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Document 62013CC0543

Conclusões do advogado-geral Mengozzi apresentadas em 12 de Fevereiro de 2015.
Raad van bestuur van de Sociale verzekeringsbank contra E. Fischer-Lintjens.
Pedido de decisão prejudicial: Centrale Raad van Beroep - Países Baixos.
Reenvio prejudicial - Segurança social dos trabalhadores migrantes - Regulamento (CEE) n.º 1408/71 - Artigo 27.º - Anexo VI, rubrica R, n.º 1, alíneas a) e b) - Conceito de ‘pensões ou rendas devidas por força da legislação de dois ou mais Estados-Membros’ - Prestações em espécie - Atribuição retroativa de uma pensão por força da legislação do Estado-Membro de residência - Benefício da prestação de cuidados de saúde sujeito à condição de subscrição de um seguro de doença obrigatório - Declaração de isenção de seguro nos termos da legislação relativa ao seguro de doença obrigatório do Estado-Membro de residência - Subsequente inexistência de obrigação de contribuição nesse Estado-Membro - Revogação retroativa dessa declaração - Impossibilidade de subscrever retroativamente um seguro de doença obrigatório - Interrupção da cobertura do risco de doença por esse seguro - Efeito útil do Regulamento n.º 1408/71.
Processo C-543/13.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2015:96

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 12 de fevereiro de 2015 ( 1 )

Processo C‑543/13

Raad van bestuur van de Sociale verzekeringsbank

contra

E. Fischer‑Lintjens

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Centrale Raad van Beroep (Países Baixos)]

«Reenvio prejudicial — Seguro de doença — Regulamento (CEE) n.o 1408/71 — Artigo 27.o — Conceito de ‘pensões ou de rendas devidas por força da legislação de dois ou mais Estados‑Membros’ — Atribuição retroativa de uma pensão no Estado‑Membro de residência — Retroatividade de um seguro de saúde»

I — Introdução

1.

O presente reenvio prejudicial, apresentado pelo Centrale Raad van Beroep (Países Baixos), tem essencialmente por objeto a interpretação do artigo 27.o do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade ( 2 ), nas suas versões alteradas pelo Regulamento (CE) n.o 631/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004 ( 3 ), e pelo Regulamento (CE) n.o 1992/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006 ( 4 ) (a seguir «Regulamento n.o 1408/71»).

2.

Mais precisamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o conceito de pensões ou de rendas «devidas», previsto no artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71, pode ser interpretado no sentido de que, para a determinação do momento a partir do qual a pensão ou a renda é «devida», é decisiva a data da decisão de atribuição no seguimento da qual a pensão é paga ou a data de início da pensão atribuída com efeitos retroativos. Caso se deva optar pela segunda solução prevista na sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se essa interpretação pode ser conciliada com o facto de que o titular da pensão abrangida pelo artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71 não pode, por força da legislação neerlandesa, subscrever um seguro de saúde com os mesmos efeitos retroativos.

3.

Estas questões surgem no quadro de um processo que opõe o Raad van Bestuur van de Sociale verzekeringsbank (Conselho de Administração do Instituto da Segurança Social, a seguir «SVB») a E. Fischer‑Lintjens, a respeito da revogação de uma declaração, dita «declaração do artigo 21.o» ( 5 ), que confirmava que E. Fischer‑Lintjens estava isenta da obrigação de ter um seguro de saúde neerlandês, sendo esse seguro, segundo a regulamentação em causa no processo principal, obrigatório a fim de poder beneficiar de prestações relativas a cuidados de saúde nos Países Baixos a cargo desse Estado‑Membro.

4.

E. Fischer‑Lintjens nasceu em 1 de dezembro de 1934. Residiu até 1 de setembro de 1970 nos Países Baixos. Em seguida, residiu na Alemanha até 1 de maio de 2006. Reside desde então, novamente, nos Países Baixos.

5.

Desde outubro de 2004, E. Fischer‑Lintjens beneficia da concessão pela Alemanha de uma pensão de viuvez. Em 2006, na sequência da sua mudança da Alemanha para os Países Baixos, inscreveu‑se, através de um formulário E 121 ( 6 ), na seguradora de saúde neerlandesa CZ (a seguir «CZ») e, a partir de 1 de junho de 2006, podia reclamar prestações a título do artigo 28.o do Regulamento n.o 1408/71, a cargo da República Federal da Alemanha. E. Fischer‑Lintjens pagou igualmente contribuições na Alemanha, para o seguro de saúde alemão.

6.

Em 20 de outubro de 2006, E. Fischer‑Lintjens obteve a declaração do artigo 21.o junto da autoridade competente à data, a saber, o College voor zorgverzekeringen (a seguir «Cvz») ( 7 ), declaração que se destinava a provar à autoridade neerlandesa encarregada da cobrança das contribuições que não era devida nenhuma contribuição nos Países Baixos. Resultava dessa declaração que E. Fischer‑Lintjens não estava segurada ao abrigo da Lei geral dos encargos especiais de saúde (Algemene Wet Bijzondere Ziektekosten, a seguir «AWBZ»). A referida declaração indicava que, não havendo uma alteração das circunstâncias, era válida pelo período de 1 de junho de 2006 a 31 de dezembro de 2010.

