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Document 61995CJ0072
Judgment of the Court of 24 October 1996. # Aannemersbedrijf P.K. Kraaijeveld BV e.a. v Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland. # Reference for a preliminary ruling: Raad van State - Netherlands. # Environment - Directive 85/337/EEC - Assessment of the effects of certain public and private projects. # Case C-72/95.
Acórdão do Tribunal de 24 de Outubro de 1996.
Aannemersbedrijf P.K. Kraaijeveld BV e.a. contra Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland.
Pedido de decisão prejudicial: Raad van State - Países Baixos.
Ambiente - Directiva 85/337/CEE - Avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados.
Processo C-72/95.
Acórdão do Tribunal de 24 de Outubro de 1996.
Aannemersbedrijf P.K. Kraaijeveld BV e.a. contra Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland.
Pedido de decisão prejudicial: Raad van State - Países Baixos.
Ambiente - Directiva 85/337/CEE - Avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados.
Processo C-72/95.
Colectânea de Jurisprudência 1996 I-05403
ECLI identifier: ECLI:EU:C:1996:404
Acórdão do Tribunal de 24 de Outubro de 1996. - Aannemersbedrijf P.K. Kraaijeveld BV e.a. contra Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland. - Pedido de decisão prejudicial: Raad van State - Países Baixos. - Ambiente - Directiva 85/337/CEE - Avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados. - Processo C-72/95.
Colectânea da Jurisprudência 1996 página I-05403
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
++++
1. Direito comunitário ° Interpretação ° Textos plurilingues ° Interpretação uniforme ° Divergências entre as diferentes versões linguísticas ° Economia geral e finalidade da regulamentação em causa como base de referência
2. Ambiente ° Avaliação dos efeitos de determinados projectos no ambiente ° Directiva 85/337 ° "Obras de canalização e de regularização dos cursos de água", na acepção do Anexo II, ponto 10, alínea e) ° Conceito ° Obras nos diques ao longo das vias navegáveis ° Inclusão ° Conceito que engloba também as alterações de diques existentes
[Directiva 85/337 do Conselho, Anexo II, ponto 10, alínea e)]
3. Ambiente ° Avaliação dos efeitos de determinados projectos no ambiente ° Directiva 85/337 ° Submissão à avaliação dos projectos pertencentes às categorias enumeradas no Anexo II ° Poder de apreciação dos Estados-Membros ° Alcance e limites ° Obrigação dos órgãos jurisdicionais nacionais ° Verificação ex officio do cumprimento dos limites do poder de apreciação ° Necessidade de assegurar a eficácia da directiva em caso de não cumprimento desses limites
[Directiva 85/337 do Conselho, artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, e Anexo II, ponto 10, alínea e)]
1. A interpretação de uma disposição de direito comunitário implica uma comparação das suas versões linguísticas. A necessidade de uma interpretação uniforme dessas versões exige, em caso de divergência entre elas, que a disposição em causa seja interpretada em função da economia geral e da finalidade da regulamentação de que constitui um elemento.
2. A expressão "obras de canalização e de regularização de cursos de água", que figura no Anexo II, ponto 10, alínea e), da Directiva 85/337 relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, deve ser interpretada no sentido de que engloba igualmente obras de retenção das águas e de prevenção das inundações e, portanto, obras relativas a diques ao longo das vias navegáveis. Com efeito, uma vez que podem afectar de modo duradouro a composição dos solos, a fauna e a flora ou ainda a paisagem, essas obras são susceptíveis de ter um impacte significativo no ambiente, na acepção da directiva.
Por outro lado, a mesma expressão deve ser interpretada no sentido de que engloba não apenas a construção de um novo dique mas igualmente a modificação de um dique existente através da sua deslocação, reforço ou alargamento, a substituição de um dique pela construção de um novo dique no mesmo local, independentemente de ser mais sólido ou mais largo que o anterior, ou ainda uma conjugação de várias destas situações.
3. O artigo 4. , n. 2, da Directiva 85/337 relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente prevê que os projectos pertencentes às categorias enumeradas no Anexo II da directiva são submetidos a uma avaliação sempre que os Estados-Membros considerarem que as suas características o exigem, e que os Estados-Membros podem, com esse objectivo, especificar os tipos de projectos a submeter a uma avaliação ou fixar critérios e/ou limiares que permitam determinar quais os projectos que devem ser submetidos a uma avaliação. Esta disposição e o Anexo II, ponto 10, alínea e), que visa as obras de canalização e de regularização de cursos de água, devem ser interpretados no sentido de que, quando um Estado-Membro, tratando-se dos projectos relativos aos diques que devem ser objecto de uma avaliação, fixa os referidos critérios e/ou limiares de modo que, na prática, a totalidade dos projectos fica de antemão subtraída à obrigação de estudo do impacte ambiental, excede a margem de apreciação de que dispõe nos termos dos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva, salvo se a totalidade dos projectos excluídos podia ser considerada, com base numa apreciação global, não susceptível de ter efeitos significativos no ambiente.
