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Document 62004TJ0305

Acórdão do Tribunal Geral (Terceira Secção) de 27 de outubro de 2005.
Eden SARL contra Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia.
Processo T-305/04.

European Court Reports 2005 II-04705

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2005:380

Processo T‑305/04

Eden SARL

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

«Marca comunitária – Marca olfactiva ‘Odeur de fraise mûre’ – Motivo absoluto de recusa – Sinal não susceptível de representação gráfica – Artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) de 27 de Outubro de 2005 

Sumário do acórdão

1.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Sinais susceptíveis de constituir uma marca – Sinais que não podem ser perceptíveis visualmente – Inclusão – Condição – Sinais que podem ser objecto de uma representação gráfica – Sinais olfactivos

(Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 4.°)

2.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Sinais não susceptíveis de constituir uma marca – Sinal olfactivo – Odor de morango maduro

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigos 4.° e 7.°, n.° 1, alínea a)]

1.     O artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária deve ser interpretado no sentido de que um sinal que não é, em si mesmo, susceptível de ser visualmente perceptível pode constituir uma marca, desde que possa ser objecto de representação gráfica, nomeadamente através de figuras, de linhas ou de caracteres, que seja clara, precisa, completa por si própria, facilmente acessível, inteligível, duradoura e objectiva. A representação gráfica de um sinal deve permitir que este possa ser identificado com exactidão a fim de garantir o bom funcionamento do sistema do registo das marcas. Consequentemente, as condições para se admitir a validade de uma representação gráfica não podem ser modificadas nem afrouxadas a fim de facilitar o registo dos sinais cuja natureza torna a representação gráfica mais difícil.

No que respeita aos sinais olfactivos, não se pode excluir a possibilidade um sinal ser eventualmente objecto de uma descrição que preencha todas as condições do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94.

(cf. n.os 24-25, 28, 39)

2.     Não é susceptível de constituir uma marca comunitária na acepção dos artigos 4.° e 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 40/94, por não ter sido objecto de uma representação gráfica, um sinal olfactivo, não perceptível visualmente, descrito pelas palavras «odor de morango maduro» e acompanhado da imagem a cores de um morango maduro.

Com efeito, uma vez que pode referir‑se a diversas variedades de morangos e, como tal, a odores distintos, a descrição «odor de morango maduro» não é unívoca nem precisa e não permite afastar os elementos de subjectividade no processo de identificação e de percepção do sinal reivindicado.

Por outro lado, a imagem um morango, uma vez que representa apenas o fruto que exala um odor supostamente idêntico ao sinal olfactivo em causa, e não o odor reivindicado, não constitui uma representação gráfica do sinal olfactivo. Além disso, os morangos, ou pelo menos alguns deles, possuem um odor diferente consoante a sua variedade, a imagem de um morango cuja variedade não está especificada não permite identificar com clareza e precisão o sinal olfactivo reivindicado.

Por último, a combinação de meios de representação que não sejam, por si próprios, susceptíveis de satisfazer os requisitos da representação gráfica não pode satisfazer os referidos requisitos e é necessário que pelo menos um dos elementos da representação preencha todas as condições. Consequentemente, a descrição nominativa e a imagem do morango maduro não preenchem as condições exigidas para a representação gráfica, a sua combinação não constitui uma representação gráfica idónea.

(cf. n.os 33, 40-41, 45)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

27 de Outubro de 2005 (*)

«Marca comunitária – Marca olfactiva ‘Odeur de fraise mûre’ – Motivo absoluto de recusa – Sinal não susceptível de representação gráfica – Artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T‑305/04,

Eden SARL, com sede em Paris (França), representada por Antoine‑Lalance, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objecto um recurso da decisão da Primeira Câmara de recurso do IHMI de 24 de Maio de 2004 (processo R 591/2003‑1), respeitante ao registo do sinal olfactivo Odeur de fraise mûre como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, V. Tiili e O. Czúcz, juízes,

secretário: B. Pastor, secretária adjunta,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 26 de Julho de 2004,

vista a contestação entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 25 de Outubro de 2004,

após a audiência de 21 de Abril de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1       Em 26 de Março de 1999, os Laboratoires France Parfum SA (a seguir «LFP») apresentaram um pedido de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO L 11, p. 1), na sua versão modificada.