7.

Apesar de E. Fischer‑Lintjens ter atingido a idade de 65 anos que lhe conferia o direito a uma pensão nos Países Baixos a partir de 1 de dezembro de 1999 ao abrigo da Lei geral das pensões de velhice (Algemene Ouderdomswet, a seguir «AOW»), ela só solicitou essa pensão em de maio de 2007.

8.

Por decisão de 8 de novembro de 2007, alterada em 24 de abril de 2008, o SVB concedeu a E. Fischer‑Lintjens uma pensão com efeitos reportados a um ano antes da data da apresentação do pedido, ou seja, com efeitos a partir de 1 de maio de 2006.

9.

No entanto, E. Fischer‑Lintjens não comunicou ao CZ, nem ao Cvz, nem ao organismo alemão de seguros de saúde (a seguir «DAK») as alterações da sua situação em matéria de prestações obtidas até outubro de 2010.

10.

Com efeito, só em 21 de outubro de 2010 é que E. Fischer‑Lintjens informou o Cvz, no âmbito do seu pedido de prorrogação da declaração do artigo 21.o, de que recebia uma pensão ao abrigo da AOW, desde 1 de maio de 2006. Por decisão de 2 de novembro de 2010, este organismo informou E. Fischer‑Lintjens de que estava obrigada a subscrever um seguro de saúde nos termos da AWBZ e da Zorgverzekeringswet (Lei do seguro de saúde, a seguir «Zvw») e que devia, por conseguinte, pagar contribuições nos Países Baixos. Esta decisão baseava‑se no facto de que E. Fischer‑Lintjens já não se encontrava numa situação que lhe permitisse obter a declaração do artigo 21.o, que, portanto, foi revogada retroativamente.

11.

Em seguida, o DAK restituiu o montante das contribuições de seguros de saúde que E. Fischer‑Lintjens tinha pago na Alemanha desde 1 de junho de 2006. Subsequentemente, o CZ reclamou a E. Fischer‑Lintjens as despesas de saúde reembolsadas a esse Estado‑Membro de um montante superior a 11000 euros.

12.

Por outro lado, segundo o Cvz, E. Fischer‑Lintjens estava obrigada a subscrever um seguro nos termos da AWBZ e da Zvw, com efeitos retroativos. Todavia, na medida em que, por força do artigo 5.o, n.o 5, da Zvw, o seguro de saúde só pode produzir efeitos retroativos no máximo quatro meses antes do surgimento da obrigação de subscrever o seguro, E. Fischer‑Lintjens devia, portanto, pagar ela própria as despesas de saúde reembolsadas à República Federal da Alemanha relativas período não abrangido pelo seguro de saúde. No entanto, ela dispõe, desde 1 de julho de 2010, de um seguro de saúde neerlandês.

13.

Após a sua reclamação ter sido indeferida, E. Fischer‑Lintjens contestou, com sucesso, a decisão do Cvz no Rechtbank Roermond. Segundo esse órgão jurisdicional, a declaração do artigo 21.o que E. Fischer‑Lintjens recebeu destinava‑se a produzir efeitos jurídicos que não podiam ser suprimidos por meio da revogação da declaração.

14.

O SVB, organismo para o qual foram entretanto transferidas as competências do Cvz, interpôs recurso dessa decisão no órgão jurisdicional de reenvio, alegando que a declaração do artigo 21.o era um ato de natureza puramente declarativa, à semelhança do formulário E 121.

15.

O órgão jurisdicional de reenvio considera que o SVB tinha o poder de revogar, com efeitos retroativos, a declaração do artigo 21.o, mas que, ao fazê‑lo, não teve suficientemente em conta os interesses de E. Fischer‑Lintjens. Esse órgão jurisdicional entende que pode decorrer designadamente do princípio da segurança jurídica que a competência efetiva para conceder as pensões e assumir os encargos das prestações em espécie só surge a partir da data da decisão de concessão de uma pensão, em virtude da qual se estabelece que o interessado tem efetivamente direito à pensão solicitada. Por essa razão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber em que momento a pensão em causa no processo principal era efetivamente «devida», na aceção do artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71, a E. Fischer‑Lintjens porquanto, segundo esse órgão jurisdicional, se este artigo for aplicável com efeitos retroativos, isso acarretará, em princípio, diversas consequências jurídicas também com efeitos retroativos, entre as quais, no presente caso, a obrigação de dispor de um seguro de saúde neerlandês.

16.

Nestas condições, o Centrale Raad van Beroep decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.

Deve o conceito de [pensões ou rendas] ‘devidas’, na aceção dos artigos 27.° e seguintes do Regulamento [n.o 1408/71], ser interpretado no sentido de que, para a determinação do momento a partir do qual a pensão ou a renda é devida, é decisiva a data da decisão de atribuição no seguimento da qual a pensão é paga ou a data de início da pensão atribuída com efeitos retroativos?

2.

Caso o conceito de [pensões ou rendas] ‘devidas’ se refira à data de início da pensão atribuída com efeitos retroativos: Pode isso ser conciliado com o facto de que o titular da pensão abrangida pelo artigo 27.o do Regulamento [n.o 1408/71], não pode, por força da legislação neerlandesa, subscrever um seguro de saúde com os mesmos efeitos retroativos?»

