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Document 62006TJ0361

Acórdão do Tribunal Geral (Sexta Secção) de 27 de setembro de 2012.
Ballast Nedam NV contra Comissão Europeia.
Concorrência ― Acordos, decisões e práticas concertadas ― Mercado neerlandês do betume rodoviário ― Decisão que declara uma infração ao artigo 81.° CE ― Imputabilidade do comportamento ilícito ― Direitos de defesa ― Efeitos de um acórdão de anulação em relação a terceiros.
Processo T‑361/06.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2012:491

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

27 de setembro de 2012 ( *1 )

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado neerlandês do betume rodoviário — Decisão que declara uma infração ao artigo 81.o CE — Imputabilidade do comportamento ilícito — Direitos de defesa — Efeitos de um acórdão de anulação em relação a terceiros»

No processo T-361/06,

Ballast Nedam NV, com sede em Nieuwegein (Países Baixos), representada inicialmente por A. Bosman e J. van de Hel e, em seguida, por Bosman e E. Oude Elferink, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por A. Bouquet, A. Nijenhuis e F. Ronkes Agerbeek, na qualidade de agentes, assistidos inicialmente por F. Wijckmans, F. Tuytschaever e L. Gyselen e, em seguida, por F. Wijckmans e F. Tuytschaever, advogados,

recorrida,

que tem por objeto, a título principal, um pedido de anulação da Decisão C (2006) 4090 final da Comissão, de 13 de setembro de 2006, relativa a um procedimento nos termos do artigo 81.o [CE] [Processo COMP/F/38.456 — Betume (Países Baixos)], na parte relativa à recorrente e, a título subsidiário, por um lado, um pedido de anulação parcial da referida decisão na parte em que esta fixa a duração da infração no que lhe diz respeito e, por outro lado, um pedido de redução do montante da coima que lhe foi aplicada,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, N. Wahl e S. Soldevila Fragoso (relator), juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 30 de junho de 2011,

profere o presente

Acórdão

Factos na origem do litígio

1

A recorrente, Ballast Nedam NV, dirige o grupo Ballast Nedam, que opera no setor da construção nos Países Baixos. Em 1995, o grupo adquiriu as sociedades de construção rodoviária Eemsmond Wegenbouw BV e Bruil Infrastructuur BV, tornando-se assim um ator importante do setor da construção rodoviária nos Países Baixos, centralizando as suas atividades na Ballast Nedam Grond en Wegen BV (a seguir «BNGW»), filial detida a 100% pela Ballast Nedam Infra BV (a seguir «BN Infra»), ela própria detida a 100% pela recorrente. A partir de 1 de outubro de 2000, as atividades de construção rodoviária do grupo foram exercidas diretamente pela BN Infra. Desde 14 de fevereiro de 2003, a Ballast Nedam Nederland BV é a sociedade intermediária entre a recorrente e a BN Infra.

2

Por carta de 20 de junho de 2002, a British Petroleum informou a Comissão das Comunidades Europeias da existência de um possível cartel no mercado do betume rodoviário nos Países Baixos e apresentou um pedido com vista a obter imunidade em matéria de coimas, nos termos da comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas, e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002 C 45, p. 3).

3

Em 1 e 2 de outubro de 2002, a Comissão procedeu a inspeções inopinadas nas instalações de determinadas sociedades. A Comissão enviou pedidos de informações a várias sociedades, entre as quais a BN Infra, em 4 de julho de 2003, pedido esse a que esta respondeu em 12 de setembro de 2003. Em 10 de fevereiro de 2004, a Comissão enviou um pedido de informações à recorrente, ao qual esta respondeu em 9 de março de 2004.

4

Em 18 de outubro de 2004, a Comissão desencadeou o processo administrativo e aprovou uma comunicação de acusações, que foi enviada no dia seguinte a várias sociedades, entre as quais a recorrente e a BN Infra, à qual a recorrente respondeu em 20 de maio de 2005.

5

Em 13 de setembro de 2006, a Comissão adotou a decisão C (2006) 4090 final, relativa a um procedimento nos termos do artigo 81.o [CE] [Processo COMP/F/38.456 — Betume (Países Baixos)] (a seguir «decisão impugnada»), de que foi publicado um resumo no Jornal Oficial da União Europeia de 28 de julho de 2007 (JO L 196, p. 40) e que foi notificada à recorrente em 25 de setembro de 2006.

6

Na decisão impugnada, a Comissão referiu que as sociedades destinatárias da decisão tinham participado numa infração única e continuada ao artigo 81.o, n.o 1, CE, que consistiu na fixação conjunta e regular, durante os períodos em causa e para a venda e a compra de betume rodoviário nos Países Baixos, do preço bruto, de um desconto uniforme sobre o preço bruto para os construtores rodoviários que participaram no cartel e de um desconto máximo reduzido sobre o preço bruto para os outros construtores rodoviários.

7

A recorrente foi considerada culpada desta infração relativamente ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 15 de abril de 2002, tal como a sua filial BN Infra. Com efeito, a Comissão presumiu que, durante aquele período, a recorrente tinha exercido uma influência determinante sobre as suas filiais BN Infra e BNGW. Foi aplicada solidariamente à recorrente e à BN Infra uma coima de 4,65 milhões de euros.

Tramitação processual e pedidos das partes

8

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de dezembro de 2006, a recorrente interpôs o presente recurso.

9

Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal Geral (Sexta Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.o do seu Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes. As partes responderam a estas questões no prazo fixado.

10

As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 30 de junho de 2011.

11

Uma vez que um dos membros da Sexta Secção ficou impedido, o presidente do Tribunal Geral designou-se a si próprio, em aplicação do artigo 32.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, para completar a Secção.

12

Por despacho de 18 de novembro de 2011, o Tribunal Geral (Sexta Secção), na sua nova composição, reabriu a fase oral do processo e as partes foram informadas de que seriam ouvidas por ocasião de nova audiência.

13

Por cartas, respetivamente, de 25 e de 28 de novembro de 2011, a Comissão e a recorrente informaram o Tribunal Geral de que renunciavam a ser novamente ouvidas.

14

Consequentemente, o presidente do Tribunal decidiu encerrar a fase oral do processo.

