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Document 62013TJ0355

Acórdão do Tribunal Geral (Segunda Secção) de 21 de janeiro de 2015.
easyJet Airline Co. Ltd contra Comissão Europeia.
Concorrência ― Abuso de posição dominante ― Mercado dos serviços aeroportuários ― Decisão de rejeição de uma denúncia ― Artigo 13.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003 ― Instrução do processo por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro ― Rejeição da denúncia por motivos de prioridade ― Decisão da autoridade da concorrência que tira conclusões, em direito da concorrência, de uma investigação conduzida à luz de uma legislação nacional aplicável ao setor em causa ― Dever de fundamentação.
Processo T-355/13.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2015:36

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

21 de janeiro de 2015 ( *1 )

«Concorrência — Abuso de posição dominante — Mercado dos serviços aeroportuários — Decisão de rejeição de uma denúncia — Artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 — Instrução do processo por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro — Rejeição da denúncia por motivos de prioridade — Decisão da autoridade da concorrência que tira conclusões, em direito da concorrência, de uma investigação conduzida à luz de uma legislação nacional aplicável ao setor em causa — Dever de fundamentação»

No processo T‑355/13,

easyJet Airline Co. Ltd, com sede em Luton (Reino Unido), representada por M. Werner e R. Marian, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por A. Biolan e F. Ronkes Agerbeek, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Luchthaven Schiphol NV, com sede em Schiphol (Países Baixos), representada por J. de Pree, G. Hakopian e S. Molin, advogados,

interveniente,

que tem por objeto um pedido de anulação da Decisão C(2013) 2727 final da Comissão, de 3 de maio de 2013, que indefere a denúncia apresentada pela recorrente contra a Luchthaven Schiphol, por um alegado comportamento anti concorrencial no mercado dos serviços aeroportuários (processo COMP/39.869 — easyjet/Schiphol).

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: M. E. Martins Ribeiro, presidente, S. Gervasoni (relator) e L. Madise, juízes,

secretário: C. Kristensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 26 de setembro de 2014,

profere o presente

Acórdão

Factos na origem do litígio

1

A recorrente, easyJet Airline Co., é uma companhia aérea do Reino Unido, que exerce uma atividade importante na União Europeia, nomeadamente em voos com partida do aeroporto de Schiphol em Amsterdão e chegada a esse aeroporto (Países Baixos).

2

Em 11 de setembro de 2008, a recorrente apresentou duas denúncias à Nederlandse Mededingingsautoriteit (autoridade de concorrência neerlandesa, a seguir «NMa») contra a Luchthaven Schiphol NV (a seguir «Schiphol»), que explora o aeroporto de Schiphol em Amsterdão, relativas às taxas de segurança e às taxas de passageiros a aplicar a partir de 1 de novembro de 2008. A primeira denúncia foi apresentada com base no § 8.25f, n.o 1, da WetLuchtvaart (lei da aviação, a seguir «WL») e a segunda com base nas disposições da Mededingingswet (lei da concorrência, a seguir «MW») e do artigo 102.o TFUE.

3

Em 20 de novembro de 2008, a recorrente apresentou uma nova denúncia à NMa, relativa às taxas de segurança e às taxas de passageiros a serem aplicadas pela Schiphol a partir de 1 de abril de 2009, com base no § 8.25f, n.o 1, da WL (a seguir «terceira denúncia»).

4

Em 19 de dezembro de 2008, a NMa julgou a primeira denúncia intempestiva. Por outro lado, informou a recorrente de que suspendia o exame da segunda denúncia enquanto aguardava os resultados da apreciação da terceira.

5

Por decisão de 14 de julho de 2009, a NMa rejeitou a terceira denúncia com o fundamento de que a recorrente não tinha demonstrado que as taxas aplicadas pela Schiphol a partir de 1 de abril de 2009 eram contrárias às disposições da WL e, concretamente, aos princípios de cálculo das taxas em função dos custos, da não discriminação e do caráter razoável das taxas. A recorrente interpôs recurso desta decisão, ao qual foi negado provimento por acórdão do Rechtbank Rotterdam (tribunal distrital de Roterdão) de 25 de novembro de 2010. Em seguida, interpôs recurso desse acórdão para o College van Beroep voor het bedrijfsleven (tribunal de recurso do contencioso administrativo em matéria económica) antes de desistir.

6

Por decisão de 16 de dezembro de 2009, a NMa rejeitou a segunda denúncia. Considerou que as diferentes denúncias apresentadas pela recorrente tinham características comuns e que as taxas a entrar em vigor em abril de 2009 não eram, no essencial, diferentes das que entraram em vigor em novembro de 2008. Além disso, a NMa considerou que os conceitos de não discriminação e de caráter razoável que figuram no § 8.25d, n.os 2 e 3, da WL eram análogos aos do direito da concorrência europeu (artigo 102.o TFUE) e nacional (artigo 24.o MW). Recordou igualmente que, na sua decisão de 14 de julho de 2009, tinha interpretado as disposições da WL de harmonia com a jurisprudência das jurisdições da União relativa ao artigo 102.o TFUE. Por outro lado, salientou que não era necessária, no caso em apreço, uma definição do mercado relevante, a que tinha procedido no âmbito de uma investigação efetuada com base nas disposições do direito da concorrência, uma vez que tinha suposto que a Schiphol se encontrava numa situação de poderio económico. Concluiu que um exame das taxas aplicadas em novembro de 2008, à luz do artigo 102.o TFUE, levaria aos mesmos resultados que o exame da terceira denúncia e, consequentemente, indeferiu a segunda denúncia em conformidade com a sua política de fixação de prioridades. A recorrente não interpôs recurso desta decisão.