17.

O SVB, os Governos neerlandês e alemão e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas sobre estas questões.

II — Análise

A — Quanto à primeira questão prejudicial

18.

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga, em substância, o Tribunal de Justiça sobre a questão de saber a partir de que momento uma pensão concedida pelo Estado‑Membro de residência de um beneficiário da segurança social deve ser considerada «devida», na aceção do artigo 27.o do Regulamento n.° 1408/71, para determinar correlativamente o momento a partir do qual a competência para lhe pagar as prestações de cuidados de saúde é transferida para esse mesmo Estado‑Membro de residência, tendo em conta as particularidades do processo principal.

19.

A este respeito, há que salientar antes de mais que é ponto assente que, até 30 de abril de 2006, E. Fischer‑Lintjens, na qualidade de titular de uma pensão de viuvez concedida pela República Federal da Alemanha e de residente nesse Estado‑Membro, estava abrangida pela competência das autoridades desse Estado‑Membro.

20.

A competência das autoridades alemãs em matéria de pensões e de prestações de cuidados de saúde não foi posta em causa pelo regresso de E. Fischer‑Lintjens aos Países Baixos nem pela sua decisão de aí residir a partir de 1 de maio de 2006.

21.

Com efeito, nos termos da norma de conflitos enunciada no artigo 28.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71, o titular de uma pensão ou de uma renda devida por força da legislação de um Estado‑Membro ou de pensões ou de rendas devidas ao abrigo das legislações de dois ou mais Estados‑Membros, que não tenha direito às prestações ao abrigo da legislação do Estado‑Membro em cujo território reside, beneficia, no entanto, dessas prestações, desde que a tal tivesse direito por força da legislação do Estado‑Membro ou de, pelo menos, um dos Estados‑Membros competentes em matéria de pensões, se residisse no território do Estado em causa.

22.

No caso vertente, foi nesta base que, por um lado, E. Fischer‑Lintjens recebeu, em outubro de 2006, uma declaração do artigo 21.o emitida pelo Cvz, confirmando que, em virtude da sua pensão alemã, não era devida nenhuma contribuição de seguro de saúde nos Países Baixos e, por outro, que as prestações de cuidados de saúde que obteve nesse Estado‑Membro foram pagas por conta da instituição competente do Estado‑Membro devedor da pensão, a saber, a República Federal da Alemanha, à qual E. Fischer‑Lintjens continuava a pagar as contribuições.

23.

Em contrapartida, a partir do momento em que E. Fischer‑Lintjens começou a receber uma pensão neerlandesa, na sequência do seu pedido datado de maio de 2007, a sua situação passou do âmbito de aplicação do artigo 28.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71 para o do artigo 27.o do referido regulamento.

24.

Com efeito, segundo esta última disposição, o titular de pensões ou de rendas devidas por força das legislações de dois ou mais Estados‑Membros, designadamente por força da legislação do Estado‑Membro em cujo território reside, e que tenha direito às prestações ao abrigo da legislação deste último Estado‑Membro, tendo em conta, se for caso disso, o disposto no artigo 18.o e no Anexo VI do Regulamento n.o 1408/71, beneficia dessas prestações por parte e a cargo da instituição do lugar de residência, como se o interessado fosse titular de uma pensão ou de uma renda devida ao abrigo unicamente da legislação deste último Estado‑Membro.

25.

Assim, como o Tribunal de Justiça já declarou, o sistema instituído designadamente pelos artigos 27.° e 28.° do Regulamento n.o 1408/71 estabelece um nexo entre a competência para pagar as pensões ou as rendas e a obrigação de assumir o encargo das prestações em espécie, e leva à conclusão que esta obrigação é acessória de uma competência efetiva em matéria de pensões ( 8 ).

26.

Todavia, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta em que momento a pensão neerlandesa de E. Fischer‑Lintjens deve ser considerada «devida», na aceção do artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71, para se poder declarar a transferência de competência em benefício do Reino dos Países Baixos, Estado‑Membro de residência de E. Fischer‑Lintjens desde 1 de maio de 2006.

27.

Esta interrogação explica‑se em razão das circunstâncias particulares do processo principal, na medida em que existe um intervalo de tempo entre, por um lado, o momento em que a decisão do SVB que declara o direito à pensão foi tomada e a data a partir da qual o primeiro pagamento da pensão foi efetuado, a saber, 8 de novembro de 2007, e, por outro, o momento em que essa decisão produz efeitos, a saber, retroativamente a 1 de maio de 2006, ou seja, um ano antes da apresentação junto do SVB do pedido de E. Fischer‑Lintjens no sentido de lhe ser concedida uma pensão nos Países Baixos.

28.

As partes interessadas propõem responder a esta pergunta de maneira unívoca, no sentido de que o elemento determinante para estabelecer o momento a partir do qual uma pensão é «devida», na aceção do artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71, é a data de início da referida pensão concedida com efeitos retroativos, no caso vertente, 1 de maio de 2006. Com base no acórdão Rundgren (C‑389/99, EU:C:2001:264), essas partes sustentam, em substância, que o facto de a pensão ser atribuída retroativamente não tem nenhuma influência na efetividade do direito de obter essa pensão.