15

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

a título principal, anular a decisão impugnada na parte que se lhe aplica;

a título subsidiário, anular parcialmente a decisão impugnada na parte que lhe diz respeito e que fixa a duração da infração, e reduzir o montante da coima que lhe foi aplicada;

condenar a Comissão nas despesas.

16

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

julgar o recurso improcedente;

condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

17

Em apoio dos seus pedidos, a recorrente apresenta dois fundamentos, o primeiro, relativo a erros manifestos de apreciação e de direito na imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW e, o segundo, relativo a uma violação do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1) e dos direitos de defesa, uma vez que a Comissão não referiu na comunicação de acusações que considerava a recorrente responsável.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo aos erros de direito e aos erros manifestos de apreciação na imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW

Quanto ao erro de direito relativo à tomada em consideração apenas do vínculo de capital na presunção do exercício de uma influência determinante pela sociedade-mãe na política comercial das suas filiais

¾ Argumentos das partes

18

A recorrente considera que a Comissão violou o artigo 81.o CE ao imputar-lhe a responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW com base apenas no facto de a recorrente ser detentora de 100% do capital destas sociedades. O juiz da União considerou claramente que a detenção da totalidade do capital de uma filial não permite, por si só, demonstrar a existência de um controlo por parte da sociedade-mãe sobre a sua filial (acórdão do Tribunal de Justiça, de 16 de novembro de 2000, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, C-286/98 P, Colet., p. I-9925, n.o 28, e acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2005, DaimlerChrysler/Comissão, T-325/01, Colet., p. II-3319, n.os 218 e 219).

19

No caso em apreço, a recorrente não participou nos acordos colusórios, de forma direta ou indireta, nunca se apresentou como interlocutor da BN Infra ou da BNGW durante o procedimento administrativo e alegou expressamente, na sua resposta à comunicação de acusações, que a BN Infra dispunha de verdadeira autonomia. Assim, a BN Infra e a BNGW definiram a sua política comercial sem a intervenção da recorrente e sem terem de lhe prestar contas, uma vez que o seu papel estava, à data da infração, limitado a aspetos de natureza essencialmente financeira. Por conseguinte, cabia à Comissão demonstrar que a recorrente tinha exercido uma influência determinante no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW no mercado em causa e que existia uma ligação entre essa influência e o comportamento ilícito.

20

A recorrente considera que a Comissão não podia, em contrapartida, basear-se em elementos muito gerais, tais como a consolidação dos resultados financeiros, as decisões em matéria de fusões, a utilização dos lucros das filiais, a política de investimentos, de compras e de vendas ou a nomeação dos seus diretores, para demonstrar que a recorrente tinha exercido uma influência determinante no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW. Com efeito, tais critérios correspondem aos deveres que incumbem a qualquer sociedade-mãe por força do código civil neerlandês, e reconhecer a pertinência de tais elementos onera as sociedades-mãe com uma presunção inilidível de responsabilidade com base na culpa. De acordo com a jurisprudência, o critério adequado é o da possibilidade de uma sociedade-mãe determinar o comportamento comercial da sua filial, ou seja, a política de distribuição e de preços praticada por esta (acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de outubro de 1983, AEG-Telefunken/Comissão, 107/82, Recueil, p. 3151).

21

Assim, de acordo com a recorrente, os critérios adotados pela Comissão, relativos à imputação a uma sociedade-mãe da responsabilidade pela infração cometida por uma filial violam o princípio da presunção de inocência reconhecido pelo artigo 6.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»).

22

A Comissão rejeita todos os argumentos da recorrente.

¾ Apreciação do Tribunal

23

Na decisão impugnada, a Comissão considerou que a participação nos acordos colusórios se efetuou, entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, através de um empregado da BNGW e, posteriormente, entre 1 de outubro de 2000 e 15 de abril de 2002, através do diretor da BN Infra. A Comissão optou por considerar a recorrente responsável pela infração relativamente a todo o período em que esta ocorreu, dado que a recorrente detinha a totalidade do capital da BN Infra e da BNGW, presumindo-se por isso que exercia efetivamente uma influência determinante sobre estas (considerandos 293 a 297 da decisão impugnada).

24

Importa recordar, a título preliminar que o direito da concorrência da União visa as atividades das empresas (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C-204/00 P, C-205/00 P, C-211/00 P, C-213/00 P, C-217/00 P e C-219/00 P, Colet., p. I-123, n.o 59) e que o conceito de empresa, na aceção do artigo 81.o CE, inclui entidades económicas constituídas, cada uma, por uma organização unitária de elementos pessoais, materiais e incorpóreos que prossegue, de forma duradoura, um objetivo económico determinado, organização esta que pode concorrer para a prática de uma das infrações previstas nesta disposição (v. acórdão do Tribunal Geral de 20 de março de 2002, HFB e o./Comissão, T-9/99, Colet., p. II-1487, n.o 54, e jurisprudência referida). O conceito de empresa, visto nesse contexto, deve ser entendido como designando uma unidade económica, mesmo que, do ponto de vista jurídico, essa unidade económica seja constituída por várias pessoas singulares ou coletivas (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de dezembro de 2006, Confederación Española de Empresarios de Estaciones de Servicio, C-217/05, Colet., p. I-11987, n.o 40).

25

O comportamento anticoncorrencial de uma empresa pode ser imputado a outra quando aquela não determine de forma autónoma o seu comportamento no mercado, mas aplique, no essencial, as instruções que lhe são dadas por esta última, em particular tendo em conta os laços económicos e jurídicos que as unem (acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de novembro de 2000, Metsä-Serla e o./Comissão, C-294/98 P, Colet., p. I-10065, n.o 27; de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C-189/02 P, C-202/02 P, C-205/02 P a C-208/02 P e C-213/02 P, Colet., p. I-5425, n.o 117, e de 10 de setembro de 2009, Akzo Nobel e o./Comissão, C-97/08 P, Colet., p. I-8237, n.o 58). Assim, o comportamento de uma filial pode ser imputado à sociedade-mãe quando a filial não determine de forma autónoma o seu comportamento no mercado, mas aplique, no essencial, as instruções que lhe são fornecidas pela sociedade-mãe, formando as duas empresas uma unidade económica (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de julho de 1972, Imperial Chemical Industries/Comissão, 48/69, Colet., p. 619, n.os 133 e 134).