7

Em 14 de janeiro de 2011, a recorrente apresentou uma denúncia à Comissão Europeia com fundamento no artigo 7.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1). Alegava que as taxas fixadas pela Schiphol eram discriminatórias e excessivas, além de constituírem uma violação do artigo 102.o TFUE. Indicava, por outro lado, que tinha apresentado várias denúncias à NMa, mas considerava que esta não tinha adotado uma decisão final quando ao mérito de uma denúncia em matéria de concorrência.

8

Em 18 de dezembro de 2012, a Comissão informou a recorrente de que tencionava indeferir a sua denúncia com fundamento no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, uma vez que o assunto já tinha sido apreciado por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro. A recorrente respondeu à Comissão por carta de 31 de janeiro de 2013.

9

Em 3 de maio de 2013, a Comissão adotou a Decisão C(2013) 2727 final, na qual indeferiu a denúncia da recorrente com fundamento no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 (a seguir «decisão recorrida»). Por outro lado, considerou que a denúncia podia, em todo o caso, ser igualmente indeferida por falta de interesse da União Europeia, em razão da fraca probabilidade de fazer prova de uma violação do artigo 102.o TFUE, tendo em conta as conclusões a que a NMa tinha chegado.

Tramitação processual e pedidos das partes

10

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de julho de 2013, a recorrente interpôs o presente recurso.

11

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão recorrida;

condenar a Comissão nas despesas.

12

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

13

Por requerimento apresentado em 4 de outubro de 2013, a Schiphol pediu para intervir no litígio em apoio dos pedidos da Comissão, em conformidade com o artigo 115.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Por despacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral de 10 de dezembro de 2013, a Schiphol foi autorizada a intervir no litígio em apoio dos pedidos da Comissão.

14

A Schiphol conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

Quanto ao mérito

15

A recorrente apresenta dois fundamentos de recurso. Em primeiro lugar, alega que a Comissão cometeu um erro de direito e um erro manifesto de apreciação ao considerar que a sua denúncia podia ser rejeitada com fundamento no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003. Em segundo lugar, alega que a decisão recorrida não está suficientemente fundamentada.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro manifesto de apreciação na aplicação do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003

16

Por um lado, a recorrente sustenta que a Comissão cometeu um erro de direito ao considerar que a NMa apreciou a sua denúncia à luz do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, quando a verdade é que a referida denúncia foi indeferida por razões de prioridade. Por outro, considera que a Comissão cometeu um erro de direito e um erro manifesto de apreciação ao basear‑se numa decisão da NMa relativa a uma denúncia que não foi objeto de uma investigação conduzida à luz das regras do direito da concorrência da União, mas segundo o direito nacional da navegação aérea.

17

A título preliminar, importa recordar que a Comissão, investida pelo artigo 105.o, n.o 1, TFUE da missão de velar pela aplicação dos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE, é chamada a definir e a pôr em prática a política da concorrência da União, dispondo para esse efeito de um poder discricionário para o tratamento das denúncias (v. acórdão de 16 outubro 2013, Vivendi/Comissão, T‑432/10, EU:T:2013:538, n.o 22 e jurisprudência referida). O Tribunal de Justiça recordou igualmente que o artigo 13.o e o considerando 18 do Regulamento n.o 1/2003 traduzem o amplo poder de apreciação de que dispõem as autoridades nacionais pertencentes à rede das autoridades da concorrência, a fim de assegurar uma distribuição ótima dos processos no âmbito desta última (acórdão de 14 de fevereiro de 2012, Toshiba Corporation e o., C‑17/10, Colet., EU:C:2012:72, n.o 90). Tendo em conta o papel conferido à Comissão pelo TFUE de modo a definir e a pôr em prática a política de concorrência, a Comissão dispõe, a fortiori, igualmente de um amplo poder de apreciação quando aplica o artigo 13.o do Regulamento n.o 1/2003.

18

A jurisprudência relativa à apreciação do interesse da União recordou contudo que o poder discricionário da Comissão não é ilimitado. Com efeito, a Comissão deve ter em consideração todos os elementos de direito e de facto pertinentes a fim de decidir do seguimento a dar à denúncia. Mais especialmente, a Comissão é obrigada a examinar atentamente todos os elementos de facto e de direito levados ao seu conhecimento pelo denunciante (v. acórdão de 17 de maio de 2001, IECC/Comissão, C‑450/98 P, Colet., EU:C:2001:276, n.o 57 e jurisprudência referida).

19

A este respeito, resulta de jurisprudência constante que, quando as instituições dispõem de um amplo poder de apreciação, o respeito pelas garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos processos administrativos assume uma importância ainda mais fundamental e que, entre essas garantias, figura, designadamente, a obrigação de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto (v. acórdão de 17 de dezembro de 2008, HEG e Graphite India/Conselho, T‑462/04, Colet., EU:T:2008:586, n.o 68 e jurisprudência referida). Todavia, a fiscalização pelo juiz da União sobre o exercício do poder discricionário que lhe é reconhecido no tratamento das denúncias não deve levá‑lo a substituir a apreciação do interesse comunitário da Comissão pela sua própria apreciação, antes se destinando a verificar que a decisão controvertida não se baseia em factos materialmente inexatos e não está ferida de um erro de direito nem de um erro manifesto de apreciação ou de desvio de poder (v. acórdão de 15 de dezembro de 2010, CEAHR/Comissão, T‑427/08, Colet., EU:T:2010:517, n.o 65 e jurisprudência referida).