29.

Posso acolher esta posição desde que seja indubitável, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, que a pensão em questão foi efetivamente paga pelo período a partir do qual produz efeitos, isto é, a contar de 1 de maio de 2006.

30.

Uma série argumentos baseados na jurisprudência do Tribunal de Justiça e na proteção dos direitos dos interessados milita a favor desta solução.

31.

Com base numa interpretação sistemática do Regulamento n.o 1408/71, o Tribunal de Justiça precisou, no acórdão Rundgren (C‑389/99, EU:C:2001:264), que, no que se refere designadamente ao artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71, o caráter acessório do encargo das prestações em espécie relativamente à competência efetiva em matéria de pensões, que já mencionei, implicava que esse encargo não podia ser atribuído à instituição de um Estado‑Membro que apenas tem uma competência eventual em matéria de pensões. Segundo o Tribunal de Justiça, Resulta daí que o artigo 27.o, à semelhança dos artigos 28.° e 28.°‑A do Regulamento n.o 1408/71, quando se refere a uma pensão ou renda devidas, visa uma pensão ou uma renda «efetivamente pagas ao interessado» ( 9 ).

32.

O Tribunal de Justiça foi levado a precisar o alcance dos artigos 27.°, 28.° e 28.°‑A do Regulamento n.o 1408/71 no sentido que acabámos de referir num contexto em que o Estado‑Membro de residência do titular de uma pensão de reforma de outro Estado‑Membro lhe reclamava, no entanto, o pagamento de contribuições de reforma e de segurança social com fundamento apenas na sua residência. O Estado‑Membro de residência, nesse caso a República da Finlândia, considerava que, para excluir a obrigação de pagamento de contribuições, não era suficiente que o interessado apresentasse uma declaração segundo a qual não tinha solicitado nem obtido uma pensão nesse Estado‑Membro. Segundo as autoridades finlandesas, o interessado devia, além disso, demonstrar que não tinha qualquer direito (teórico) à pensão na Finlândia, argumentação que o Tribunal de Justiça rejeitou, insistindo no caráter efetivo do pagamento da pensão ao interessado para que o Estado‑Membro possa reclamar o pagamento de contribuições sociais.

33.

No caso vertente, não há dúvida de que a pensão de que E. Fischer‑Lintjens beneficia nos Países Baixos lhe foi efetivamente paga. Portanto, no presente processo, não se trata de questionar de novo, como no referido processo Rundgren, sobre a oposição, de caráter geral, que existe entre um direito teórico à pensão e a concretização desse direito através do pagamento efetivo dessa pensão. Por outras palavras, o acórdão Rundgren (C‑389/99, EU:C:2001:264) constitui um bom ponto de partida para o raciocínio que deve ser feito para responder à primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, mas não é de modo nenhum suficiente para dar uma resposta completa.

34.

Em definitivo, entendo que a questão apresentada implica que se determine se o artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71 se opõe a que um Estado‑Membro possa decidir que uma pensão pode ser «efetivamente paga» por um período anterior à data em que as instituições competentes do Estado‑Membro reconheceram formalmente o direito à pensão.

35.

Com efeito, há que recordar que foi com base no artigo 16.o, n.o 2, da AOW que o SVB fez retroagir pelo período de um ano a contar da apresentação do pedido de E. Fischer‑Lintjens os efeitos da sua decisão de 8 de novembro de 2007, que declara o direito à pensão desta pessoa nos Países Baixos.

36.

À primeira vista, dado que a pensão só foi «efetivamente paga» na sequência da decisão de 8 de novembro de 2007, poderia parecer que, portanto, a pensão só passou a ser «devida», na aceção do artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71, após a referida decisão.

37.

Consequentemente, entendo que esta interpretação não pode ser acolhida. O acórdão Rundgren (C‑389/99, EU:C:2001:264) precisou, em substância, que uma pensão só é «devida» quando, antes de mais, tiver sido reconhecida pela instituição competente de um Estado‑Membro, na sequência, se for caso disso, de um pedido nesse sentido, e, em seguida, tiver sido efetivamente paga pela referida instituição. Isto não significa que exista necessariamente uma correspondência entre o momento em que a pensão é reconhecida e o momento em que é devida, no sentido de «efetivamente paga». Quando uma pensão é reconhecida, pode sê‑lo a título retroativo. Nesse caso, a instituição competente reconhece que a pensão era devida anteriormente à sua decisão, mas que por razões materiais, relativas nomeadamente, como no caso vertente, à apresentação e à tramitação de um pedido de um segurado, só foi paga mais tarde. Todavia, dado que o pagamento efetivo abrange um determinado período, a saber, o período a contar do momento em que a pensão é reconhecida, essa pensão deveria, em meu entender, ser considerada «devida» ao longo de todo esse período.

38.

Como sublinhou, com muita pertinência, o Governo alemão, se o momento considerado no processo principal fosse o momento da adoção da decisão de 8 de novembro de 2007, a aplicabilidade temporal da competência de um Estado‑Membro em matéria de pensões dependeria da rapidez de tramitação dos pedidos dirigidos às administrações nacionais.