2       A marca cujo registo foi pedido é o sinal olfactivo, não perceptível visualmente, descrito pelas palavras «odor de morango maduro» e acompanhado da seguinte imagem a cores:

Image not found Image not found

3       Os produtos para os quais o registo foi pedido pertencem às classes 3, 16, 18 e 25 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e modificado, e correspondem à seguinte descrição:

–       classe 3: «Preparações para branquear e outras substâncias para a lavagem; preparações para limpar, polir, desengordurar e raspar; sabões, sabões desodorizantes, produtos de perfumaria, águas de toilette, águas aromáticas, óleos essenciais, óleos de toilette, óleos de amêndoas e leites de amêndoas para uso cosmético, leites de toilette, tinturas para a toilette, produtos de toilette contra a transpiração, cosméticos, batons, algodão para uso cosmético, pó‑de‑arroz para a maquilhagem, produtos cosméticos para os cuidados da pele, preparações cosméticas para o banho, bastonetes algodoados para uso cosmético, cremes cosméticos, lápis para uso cosmético, produtos para desmaquilhar, pinturas para o rosto, guias em papel para pintar os olhos, vernizes para as unhas para uso cosmético, pomadas para uso cosmético, preparações cosméticas para o bronzeamento da pele, champôs, loções para os cabelos, tinturas cosméticas, produtos para barbear, loção para depois de barbear, dentífricos, produtos para os cuidados da boca não para uso medicinal, talco para a toilette, depilatórios, loções para os cabelos, banhos de cremes para os cabelos, banhos de óleos para os cabelos, produtos de perfumaria, pedras de amaciar, pedras para polir, pedra‑pomes»;

–       classe 16: «Artigos de papelaria, canetas, lápis, lapiseiras, borrachas, folhas (papelaria), cadernos, mata‑borrões, bloco (papelaria); produtos de impressão, livros, revistas, jornais, periódicos, manuais de instrução ou de ensino (excepto aparelhos), cartas de jogar»;

–       classe 18: «Artigos de marroquinaria em couro ou em imitação do couro (excepto os estojos adaptados aos produtos que se destinam a conter, luvas e cintos), carteiras, porta‑chaves, porta‑moedas, malas de senhora, sacos de viagem, pastas escolares, artigos de correaria, malas (baús) e maletas de viagem, alcofas adaptáveis a veículos de duas rodas, coberturas em peles; chapéus‑de‑chuva, bengalas; vestuário, em especial calças, camisas e camisetas, saias e vestidos, roupa interior, blusões e sobretudos; calçado, produtos de chapelaria, e todo o vestuário para uso desportivo, vestuário em couro»;

–       classe 25: «Vestuário, roupa interior, cuecas, calções, slips, T‑shirts, combinações (vestuário e roupa interior), lingerie, fatos, gravatas, camisas, camisetas, charpas (faixas), saias, saiotes, soutiens, casacos compridos, calças, roupões, coletes, fatos de banho, roupa de praia, vestidos, roupões, peúgas, presilhas para polainas; calçado, botas, sandálias, calçado de desporto; chapelaria, bonés, boinas».

4       Por decisão de 7 de Agosto de 2003, o examinador rejeitou o pedido, nos termos do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, com fundamento em que o sinal olfactivo cujo registo era pedido, por um lado, não podia ser representado graficamente, deparando, nesta medida, com a oposição do artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do referido regulamento, e, por outro, carecia de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento, relativamente a certos produtos revindicados.

5       Em 6 de Outubro de 2003, os LFP interpuseram recurso da decisão do examinador para o IHMI, ao abrigo dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94.

6       Por decisão de 24 de Maio de 2004 (a seguir «decisão recorrida»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso com fundamento em que o sinal cujo registo era pedido não podia ser objecto de representação gráfica na acepção do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, o que constituía motivo de recusa nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 40/94.

7       Por acto de 21 de Dezembro de 2000, os LFP foram cedidos à recorrente. Em 9 de Julho de 2004, esta cessão foi comunicada ao IHMI, que, em 20 de Julho de 2004, notificou o registo da transferência do pedido de marca comunitária em causa a favor da recorrente.

 Pedidos das partes

8       A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       anular a decisão recorrida;

–       condenar o IHMI nas despesas.