26

Não é, portanto, uma relação de instigação entre a sociedade-mãe e a sua filial relativamente à infração, nem, por maioria de razão, uma implicação da primeira na referida infração, mas sim o facto de constituírem uma única empresa, na aceção acima referida, que permite à Comissão dirigir a decisão de impor coimas à sociedade-mãe de um grupo de sociedades. De facto, importa recordar que o direito da concorrência da União reconhece que sociedades diferentes pertencentes a um mesmo grupo constituem uma entidade económica e, portanto, uma empresa na aceção dos artigos 81.° CE e 82.° CE, se as sociedades em causa não determinarem de forma autónoma o seu comportamento no mercado (acórdão do Tribunal Geral de 30 de setembro de 2003, Michelin/Comissão, T-203/01, Colet., p. II-4071, n.o 290).

27

No caso especial de uma sociedade-mãe deter 100% do capital da sua filial que cometeu uma infração, por um lado, essa sociedade-mãe pode exercer uma influência determinante no comportamento dessa filial e, por outro, existe uma presunção ilidível de que a referida sociedade-mãe exerce efetivamente tal influência (v. acórdão Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25, supra, n.o 60, e jurisprudência referida).

28

Nestas condições, basta que a Comissão prove que a totalidade do capital de uma filial é detida pela respetiva sociedade-mãe para se presumir que esta exerce uma influência determinante na política comercial dessa filial. A Comissão pode, em seguida, considerar que a sociedade-mãe é solidariamente responsável pelo pagamento da coima aplicada à sua filial, a menos que essa sociedade-mãe, à qual incumbe ilidir a referida presunção, apresente elementos de prova suficientes, suscetíveis de demonstrar que a sua filial se comporta de forma autónoma no mercado (acórdãos Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, referido no n.o 18, supra, n.o 29, e Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25 supra, n.o 61).

29

Embora seja verdade que o Tribunal de Justiça evocou, nos n.os 28 e 29 do acórdão Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, referido no n.o 18, supra, para além da detenção de 100% do capital da filial, outras circunstâncias, tais como a não contestação da influência exercida pela sociedade-mãe na política comercial da sua filial e a representação comum das duas sociedades durante o procedimento administrativo, não é menos verdade que tais circunstâncias foram referidas pelo Tribunal de Justiça apenas com o objetivo de expor todos os elementos nos quais o Tribunal Geral tinha baseado o seu raciocínio nesse processo, e não para subordinar a aplicação da presunção acima referida à produção de indícios suplementares relativos ao exercício efetivo de uma influência pela sociedade-mãe sobre a sua filial (acórdãos do Tribunal de Justiça Akzo Nobel e o./Comissão, n.o 25, supra, n.o 62, e de 20 de janeiro de 2011, General Química e o./Comissão, C-90/09 P, Colet., p. I-1, n.o 41).

30

A recorrente considera que a abordagem adotada pela Comissão é contrária à presunção de inocência consagrada no artigo 6.o da CEDH. Por força do disposto no artigo 2.o do Regulamento n.o 1/2003, que concretiza a presunção de inocência reconhecida no artigo 6.o, n.o 2, da CEDH, o ónus da prova de uma violação do artigo 81.o, n.o 1, CE incumbe à autoridade que alega tal violação. Como salientou a advogada-geral J. Kokott nas suas conclusões no processo que deu origem ao acórdão Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25, supra (Colet., p. I-8241), o recurso a tal presunção do exercício efetivo de uma influência determinante por uma sociedade-mãe sobre uma filial detida a 100% não conduz a uma inversão do ónus da prova, o que seria problemático tendo em conta aquelas disposições, mas estabelece o nível da prova que deve ser atingido para determinar se a responsabilidade por uma infração recai sobre a sociedade-mãe ou sobre a filial. Na medida em que o facto de a sociedade-mãe deter a totalidade do capital da sua filial permite presumir que tal influência é exercida, considera-se que esta presunção satisfaz as exigências quanto ao ónus da prova se a sociedade-mãe não a ilidir mediante a apresentação de provas concludentes em sentido contrário (v., nesse sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.o 24, supra, n.o 79). Assim, previamente à questão da repartição do ónus da prova, todas as partes têm a obrigação de expor as suas teses (conclusões da advogada-geral J. Kokott apresentadas nos processos que deram origem aos acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de setembro de 2006, Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, C-105/04 P, Colet., p. I-8725, n.o 73, e Akzo Nobel e o./Comissão, já referidas, n.o 74).

31

A recorrente considera, por outro lado, que a interpretação que a Comissão faz da presunção do exercício efetivo de uma influência determinante por uma sociedade-mãe sobre a sua filial detida a 100% torna impossível ilidir essa presunção.

32

Decorre, no entanto, da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para ilidir a presunção de que uma sociedade-mãe que detém 100% do capital social da sua filial exerce efetivamente uma influência determinante sobre esta, cabe à referida sociedade-mãe submeter à apreciação da Comissão e, posteriormente, se for caso disso, à do juiz da União, todos os elementos que considere suscetíveis de demonstrar que não constituem uma única entidade económica, relativos aos vínculos organizacionais, económicos e jurídicos que unem essa filial à sociedade-mãe, que podem variar de caso para caso e que, como tal, não podem ser objeto de uma enumeração exaustiva (acórdãos Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25, supra, n.o 65, e General Química e o./Comissão, referido no n.o 29, supra, n.os 51 e 52). Contrariamente ao que sustenta a recorrente, trata-se, por conseguinte, de uma presunção ilidível, que lhe cabia ilidir.

33

No que respeita ao argumento da recorrente de que as obrigações a que uma sociedade-mãe está sujeita nos termos do direito neerlandês tornam impossível qualquer ilisão daquela presunção, há que recordar que uma sociedade não pode invocar a regulamentação nacional para escapar às regras do direito da União, dado que os conceitos jurídicos utilizados pelo direito da União devem, em princípio, ser interpretados e aplicados uniformemente em toda a União (acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de fevereiro de 1972, Hagen, 49/71, Colet., p. 7, n.o 6). Em todo o caso, à luz de todos os princípios recordados acima quanto à existência de tal presunção e dos critérios que permitem ilidi-la, os elementos relativos às obrigações impostas pelo direito neerlandês às sociedades-mãe relativamente às respetivas filiais parecem reforçar a presunção aplicada pela Comissão relativamente à recorrente no que respeita ao controlo por esta exercido sobre a BN Infra e a BNGW.