39.

Ora, como o Tribunal de Justiça precisou reiteradamente, a aplicação do sistema de conflito de leis estabelecido pelo Regulamento n.o 1408/71 só depende da situação objetiva em que se encontra o interessado ( 10 ).

40.

Da mesma forma que o Regulamento n.o 1408/71 não permite que um beneficiário se possa subtrair ou renunciar ao mecanismo nele instituído, nomeadamente no seu artigo 27.o ( 11 ) esse regulamento também não autoriza os Estados‑Membros a submeterem à apreciação discricionária das suas administrações o momento a partir do qual deve ser declarada uma transferência de competências entre dois Estados‑Membros na situação visada nessa disposição.

41.

Com efeito, o objetivo das normas de conflitos do Regulamento n.o 1408/71 é que qualquer beneficiário que entre no seu âmbito de aplicação fique coberto de modo contínuo, sem que sejam deixadas escolhas discricionárias à apreciação dos indivíduos ou das instituições competentes dos Estados‑Membros ( 12 ).

42.

Acresce que admitir a retroatividade do direito à pensão, bem como o seu pagamento pelo período anterior à adoção da decisão que declara formalmente a existência do referido direito vai no sentido do respeito dos direitos dos segurados e da continuidade da sua cobertura, com o objetivo de tornar neutra, do ponto de vista do benefício das prestações sociais, a transferência de competências em matéria de pensões entre dois Estados‑Membros.

43.

Por conseguinte, convido o Tribunal de Justiça a interpretar o artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71 no sentido de que o termo «devida» abrange o período durante o qual um interessado tem direito a uma pensão, independentemente do momento em que esse direito foi formalmente declarado, desde que essa pensão tenha sido efetivamente paga pelo referido período, incluindo de modo retroativo.

44.

Se o Tribunal de Justiça subscrever esta interpretação, haverá que analisar e responder à segunda questão prejudicial submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio.

B — Quanto à segunda questão prejudicial

45.

Com a sua segunda questão, que está no cerne do processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a compatibilidade com o direito da União de uma legislação nacional, como o artigo 5.o, n.o 5, da Zvw, nos termos da qual o seguro de saúde só pode ter início retroativamente quatro meses no máximo a contar do surgimento da obrigação de seguro. Por conseguinte, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, existe um hiato entre a transferência de competência em benefício do Reino dos Países Baixos a título do artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71 e a subscrição (obrigatória) de um seguro de saúde nesse Estado‑Membro.

46.

Enquanto o Governo alemão entende que a limitação a quatro meses dos efeitos retroativos do seguro de saúde é contrária à finalidade de coordenação dos sistemas de segurança social dos Estados‑Membros, o SVB, o Governo neerlandês e a Comissão consideram, em substância, que o hiato apontado pelo órgão jurisdicional de reenvio é consequência do incumprimento por E. Fischer‑Lintjens das suas obrigações de informação para com as autoridades competentes, quando devia subscrever um seguro de saúde nos Países Baixos a partir de 1 de maio de 2006, em aplicação do Anexo VI, rubrica R, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 1408/71 e da legislação neerlandesa.

47.

Segundo essas partes interessadas, E. Fischer‑Lintjens não pode contrapor a essa argumentação uma pretensa proteção da confiança legítima na manutenção da validade da declaração do artigo 21.o, uma vez que esta tem um caráter meramente declarativo e foi emitida com base em informações inexatas. Em todo o caso, o SVB e o Governo neerlandês afirmam que o direito da União não se opõe a uma restrição ampla da data de produção de efeitos retroativos do seguro de saúde. Nos Países Baixos, o direito às prestações só existe se o beneficiário tiver subscrito um seguro de saúde, que, nesse Estado‑Membro, não é um seguro de natureza pública, mas de danos de direito civil destinado cobrir riscos emergentes de eventos futuros, que deve ser subscrito junto de uma empresa privada, e cuja possibilidade de ser contratado retroativamente está limitada ao objetivo de preservar o princípio da solidariedade, o que justifica o eventual caráter restritivo desta medida nacional.

48.

As considerações formuladas por estas três partes interessadas não me convencem totalmente.

49.

É verdade que o artigo 27.o do Regulamento n.o 1408/71 recorda o direito do titular de pensões ou de rendas devidas por força das legislações de dois ou mais Estados‑Membros, designadamente por força da legislação do Estado‑Membro em cujo território reside, de beneficiar das prestações por força da legislação deste último Estado‑Membro, tendo em conta, se for caso disso, o disposto no Anexo VI do referido regulamento. Ora, também é verdade que o n.o 1, alínea a), i), da rubrica R do referido anexo, intitulado «Seguro de doença», prevê que «[no] que diz respeito ao direito às prestações em espécie ao abrigo da legislação dos Países Baixos, deve entender‑se por ‘beneficiário’ das [referidas] prestações […] a pessoa que, nos termos do artigo 2.o da [Zvw] é obrigada a subscrever um seguro junto de uma seguradora de saúde», ao passo que esse mesmo n.o 1, alínea b), precisa que «[a]s pessoas referidas na subalínea i) da alínea a) devem, nos termos das disposições da [Zvw], subscrever um seguro junto de uma seguradora de saúde […]».