Por outro lado, e quando, por força do direito nacional, o órgão jurisdicional, a quem foi submetido um recurso de anulação de uma decisão de aprovação de um projecto, tem a obrigação ou a faculdade de suscitar ex officio os fundamentos de direito decorrentes de uma norma interna de natureza coerciva, que não foram invocados pelas partes, compete-lhe verificar ex officio, no âmbito da sua competência, se as autoridades legislativas ou administrativas do Estado-Membro permaneceram dentro dos limites da margem de apreciação fixada nos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva e ter tal facto em conta no âmbito da apreciação do recurso de anulação. No caso de essa margem de apreciação ter sido ultrapassada e de, portanto, deverem ser afastadas as disposições nacionais a esse respeito, compete às autoridades do Estado-Membro, no âmbito das suas competências, adoptar todas as medidas necessárias, gerais ou especiais, para que os projectos sejam examinados a fim de determinar se os mesmos são susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente e, na afirmativa, para que sejam submetidos a um estudo do impacte ambiental.
No processo C-72/95,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, pelo Nederlandse Raad van State (Países Baixos), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre
Aannemersbedrijf P. K. Kraaijeveld BV e o.
e
Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland,
uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação da Directiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente (JO L 175, p. 40; EE 15 F6 p. 9), e sobre a obrigação de um órgão jurisdicional nacional assegurar o cumprimento de uma directiva que tem efeito directo, mas que um particular não invocou,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, G. F. Mancini, J. L. Murray, L. Sevón (relator), presidentes de secção, C. N. Kakouris, P. J. G. Kapteyn, C. Gulmann, D. A. O. Edward, J.-P. Puissochet, G. Hirsch e M. Wathelet, juízes,
advogado-geral: M. B. Elmer,
secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,
vistas as observações escritas apresentadas:
° em representação da Aannemersbedrijf P. K. Kraaijeveld BV e o., por J. A. Kraaijeveld, J. Kraaijeveld Sr., J. Kraaijeveld Jr., W. Kraaijeveld e P. K. Kraaijeveld,
° em representação do Governo neerlandês, por A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,
° em representação do Governo italiano, por U. Leanza, chefe do serviço do contencioso diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por P. G. Ferri, avvocato dello Stato,
° em representação do Governo do Reino Unido, por J. E. Collins, Assistant Treasury Solicitor, na qualidade de agente, assistido por D. Wyatt, QC,
° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por M. van der Woude, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações da Aannemersbedrijf P. K. Kraaijeveld BV e o., representada por J. Kraaijeveld Jr. e W. Kraaijeveld, do Governo neerlandês, representado por J. S. van den Oosterkamp, consultor jurídico adjunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por J. Poot, perito, do Governo italiano, representado por P. G. Ferri, do Governo do Reino Unido, representado por J. E. Collins, assistido por D. Wyatt, e da Comissão, representada por W. Wils, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, na audiência de 14 de Fevereiro de 1996,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 26 de Março de 1996,
profere o presente
Acórdão
1 Por acórdão de 8 de Março de 1995, que deu entrada no Tribunal de Justiça no dia 14 do mesmo mês, o Nederlandse Raad van State colocou, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, quatro questões prejudiciais sobre a interpretação da Directiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente (JO L 175, p. 40; EE 15 F6 p. 9, a seguir "directiva"), e sobre a obrigação de um órgão jurisdicional nacional assegurar o cumprimento de uma directiva que tem efeito directo, mas que um particular não invocou.
2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um recurso de anulação interposto pela Aannemersbedrijf P. K. Kraaijeveld BV e o. (a seguir "Kraaijeveld") contra a decisão de 18 de Maio de 1993, pela qual os Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland aprovaram o plano de ocupação dos solos, intitulado "Revisão parcial dos planos de ocupação dos solos no âmbito do reforço dos diques", adoptado pelo conselho comunal de Sliedrecht nos termos da Wet op de Ruimtelijke Ordening.
A directiva
3 A directiva prevê que, antes da realização de certas obras ou de outras intervenções no meio natural, se deve proceder a uma avaliação dos seus efeitos no ambiente.
4 Nos termos dos sexto, oitavo, nono e décimo primeiro considerandos:
"Considerando que a aprovação dos projectos públicos e privados que possam ter um impacto significativo no ambiente só deveria ser concedida após uma avaliação prévia dos efeitos significativos que estes projectos possam ter no ambiente; que esta avaliação se deve efectuar com base na informação adequada fornecida pelo dono da obra e eventualmente completada pelas autoridades e pelo público a quem o projecto diga respeito;
Considerando que os projectos que pertencem a determinadas categorias têm um impacto significativo no ambiente e que esses projectos devem em princípio ser sujeitos a uma avaliação sistemática;
Considerando que os projectos pertencentes a outras categorias não têm necessariamente um impacto significativo no ambiente em todos os casos e que devem ser sujeitos a uma avaliação quando os Estados-Membros considerarem que as suas características o exigem;
Considerando que os efeitos de um projecto no ambiente devem ser avaliados para proteger a saúde humana, para contribuir através de um ambiente melhor para a qualidade de vida, para garantir a manutenção da diversidade das espécies e para conservar a capacidade de reprodução do ecossistema enquanto recurso fundamental da vida."