34

Por último, a recorrente sustenta que a Comissão atribuiu demasiada importância a elementos muito formais e gerais para demonstrar que a recorrente tinha exercido uma influência determinante sobre a BN Infra e sobre a BNGW.

35

Antes de mais, há que recordar, a este respeito, que os indícios suplementares do exercício efetivo, por parte da recorrente, de uma influência determinante no comportamento das suas filiais, apresentados pela Comissão, constituem elementos de prova adicionais que, para além da presunção relativa à detenção, pela recorrente, da totalidade do capital das suas filiais, vieram confirmar não a participação material efetiva da recorrente na infração em causa, mas a sua influência determinante no comportamento das suas filiais e a utilização efetiva desse poder (acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de outubro de 2003, ARBED/Comissão, C-176/99 P, Colet., p. I-10687, n.o 20; v. igualmente acórdão Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25, supra, n.o 62).

36

Por outro lado, como já foi recordado no n.o 32, supra, o juiz da União considera que, na sua apreciação da existência de uma única entidade económica entre a sociedade-mãe e a sua filial, deve ter em conta todos os elementos que lhe são submetidos pelas partes, relativos aos vínculos organizacionais, económicos e jurídicos entre as duas sociedades, cujo caráter e importância podem variar de acordo com as características próprias de cada caso concreto (acórdãos Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25 supra, n.o 65). Ainda que determinados factos, tais como a consolidação das contas ao nível do grupo, sejam desprovidos de pertinência (acórdão General Química e o./Comissão, referido no n.o 29, supra, n.o 108), outros elementos, tais como os vínculos pessoais estreitos entre a sociedade-mãe e a sua filial ou a capacidade da sociedade-mãe para reorganizar as tarefas atribuídas às suas diferentes filiais, que, por si sós, não permitem demonstrar a existência de uma única entidade económica, podem constituir, no seu conjunto, um leque de indícios concordantes suficientes.

37

Resulta das considerações que antecedem que a Comissão não cometeu um erro de direito ao considerar que a recorrente, sociedade-mãe a 100% da BN Infra e da BNGW, tendo exercido uma influência determinante sobre estas, era responsável pela infração que elas cometeram.

Quanto aos erros manifestos de apreciação relativos à imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW

¾ Argumentos das partes

38

A recorrente considera que a Comissão cometeu erros manifestos de apreciação no que respeita às circunstâncias particulares nas quais se baseou na decisão impugnada para lhe imputar a responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW.

39

A título prévio, sublinha que a presunção do exercício efetivo de uma influência determinante não dizia respeito à BNGW durante o procedimento administrativo e que, em relação a esta, a Comissão se limitou, na decisão impugnada, a referir a reorganização interna das atividades de construção rodoviária em 2000. Por conseguinte, considera que os demais elementos apresentados pela Comissão na fase do processo jurisdicional são inadmissíveis.

40

Assim, de acordo com a recorrente, a Comissão tomou em consideração, erradamente, a composição do seu conselho de administração, que se limitava a duas pessoas, embora este elemento apenas permitisse demonstrar que a recorrente não podia controlar o comportamento da BN Infra e da BNGW no mercado, tendo em conta as diversas atividades do grupo. De igual modo, a Comissão interpretou de forma errada as funções do «concern council», que reúne o seu conselho de administração e os diretores-gerais dos grandes departamentos do grupo e que apenas trata de assuntos estratégicos que dizem respeito a todo o grupo. De resto, a presença de representantes da BN Infra e da BNGW neste órgão constitui uma indicação do posicionamento independente destas no grupo, na medida em que lhes é possível, desse modo, aí defender a sua autonomia. Além disso, a Comissão cometeu um erro de facto ao considerar que o empregado da BN Infra que participou nas reuniões do cartel a partir de outubro de 2000 fazia parte do «concern council» durante o período da infração, uma vez que este apenas integrou aquele órgão em fevereiro de 2004, quando foi nomeado diretor geral da BN Infra. De igual modo, o facto de a recorrente estar sediada no mesmo endereço que a BN Infra não é pertinente, uma vez que as duas sociedades estavam instaladas em edifícios diferentes. Por último, a reorganização das atividades de construção rodoviária do grupo, em outubro de 2000, não fornece qualquer indicação quanto à falta de autonomia comercial da BN Infra, uma vez que qualquer sociedade-mãe pode reorganizar o seu grupo.

41

Além disso, a recorrente recorda, como salientou na sua resposta à comunicação de acusações, que é apenas uma holding financeira e que a BN Infra e a BNGW são individualmente responsáveis pelos aspetos comerciais, financeiros e jurídicos da respetiva atividade, bem como pela respetiva política de pessoal. Estas sociedades estão obrigadas a apresentar à recorrente um plano de empresa, no qual são expostas apenas as grandes linhas da sua estratégia, bem como previsões financeiras. Além disso, algumas das suas decisões são sujeitas à autorização da recorrente, mas em matérias completamente estranhas à política comercial. O direito das sociedades neerlandês impõe igualmente a qualquer sociedade-mãe que mantenha determinadas relações com as suas filiais, nomeadamente no que respeita à nomeação dos diretores pela assembleia geral dos acionistas, à tomada de decisão relativa à utilização dos lucros, à elaboração das contas consolidadas a partir de relatórios financeiros das filiais ou ainda às decisões de alteração da estrutura do grupo.

42

Assim, a BN Infra era, desde outubro de 2000, totalmente livre de determinar o seu comportamento comercial, nomeadamente em matéria de compra de matérias-primas, ficando apenas as propostas relativas a empreitadas de um determinado valor ou que apresentassem um perfil de risco específico submetidas a um comité dos contratos no qual a recorrente participa. Acresce que a BN Infra estava obrigada a pedir autorização ao conselho de administração da recorrente apenas em caso de celebração de acordos de cooperação que saíssem do âmbito da sua atividade normal.