20

No que diz respeito à fiscalização jurisdicional exercida sobre uma decisão da Comissão baseada no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, esta tem por objeto verificar que a decisão controvertida não assenta em factos materialmente inexatos e que a Comissão não cometeu um erro de direito, um erro manifesto de apreciação ou um desvio de poder ao considerar que uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro já apreciou uma denúncia. Em contrapartida, importa recordar que a fiscalização das decisões das autoridades da concorrência dos Estados‑Membros compete unicamente aos órgãos jurisdicionais nacionais, que desempenham uma função essencial na aplicação das regras de concorrência da União.

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa a um erro de direito

21

A recorrente sustenta que o conceito de instrução do processo por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro, na aceção do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, que confere à Comissão a faculdade de rejeitar uma denúncia, deve ser interpretado à luz das disposições do artigo 5.o do referido regulamento, que visa os diferentes tipos de decisões que podem ser adotadas pela referida autoridade. Consequentemente, não se pode considerar que um processo foi instruído por esta autoridade a menos que a mesma tenha, pelo menos, decidido que não se justificava intervir, no final de uma investigação preliminar. Em contrapartida, não se pode considerar que a mesma autoridade instruiu o processo, na aceção do artigo 13.o, n.o 2, deste regulamento, quando esta se limitou a rejeitar o mesmo por razões de prioridade. Esta interpretação é corroborada pelas disposições do n.o 20 da comunicação da Comissão relativa à cooperação no âmbito da rede de autoridades de concorrência (JO 2004, C 101, p. 43, a seguir «comunicação relativa à cooperação no âmbito da rede de autoridades de concorrência»).

22

A Comissão e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

23

Nos termos do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, «[s]e for apresentada a uma autoridade de um Estado‑Membro responsável em matéria de concorrência ou à Comissão uma denúncia contra um acordo, uma decisão de uma associação ou uma prática que já está a ser instruída por outra autoridade responsável em matéria de concorrência, tal denúncia pode ser rejeitada».

24

Segundo jurisprudência constante, na interpretação de uma disposição do direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (v. acórdãos de 7 de junho de 2005, VEMW e o., C‑17/03, Colet., EU:C:2005:362, n.o 41 e jurisprudência referida, e de 26 de outubro 2010, Alemanha/Comissão, T‑236/07, Colet., EU:T:2010:451, n.o 44 e jurisprudência referida).

25

É à luz destes princípios que importa examinar se a expressão «denúncia […] que já foi instruída por outra autoridade de concorrência», que figura no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, deve ser entendida no sentido de que permite à Comissão rejeitar uma denúncia quando a autoridade de concorrência de um Estado‑Membro rejeitou previamente a mesma denúncia por razões de prioridade.

26

Em primeiro lugar, afigura‑se que a resposta à questão de saber se a Comissão pode rejeitar uma denúncia que já tenha sido anteriormente rejeitada por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro por razões de prioridade pode ser deduzida de uma interpretação literal do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, tendo em conta o sentido claro da expressão «denúncia […] que já foi instruída por outra autoridade de concorrência». Importa, a este respeito, salientar que esta expressão tem um alcance amplo, na medida em que é suscetível de englobar todos os casos de denúncias que tenham sido examinadas por uma autoridade de concorrência, independentemente do resultado desse exame. O legislador optou assim por não circunscrever o âmbito de aplicação deste artigo apenas ao caso das denúncias que já foram objeto de uma decisão de outra autoridade de concorrência.

27

Em segundo lugar, a interpretação seguida no n.o 26 supra afigura‑se igualmente conforme à economia geral do Regulamento n.o 1/2003. Com efeito, importa ler o artigo 13.o, n.o 2, do referido regulamento à luz das disposições do seu n.o 1, que preveem a rejeição de uma denúncia por parte da Comissão quando outra autoridade de concorrência de um Estado‑Membro tenha instruído o processo. Portanto, o que importa não é o resultado do exame da denúncia por parte da referida autoridade de concorrência, mas o facto de tal denúncia ter sido examinada por esta.

28

A interpretação seguida no n.o 26 supra é ainda confortada pelo considerando 18 do Regulamento n.o 1/2003, que se refere ao artigo 13.o, n.o 2, deste (acórdão Toshiba Corporation e o., n.o 17 supra, EU:C:2012:72, n.o 90) e que precisa que «essa disposição não deve prejudicar a faculdade de a Comissão rejeitar uma denúncia por falta de interesse comunitário, mesmo quando nenhuma autoridade responsável em matéria de concorrência tenha indicado a sua intenção de se ocupar do processo». Com efeito, uma vez que a Comissão pode decidir rejeitar uma denúncia por falta de interesse comunitário, mesmo que esta não tenha sido instruída por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro, aquela pode, a fortiori, rejeitar uma denúncia examinada pela referida autoridade, mas que tenha sido objeto de uma decisão de rejeição por parte desta com base em razões de prioridade.

29

A comunicação relativa à cooperação no âmbito da rede de autoridades da concorrência, que visa dar execução às disposições do Regulamento n.o 1/2003 e que a recorrente invoca, também sustenta a interpretação seguida no n.o 26 supra. Com efeito, o n.o 20 da referida comunicação precisa que, «[n]o artigo 13.o [do referido regulamento], a expressão ‘instrução do processo’ não significa apenas que foi apresentada uma denúncia a outra autoridade, mas que a outra autoridade está a investigar ou já investigou o caso por sua própria conta». Em contrapartida, não dá indicação quanto ao resultado a que a autoridade de concorrência chegou. O n.o 22 desta comunicação refere‑se, de maneira explícita, à hipótese em que uma denúncia foi examinada por uma autoridade de concorrência, mas foi rejeitada por outros motivos que não o exame quanto ao mérito do processo, citando o exemplo do caso em que a autoridade não conseguiu reunir as provas necessárias para demonstrar a infração e indicando que havia que fazer prova de flexibilidade permitindo a outra autoridade efetuar a sua própria investigação e instruir ela mesma o processo. De resto, o Tribunal de Justiça reconheceu o amplo poder de apreciação de que dispõem as autoridades de concorrência a fim de assegurar uma distribuição ótima dos processos, ao precisar, no que diz respeito ao artigo 13.o, n.o 2, do referido regulamento, que cada autoridade tinha a possibilidade e não a obrigação de rejeitar uma denúncia que lhe tivesse sido apresentada quando outra autoridade nacional dessa rede já estivesse a instruir o processo (acórdão Toshiba Corporation, n.o 17 supra, EU:C:2012:72, n.o 90).