5 Nos termos do artigo 1. , n. 1, da directiva:
"A presente directiva aplica-se à avaliação dos efeitos no ambiente de projectos públicos e privados susceptíveis de terem um impacto considerável no ambiente."
6 O artigo 1. , n. 2, especifica o que deve entender-se, na acepção da directiva, nomeadamente, por "projecto":
"° a realização de obras de construção ou de outras instalações ou obras,
° outras intervenções no meio natural ou na paisagem, incluindo as intervenções destinadas à exploração dos recursos do solo".
7 O artigo 2. , n. 1, precisa as categorias de projectos que devem ser objecto de um estudo:
"Os Estados-Membros tomarão as disposições necessárias para que, antes de concessão da aprovação, os projectos que possam ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização, sejam submetidos à avaliação dos seus efeitos.
Estes projectos são definidos no artigo 4. "
8 Nos termos do artigo 3. da directiva:
"A avaliação dos efeitos no ambiente identificará, descreverá e avaliará, de modo adequado, em função de cada caso particular e nos termos dos artigos 4. a 11. , os efeitos directos e indirectos de um projecto sobre os seguintes factores:
° o homem, a fauna e a flora,
° o solo, a água, o ar, o clima e a paisagem,
° a interacção entre os factores referidos nos primeiro e segundo travessões,
° os bens materiais e o património cultural."
9 O artigo 4. distingue duas categorias de projectos. O n. 1 desta disposição prevê que, em princípio, os projectos enumerados no Anexo I da directiva devem sempre ser submetidos a uma avaliação. No que diz respeito às outras categorias de projectos, o artigo 4. , n. 2, prevê:
"Os projectos pertencentes às categorias enumeradas no Anexo II são submetidos a uma avaliação nos termos dos artigos 5. a 10. , sempre que os Estados-Membros considerarem que as suas características assim o exigem.
Para este fim, os Estados-Membros podem nomeadamente especificar determinados tipos de projectos a submeter a uma avaliação ou fixar critérios e/ou limiares a reter para poderem, de entre os projectos pertencentes às categorias enumeradas no Anexo II, determinar quais os que devem ser submetidos a uma avaliação nos termos dos artigos 5. a 10. "
10 O Anexo II enumera um determinado número de projectos, entre os quais:
"10. Projectos de infra-estruturas:
...
e) Obras de canalização e de regularização dos cursos de água;
...
12. Alteração dos projectos que constam do Anexo I e dos projectos do Anexo II que se destinam exclusiva ou principalmente a desenvolver ou ensaiar novos métodos ou produtos e que não são utilizados durante mais de um ano."
11 A directiva não contém qualquer disposição específica relativa às alterações dos projectos que constam do Anexo II.
12 Por último, a directiva prevê a informação do público e a possibilidade de este exprimir a sua opinião. O artigo 6. , n. 3, da directiva dispõe que as modalidades dessa informação e dessa consulta são definidas pelos Estados-Membros, nomeadamente quanto ao público interessado e ao modo de o informar.
13 Nos termos do artigo 12. , n. 1, da directiva, "Os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias para darem cumprimento à presente directiva no prazo de três anos a contar da sua notificação."
A regulamentação neerlandesa aplicável aos factos do processo principal
14 Nos Países Baixos, a Deltawet, de 8 de Maio de 1958, houdende de afsluiting van de zeearmen tussen de Westerschelde en de Rotterdamse Waterweg en de versterking van de hoogwaterkering ter beveiliging van het land tegen stormvloeden (Stb. 246, a seguir "Deltawet"), prevê, nomeadamente, a construção de obras destinadas a reforçar a protecção contra as águas e as marés ao longo do Rotterdamse Waterweg e ao longo de todos os cursos de água que com ele comunicam [artigo 1. , initio, e II, d)]. Nos termos desta lei, foram efectuados estudos, nomeadamente no decurso dos anos de 1987 e 1988, pela Comissão de Coordenação de Reforço dos Diques, sob a direcção da província da Holanda do Sul. Foi proposto por esta comissão de coordenação um novo traçado dos diques no sector Sliedrecht-Oeste, Sliedrecht-Centro e Sliedrecht-Este, aprovado pelos Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland e adoptado, em 26 de Abril de 1990, pelo ministro dos Transportes e das Águas, em conformidade com o artigo 2. , n. 4, da Deltawet. Posteriormente, o conselho comunal de Sliedrecht aprovou, em 23 de Novembro de 1992, o plano de ocupação dos solos relativo a esse sector, nos termos da Wet op de Ruimtelijke Ordening.
15 A directiva foi transposta para os Países Baixos por uma alteração da Wet algemene bepalingen milieuhygiëne de 13 de Junho de 1979 (a seguir "lei de 1979"), cujo artigo 41. b, n. 1, dispunha, na altura dos factos: "Em diploma regulamentar, serão indicadas as actividades que podem ter consequências nocivas importantes para o ambiente. Além disso, serão estabelecidas uma ou mais decisões da administração em sede das actividades indicadas em cuja preparação deve ser feito um estudo do impacte ambiental." A própria lei de 1979 foi executada pelo Besluit milieu-effectrapportage de 20 de Maio de 1987. O artigo 2. deste diploma e a secção C, 12.1, do seu anexo, na versão em vigor na altura dos factos, definiam a "construção de um dique" como uma actividade na acepção do artigo 41. b da lei, quando se trate de um dique com um comprimento de 5 quilómetros ou mais e um perfil transversal de 250 m2 ou mais. Qualificam também de diploma, para a preparação do qual deve ser efectuada uma avaliação dos efeitos no ambiente, a adopção de um plano de princípio ou de um diploma adoptado nos termos do artigo 2. , n.os 3 e 4, da Deltawet.