43

De igual modo, até outubro de 2000, a BNGW decidiu livremente a celebração de contratos de empreitadas de construção rodoviária, com exceção das empreitadas cujo valor ultrapassava um determinado limite, que eram submetidas ao comité dos contratos, mas que representaram apenas uma pequena parte do seu volume de negócios. Além disso, a BNGW estava obrigada a transmitir ao conselho de administração da recorrente, a cada trimestre, apenas os seus resultados financeiros, nunca tendo referido qualquer projeto em concreto. Por último, a direção da BNGW exerceu funções noutras sociedades do grupo, nomeadamente na BN Infra, apenas durante um período muito limitado, em 2000, e o facto de o empregado da BNGW que participou nas reuniões do cartel se ter tornado diretor comercial da BN Infra a partir de outubro de 2000 não teve influência no grau de autonomia de que a BNGW beneficiava até àquela data.

44

A Comissão considera que a recorrente não conseguiu ilidir a presunção do exercício efetivo de uma influência determinante da sua parte no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW e que, de qualquer modo, vários elementos referidos na decisão impugnada demonstram, a título subsidiário, que a recorrente exerceu efetivamente uma influência determinante na política da BN Infra e da BNGW.

45

Por outro lado, na réplica, a Comissão considerou que a recorrente tinha apresentado determinados elementos destinados a ilidir a presunção do exercício efetivo de uma influência determinante da sua parte no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW, pela primeira vez, na petição inicial, o que era contrário à jurisprudência do Tribunal Geral (acórdão de 27 de setembro de 2006, Akzo Nobel/Comissão, T-330/01, Colet., p. II-3389, n.o 89). Contudo, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral, relativa ao acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de julho de 2010, Knauf Gips/Comissão (C-407/08 P, Colet., p. I-6371, n.os 89 a 92), a Comissão declarou que já não se opunha à admissibilidade dos argumentos da recorrente com vista a ilidir a referida presunção.

46

Por último, a Comissão considerou que, caso o Tribunal Geral considere admissíveis os argumentos destinados a ilidir aquela presunção que foram apresentados pela primeira vez pela recorrente perante este órgão jurisdicional, deve dar oportunidade à Comissão de responder a esses argumentos durante o processo jurisdicional.

¾ Apreciação do Tribunal

47

A análise das acusações que visam demonstrar que a Comissão cometeu erros manifestos de apreciação ao imputar à recorrente a responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW deve procurar apurar se a recorrente apresentou elementos que permitam ilidir a presunção de que estas três sociedades constituíam uma única entidade económica.

48

A título prévio, importa recordar que, de acordo com a jurisprudência, no que respeita à aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE, nenhuma disposição do direito da União obriga o destinatário da comunicação de acusações a contestar todos seus elementos de facto ou de direito durante o procedimento administrativo, sob pena de já não poder fazê-lo ulteriormente, na fase do processo jurisdicional, uma vez que tal limitação é contrária aos princípios fundamentais da legalidade e do respeito pelos direitos de defesa (acórdão Knauf Gips/Comissão, referido no n.o 45, supra, n.os 89 a 92).

49

Quanto à questão de saber se a Comissão podia igualmente apresentar indícios complementares relativos à existência de uma única entidade económica entre a recorrente e a BNGW na fase contenciosa, importa recordar que, no âmbito de um recurso de anulação interposto nos termos do artigo 230.o CE, ainda que a Comissão não possa apresentar, em apoio da decisão impugnada, novos elementos de prova da acusação que não tenham sido tidos em conta nessa decisão, tem, no entanto, o direito de responder aos argumentos da recorrente quando esta procure demonstrar, com base noutros documentos por ela apresentados no Tribunal Geral, que a tese da Comissão está errada quanto aos factos (acórdão do Tribunal Geral de 8 de julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T-67/00, T-68/00, T-71/00 e T-78/00, Colet., p. II-2501, n.os 175 e 176). Acresce que o Tribunal de Justiça já reconheceu que o autor de uma decisão impugnada podia prestar esclarecimentos durante o processo contencioso a fim de completar uma fundamentação já em si mesma suficiente, uma vez que aqueles podem ser úteis à fiscalização interna dos fundamentos da decisão, exercida pelo juiz da União, na medida em que permitem à instituição explicar as razões que estão na base da sua decisão (acórdão da Tribunal de Justiça de 16 de novembro de 2000, Finnboard/Comissão, C-298/98 P, Colet., p. I-10157, n.o 46).

50

Importa por isso concluir que, no caso em apreço, a Comissão tinha o direito de responder aos argumentos apresentados pela recorrente na fase do processo jurisdicional com vista a ilidir a presunção do exercício efetivo de uma influência determinante da sua parte no comportamento comercial da BNGW.

51

A título principal, importa recordar que, nos termos dos considerandos 293 a 297 da decisão impugnada, a Comissão expôs, antes de mais, que podia aplicar a presunção do exercício efetivo, pela recorrente, de uma influência determinante sobre a BNGW relativamente ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000 e, posteriormente, sobre a BN Infra relativamente ao período compreendido entre 1 de outubro de 2000 e 15 de abril de 2002. Em seguida, considerou que vários elementos relativos à estrutura do grupo vinham reforçar esta presunção. Assim, o conselho de administração da recorrente é composto apenas por duas pessoas, que formam, com os diretores-gerais dos grandes departamentos, o «concern council», do qual fazia parte o empregado da BN Infra que participou diretamente no cartel desde 2000. Acresce que a Comissão salientou que a recorrente e a BN Infra estavam sediadas no mesmo endereço. Por último, realçou as competências institucionais de organização do grupo de que a recorrente dispunha, que esta exerceu, nomeadamente em 2000, ao reorganizar a atividade de construção rodoviária.

52

Em primeiro lugar, ainda que a recorrente considere que a Comissão se devia ter baseado em elementos que permitissem apreciar o seu papel no comportamento anticoncorrencial em questão para considerar que a recorrente podia ser responsável pela infração cometida pelas suas filiais, importa recordar que, de acordo com a jurisprudência, o controlo exercido pela sociedade-mãe sobre as suas filiais não tem de ter necessariamente relação com o comportamento ilícito (v. n.o 26, supra, e acórdãos Akzo Nobel e o./Comissão, referido no n.o 25, supra, n.o 59, e General Química e o./Comissão, referido no n.o 29, supra, n.os 38, 102 e 103). Por conseguinte, não é necessário analisar se a recorrente exerceu efetivamente uma influência sobre o comportamento ilícito da BN Infra e da BNGW.