9       O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

10     A recorrente invoca um único fundamento de recurso, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 40/94.

 Argumentos das partes

11     A recorrente recorda que, no seu acórdão de 12 de Dezembro de 2002, Sieckmann (C‑273/00, Colect., p. I‑11737), o Tribunal de Justiça declarou que um sinal que não é, em si mesmo, susceptível de ser visualmente perceptível, como os sons ou os odores, pode constituir uma marca, desde que possa ser objecto de representação gráfica. A recorrente sublinha que, neste acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que a representação gráfica de um odor pode ser feita através de figuras, linhas ou caracteres e deve ser «clara, precisa, completa por si própria, facilmente acessível, inteligível, duradoura e objectiva» (n.° 55 do acórdão). Recorda que, no tocante, mais particularmente, aos sinais olfactivos, o Tribunal de Justiça declarou que «os requisitos da representação gráfica não são cumpridos através de uma fórmula química, de uma descrição por palavras escritas, da apresentação de uma amostra de um odor ou da conjugação destes elementos» (n.° 73 do acórdão).

12     A recorrente acusa a Câmara de Recurso de ter transposto esta jurisprudência para o caso vertente sem ter em conta as características do pedido de registo em causa.

13     Em primeiro lugar, alega que, diversamente do pedido em causa no acórdão Sieckmann, já referido, o presente pedido de registo não contém nem uma amostra nem uma fórmula química. Entende que a Câmara de Recurso deveria ter examinado se a representação gráfica contida no pedido de registo, constituída por uma descrição verbal e por uma representação a cores de um morango maduro, preenchia a condição prevista no artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94.

14     Em segundo lugar, a recorrente considera que a Câmara de Recurso procedeu a uma análise errada dos elementos gráficos que compõem o pedido de registo.

15     Antes de mais, no que diz respeito à representação verbal, a recorrente alega, em resposta ao argumento de que a descrição da marca fornecida no pedido de registo pode ser interpretada de forma subjectiva, que esta crítica é irrelevante uma vez que a percepção de qualquer sinal pode variar de um indivíduo para outro. Considera que um sinal deve apenas ser apto para distinguir os produtos que designa e que, para uma marca desempenhar a sua função, basta que seja percebida como tal por um ser humano. Perante um sinal, o consumidor associa intelectualmente a forma por ele percebida e o sinal em causa, em função da sua cultura e das suas experiências sensoriais.

16     Evocando o acórdão Sieckmann, já referido, a recorrente sustenta que basta que o meio de representação gráfico seja «inequívoco», sem necessidade de se averiguar se essa representação será percebida de forma mais ou menos subjectiva pelo consumidor. Neste sentido, considera que não existe para os outros tipos de sinal qualquer critério assente na objectividade e que, portanto, também não deveria ser exigido relativamente aos sinais olfactivos.

17     No tocante à afirmação da Câmara de Recurso segundo a qual existe um desfasamento entre a descrição e o odor, dado o grande número de variedades de morango que podem ser distinguidas pelo seu odor, a recorrente indica que é falsa. Alega que as provas apresentadas demonstram que o odor dos morangos se mantém de uma variedade para outra, variando apenas o gosto. Daí conclui que o odor de morango maduro é estável e duradouro.

18     A recorrente acrescenta que o odor apresentado é igualmente preciso pois não se trata de um odor qualquer mas sim o de um morango maduro. Além disso, trata‑se de um odor bem conhecido dos consumidores, que o memorizaram desde a infância.

19     Seguidamente, no tocante à representação figurativa, a recorrente alega que a Câmara de Recurso não explica, na decisão recorrida, o motivo pelo qual a conjugação de uma descrição verbal e de uma imagem não é suficientemente clara e precisa. Afirma que a imagem de um morango maduro não pode ser percebida isoladamente nem pelo público nem pelas autoridades competentes, estando associada às outras menções que constam do pedido de registo, a saber, a descrição «odor de morango maduro» e «marca olfactiva». Tal como foi objecto do pedido de registo, a marca forma um todo que as autoridades e o público entendem como tal.

20     Por fim, no tocante à conjugação dos dois elementos gráficos, descrição e imagem, a recorrente contesta a afirmação da Câmara de Recurso segundo a qual, «se a descrição, por palavras, do odor de um morango ou a simples reprodução da imagem de um morango não são susceptíveis de satisfazer, por si sós, as exigências de uma representação gráfica, a sua conjugação também não é susceptível de satisfazer essas exigências, nomeadamente de clareza e precisão». A recorrente entende que a Câmara de Recurso se limitou a retomar a formulação do acórdão Sieckmann, já referido, quando os elementos utilizados para representar a marca ora em causa diferem dos da marca em causa nesse acórdão. Acusa a Câmara de Recurso de, na decisão recorrida, ter examinado separadamente a descrição verbal e a imagem em vez de examinar o conjunto da representação da marca.