16 A lei de 1979 foi alterada e tornou-se, em 1994, a Wet milieubeheer. Um novo diploma de execução foi adoptado em 4 de Julho de 1994, abandonando os critérios de dimensão da obra. Todavia, este diploma não é aplicável aos factos do processo principal.
A tramitação processual no órgão jurisdicional nacional e as questões prejudiciais
17 A Kraaijeveld contestou o plano de ocupação dos solos, aprovado em 23 de Novembro de 1992 pelo conselho comunal de Sliedrecht, no que respeita ao dique de Merwede, junto dos Gedeputeerde Staten van Zuid-Holland, que, no entanto, por decisão de 18 de Maio de 1993, o adoptou. Foi contra essa decisão que a Kraaijeveld interpôs, em 20 de Julho de 1993, um recurso de anulação no Nederlandse Raad van State.
18 Segundo o novo plano, o curso de água a que a Kraaijeveld tem acesso deixará de comunicar com as vias navegáveis, o que prejudica a empresa na medida em que, tendo esta por actividade económica os trabalhos relativos aos cursos de água ("natte waterbouw"), o desaparecimento de um acesso a uma via navegável ser-lhe-ia fatal.
19 O Nederlandse Raad van State salienta que não foi efectuada qualquer avaliação dos efeitos no ambiente, porque não se tratava de uma obra cujas dimensões atingissem os limiares fixados pela legislação nacional.
20 Por acórdão de 8 de Março de 1995, o Nederlandse Raad van State decidiu colocar ao Tribunal de Justiça as quatro questões prejudiciais seguintes:
"1) O conceito 'Obras de canalização e de regularização dos cursos de água' , constante do Anexo II da directiva, deve ser interpretado no sentido de que também abrange determinados tipos de obras relativas a um dique ao longo de cursos de água?
2) É relevante, para a resposta à questão 1, também vistos os conceitos de 'projectos' e 'alterações dos projectos' utilizados na directiva, que se trate:
a) da construção de um novo dique,
b) da deslocação de um dique existente,
c) do reforço e/ou alargamento de um dique existente,
d) da substituição, no mesmo local, de um dique por outro mais sólido ou não e ou mais largo ou não do que o dique substituído,
e) de uma conjugação de uma ou mais das situações previstas de a) a d)?
3) Os artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva devem ser interpretados no sentido de que ° se um Estado-membro, nas suas disposições nacionais de execução, consagrou, para um projecto determinado referido no Anexo II, especificações ou critérios e/ou limiares incorrectos, como previsto no referido artigo 4. , n. 2 ° existe uma obrigação nos termos do referido artigo 2. , n. 1, de submeter o referido projecto a um estudo de impacte ambiental, se o referido projecto puder ter, como referido nesse mesmo n. 1, um 'impacte significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização' ?
4) Se a resposta à questão 3 for afirmativa, esta obrigação tem efeito directo, ou seja, pode ser invocada por um particular perante o juiz nacional e deve, mesmo não sendo de facto invocada no litígio submetido ao juiz, ser no entanto aplicada por esse juiz?"
Quanto à primeira questão
21 Através desta questão, o Nederlandse Raad van State pergunta se o conceito de "obras de canalização e de regularização dos cursos de água", que figura no Anexo II, ponto 10, alínea e), da directiva, deve ser interpretado no sentido de que engloba também determinadas categorias de obras relativas a um dique ao longo de vias navegáveis.
22 Tendo em conta a expressão "canalization and flood-relief works", que figura na versão inglesa da directiva, o órgão jurisdicional de reenvio considera que o projecto visado sob essa rubrica do Anexo II diz respeito a actividades susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente. Considera, assim, que essa expressão pode englobar determinadas obras relativas a um dique.
23 Segundo a Kraaijeveld, os projectos de diques fluviais são obras que se destinam a modificar a frequência das imersões dos taludes naturais e das zonas adjacentes e que, por esse motivo, têm um impacte significativo no ambiente. Quanto à regularização da gestão das vias hidráulicas, os diques não seriam obras de valor inferior a outras obras relativas à canalização e à regularização desses cursos de água.
24 O Governo neerlandês alega que existe uma distinção entre as obras relativas a um dique e as de regularização dos cursos de água ou de canalização. Estas últimas são realizadas com um objectivo de gestão das vias hidráulicas ou em benefício da navegação fluvial. Alteram a natureza do próprio curso de água, quer dizer, a quantidade ou a qualidade da água, bem como as margens e os taludes naturais, de modo que têm um impacte considerável na fauna e na flora aquáticas. Em contrapartida, as obras de reforço dos diques consistem em construir ou em elevar taludes, utilizando areia ou argila. A Rivierenwet garante que as obras actuais não prejudiquem o nível de regularização já atingido por um dado rio. Essas obras não têm, assim, qualquer influência na flora e na fauna de um rio.