53

Em segundo lugar, os elementos apresentados pela recorrente para demonstrar que não exerceu uma influência determinante no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW não permitem ilidir a presunção do exercício de tal influência. Com efeito, o argumento de que o seu conselho de administração era composto por apenas duas pessoas, o que tornava mais difícil o acompanhamento das várias atividades do grupo, não é suficiente, por si só, para ilidir esta presunção, uma vez que não permite demonstrar que a recorrente tinha renunciado ao exercício do seu poder de controlo sobre a BN Infra e sobre a BNGW. De igual modo, as afirmações da recorrente de que a presença dos diretores da BN Infra e da BNGW no «concern council» constituía uma indicação do posicionamento independente destas na organização do grupo não é suficiente para provar que lhes concedeu total autonomia para definirem o seu comportamento no mercado, até porque a existência do «concern council» indica, em si mesma, que a recorrente participava estreitamente na determinação dos objetivos estratégicos das suas filiais. Por outro lado, o facto de a BN Infra e a BNGW terem levado a cabo uma política comercial relativamente autónoma, abaixo de um determinado limiar, não permite, por si só, infirmar a conclusão de que, enquanto única acionista, a recorrente exercia efetivamente uma influência determinante no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW. Com efeito, este argumento não é determinante para ilidir a presunção de que a recorrente exercia efetivamente uma influência determinante acima desse limiar. Por último, o facto de a direção da BNGW ter desempenhado funções noutras sociedades do grupo, nomeadamente na BN Infra, apenas durante um período muito limitado não é suficiente para demonstrar a autonomia da BNGW em relação à recorrente. De facto, este argumento não acrescenta elementos que permitam ilidir a presunção relativamente ao período durante o qual a direção da BNGW desempenhou essas funções.

54

Em terceiro lugar, a recorrente sustenta que era apenas uma holding financeira que não interferia nas atividades operacionais da BN Infra e da BNGW. O conceito de holding abrange várias situações, mas, de um modo geral, uma holding pode ser definida como uma sociedade que detém participações numa ou em várias sociedades, a fim de as controlar (acórdão do Tribunal Geral de 8 de outubro de 2008, Schunk e Schunk Kohlenstoff-Technik/Comissão, T-69/04, Colet., p. II-2567, n.o 60). Ainda que a presunção do exercício efetivo de uma influência determinante possa, em princípio, ser questionada quando uma sociedade-mãe se comporte como uma pura holding financeira, resulta dos autos que, no caso em apreço, a recorrente não se comportava como tal. Assim, a assembleia geral dos acionistas da recorrente estava encarregada de nomear os diretores das filiais e de aprovar algumas decisões estratégicas importantes destas, nomeadamente sobre a utilização dos lucros, as ações judiciais, os créditos bancários, os investimentos ou ainda a cooperação com outras empresas. De igual modo, a existência do «concern council» indica que a recorrente participava estreitamente na definição dos objetivos estratégicos das suas filiais e da estrutura do grupo, como de resto ficou demonstrado na restruturação das atividades de construção rodoviária, em 2000. Por último, as filiais estavam obrigadas a apresentar, a cada trimestre, várias informações à recorrente, tais como os planos de empresa, as propostas de empreitadas de valor superior a um determinado montante e os seus relatórios financeiros. Todos estes elementos demonstram que o papel da recorrente ultrapassava o de uma mera holding financeira.

55

De qualquer modo, resulta de todos estes elementos, em especial da existência de vínculos económicos e organizacionais significativos entre a recorrente e as suas filiais, que a Comissão concluiu corretamente pela falta de autonomia destas últimas e, portanto, pela existência de uma única entidade económica.

56

O facto de a recorrente e a BN Infra estarem sediadas no mesmo endereço, ainda que se trate de edifícios diferentes, e de se apresentarem sob a mesma denominação perante terceiros pode igualmente constituir um indício que, corroborado por outros, permite declarar a existência de uma única entidade económica. Por último, o facto de o empregado da BN Infra que participou diretamente nas reuniões do cartel a partir de outubro de 2000 ter integrado o «concern council» em 2004, ou seja, após o fim do período da infração, constitui um indício suplementar da existência de vínculos hierárquicos e de relações estreitas entre a BN Infra e a recorrente. A este respeito, importa de resto realçar que, contrariamente ao que afirma a recorrente, a Comissão não fez qualquer referência, na decisão impugnada, ao facto de este empregado fazer parte do «concern council» durante o período da infração.

57

Resulta das considerações que antecedem que os elementos apresentados pela recorrente, na fase administrativa e no processo judicial, não permitem ilidir a presunção de que, pelo facto de deter 100% do capital da BN Infra e da BNGW, aquela exerceu efetivamente uma influência determinante sobre estas. Por conseguinte, há que confirmar a conclusão, constante da decisão impugnada, de que a recorrente constituía, com a BN Infra e a BNGW, uma empresa, na aceção do artigo 81.o CE, sem que seja necessário verificar se exerceu uma influência no comportamento ilícito da BN Infra e da BNGW.

Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

Argumentos das partes

58

A recorrente afirma que a Comissão violou o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e os seus direitos da defesa ao não referir na comunicação de acusações que presumia que a recorrente era responsável, com base no facto de esta ter exercido efetivamente uma influência determinante sobre a BNGW, durante o período de 21 de junho de 1996 a 1 de outubro de 2000. Considera, por isso, que o montante da coima devia ser reduzido proporcionalmente à duração da infração e, assim, ser fixado em 1213650 euros.

59

Com efeito, na comunicação de acusações, a Comissão não referiu que considerava que a BNGW era uma filial da BN Infra, nem que considerava que a recorrente tinha exercido uma influência determinante sobre a BNGW. Contudo, o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e o juiz da União exigem que seja dada ao destinatário da comunicação de acusações a possibilidade de dar a conhecer o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados, bem como sobre os documentos considerados pela Comissão em apoio da sua alegação de existência de uma infração ao tratado (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.o 24, supra, n.o 66).