21     Por conseguinte, a recorrente considera que a representação gráfica da marca satisfaz as exigências impostas pela jurisprudência. Sustenta que a descrição verbal é clara, precisa, facilmente acessível, inteligível, duradoira e objectiva e que a imagem permite que o sinal seja, por si só, completo. Uma vez que a conjugação destes dois elementos satisfaz a exigência de representação gráfica prevista no artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, o pedido de registo deveria ser deferido.

22     O IHMI sustenta as apreciações da Câmara de Recurso.

 Apreciação do Tribunal

23     Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo de sinais que não estejam em conformidade com o artigo 4.° do referido regulamento. O artigo 4.° prevê que «[p]odem constituir marcas comunitárias todos os sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, algarismos, e a forma do produto ou do seu acondicionamento, desde que esses sinais sejam adequados para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outra empresa».

24     No que respeita, em particular, ao registo das marcas olfactivas, o Tribunal de Justiça declarou, a propósito do artigo 2.° da Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), que «um sinal que não é, em si mesmo, susceptível de ser visualmente perceptível pode constituir uma marca, desde que possa ser objecto de representação gráfica, nomeadamente através de figuras, de linhas ou de caracteres, que seja clara, precisa, completa por si própria, facilmente acessível, inteligível, duradoura e objectiva» (acórdão Sieckmann, já referido).

25     A título preliminar, importa referir que, apesar de, como foi afirmado na audiência, a memória olfactiva ser provavelmente a memória mais fiável de que dispõe o ser humano e de, consequentemente, os operadores económicos terem interesse óbvio em recorrer a sinais olfactivos para identificar os seus produtos, a representação gráfica de um sinal deve permitir que este possa ser identificado com exactidão a fim de garantir o bom funcionamento do sistema do registo das marcas (acórdãos do Tribunal de Justiça, Sieckmann, já referido, n.os 46 e 47; de 6 de Maio de 2003, Libertel, C‑104/01, Colect., p. I‑3793, n.° 28; e de 24 de Junho de 2004, Heidelberger Bauchemie, C‑49/02, Colect., p. I‑6129, n.os 25 e 26). Consequentemente, as condições para se admitir a validade de uma representação gráfica não podem ser modificadas nem afrouxadas a fim de facilitar o registo dos sinais cuja natureza torna a representação gráfica mais difícil.

26      No caso vertente, a marca olfactiva cujo registo foi pedido veio acompanhada da conjugação de um elemento figurativo, a imagem reproduzida no n.° 2 supra, e de uma descrição verbal, «odor de morango maduro». A Câmara de Recurso entendeu que esta representação não constituía uma representação gráfica idónea na acepção do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, tal como esta disposição foi interpretada pela jurisprudência, e recusou o registo com fundamento no motivo previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 40/94.

27     Em primeiro lugar, quanto ao elemento verbal, a Câmara de Recurso considerou, por um lado, que a descrição em causa continha factores subjectivos, podendo, por conseguinte, prestar‑se a interpretações subjectivas e, por outro, que era difícil descrever o sinal em causa de forma suficientemente clara, precisa e inequívoca uma vez que, sendo o odor dos morangos diferente em função das suas variedades, existe necessariamente um desfasamento entre a própria descrição e o odor real. Daí a Câmara de Recurso deduziu que uma descrição não pode representar graficamente o odor do qual pretende constituir a expressão escrita.

28     A este respeito, o Tribunal entende que, embora, como resulta do acórdão Sieckmann, já referido, uma descrição não possa representar graficamente sinais olfactivos susceptíveis de ser objecto de uma diversidade de descrições, não se pode, porém excluir a possibilidade de um sinal olfactivo ser eventualmente objecto de uma descrição que preencha todas as condições do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, tal como este é interpretado pela jurisprudência.

29     No caso vertente, a recorrente alega que o odor de morango maduro não varia de uma espécie para outra e que, consequentemente, a descrição «odor de morango maduro» é inequívoca, precisa e objectiva. Baseia esta conclusão em dois estudos anexos à petição inicial.