50.

Portanto, não há dúvida de que, para beneficiar das prestações em espécie pagas pelo Reino dos Países Baixos, Estado‑Membro de residência de E. Fischer‑Lintjens desde 1 de maio de 2006, esta última era obrigada a subscrever um seguro junto de uma seguradora de saúde, nos termos do Anexo VI, rubrica R, n.o 1, alínea a), i), e alínea b), do Regulamento n.o 1408/71 e das disposições da Zvw.

51.

Admito igualmente que, para se opor a essa conclusão, um beneficiário da segurança social, como E. Fischer‑Lintjens, não pode basear‑se na sua confiança legítima quanto à manutenção da validade de uma declaração, como a declaração do artigo 21.o emitida pelo Cvz em outubro de 2006, que confirmava, à data, a isenção de E. Fischer‑Lintjens da obrigação de subscrição junto de uma seguradora de saúde neerlandesa e do pagamento de contribuições de segurança social nos Países Baixos. Com efeito, como defenderam o SVB e a Comissão, tal declaração, sendo apenas uma tradução do formulário E 121, reveste um caráter puramente declarativo, à semelhança, precisamente, do que decidiu o Tribunal de Justiça a propósito do referido formulário ( 13 ). Além disso, resulta dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional de reenvio que essa declaração só era válida até 31 de dezembro de 2010 no caso de não haver «alteração de circunstâncias».

52.

Todavia, não posso subscrever a posição dessas mesmas partes interessadas segundo a qual uma situação como a do processo principal é, afinal, apenas a consequência da omissão por parte do beneficiário da segurança social de transmitir as informações necessárias sobre a sua situação pessoal aos organismos competentes, e não constitui o resultado dos limites impostos pela legislação neerlandesa aos efeitos retroativos do seguro de saúde que o titular de uma pensão paga pelo Reino dos Países Baixos e que reside nesse Estado‑Membro é obrigado a subscrever a fim de beneficiar de prestações em espécie pagas por esse mesmo Estado.

53.

Com efeito, como salienta brevemente o órgão jurisdicional de reenvio, uma pessoa a quem é concedido pelas autoridades neerlandesas o pagamento de uma pensão com efeitos retroativos de mais de quatro meses a contar da apresentação do respetivo pedido encontrar‑se‑á sempre na impossibilidade, em especial no caso de beneficiar até então de cuidados de saúde a cargo de outro Estado‑Membro, de obter um seguro de saúde nos Países Baixos cuja retroatividade seja equivalente a mais de quatro meses.

54.

Assim, no caso de E. Fischer‑Lintjens, se esta tivesse informado os organismos competentes em 8 de novembro de 2007, data da adoção da decisão do SVB que declara o seu direito à pensão nos Países Baixos com efeitos retroativos a 1 de maio de 2006, E. Fischer‑Lintjens não teria podido, por força do artigo 5.o, n.o 5, da Zvw que limita a retroatividade do seguro de saúde a um máximo quatro meses, subscrever um seguro de saúde antes de julho de 2007.

55.

Ora, independentemente do eventual caráter tardio das informações comunicadas por E. Fischer‑Lintjens, questão que abordarei ulteriormente, o facto de um residente, titular de uma pensão paga pelo Reino dos Países Baixos, que é obrigado, por força das disposições conjugadas do artigo 27.o e do Anexo VI, rubrica R, n.o 1, alínea a), i), e alínea b), do Regulamento n.o 1408/71, a inscrever‑se junto de uma seguradora de saúde nesse Estado‑Membro, não poder cumprir totalmente essa obrigação em razão dos limites impostos pelas disposições da legislação do referido Estado‑Membro prejudica, no meu entender, o efeito útil do sistema estabelecido pelo Regulamento n.o 1408/71 e das obrigações que incumbem aos beneficiários da segurança social, por força desse regulamento.

56.

Com efeito, como já recordei, a aplicação do sistema de conflitos de leis instituído pelo Regulamento n.o 1408/71 só depende da situação objetiva em que se encontra o beneficiário em questão. Essas normas de conflitos impõem‑se de modo imperativo quer aos Estados‑Membros quer às pessoas interessadas, sendo que os primeiros não podem privar as segundas de cumprirem inteiramente as obrigações que lhes incumbem por força do regulamento. No caso em apreço, o Reino dos Países Baixos não pode, no meu entender, privar um residente da possibilidade de cumprir a obrigação de subscrever um seguro de saúde a partir do momento em que esse Estado‑Membro se torna competente para pagar uma pensão a favor desse beneficiário e tomar a cargo as prestações sociais que lhe são concedidas, bem como para cobrar as contribuições sociais ao referido beneficiário.

57.

Se os Estados‑Membros tivessem essa margem de manobra, resultaria daí que as pessoas que entram no âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1408/71 se veriam privadas de proteção em matéria de segurança social, por falta de legislação aplicável ( 14 ). A situação de E. Fischer‑Lintjens ilustra perfeitamente esse risco, uma vez que a cobertura de cuidados de saúde de que beneficiava a cargo das instituições alemãs competentes foi interrompida, com efeitos retroativos, a partir de 1 de maio de 2006, quando ela só poderia ter subscrito um seguro de saúde nos Países Baixos, na melhor das hipóteses, a partir do mês de julho de 2007, apesar de este último Estado‑Membro se ter tornado competente para lhe pagar uma pensão e correlativamente as prestações sociais nos termos do Regulamento n.o 1408/71 a partir de 1 de maio de 2006.