60

A recorrente considera que a mera referência à BNGW, por duas vezes, na comunicação de acusações (n.o 342 e nota de pé de página n.o 518) não é suficiente. Com efeito, a Comissão, por um lado, designou erradamente a BNGW como antecessora legal da BN Infra e, por outro lado, em nenhum momento se referiu à BNGW como uma entidade jurídica independente que participou no cartel e em cuja política comercial a recorrente exerceu uma influência determinante. De igual modo, a mera alusão da Comissão às regras gerais relativas à imputação às sociedades-mãe das infrações cometidas pelas suas filiais não pode substituir-se à identificação das filiais em questão. Por último, a recorrente considera que o facto de ter feito referência à BNGW, de forma geral, na sua resposta à comunicação de acusações não basta para considerar que a Comissão satisfez as exigências fixadas na jurisprudência quanto ao conteúdo da comunicação de acusações (acórdãos do Tribunal de Justiça ARBED/Comissão, referido no n.o 35, supra, n.o 23, e de 14 de julho de 2005, ThyssenKrupp/Comissão, C-65/02 P e C-73/02 P, Colet., p. I-6773, n.o 85).

61

Por outro lado, na audiência, a recorrente sustentou que, em todo o caso, se, no processo T-362/06, o Tribunal Geral decidir anular a decisão impugnada na parte que diz respeito à imputação à BN Infra do comportamento da BNGW, não pode ser obrigada a pagar a coima, uma vez que a responsabilidade de uma sociedade-mãe não pode ser superior à responsabilidade da sua filial.

62

A Comissão refuta todos os argumentos da recorrente. Na audiência, em resposta aos argumentos da recorrente relativos às consequências a retirar da eventual anulação parcial da decisão impugnada no processo T-362/06, a Comissão considerou que a coima aplicada à recorrente devia em todo o caso manter-se, uma vez que a Comissão dispõe de uma margem de apreciação relativamente à questão de saber quais são as entidades de uma empresa que considera responsáveis por uma infração.

Apreciação do Tribunal

¾ Quanto à violação dos direitos de defesa

63

O artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 tem a seguinte redação:

«Antes de tomar as decisões previstas nos artigos 7.°, 8.° e 23.° e no n.o 2 do artigo 24.o, a Comissão dá às empresas ou associações de empresas sujeitas ao processo [por ela] instruído oportunidade de se pronunciarem sobre as acusações por ela formuladas. A Comissão deve basear as suas decisões apenas em acusações sobre as quais as partes tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações. Os autores das denúncias são estreitamente associados ao processo.»

64

De acordo com a jurisprudência, o respeito pelos direitos de defesa exige que a empresa interessada tenha tido a possibilidade, durante o processo administrativo, de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e circunstâncias alegados e sobre os documentos considerados pela Comissão em apoio da sua alegação de existência de uma infração ao Tratado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.o 10, e de 6 de abril de 1995, BPB Industries e British Gypsum/Comissão, C-310/93 P, Colet., p. I-865, n.o 67). De igual modo, de acordo com jurisprudência constante, tendo em conta a sua importância, a comunicação de acusações deve precisar, inequivocamente, a pessoa coletiva à qual poderão ser aplicadas coimas e deve ser dirigida a esta última (acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de março de 2000, Compagnie maritime belge transports e o./Comissão, C-395/96 P e C-396/96 P, Colet., p. I-1365, n.os 143 e 146, e ARBED/Comissão, referido no n.o 35, supra, n.o 21; acórdão Akzo Nobel/Comissão, referido no n.o 45, supra, n.o 87). Importa igualmente que a comunicação de acusações indique em que qualidade uma empresa é acusada dos factos alegados (acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de setembro de 2009, Papierfabrik August Koehler e o./Comissão, C-322/07 P, C-327/07 P e C-338/07 P, Colet., p. I-7191, n.o 39).

65

No entanto, há que recordar que, de acordo com a jurisprudência, a decisão não tem necessariamente de ser uma cópia exata da comunicação de acusações (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de outubro de 1980, van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.o 68). Por conseguinte, só se deverá julgar provada uma violação dos direitos de defesa se a decisão final imputar às empresas em causa infrações diferentes das referidas na comunicação de acusações ou tomar em consideração factos diferentes (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de julho de 1970, ACF Chemiefarma/Comissão, 41/69, Colet., p. 661, n.os 26 e 94, e acórdão do Tribunal Geral de 23 de fevereiro de 1994, CB e Europay/Comissão, T-39/92 e T-40/92, Colet., p. II-49, n.os 49 a 52). Não é esse o caso quando as alegadas diferenças entre a comunicação de acusações e a decisão final não sejam relativas a outros comportamentos que não aqueles sobre os quais as empresas em causa já se tenham pronunciado e que são, portanto, estranhos a qualquer acusação nova (acórdão do Tribunal Geral de 30 de setembro de 2003, Atlantic Container Line e o./Comissão, T-191/98, T-212/98 a T-214/98, Colet., p. II-3275, n.o 191).

66

A este respeito, há que salientar que, para alegarem que houve violação dos direitos de defesa relativamente às acusações constantes da decisão impugnada, as empresas em causa não podem limitar-se a invocar a mera existência de diferenças entre a comunicação de acusações e a decisão impugnada sem exporem, de forma precisa e concreta, de que modo cada uma dessas diferenças constitui, no caso concreto, uma acusação nova sobre a qual não tiveram a oportunidade de ser ouvidas (acórdão Atlantic Container Line e o./Comissão, referido no n.o 65, supra, n.o 192). Com efeito, de acordo com a jurisprudência, uma violação dos direitos de defesa deve ser analisada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, uma vez que depende essencialmente das acusações tomadas em consideração pela Comissão para demonstrar a infração imputada às empresas em causa (acórdão do Tribunal Geral de 29 de junho de 1995, ICI/Comissão, T-36/91, Colet., p. II-1847, n.o 70).

67

A recorrente considera que, no caso em apreço, a Comissão não cumpriu as suas obrigações ao não referir na comunicação de acusações que presumia que a recorrente era responsável, com base no facto de esta ter exercido uma influência determinante sobre a BNGW, durante o período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 1 de outubro de 2000.

68

Na comunicação de acusações, a Comissão recordou, antes de mais, que cada grupo de sociedades em causa constituía uma única empresa e que a sociedade-mãe do grupo podia exercer uma influência determinante no comportamento das suas filiais (n.o 324). Em seguida, referiu que a recorrente tinha participado no cartel através do diretor da BNGW (n.o 236 da comunicação de acusações), posteriormente da BN Infra (n.o 339 da comunicação de acusações) e que, uma vez que a recorrente controlava a totalidade do capital da BN Infra (anteriormente Ballast Nedam Wegenbouw BV e BNGW) através da entidade intermediária Ballast Nedam Nederland, presumiu que a sociedade-mãe exercia uma influência determinante no comportamento destas duas filiais. Por último, a Comissão apresentou determinados elementos complementares relativos à existência de uma empresa unitária entre a recorrente e a BN Infra (n.o 340 da comunicação de acusações). Tendo em conta todos estes elementos, a Comissão decidiu que devia dirigir a comunicação de acusações à BN Infra pela participação direta desta (e das suas antecessoras) nos acordos e à recorrente pela participação desta através do exercício efetivo de uma influência determinante no comportamento da BN Infra (n.o 342 da comunicação de acusações).