30     Desde logo, no tocante ao estudo realizado pelo Institut pour la protection des fragrances, deve referir‑se que, uma vez que não foi apresentado à Câmara de Recurso, não pode ser tido em consideração. Efectivamente, dado que o recurso para o Tribunal se destina à fiscalização da legalidade das decisões das câmaras de recurso do IHMI, nos termos do artigo 63.° do Regulamento n.° 40/94, a função do Tribunal não é reexaminar as circunstância de facto à luz das provas apresentadas pela primeira vez perante ele [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Julho de 2003, Alejandro/IHMI – Anheuser‑Busch (BUDMEN), T‑129/01, Colect., p. II‑2251, n.° 67, e de 1 de Fevereiro de 2005, SPAG/IHMI – Danne Backer (HOOLIGAN), T‑57/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 20].

31     Seguidamente, no tocante ao estudo elaborado pela Cooperação europeia no domínio da investigação científica e técnica (COST), importa referir que o mesmo não confirma a tese da recorrente segundo o qual todas variedades de morango possuem o mesmo odor. Assim, os quadros 4, 5 e 6 do referido estudo indicam que degustadores de um painel sensorial puderam distinguir, pelo seu odor, as variedades de morango de cinco das nove culturas examinadas pelo estudo (em particular as de 9 de Julho de 1997, 3 e 10 de Junho de 1998, 15 de Julho de 1998 e 2 de Junho de 1999) e isso com uma margem de erro igual ou inferior a 5%, o que significa, segundo as explicações que acompanham esses quadros, que as diferentes variedades de morango apresentam diferenças de odor significativas. Esta interpretação foi confirmada pelo facto de a margem de erro para o descritor «odor de morango» ser, no caso de certas culturas, idêntica à que foi constatada relativamente a outros descritores, tais como «sabor a morango (odor)» ou «sabor açucarado», considerados pelo estudo como muito eficazes para diferenciar as variedades de morango.

32     É verdade que dos referidos quadros resulta que o odor de morango não permitiu distinguir de forma significativa as variedades de morango em todas as culturas. Ora, deve observar‑se que, para verificar o mérito do argumento da recorrente de que o odor de morango maduro é único e inequívoco relativamente a todas as variedades, não é necessários que estas apresentem sistematicamente diferenças de odor importantes. Com efeito, a simples conclusão de que as variedades de morango puderam ser distinguidas pelo seu odor em cinco das nove culturas examinadas no estudo basta, por si só, para demonstrar que o odor de morango não é único.

33     Deve, portanto, concluir‑se que as provas apresentadas à Câmara de Recurso demonstram que o odor de morango muda de uma variedade para outra. Por consequência, uma vez que pode referir‑se a diversas variedades e, como tal, a odores distintos, a descrição «odor de morango maduro» não é unívoca nem precisa, tal como não permite afastar os elementos de subjectividade no processo de identificação e de percepção do sinal reivindicado.

34     Além disso, é dado assente que, actualmente, não existe uma classificação internacional de odores geralmente aceite que permita, à semelhança dos códigos internacionais de cor ou de escrita musical, a identificação objectiva e precisa de um sinal olfactivo através da atribuição de uma denominação ou de um código precisos e próprios a cada odor.

35     Resulta das considerações precedentes que a recorrente não demonstrou que a Câmara de Recurso tenha cometido um erro ao considerar que a descrição «odor de morango maduro» não era objectiva, clara e precisa.

36     Em segundo lugar, quanto ao elemento figurativo, a Câmara de Recurso afirmou que «uma representação desta natureza [era] ainda menos precisa que uma descrição verbal» visto que, por um lado, «não [era] possível às autoridades competentes e ao público […] determinar se o sinal, objecto da protecção, era a própria imagem do morango maduro ou o seu odor» e que, por outro, a imagem do morango «ser[ia] intelectualmente substituída pelo seu equivalente linguístico ‘morango vermelho’ [ou] ‘morango maduro’, o que equivale a definir de novo o odor através de palavras, tendo esta definição já sido considerada demasiado imprecisa».

37     A este respeito, importa começar por referir que, como afirma a recorrente, não há nenhuma razão para se entender que as autoridades e o público não poderão determinar se o sinal protegido é um sinal figurativo, que consiste num morango, ou um sinal olfactivo, que possui alegadamente o mesmo odor que um morango maduro. Efectivamente, uma vez que, no pedido de registo, está indicado tratar‑se de uma marca olfactiva, não podem existir dúvidas quanto à natureza do sinal registado, da mesma forma que as autoridades e o público têm condições para determinar se uma partitura musical representa um sinal figurativo, que consiste em linhas e sinais, ou a melodia da qual a partitura constitui a transcrição.