30

Quanto aos argumentos da recorrente relativos ao artigo 5.o do Regulamento n.o 1/2003, estes não permitem pôr em causa a interpretação seguida no n.o 26 supra.

31

A recorrente sustenta que o artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 deve ser lido à luz das disposições do artigo 5.o do referido regulamento, relativo à competência das autoridades dos Estados‑Membros para aplicar, em processos individuais, os artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE. Segundo a recorrente, a Comissão não pode rejeitar uma denúncia quando essa denúncia não foi objeto de uma decisão de uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro, prevista no artigo 5.o deste regulamento. Considera, no caso em apreço, que a decisão da NMa de 16 de dezembro de 2009 não constitui uma decisão adotada com base neste último artigo, uma vez que «representa menos que o máximo consentido à autoridade nacional de concorrência, que é constatar que não deve intervir», não tendo a NMa verificado se estavam cumpridos os requisitos de uma proibição.

32

As disposições do artigo 5.o do Regulamento n.o 1/2003, que figuram no capítulo II dedicado às competências, definem as decisões que podem ser adotadas pelas autoridades de concorrência dos Estados‑Membros quando aplicam, em processos individuais, os artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE. O primeiro parágrafo do artigo 5.o do referido regulamento prevê assim que estas autoridades, decidindo quanto ao mérito, podem, atuando oficiosamente ou na sequência de denúncia, tomar as seguintes decisões, ou seja, exigir que seja posto termo à infração, ordenar medidas provisórias, aceitar compromissos e aplicar coimas, sanções pecuniárias compulsórias ou qualquer outra sanção prevista pelo respetivo direito nacional. Nos termos do segundo parágrafo do artigo 5.o deste regulamento, «[s]empre que [as autoridades de concorrência nacionais considerem que], com base nas informações de que dispõem, não estejam preenchidas as condições de proibição, podem igualmente decidir que não se justifica a sua intervenção». Em resposta à questão de saber se as autoridades nacionais de concorrência podiam adotar uma decisão que concluísse pela não violação dos artigos 101.° ou 102.° TFUE, o Tribunal de Justiça precisou que o artigo 5.o do mesmo regulamento deve ser interpretado no sentido de que define de maneira limitativa as decisões que podem ser adotadas por aquelas (acórdão de 3 de maio de 2011, Tele2 Polska, C‑375/09, Colet., EU:C:2011:270, n.os 19 a 30).

33

O artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, que figura no capítulo IV dedicado à cooperação, prevê contudo unicamente que a denúncia deve ter sido instruída por outra autoridade de concorrência e não deve necessariamente ter sido objeto de uma decisão (v. n.o 26 supra). Assim, como salientou a Comissão na decisão recorrida, esta disposição não impõe necessariamente a adoção de uma decisão por parte da autoridade de concorrência de um Estado‑Membro que já tenha rejeitado a denúncia. Por conseguinte, mesmo supondo que uma rejeição da denúncia por uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro por motivos de prioridade não constitui uma decisão na aceção do artigo 5.o, a Comissão poderia aplicar, nesse caso, as disposições do artigo 13.o, n.o 2.

34

Em todo o caso, a título subsidiário a decisão da NMa de 16 de dezembro de 2009 pode ser considerada uma decisão baseada no artigo 5.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1/2003. Como sustenta a Comissão, esta disposição abrange, de facto, todos os casos em que a autoridade da concorrência de um Estado‑Membro considera que as informações de que dispõe não lhe permitem considerar que estão preenchidos os requisitos de uma proibição, sem necessidade de ter procedido a medidas prévias de instrução. Ora, no caso em apreço, ao considerar, na sua decisão de 16 de dezembro 2009, que um exame das taxas aplicadas a partir de abril de 2009 à luz do artigo 102.o TFUE levaria aos mesmos resultados que o exame da terceira denúncia e ao rejeitar, consequentemente, a segunda denúncia em conformidade com a sua política de fixação de prioridades, a NMa considerou necessariamente que não estavam preenchidos os requisitos da proibição. Além disso, considerar que uma decisão de rejeição de denúncia da autoridade de concorrência de um Estado‑Membro por razões de prioridade constitui uma decisão adotada com base no artigo 5.o, segundo parágrafo, do referido regulamento, está em conformidade com o acórdão Tele2 Polska, n.o 32 supra (EU:C:2011:270), em que o Tribunal de Justiça considerou que este artigo enumerava de forma restritiva o tipo de decisões que podiam ser adotadas por uma autoridade nacional. Uma interpretação diferente teria por efeito privar as autoridades de concorrência dos Estados‑Membros da possibilidade de adotar decisões de rejeição de denúncias por razões de prioridade, quando as autoridades nacionais de concorrência se baseiam nessas razões, adotando decisões mais ou menos formais de arquivamento. Consequentemente, a interpretação seguida no n.o 26 supra é conforme ao artigo 5.o deste regulamento, podendo a Comissão rejeitar uma denúncia com base no facto de esta já ter sido objeto de uma decisão de rejeição por parte de uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro por razões de prioridade.