25 Quanto à referência feita à versão inglesa da directiva, o Governo neerlandês considera que a versão neerlandesa da directiva é, no que lhe diz respeito, a única versão linguística autêntica. Recorda a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual a eliminação das divergências linguísticas por via interpretativa pode, em determinadas circunstâncias, ir contra o princípio da segurança jurídica, na medida em que alguns dos textos em causa podem ser interpretados de um modo que difere do sentido próprio e usual dos termos (acórdão de 3 de Março de 1977, North Kerry Milk Products, 80/76, Recueil, p. 425, n. 11, Colect., p. 149). Assim, uma dada versão linguística não pode ser determinante para uma interpretação uniforme. As diferentes versões linguísticas fazem igualmente fé (acórdão de 6 de Outubro de 1982, Cilfit e o., 283/81, Recueil, p. 3415).
26 Por último, o Governo neerlandês recorda o objectivo da directiva, isto é, criar condições de concorrência iguais nos diferentes Estados-Membros. Assim, as obras referidas na directiva só podem abranger as obras que possam ser feitas em praticamente todos os Estados-Membros e não apenas as que são principalmente efectuadas num único Estado-Membro, como a construção de diques. O Governo neerlandês conclui, assim, que as obras de reforço dos diques ao longo dos cursos de água neerlandeses não são abrangidas pelo conceito de obras de canalização e de regularização dos cursos de água.
27 Segundo a Comissão, a canalização de um rio tem um impacte inevitável na velocidade do seu escoamento e no nível das águas. Pode ter por consequência a construção de diques na bacia do rio, a fim de impedir as inundações e garantir a segurança das populações. Um dique deste tipo deve, assim, ser qualificado de regularização de um curso de água. Por outro lado, há que ter em conta o objectivo da directiva relativo aos efeitos que determinados projectos podem produzir no ambiente, independentemente do objectivo social dos referidos projectos. A construção de diques fluviais tem efeitos no ambiente, quer seja feita para melhorar a navegabilidade de um curso de água quer para proteger as populações instaladas em zonas inundáveis. As obras relativas a um dique fluvial, que possam ter efeitos significativos no ambiente, são, assim, abrangidas pelo conceito de "obras de canalização e de regularização dos cursos de água".
28 Deve-se recordar que, como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a interpretação de uma disposição de direito comunitário implica uma comparação das suas versões linguísticas (v. acórdão Cilfit e o., já referido, n. 18). Por outro lado, a necessidade de uma interpretação uniforme dessas versões exige, em caso de divergência entre elas, que a disposição em causa seja interpretada em função da economia geral e da finalidade da regulamentação de que constitui um elemento (acórdão de 7 de Dezembro de 1995, Rockfon, C-449/93, Colect., p. I-4291, n. 28).
29 No caso em apreço, a análise das diferentes versões linguísticas do Anexo II, ponto 10, alínea e), da directiva demonstra que estas podem ser classificadas em duas categorias, consoante os termos utilizados evoquem ou não a ideia de inundação. Com efeito, as versões inglesa ("canalization and flood-relief works") e finlandesa ("kanavointi- ja tulvasuojeluhankkeet") fazem alusão às obras de canalização e de prevenção das inundações, ao passo que as versões alemã, grega, espanhola, francesa, italiana, neerlandesa e portuguesa fazem alusão às obras de canalização e de regularização dos cursos de água, contendo a versão grega, além disso, o termo francês "canalisation" entre parênteses, ao lado do termo grego "***********". Quanto às versões dinamarquesa e sueca, contêm apenas uma única expressão, dando a ideia de regularização dos cursos de água ("anlaeg til regulering af vanloeb", "Anlaeggningar foer reglering av vattenfloeden").
30 Perante esta divergência, há que examinar a economia geral e o objectivo da directiva. Nos termos do artigo 1. , n. 2, da directiva, entende-se por projecto "a realização de obras de construção ou de outras instalações ou obras", bem como "outras intervenções no meio natural ou na paisagem, incluindo as intervenções destinadas à exploração dos recursos do solo". Nos termos do seu artigo 2. , n. 1, a directiva abrange "os projectos que possam ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização". O artigo 3. dispõe que a avaliação dos efeitos no ambiente deve identificar, descrever e avaliar, nomeadamente, os efeitos directos e indirectos de um projecto no homem, na fauna, na flora, no solo, na água, no ar, no clima, na paisagem, nos bens materiais e no património cultural.
31 Pode deduzir-se do texto da directiva que o seu âmbito de aplicação é vasto e o seu objectivo muito lato. Esta única observação deveria ser, em si mesma, suficiente para interpretar o Anexo II, ponto 10, alínea e), da directiva, como englobando as obras de retenção das águas e de prevenção das inundações ° e, portanto, as obras nos diques °, mesmo se esta precisão não resulta de todas as versões linguísticas.