38     Seguidamente, o Tribunal conclui que o facto de a imagem do morango poder ser intelectualmente substituída pela expressão «morango vermelho» é irrelevante. Com efeito, todas as representações figurativas de uma marca, qualquer que seja o seu tipo, podem ser descritas verbalmente e serão intelectualmente substituídas por uma descrição sempre que esta seja mais fácil de memorizar do que a própria representação figurativa. Assim, nomeadamente, a partitura musical de um sinal sonoro que consista numa melodia bastante conhecida será muito provavelmente substituída intelectualmente pelo nome dessa melodia.

39     Ora, no n.° 69 do seu acórdão Sieckmann, já referido, o Tribunal de Justiça declarou que, para ser admitida, a representação gráfica de uma marca olfactiva deve representar o odor cujo registo é pedido e não o produto que o exala. Deste modo, considerou que a fórmula química da substância que exala o odor em causa não podia ser considerada uma representação gráfica idónea.

40     Consequentemente, o Tribunal não pode deixar de concluir que, visto não representar mais do que o fruto que exala um odor supostamente idêntico ao sinal olfactivo em causa, e não o odor reivindicado, a imagem de um morango contida no pedido de registo não constitui uma representação gráfica do sinal olfactivo.

41     Além disso, esta imagem depara com as mesmas críticas que a descrição «odor de morango maduro». Efectivamente, uma vez que se concluiu que os morangos, ou pelo menos alguns deles, possuem um odor diferente consoante a sua variedade, a imagem de um morango cuja variedade não está especificada não permite identificar com clareza e precisão o sinal olfactivo reivindicado.

42     Por consequência, as conclusões da Câmara de Recurso a propósito da imagem do morango vermelho devem igualmente ser acolhidas.

43     Em terceiro lugar, quanto à conjugação da descrição verbal e da imagem, a Câmara de Recurso entendeu que, uma vez que os dois elementos não constituem representações gráficas idóneas, a sua conjugação também não pode ser considerada uma representação admissível.

44     A recorrente acusa a Câmara de Recurso de ter examinado separadamente os dois elementos da representação em vez de os examinar como uma representação única e alega que a imagem completa a descrição, no sentido de que reflecte o estado de maturidade em que os morangos exalam o odor em causa, fazendo então com que a representação se torne, por si só, completa.

45     A este respeito, o Tribunal começa por observar que resulta da jurisprudência que a combinação de meios de representação que não sejam, por si próprios, susceptíveis de satisfazer os requisitos da representação gráfica não pode satisfazer os referidos requisitos e que é necessário que pelo menos um dos elementos da representação preencha todas as condições (acórdãos Sieckmann, já referido, n.° 72, e Libertel, já referido, n.° 36). Consequentemente, uma vez que se considerou que a descrição nominativa em causa e a imagem do morango maduro, reproduzida no n.° 2 supra, não preenchem as condições exigidas para a representação gráfica, deve concluir‑se que a sua combinação não constitui uma representação gráfica idónea.

46     Acresce que, contrariamente ao que sustenta a recorrente, a imagem não acrescenta qualquer informação suplementar relativamente à descrição verbal. Com efeito, a informação alegadamente acrescentada, isto é, o estado de maturidade em que um morango exala o odor em causa, já consta da descrição fornecida, uma vez que esta precisa tratar‑se do odor de um morango «maduro». Assim, dado que os dois elementos da representação veiculam a mesma informação, a sua conjugação não pode valer mais que a soma das duas componentes nem permitir ultrapassar as críticas suscitadas contra cada uma delas, considerada individualmente.

47     Resulta do que precede que a Câmara de Recurso pôde correctamente considerar que o sinal olfactivo em causa não havia sido objecto de uma representação gráfica na acepção do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, tal como esta disposição foi interpretada pela jurisprudência.

48     Consequentemente, uma vez que o único fundamento invocado não é procedente, deve ser negado provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

49     Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido do recorrido.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente é condenada nas despesas.

Jaeger

Tiili

Czúcz

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Outubro de 2005.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Jaeger


* Língua do processo: francês.

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