35

Por fim, a interpretação seguida no n.o 26 supra é conforme ao mecanismo do artigo 13.o, n.o 2, que prevê igualmente que uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro pode rejeitar uma denúncia se esta já tiver sido instruída pela Comissão. Tendo a jurisprudência reconhecido de maneira constante à Comissão o poder de adotar decisões de rejeição de denúncias por razões de prioridade (v., por exemplo, acórdão Vivendi/Comissão, n.o 17 supra, n.os 22 a 25 e jurisprudência referida), a autoridade de concorrência de um Estado‑Membro pode igualmente rejeitar uma denúncia que tenha previamente sido rejeitada pela Comissão com base nesse motivo.

36

Em terceiro lugar, a interpretação seguida no n.o 26 supra afigura‑se de harmonia com um dos objetivos principais do Regulamento n.o 1/2003, que é a instituição de um sistema descentralizado eficaz de aplicação das regras de concorrência da União. Com efeito, resulta do considerando 6 do referido regulamento que, «para assegurar a aplicação eficaz das regras comunitárias de concorrência, as autoridades dos Estados‑Membros responsáveis em matéria de concorrência deverão ter maior participação nessa aplicação». O considerando 15 deste regulamento dispõe, por outro lado, que «a Comissão e as autoridades dos Estados‑Membros responsáveis em matéria de concorrência deverão instituir juntamente uma rede de autoridades públicas responsáveis por aplicar as regras comunitárias de concorrência em estreita cooperação». O mesmo regulamento pôs assim termo ao regime centralizado anterior e organizou, em conformidade com o princípio da subsidiariedade, uma associação mais ampla das autoridades nacionais responsáveis em matéria de concorrência, autorizando‑as para esse fim a aplicar o direito da concorrência da União (acórdão de 8 de março de 2007, France Télécom/Comissão, T‑339/04, Colet., EU:T:2007:80, n.o 79). «A fim de assegurar uma distribuição otimizada dos processos no âmbito da rede», o considerando 18 do regulamento em causa indica que «é necessário prever uma disposição geral que permita a uma autoridade responsável em matéria de concorrência suspender ou arquivar um processo por motivo de outra autoridade o estar a instruir, por forma a que cada processo apenas seja apreciado por uma única autoridade».

37

Em contrapartida, a interpretação proposta pela recorrente, que teria por efeito forçar a Comissão a proceder sistematicamente ao exame de uma denúncia sempre que uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro instruísse uma denúncia mas não tivesse adotado uma das decisões previstas pelas disposições do artigo 5.o do Regulamento n.o 1/2003 ou adotado uma decisão de rejeição por razões de prioridade, não seria compatível com o objetivo do artigo 13.o, n.o 2, do referido regulamento, que era instituir, com um objetivo de eficácia, uma distribuição otimizada dos recursos no âmbito da rede europeia de concorrência.

38

Além disso, como salientou a interveniente, a interpretação proposta pela recorrente afigura‑se contrária aos trabalhos preparatórios do Regulamento n.o 1/2003. A exposição de motivos da proposta da Comissão de Regulamento COM (2000) 582 final do Conselho relativo à execução das regras de concorrência previstas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado mostra, com efeito, que o artigo 13.o tinha como objetivo suprimir o risco de duplicação do trabalho e a incitação a múltiplas denúncias.

39

Por fim, como sublinha a Comissão, a interpretação proposta pela recorrente violaria o disposto no artigo 6.o do Regulamento n.o 1/2003, por força do qual os tribunais nacionais têm competência para aplicar os artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE. Obrigar a Comissão a examinar sistematicamente as denúncias rejeitadas por razões de prioridade por autoridades de concorrência dos Estados‑Membros teria por efeito transferir para a Comissão o poder de fiscalização das decisões das referidas autoridades, que compete em exclusivo aos órgãos jurisdicionais nacionais. É verdade que o referido regulamento instituiu um mecanismo de cooperação entre a Comissão e estas autoridades (acórdão Tele2 Polska, n.o 32 supra, EU:C:2011:270, n.o 26), mas não prevê um mecanismo de substituição dos órgãos jurisdicionais nacionais pela Comissão, uma vez que esses órgãos jurisdicionais cumprem uma função essencial na aplicação das regras de concorrência da União [v. considerando 7 da Proposta de Regulamento da Comissão COM(2000) 582 final do Conselho relativo à execução das regras de concorrência previstas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado].

40

Assim, resulta tanto da redação e da economia do Regulamento n.o 1/2003, como do objetivo por este prosseguido, que a Comissão pode, para rejeitar uma denúncia, basear‑se legitimamente no facto de uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro ter previamente rejeitado esta denúncia por razões de prioridade. Logo, a circunstância, mesmo admitindo que está provada, de, no presente litígio, a NMa não ter arquivado a denúncia que lhe foi apresentada mediante a adoção de uma decisão, na aceção do artigo 5.o do referido regulamento, e de se ter baseado em razões de prioridade, não obstava a que a Comissão concluísse, em aplicação do artigo 13.o, n.o 2 deste regulamento, que a referida denúncia tinha sido instruída por uma autoridade da concorrência de um Estado‑Membro e a rejeitasse por esse motivo.

Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação

41

A recorrente alega que a Comissão cometeu um erro de direito e um erro manifesto de apreciação ao basear‑se numa decisão da NMa relativa a uma denúncia que não foi objeto de uma investigação conduzida à luz das regras do direito da concorrência da União, mas à luz do direito nacional da navegação aérea.

