí residido regularmente por muitos anos, que aí estejam, em princípio, bem integrados, que tenham coabitado com o cidadão turco desde a data da sua chegada ao Estado‑Membro de acolhimento e isto durante um período durante o qual esse cidadão exerceu ininterruptamente uma atividade por conta de outrem durante pelo menos três ou cinco anos, o que não é conforme com o objetivo do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80.

72

Contudo, nada na redação desta última disposição nem, em termos gerais, na Decisão n.o 1/80 permite considerar que a intenção dos autores desta última era excluir os membros da família de uma categoria tão importante de trabalhadores turcos dos direitos previstos no artigo 7.o, primeiro parágrafo, dessa decisão.

73

Acresce que há que recordar que, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, o exercício dos direitos dos nacionais turcos resultantes da Decisão n.o 1/80 não está subordinado a qualquer condição relacionada com o motivo por que lhes foi inicialmente concedido o direito de entrada e de residência no Estado‑Membro de acolhimento (acórdão de 18 de dezembro de 2008, Altun, C‑337/07, EU:C:2008:744, n.o 42 e jurisprudência referida).

74

Neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou que o artigo 6.o, n.o 1, da Decisão n.o 1/80 visa os nacionais turcos que têm a qualidade de trabalhadores no Estado‑Membro de acolhimento sem, todavia, exigir que tenham entrado na União nessa qualidade, podendo ter adquirido essa qualidade depois da sua entrada na mesma (v., neste sentido, acórdão de 24 de janeiro de 2008, Payir e o., C‑294/06, EU:C:2008:36, n.o 38).

75

Nestas condições, há que considerar que, para efeitos de aquisição de um direito de residência nos termos do artigo 7.o, primeiro parágrafo, da Decisão n.o 1/80, por um membro da família do trabalhador turco de referência, o requisito da integração deste último trabalhador no mercado regular de trabalho não tem necessariamente de estar preenchido na data de chegada do membro da família em questão ao Estado‑Membro de acolhimento e durante os três ou os cinco anos imediatamente seguintes a essa data.

76

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão no processo C‑508/15 que o artigo 7.o, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.o 1/80 deve ser interpretado no sentido de que esta disposição confere um direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento ao membro da família de um trabalhador turco, que foi autorizado a entrar nesse Estado‑Membro ao abrigo do reagrupamento familiar, e que, desde a sua entrada no território do referido Estado‑Membro, coabitou com esse trabalhador turco, mesmo que o período de pelo menos três anos durante o qual este último esteve integrado no mercado regular de trabalho não se seguiu imediatamente à chegada do membro da família em causa no Estado‑Membro de acolhimento, sendo posterior a esta.

Quanto à segunda questão no processo C‑508/15 e à questão no processo C‑509/15

77

Tendo em atenção a resposta dada à primeira questão no processo C‑508/15, não há que responder à segunda questão nesse mesmo processo nem à questão no processo C‑509/15.

Quanto às despesas

78

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

O artigo 7.o, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Decisão n.o 1/80 do Conselho de Associação, de 19 de setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da Associação, deve ser interpretado no sentido de que esta disposição confere um direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento ao membro da família de um trabalhador turco, que foi autorizado a entrar nesse Estado‑Membro ao abrigo do reagrupamento familiar, e que, desde a sua entrada no território do referido Estado‑Membro, coabitou com esse trabalhador turco, mesmo que o período de pelo menos três anos durante o qual este último esteve integrado no mercado regular de trabalho não se seguiu imediatamente à chegada do membro da família em causa no Estado‑Membro de acolhimento, sendo posterior a esta.

 

Assinaturas


( *1 ) * Língua do processo: alemão.

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