58.

Sustentar, à semelhança do Governo neerlandês, que uma retroatividade do seguro de saúde limitada a um máximo de quatro meses se justifica pela necessidade de garantir o princípio de solidariedade estabelecido pelo regime e de prevenir os abusos não me parece ser de modo nenhum pertinente num contexto como o do processo principal.

59.

Com efeito, uma vez que esse seguro é obrigatório, que a sua retroatividade é em princípio admitida por força da própria legislação neerlandesa e que nenhum elemento do processo principal sugere que E. Fischer‑Lintjens tenha tido a intenção de utilizar de modo abusivo as disposições de direito da União ( 15 ), o Reino dos Países Baixos não pode privar as pessoas que entram no âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1408/71 da possibilidade de satisfazer as obrigações que lhes incumbem por força desse ato a fim de poder beneficiar plenamente dos direitos que esse regulamento lhes confere, ou seja, no caso vertente, o direito de obter uma cobertura de cuidados de saúde a partir do momento em que esse Estado‑Membro se tornou competente, a título retroativo a partir de 1 de maio de 2006, para pagar a pensão devida a E. Fischer‑Lintjens e para lhe pagar as prestações sociais ( 16 ).

60.

Tal abordagem não é contrariada pelas apreciações do Tribunal de Justiça constantes do n.o 76 do seu acórdão van Delft e o. (C‑345/09, EU:C:2010:610), segundo as quais a solidariedade de um regime nacional de segurança social (tratava‑se igualmente do regime neerlandês) deve ser assegurada obrigatoriamente para todos os beneficiários abrangidos, independentemente do comportamento individual que cada um deles possa adotar em função de parâmetros pessoais.

61.

Com efeito, por um lado, essas considerações referem‑se ao pagamento pelos beneficiários da segurança social das retenções de contribuições sociais em benefício das instituições competentes do Estado‑Membro em cuja regulamentação se baseia a existência do direito às prestações sociais, obrigação que não é posta em causa no caso em apreço, a partir do momento em que o Reino dos Países Baixos se torna devedor de uma pensão e competente para pagar as prestações sociais a favor de um beneficiário, como E. Fischer‑Lintjens. Por outro lado, as apreciações do Tribunal de Justiça no referido acórdão van Delft e o. tinham por objeto recordar que as normas de conflitos previstas nos artigos 28.° e 28.°‑A do Regulamento n.o 1408/71 se impõem aos beneficiários e que, portanto, estes não se podem subtrair ao pagamento das retenções de contribuições sociais previstas pela legislação de um Estado‑Membro devedor de uma pensão e obrigado a pagar prestações em espécie a favor desses beneficiários. Ora, na minha opinião, é precisamente a situação objetiva resultante da norma de conflitos prevista no artigo 27.o e do Anexo VI, rubrica R, n.o 1, alínea a), i), e alínea b), do Regulamento n.o 1408/71 que impõe que um Estado‑Membro, que admite o princípio da retroatividade dos contratos privados de seguros de saúde, faça retroagir estes últimos de maneira a refletir precisamente essa situação objetiva e a permitir que os beneficiários exerçam plenamente os seus direitos resultantes dessa situação.

62.

Quanto à interrupção da cobertura de cuidados de saúde de E. Fischer‑Lintjens entre novembro de 2007 e 1 de julho de 2010, também não estou convencido da procedência das explicações da Comissão que, ao recordar as obrigações de informação que decorrem do artigo 84.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71 a cargo das pessoas que entram no seu âmbito de aplicação, sustenta que E. Fischer‑Lintjens não cumpriu essas obrigações e que, por conseguinte, deve suportar todas as consequências desse incumprimento.

63.

Com efeito, como admite a Comissão, o artigo 84.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71 destina‑se também às instituições competentes dos Estados‑Membros que, em conformidade com o princípio da boa administração, devem responder a todos os pedidos num prazo razoável e «comunicar[…] aos interessados qualquer informação necessária para o exercício dos direitos que lhes são conferidos pelo […] regulamento [n.o 1408/71]».

64.

No caso vertente, essa obrigação deve, na minha opinião, ser apreciada no contexto das particularidades do sistema obrigatório de seguros de saúde nos Países Baixos, que não prevê um seguro de doença público de pleno direito, mas obriga as pessoas interessadas a diligenciarem no sentido de subscrever tal seguro junto de uma seguradora privada.

65.

Ora, nesse contexto, entendo que compete às instituições neerlandesas competentes, neste caso, ao SVB, nos termos do artigo 84.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71, fornecerem a E. Fischer‑Lintjens, quando da comunicação da decisão de 8 de novembro de 2007 em resposta ao seu pedido de beneficiar de uma pensão nos Países Baixos, as informações suficientes para lhe permitir compreender que devia subscrever um seguro de saúde junto de uma seguradora privada, a fim de poder gozar plenamente dos direitos que lhe são conferidos pelo Regulamento n.o 1408/71. Embora não pareça ter sido esse o caso, compete, em todo o caso, ao órgão jurisdicional de reenvio verificá‑lo.