42

A Comissão e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

43

É verdade que o artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, tal como a totalidade das disposições do referido regulamento, visa situações relativas à execução dos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE. Em particular, o artigo 3.o, n.o 1, deste regulamento, prevê que sempre que as autoridades nacionais da concorrência dos Estados‑Membros apliquem a legislação nacional em matéria de concorrência a uma prática abusiva de uma empresa com uma posição dominante no mercado, suscetível de afetar o comércio entre os Estados‑Membros, devem igualmente aplicar o artigo 102.o TFUE.

44

Consequentemente, a Comissão só pode rejeitar uma denúncia com base no disposto no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 quando esta tenha sido objeto de um exame conduzido à luz das regras do direito da concorrência da União

45

No entanto, nenhuma disposição deste regulamento impede uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro de se basear, no âmbito das investigações que conduz para apreciar o respeito pelas regras da concorrência da União, em conclusões a que tenha chegado no âmbito de investigações efetuadas à luz de outra legislação nacional. O n.o 21 da comunicação relativa à cooperação no âmbito da rede de autoridades de concorrência limita‑se assim a indicar que o «o artigo 13.o do [Regulamento n.o 1/2003] pode ser invocado quando o acordo ou a prática envolve a(s) mesma(s) infração(ões) nos mesmos mercados geográficos e do produto relevantes».

46

Resulta do que precede que a Comissão pode, para rejeitar uma denúncia com fundamento nas disposições do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, basear‑se legitimamente no facto de uma autoridade de concorrência de um Estado‑Membro ter previamente rejeitado esta denúncia na sequência de um exame assente em conclusões a que chegou no âmbito de uma investigação conduzida à luz de outras disposições de direito nacional, desde que este exame tenha sido conduzido à luz das regras do direito da concorrência da União.

47

No caso em apreço, resulta da decisão recorrida que a Comissão considerou que a NMa tinha instruído a denúncia da recorrente com fundamento no artigo 102.o TFUE. Revelou que a NMa tinha indicado, nomeadamente, em que medida as conclusões da investigação conduzida à luz do direito da navegação aérea eram pertinentes para o seu exame baseado no direito da concorrência, ao descrever as semelhanças existentes entre as duas regulamentações, ao comparar a equivalência dos serviços em causa e ao apreciar a desvantagem concorrencial causada pelo sistema de taxas da Schiphol. Considerou que a NMa tinha assim examinado se as taxas eram proporcionais aos custos, tendo‑as comparado às de outros aeroportos internacionais e apreciado à luz da qualidade do serviço recebido pela recorrente. Por fim, considerou que não lhe competia pronunciar‑se quanto aos argumentos e conclusões expostos pela NMa, nem quanto à metodologia por esta utilizada.

48

Resulta, por outro lado, da decisão da NMa de 16 de dezembro de 2009 que a denúncia da recorrente foi examinada à luz das disposições do artigo 24.o da MW e do artigo 102.o TFUE. A NMa considerou nessa decisão, nomeadamente, como salientou a Comissão na decisão recorrida, que a apreciação dos conceitos de não discriminação e de caráter razoável que figuram no § 8.25 d, n.os 2 e 3, da WL era semelhante à efetuada em direito da concorrência da União. Recordou igualmente que, na sua decisão de 14 de julho de 2009, tinha interpretado as disposições da WL em conformidade com a jurisprudência das jurisdições da União relativa ao artigo 102.o TFUE. Salientou além disso que não era necessária, no caso em apreço, uma definição do mercado relevante, a efetuar no âmbito de uma investigação conduzida com fundamento nas disposições do direito da concorrência, uma vez que partiu do princípio de que a Schiphol estava numa situação de poderio económico.

49

Resulta do que precede que a Comissão não cometeu um erro de direito ao rejeitar a denúncia da recorrente com fundamento no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, uma vez que considerou que a autoridade de concorrência de um Estado‑Membro tinha instruído esta denúncia com fundamento nas disposições do artigo 102.o TFUE.

50

Embora admitindo que as disposições da WL em causa se referem, em parte, a conceitos provenientes do direito da concorrência da União, a recorrente invoca cinco argumentos com vista a demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que a NMa instruiu a sua denúncia com fundamento nas disposições do artigo 102.o TFUE.

51

Decorre do n.o 20 supra que, a fim de responder aos argumentos da recorrente, o Tribunal Geral deve limitar‑se a verificar que a Comissão, ao rejeitar a decisão controvertida com fundamento no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, não cometeu um erro de direito nem um erro manifesto de apreciação por considerar que NMa já tinha instruído a denúncia da recorrente à luz do direito da concorrência da União. Incumbe à Comissão, neste âmbito, verificar que a NMa não tinha rejeitado a denúncia da recorrente sem ter procedido previamente ao seu exame à luz das regras de concorrência do direito da União. No entanto, a fiscalização do Tribunal Geral não deve levar a uma apreciação quanto ao mérito da decisão da NMa ou quanto ao procedimento ou à metodologia que esta utilizou, apreciação que de resto a própria Comissão não realizou e que compete aos órgãos jurisdicionais nacionais

52

Em primeiro lugar, a recorrente sublinha que a NMa não procedeu a uma definição do mercado relevante, elemento que segundo ela é indispensável a qualquer exame relativo ao respeito do artigo 102.o TFUE e que a Comissão não podia, por isso, considerar que a denúncia tinha sido instruída pela NMa com base nesta disposição. Contudo, este argumento deve ser considerado inoperante, tendo em conta o alcance e o objeto da fiscalização exercida pelo Tribunal Geral recordados no n.o 51 supra. Com efeito, este argumento refere‑se à metodologia e ao mérito da análise realizada pela NMa para proceder ao tratamento da denúncia da recorrente.