32 Embora, como observa o Governo neerlandês, as obras em diques consistam em construir ou em elevar taludes a fim de conter o curso da água e evitar uma inundação das terras, há que salientar que mesmo os trabalhos de retenção, não do curso de água corrente, mas de uma quantidade de água parada, podem ter um impacte significativo no ambiente na acepção da directiva, uma vez que podem afectar de modo duradouro a composição dos solos, a fauna e a flora ou ainda a paisagem. Assim, deve daqui deduzir-se que esse tipo de obras deve ser incluído no âmbito de aplicação da directiva.
33 Por conseguinte, a argumentação do Governo neerlandês, segundo a qual as obras nos diques não modificariam o curso de uma linha de água, não é procedente.
34 Por último, o argumento do Governo neerlandês, segundo o qual os diques não são abrangidos pelo âmbito de aplicação de uma directiva comunitária devido ao facto de se tratar de obras específicas aos Países Baixos, é irrelevante, uma vez que, como acaba de ser exposto, o critério de apreciação é o impacte significativo que um projecto pode ter no ambiente.
35 Tendo em conta estas considerações, há que responder à primeira questão que a expressão "obras de canalização e de regularização dos cursos de água", que figura no Anexo II, ponto 10, alínea e), da directiva, deve ser interpretada no sentido de que engloba igualmente certos tipos de obras relativas a um dique ao longo de vias navegáveis.
Quanto à segunda questão
36 Através desta questão, o Nederlandse Raad van State pergunta se, tendo em conta nomeadamente os conceitos de "projectos" e de "alteração de projectos" utilizados na directiva, a resposta à primeira questão será diferente, consoante se trate:
a) da construção de um novo dique;
b) da deslocação de um dique existente;
c) do reforço ou do alargamento de um dique existente;
d) da substituição, no mesmo local, de um dique por um outro que seja mais sólido ou mais largo que o anterior;
e) de uma conjugação de várias das situações previstas nas quatro alíneas anteriores.
37 Nos termos da directiva, as alterações dos projectos constantes do Anexo I estão sujeitas ao mesmo regime que os projectos do Anexo II e são, assim, abrangidas pelo artigo 4. , n. 2, da directiva. A este respeito, a ausência de qualquer menção relativa às alterações de projectos abrangidos pelo Anexo II é interpretada, nas observações, de modos divergentes quanto à sua inclusão no âmbito de aplicação da directiva. Com efeito, segundo os Governos italiano e do Reino Unido, as alterações dos projectos que figuram no Anexo II seriam igualmente abrangidas por esse anexo, ao passo que, segundo o Governo neerlandês e a Comissão, as mesmas não seriam abrangidas pelo âmbito de aplicação da directiva. Todavia, a Comissão precisa que tal depende do significado atribuído à expressão "alteração de projecto" e que, em determinados casos, as alterações podem ser de tal modo importantes que constituem um novo projecto.
38 Não dando a directiva qualquer definição específica do conceito de "alteração de projecto", há que interpretar o mesmo à luz da economia geral e da finalidade da directiva.
39 Já foi salientado, no n. 31 do presente acórdão, que o âmbito de aplicação da directiva é vasto e o seu objectivo muito lato. Tal objectivo ficaria prejudicado se a qualificação de "alteração de projecto" permitisse que determinadas obras ou construções escapassem à obrigação de realização de um estudo do impacte ambiental, quando, devido à sua natureza, dimensões ou localização, tais obras ou construções podem ter efeitos significativos no ambiente.
40 Além disso, há que considerar que o mero facto de a directiva não mencionar expressamente as alterações de projectos abrangidos pelo Anexo II, ao contrário das alterações de projectos que figuram no Anexo I, não permite deduzir que as mesmas não são abrangidas pelo âmbito de aplicação da directiva. Com efeito, a distinção entre um "projecto" e uma "alteração de projecto", quanto aos projectos abrangidos pelo Anexo I, diz respeito à diferença de regime a que os mesmos estão sujeitos no quadro da aplicação da directiva, ao passo que uma distinção semelhante quanto aos projectos abrangidos pelo Anexo II diz respeito ao âmbito de aplicação em geral da directiva.
41 Por outro lado, no acórdão de 11 de Agosto de 1995, Comissão/Alemanha (C-431/92, Colect., p. I-2189, n. 35), relativo à central térmica de Grosskrotzenburg, o Tribunal de Justiça declarou que ligações funcionais com uma construção existente de um projecto de uma nova fase de 500 MW de uma central térmica não retiram a esse projecto o seu carácter de "central térmica com uma potência calorífica de pelo menos 300 MW" para o integrar na categoria "alteração dos projectos que constam do Anexo I", referida no Anexo II, ponto 12. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que, para determinar se as obras em causa deviam ser objecto de um estudo do impacte ambiental, as mesmas deviam ser examinadas independentemente da questão de saber se eram realizadas autonomamente, se acrescentadas a uma construção preexistente ou mesmo se tinham com esta ligações funcionais estreitas.