69

Resulta de todos de estes elementos que, embora a forma como a comunicação de acusações foi redigida pudesse ser mais clara, nomeadamente no que respeita à relação entre a BN Infra e a BNGW, a Comissão forneceu à recorrente elementos suficientes para que esta pudesse compreender os factos e as circunstâncias utilizados em apoio da sua alegação da existência de uma infração e especificou, inequivocamente, quais as pessoas jurídicas que poderiam ser objeto da aplicação de coimas. Com efeito, o simples facto de a Comissão, na comunicação de acusações, não ter fornecido qualquer elemento de prova complementar relativo à existência de uma empresa unitária entre a recorrente e a BNGW não basta para considerar que não indicou claramente que pretendia aplicar a presunção do exercício efetivo pela recorrente de uma influência determinante no comportamento comercial da BN Infra e da BNGW. Consequentemente, o Tribunal Geral considera que, com base nas informações que constam da comunicação de acusações, a recorrente não podia ignorar que poderia ser destinatária de uma decisão final da Comissão na qualidade de sociedade-mãe da BNGW.

70

Há que constatar, de resto, que, em resposta a esta alegação formulada na comunicação de acusações, a recorrente alegou, na sua resposta à comunicação de acusações, que a BN Infra não era sucessora da BNGW, mas sim sua sociedade-mãe a 100%, e apresentou argumentos para demonstrar a autonomia da BNGW em relação a ela.

71

Nestas circunstâncias, o Tribunal considera que a recorrente estava em condições, desde a fase da comunicação de acusações, de compreender o alcance da acusação formulada pela Comissão no que respeita à sua participação na infração na qualidade de sociedade-mãe da BNGW e, assim, de assegurar utilmente a sua defesa.

¾ Quanto aos efeitos do acórdão de anulação no processo T-362/06

72

Na audiência, a recorrente sustentou que, uma vez que se considerava que constituía com a BN Infra uma mesma empresa, na aceção do artigo 81.o CE, a redução do montante da coima aplicada à BN Infra tinha como consequência que a coima que lhe fora aplicada solidariamente como sociedade-mãe devia ser igualmente reduzida.

73

Em todo o caso, e sem que seja necessário emitir pronúncia sobre a admissibilidade destes argumentos, importa recordar que a anulação, pelo Tribunal Geral, no processo T-362/06, do artigo 1.o, alínea a), da decisão impugnada, na medida em que imputou à BN Infra o comportamento ilícito da BNGW entre 21 de junho de 1996 e 1 de outubro de 2000, resulta do facto de a Comissão ter desrespeitado os direitos de defesa da BN Infra ao não referir, na comunicação de acusações, que a considerava responsável pela infração cometida pela BNGW na sua qualidade de sociedade-mãe da BNGW, e não na sua qualidade de sucessora legal desta. Se o Tribunal Geral considerou que a Comissão tinha, assim, desrespeitado os direitos de defesa da BN Infra, em contrapartida, não concluiu que não houve comportamento ilícito por parte da BNGW.

74

Ora, resulta da decisão impugnada (considerando 295) que a Comissão presumiu que a recorrente tinha exercido uma influência determinante sobre a BNGW por deter, indiretamente, a totalidade do seu capital.

75

Por conseguinte, a recorrente não pode sustentar que a Comissão não podia imputar-lhe o comportamento ilícito da BNGW no que respeita ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 1 de outubro de 2000 nem condená-la solidariamente no pagamento da coima. De facto, de acordo com jurisprudência constante, a Comissão dispõe de uma margem de apreciação para decidir quais são as entidades que, numa empresa, considera responsáveis por uma infração (acórdãos do Tribunal Geral de 1 de abril de 1993, BPB Industries e British Gypsum/Comissão, T-65/89, Colet., p. II-389, n.o 154, e Michelin/Comissão, referido no n.o 26, supra, n.o 290). Nada impede, por isso, que a recorrente seja considerada a única responsável pelo comportamento da BNGW.

76

Por último, importa salientar que a recorrente não contestou a existência da infração cometida pela BNGW no que respeita ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 1 de outubro de 2000 e que, em conformidade com o n.o 57, supra, não conseguiu ilidir a presunção de que, por deter 100% do capital da BNGW, exerceu efetivamente uma influência determinante sobre esta.

77

Resulta das considerações que antecedem que a argumentação da recorrente relativa às consequências a retirar da anulação parcial da decisão impugnada no processo T-362/06 deve ser considerada improcedente.

78

Em consequência, há que julgar improcedente o segundo fundamento e, por isso, negar provimento ao recurso na sua totalidade.

Quanto às despesas

79

Nos termos do artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas em conformidade com os pedidos da Comissão.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Ballast Nedam NV é condenada nas despesas.

 

Jaeger

Wahl

Soldevila Fragoso

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de setembro de 2012.

Assinaturas

Índice

 

Factos na origem do litígio

 

Tramitação processual e pedidos das partes

 

Questão de direito

 

Quanto ao primeiro fundamento, relativo aos erros de direito e aos erros manifestos de apreciação na imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW

 

Quanto ao erro de direito relativo à tomada em consideração apenas do vínculo de capital na presunção do exercício de uma influência determinante pela sociedade-mãe na política comercial das suas filiais

 

— Argumentos das partes

 

— Apreciaηγo do Tribunal

 

Quanto aos erros manifestos de apreciação relativos à imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BN Infra e pela BNGW

 

— Argumentos das partes

 

— Apreciaηγo do Tribunal

 

Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

 

Argumentos das partes

 

Apreciação do Tribunal

 

— Quanto ΰ violaηγo dos direitos de defesa

 

— Quanto aos efeitos do acσrdγo de anulaηγo no processo T-362/06

 

Quanto às despesas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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