53

Por razões de exaustividade, importa constatar que a NMa não tinha o dever de proceder à definição do mercado relevante do caso em apreço.

54

É verdade que, nos termos da jurisprudência, a determinação do mercado relevante tem uma importância essencial para determinar a eventual posição dominante de uma empresa, devendo as possibilidades de concorrência ser apreciadas apenas em função das características dos produtos ou serviços em causa, em virtude das quais esses produtos ou serviços são particularmente aptos à satisfação das necessidades constantes e pouco substituíveis por outros produtos ou serviços (acórdãos de 21 de fevereiro de 1973, Europemballage e Continental Can/Comissão, 6/72, Colet., EU:C:1973:22, n.o 32, e de 30 de janeiro de 2007, France Télécom/Comissão, T‑340/03, Colet., EU:T:2007:22, n.o 78). Além disso, segundo jurisprudência constante, uma posição dominante é uma posição de poderio económico detida por uma empresa que lhe permite obstar à manutenção de uma concorrência efetiva no mercado em causa e lhe possibilita comportar‑se, em medida apreciável, de modo independente em relação aos seus concorrentes, aos seus clientes e, finalmente, aos consumidores. (acórdãos de 14 de fevereiro de 1978, United Brands e United Brands Continentaal/Comissão, 27/76, Colet., EU:C:1978:22, n.o 65; de 13 de fevereiro de 1979, Hoffmann‑La Roche/Comissão, 85/76, Colet., EU:C:1979:36, n.o 38, e France Télécom/Comissão, já referido, EU:T:2007:22, n.o 99).

55

No entanto, no caso em apreço, resulta da decisão da NMa de 14 de julho de 2009 que se presumiu que a interveniente estava numa situação de poderio económico e que, consequentemente, como salientou a NMa no n.o 16 da sua decisão de 16 de dezembro de 2009, uma vez que a interveniente se encontrava numa posição dominante, não era necessário proceder à definição do mercado relevante. Como tal, em caso algum a decisão da Comissão padece de erro manifesto ao considerar que a denúncia da recorrente tinha sido instruída no respeito das regras de exame prescritas pelo direito da concorrência da União.

56

Em segundo lugar, a recorrente alega que um exame efetuado ao abrigo do artigo 102.o TFUE teria levado a NMa a uma conclusão diferente, no que diz respeito ao comportamento abusivo da interveniente em matéria de preços discriminatórios.

57

Desde logo, importa recordar que não compete ao Tribunal Geral fiscalizar a legalidade da decisão da NMa (v. n.o 51 supra). Em contrapartida, compete ao Tribunal Geral verificar se a Comissão não cometeu um erro de direito ou um erro manifesto de apreciação ao considerar que a NMa já tinha instruído a denúncia da recorrente ao utilizar a definição do conceito de discriminação constante do artigo 102.o TFUE.

58

A este respeito, resulta da decisão recorrida que, na análise que levou à sua decisão de 14 de julho de 2009, a NMa teve em conta a definição de discriminação constante do artigo 102.o TFUE. Com efeito, como salientou a Comissão na decisão recorrida, a NMa, na sua decisão de 14 de julho de 2009, não só examinou a equivalência dos serviços oferecidos pela interveniente às diferentes companhias aéreas como apreciou a desvantagem comercial causada pelas taxas (n.os 113 a 156). Para proceder a este exame, a NMa indicou explicitamente que utilizou a definição de discriminação constante do artigo 102.o TFUE, conforme interpretada pelo Tribunal de Justiça (n.o 33).

59

Em terceiro lugar, a recorrente alega que a NMa indicou, noutra decisão, que embora os conceitos que figuram na WL possam ser interpretados com auxílio do direito da concorrência, a apreciação de conjunto de um processo à luz da WL não se processa no âmbito do direito da concorrência e que qualquer questão relativa a uma violação das regras da concorrência não pode ser efetuada no âmbito de uma investigação conduzida ao abrigo da WL. Este elemento, caso se considere provado, é contudo irrelevante a respeito da legalidade da decisão recorrida, sendo que, no caso em apreço, por um lado, a Comissão não estava vinculada pelas apreciações produzidas pela NMa num processo diferente e, por outro lado, resulta do que precede que a Comissão verificou efetivamente que a NMa instruiu a denúncia que lhe foi apresentada à luz do artigo 102.o TFUE.

60

Em quarto lugar, a recorrente alega que o exame de uma denúncia no âmbito da WL é efetuada apenas pelo serviço de regulação da aviação, que detém poderes e atribuições distintos dos da direção da concorrência e não tem em conta os objetivos gerais da política de concorrência da União. Este argumento deve contudo ser rejeitado uma vez que o serviço de regulação da aviação constitui um serviço da autoridade da concorrência neerlandesa e que a decisão da NMa em que a Comissão se baseou para rejeitar a denúncia da recorrente foi adotada pelo seu colégio único. Com efeito, importa recordar que as disposições do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, bem como as do conjunto do referido regulamento, referem a «autoridade de concorrência de um Estado‑Membro», sem fazer distinção entre os diferentes serviços desta autoridade. Consequentemente, é irrelevante conhecer a composição das equipas que instruíram a denúncia da recorrente com base na WL, uma vez que a NMa efetuou um exame da denúncia da recorrente à luz do direito da concorrência e que resulta do que precede que a NMa se podia basear corretamente na análise conduzida no âmbito da denúncia com base na WL.

61

Por fim, há que rejeitar o argumento da recorrente segundo o qual a decisão recorrida tem por efeito subtrair uma ampla categoria de abusos potenciais à fiscalização das autoridades da concorrência, em violação do artigo 102.o TFUE. Com efeito, resulta do que precede que a decisão recorrida não teve precisamente por efeito subtrair a interveniente à aplicação do artigo 102.o TFUE.