42 Tendo em conta estas considerações, há que responder à segunda questão que a expressão "obras de canalização e de regularização dos cursos de água", que figura no Anexo II, ponto 10, alínea e), da directiva, deve ser interpretada no sentido de que engloba não apenas a construção de um novo dique mas igualmente a modificação de um dique existente através da sua deslocação, reforço ou alargamento, a substituição de um dique pela construção de um novo dique no mesmo local, independentemente de ser mais sólido ou mais largo que o anterior, ou ainda uma conjugação de várias destas situações.
Quanto às terceira e quarta questões
43 Através destas questões, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, por um lado, se os artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva devem ser interpretados no sentido de que, quando, na legislação nacional de execução da directiva, um Estado-Membro fixou, em conformidade com o artigo 4. , n. 2, especificações, critérios ou limiares para um projecto determinado abrangido pelo Anexo II, mas reteve especificações, critérios ou limiares incorrectos, esse projecto deve ser submetido a uma avaliação dos efeitos no ambiente em conformidade com o artigo 2. , n. 1, se for susceptível de ter "um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização" na acepção dessa disposição. Por outro lado, em caso de resposta afirmativa, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se essa obrigação de submeter o projecto a uma avaliação tem efeito directo, de modo que um particular pode invocá-la no órgão jurisdicional nacional, e se o juiz nacional deve garantir o seu respeito, mesmo quando ela não tenha sido invocada.
44 Recordando o acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Agosto de 1993, Comissão/Espanha (C-355/90, Colect., p. I-4221), o Nederlandse Raad van State julga plausível que o poder de apreciação reconhecido aos Estados-Membros pelo artigo 4. , n. 2, da directiva, de fixar especificações, critérios ou limiares, seja enquadrado pela expressão "que possam ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização" constante do artigo 2. , n. 1.
45 A Kraaijeveld e a Comissão desenvolvem uma argumentação semelhante. A Comissão esclarece que as especificações, os critérios ou limiares fixados pelos Estados-Membros se destinam principalmente a facilitar o exame dos projectos, a fim de determinar se eles devem ser submetidos a um estudo do impacte ambiental, mas que a existência dessas especificações, critérios ou limiares não dispensa os Estados-Membros de procederem a um exame concreto do projecto, a fim de verificarem se o mesmo preenche os critérios do artigo 2. , n. 1, da directiva. Ambas consideram que o Reino dos Países Baixos não cumpriu correctamente a sua obrigação de implementação da directiva, uma vez que os critérios de dimensões mínimas determinados pela legislação nacional em matéria de diques eram fixados a um nível tal que nenhum dos projectos de diques fluviais o atingia e que, deste modo, a totalidade dos projectos de reforço dos diques ficava fora do âmbito de aplicação do estudo do impacte ambiental. A Kraaijveld produziu, a este respeito, a decisão de um órgão jurisdicional neerlandês em apoio da sua tese.
46 Em contrapartida, segundo o Governo neerlandês, o poder de apreciação dos Estados-Membros não é limitado de forma precisa pela directiva. Aliás, a escolha dos limiares de comprimento e de perfil dos diques foi feita, no caso concreto, tendo em conta o impacte dessas obras no ambiente. O facto de, na prática, a legislação neerlandesa que transpõe a directiva não ter submetido muitos projectos à obrigação de avaliação seria irrelevante, dado que esses projectos não tinham consequências nocivas. Assim, considera não ter excedido a sua margem de apreciação ao determinar tais limiares.
47 Quanto ao efeito directo da obrigação de submeter certos projectos ao estudo do impacte ambiental, o juiz de reenvio considera que esta obrigação se pode considerar resultante de uma disposição precisa e incondicional da directiva. A Kraaijeveld, bem como a Comissão fazem observações neste sentido, acrescentando a Comissão, por outro lado, que, uma vez que a regulamentação tem natureza processual, não deixa qualquer margem de manobra quanto ao resultado a atingir. Em contrapartida, os Governos neerlandês e do Reino Unido consideram que o artigo 2. , n. 1, conjugado com o artigo 4. , n. 2, da directiva, não é suficientemente preciso nem incondicional para ter um efeito directo, tendo em conta a margem de apreciação conferida aos Estados-Membros quanto à determinação dos limiares e critérios ou à organização do processo de consulta do público.
48 A este respeito, há que recordar que o artigo 2. , n. 1, da directiva remete para o artigo 4. , para a definição dos projectos que devem ser submetidos a uma avaliação no que diz respeito aos seus efeitos. Este artigo reconhece aos Estados-Membros, no seu n. 2, um certo poder de apreciação, uma vez que precisa que os projectos pertencentes às categorias enumeradas no Anexo II são sujeitos a uma avaliação "sempre que os Estados-Membros considerarem que as suas características assim o exigem" e que, para o efeito, os Estados-Membros podem nomeadamente especificar determinados tipos de projectos a submeter a uma avaliação ou fixar critérios e/ou limiares a reter para poderem determinar quais os projectos que devem ser objecto de uma avaliação.
49 A interpretação proposta pela Comissão, isto é, que a existência de especificações, critérios e limiares não dispensa um exame concreto de cada projecto a fim de verificar se o mesmo preenche os critérios do artigo 2. , n. 1, privaria o artigo 4. , n. 2, de todo e qualquer significado. Com efeito, um Estado-Membro não teria qualquer interesse em fixar especificações, limiares e critérios se, independentemente destes, cada projecto devesse, apesar disso, ser objecto de uma apreciação individual face aos critérios do artigo 2. , n. 1.