66.

Se as instituições competentes tivessem cumprido esta simples obrigação, e independentemente das restrições legislativas à retroatividade do seguro de saúde já analisadas, é muito provável que E. Fischer‑Lintjens tivesse efetuado imediatamente as diligências necessárias para subscrever esse seguro, sem, portanto, ter de sofrer uma interrupção da sua cobertura de saúde no período a partir de novembro de 2007.

67.

À luz destes desenvolvimentos, entendo que há que responder à segunda questão prejudicial no sentido de que um Estado‑Membro que concede a um beneficiário da segurança social, abrangido pelo disposto no artigo 27.o e no Anexo VI, rubrica R, n.o 1, alínea a), i), e alínea b), do Regulamento n.o 1408/71, uma pensão com efeitos retroativos deve permitir ao referido beneficiário subscrever um seguro obrigatório de saúde com os mesmos efeitos retroativos, de modo a refletir a situação objetiva resultante da aplicação dessas disposições do Regulamento n.o 1408/71.

III — Conclusões

68.

À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais apresentadas pelo Centrale Raad van Beroep do seguinte modo:

«1)

O artigo 27.o do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, deve ser interpretado no sentido de que o termo «devida» abrange o período durante o qual um interessado tem direito a uma pensão ou a uma renda, independentemente do momento em que esse direito foi formalmente declarado, desde que que essa pensão ou essa renda tenha sido efetivamente paga pelo referido período, incluindo de modo retroativo.

2)

Um Estado‑Membro que concede a um beneficiário da segurança social, que entra no âmbito de aplicação do artigo 27.o e do Anexo VI, rubrica R, n.o 1, alínea a), i), e alínea b), do Regulamento n.o 1408/71, uma pensão com efeitos retroativos deve permitir ao referido beneficiário subscrever um seguro obrigatório de saúde com os mesmos efeitos retroativos, de modo a refletir a situação objetiva resultante da aplicação dessas disposições do Regulamento n.o 1408/71.»


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) JO L 149, p.2, versão consolidada, JO [1997] L 28, p. 1.

( 3 ) JO L 100, p. 2.

( 4 ) JO L 392, p. 1.

( 5 ) Esta declaração baseava‑se no artigo 21.o do Decreto de 1999 sobre a extensão e limitação do número de inscritos na Segurança Social (Besluit uitbreiding en beperking kring verzekerden volksverzekeringen 1999).

( 6 ) O formulário E 121, uniformizado na União Europeia, constitui a declaração exigida para efeitos da inscrição do titular de uma pensão ou de uma renda paga por um Estado‑Membro junto da instituição do local da sua residência.

( 7 ) Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, as competências do Cvz relativas à emissão das declarações do artigo 21.o foram transferidas, a partir de 15 de março de 2011, para o SVB. Todavia, as declarações emitidas pelo Cvz consideram‑se emitidas pelo SVB, o que explica o facto de este organismo ser parte no processo principal.

( 8 ) V., nesse sentido, acórdãos Rundgren (C‑389/99, EU:C:2001:264, n.os 46 e 47) e van der Helder e Farrington (C‑321/12, EU:C:2013:648, n.os 44 e 47).

( 9 ) Acórdão Rundgren (C‑389/99, EU:C:2001:264, n.o 47).

( 10 ) V., designadamente, acórdãos van Delft e o. (C‑345/09, EU:C:2010:610, n.o 52) e Somova (C‑103/13, EU:C:2014:2334, n.o 55).

( 11 ) V., por analogia, no que respeita ao artigo 28.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71, acórdão Somova (C‑103/13, EU:C:2014:2334, n.os 55 e 56).

( 12 ) V., nesse sentido, acórdão Somova (C‑103/13, EU:C:2014:2334, n.os 54 e 55, e jurisprudência referida).

( 13 ) V. acórdão van Delft e o. (C‑345/09, EU:C:2010:610, n.o 62).

( 14 ) V., por analogia, designadamente, acórdão Kuusijärvi (C‑275/96, EU:C:1998:279, n.o 28).

( 15 ) Em especial, resulta da decisão de reenvio que, até à alteração retroativa da sua situação, E. Fischer‑Lintjens continuou a pagar as contribuições sociais ao DAK, instituição alemã competente.

( 16 ) O argumento adicional avançado pelo Governo neerlandês segundo o qual os contratos subscritos junto de seguradoras privadas se baseiam numa apreciação individual dos riscos e não podem, portanto, retroagir mais de quatro meses parece‑me dever ser objeto de cautela. Com efeito, por um lado, uma vez que a retroatividade é, em princípio, admitida, o risco constitui um critério muito relativo. Por outro, como o advogado‑geral Jääskinen referiu na nota de rodapé n.o 22 das suas conclusões apresentadas no processo van Delft e o. (C‑345/09, EU:C:2010:438), o regime de seguro obrigatório neerlandês é um sistema que impõe que os segurados se garantam contra determinados riscos e que os seguradores privados facultem contratos de adesão cobrindo os cuidados básicos sem apreciação individual dos riscos.

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