62

Resulta de tudo o que precede que a recorrente não demonstrou que a Comissão tenha cometido um erro manifesto de apreciação ao considerar que a NMa instruiu a sua denúncia com base no artigo 102.o TFUE.

63

Consequentemente, a Comissão não cometeu um erro de direito nem um erro manifesto de apreciação ao considerar que a NMa instruiu a denúncia da recorrente à luz do direito da concorrência da União.

64

O primeiro fundamento deve, portanto, ser rejeitado na totalidade.

Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do dever de fundamentação

65

A recorrente considera que a decisão recorrida, na medida em que rejeita a título subsidiário a sua denúncia por falta de interesse da União, está insuficientemente fundamentada.

66

A Comissão alega que o segundo fundamento, que tem um caráter necessariamente subsidiário, deve ser rejeitado, uma vez que a decisão recorrida, complementada pela decisão da NMa de 16 de dezembro de 2009, expõe claramente as razões pelas quais o processo não apresenta interesse suficiente para a União.

67

Resulta da decisão recorrida que a Comissão, que baseou esta no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, indicou, por outro lado, que considerava, em todo o caso, que a denúncia podia ser rejeitada por falta de interesse da União, em razão da probabilidade limitada de demonstrar uma infração, tendo em conta a conclusão análoga a que chegou a NMa no final da sua investigação.

68

A título preliminar, importa constatar que, uma vez que foi apenas a título subsidiário que a Comissão rejeitou a denúncia da recorrente por falta de interesse da União, o segundo fundamento, mesmo que viesse a ser acolhido, não pode implicar a anulação da decisão recorrida (v., neste sentido, acórdão de 27 de fevereiro de 1997, FFSA e o./Commission, T‑106/95, Colet., EU:T:1997:23, n.o 199).

69

Em todo o caso, a decisão recorrida afigura‑se suficientemente fundamentada. Com efeito, importa recordar que, segundo uma jurisprudência constante, o artigo 7.o do Regulamento n.o 1/2003 não confere ao denunciante o direito de exigir da Comissão uma decisão definitiva quanto à existência ou à inexistência da infração alegada e não obriga a Comissão a prosseguir em todos os casos o processo até a fase da decisão final (acórdãos de 18 de outubro de 1979, GEMA/Comissão, 125/78, Colet., EU:C:1979:237, n.o 18, e de 17 de maio de 2001, IECC/Comissão, C‑449/98 P, EU:C:2001:275, n.o 35). Em contrapartida, a Comissão é obrigada a examinar atentamente o conjunto dos elementos de facto e de direito levados ao seu conhecimento pelos denunciantes (acórdãos de 11 de outubro de 1983, Schmidt/Comissão, 210/81, Colet., EU:C:1983:277, n.o 19, e de 17 de novembro de 1987, British American Tobacco e Reynolds Industries/Comissão, 142/84 e 156/84, Colet., EU:C:1987:490, n.o 20). Um denunciante tem o direito a que a sua denúncia seja objeto de uma decisão da Comissão, suscetível de ser objeto de um recurso jurisdicional (acórdão de 18 de março de 1997, Guérin automobiles/Comissão, C‑282/95 P, Colet., EU:C:1997:159, n.o 36, e IECC/Comissão, já referido, n.o 35).

70

A este respeito, a Comissão está sujeita a um dever de fundamentação quando recusa prosseguir o exame de uma denúncia. Devendo a fundamentação ser suficientemente precisa e detalhada por forma a dar ao Tribunal Geral a possibilidade de exercer uma fiscalização efetiva sobre o exercício pela Comissão do seu poder discricionário de definição das prioridades, a referida instituição deve expor os elementos de facto de onde decorre a justificação da decisão e das considerações jurídicas que a levaram a adotá‑la (despacho de 31 de março de 2011, EMC Development/Comissão, C‑367/10 P, EU:C:2011:203, n.o 75).

71

No caso em apreço, resulta da decisão recorrida que a Comissão considerou que a probabilidade de provar uma infração ao artigo 102.o TFUE era limitada, tendo em conta as conclusões a que tinha chegado a NMa. Ora, importa recordar que, nos termos dos artigos 4.° e 5.° do Regulamento n.o 1/2003, a Comissão e as autoridades de concorrência dos Estados‑Membros dispõem de competências paralelas para a aplicação dos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE e que a economia do referido regulamento assenta numa estreita cooperação entre estas. Assim, no âmbito da sua apreciação, a Comissão pode igualmente ter em conta as medidas adotadas pelas referidas autoridades nacionais (acórdão Vivendi/Comissão, n.o 17 supra, EU:T:2013:538, n.o 26).

72

Resulta destas observações que a Comissão cumpriu o seu dever de fundamentação ao expor, de maneira clara e inequívoca, os elementos de facto e as considerações jurídicas que a levaram a concluir que a probabilidade de provar a existência de uma violação ao artigo 102.o TFUE era muito limitada. Dado que estas precisões dão ao Tribunal Geral a possibilidade de exercer uma fiscalização efetiva sobre o exercício pela Comissão do seu poder discricionário na decisão recorrida, há que concluir que esta está suficientemente fundamentada a esse respeito.

73

O segundo fundamento pode por isso ser julgado improcedente e, como tal, deve ser negado provimento ao recurso na totalidade.

Quanto às despesas

74

Nos termos do artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas da Comissão e da Schiphol, de acordo com os pedidos destas últimas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A easyJet Airline Co. Ltd é condenada nas despesas.

 

Martins Ribeiro

Gervasoni

Madise

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 21 de janeiro de 2015.

Assinaturas


( *1 ) * Língua do processo: inglês.

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