50 Todavia, embora o artigo 4. , n. 2, segundo parágrafo, da directiva confira aos Estados-Membros uma margem de apreciação para especificar certos tipos de projectos a submeter a uma avaliação ou para fixar critérios e/ou limiares a reter, essa margem de apreciação tem os seus limites na obrigação, enunciada no artigo 2. , n. 1, de submeter a um estudo do impacte ambiental os projectos susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização.
51 Deste modo, pronunciando-se a respeito da legislação de um Estado-Membro, segundo a qual determinadas categorias completas de projectos enumerados no Anexo II eram excluídas da obrigação de estudo do impacte ambiental, o Tribunal de Justiça considerou, no acórdão de 2 de Maio de 1996, Comissão/Bélgica (C-133/94, Colect., p. I-2323, n. 42), que os critérios e/ou os limiares mencionados no artigo 4. , n. 2, têm por finalidade facilitar a apreciação das características concretas que apresenta um projecto com vista a determinar se está sujeito à obrigação de uma avaliação e não subtrair de antemão a essa obrigação certas categorias completas de projectos enumerados no Anexo II, previsíveis no território de um Estado-Membro.
52 Numa situação como a do caso de figura, há que admitir que o Estado-Membro em causa tinha o direito de fixar critérios de dimensões dos diques, para determinar quais os projectos relativos aos diques que devem ser objecto de um estudo do impacte ambiental. A questão de saber se, ao fixar esses critérios, o Estado-Membro excedeu a sua margem de apreciação não pode ser determinada relativamente às características de um único projecto. A questão depende de uma apreciação global das características dos projectos dessa natureza, previsíveis no território do Estado-Membro.
53 Assim, um Estado-Membro, que fixe os critérios e/ou os limiares a um nível tal que, na prática, a totalidade dos projectos relativos aos diques ficaria de antemão subtraída à obrigação de estudo do impacte ambiental, excede a margem de apreciação de que dispõe nos termos dos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva, salvo se a totalidade dos projectos excluídos podia ser considerada, com base numa apreciação global, não susceptível de ter efeitos significativos no ambiente.
54 Por último, tratando-se especialmente da quarta questão, resulta do acórdão de reenvio que a Kraaijeveld não suscitou, no seu recurso, a questão de saber se foi erradamente que não foi efectuada qualquer avaliação dos efeitos no ambiente. Para responder a esta questão, é necessário, assim, examinar, se o órgão jurisdicional nacional, ao qual é submetido um recurso de anulação de uma decisão de aprovação de um plano de ocupação dos solos, tem a obrigação de suscitar ex officio a questão de saber se devia ter sido efectuada, nos termos do artigo 2. , n. 1, e do artigo 4. , n. 2, da directiva, uma avaliação dos efeitos no ambiente.
55 Deve-se recordar, em primeiro lugar, que a obrigação de um Estado-Membro adoptar todas as medidas necessárias para alcançar o resultado imposto por uma directiva é uma obrigação coerciva imposta pelo artigo 189. , terceiro parágrafo, do Tratado CE e pela própria directiva (v., neste sentido, acórdãos de 1 de Fevereiro de 1977, Verbond van Nederlandse Ondernemingen, 51/76, Recueil, p. 113, n. 22, Colect., p. 55; e de 26 de Fevereiro de 1986, Marshall, 152/84, Colect., p. 723, n. 48). Esta obrigação de tomar todas as medidas gerais ou especiais impõe-se a todas as autoridades dos Estados-Membros, incluindo, no âmbito das suas competências, os órgãos jurisdicionais (v., neste sentido, acórdão de 13 de Novembro de 1990, Marleasing, C-106/89, Colect., p. I-4135, n. 8).
56 Quanto ao direito de um particular invocar uma directiva e de o juiz nacional a tomar em consideração, o Tribunal já decidiu que é incompatível com o efeito coercivo que o artigo 189. reconhece à directiva excluir, em princípio, que a obrigação que ela impõe possa ser invocada pelas pessoas em causa. Especialmente nos casos em que as autoridades comunitárias tenham, por meio de directiva, obrigado os Estados-Membros a adoptar um determinado comportamento, o efeito útil desse acto seria enfraquecido se os particulares fossem impedidos de o invocar em juízo e os órgãos jurisdicionais nacionais impedidos de o tomar em consideração enquanto elemento do direito comunitário para verificar se, dentro dos limites da competência que lhes é atribuída quanto à forma e aos meios para a execução da directiva, o legislador nacional permaneceu dentro dos limites da margem de apreciação traçada pela directiva (v. acórdão Verbond van Nederlandse Ondernemingen, já referido, n.os 22 a 24).
57 Seguidamente, há que recordar que, quando, por força do direito nacional, os órgãos jurisdicionais nacionais devam suscitar oficiosamente os fundamentos de direito que decorrem de uma norma interna vinculativa, que não tenham sido adiantados pelas partes, igual obrigação se impõe relativamente às normas comunitárias vinculativas (v., nomeadamente, acórdão de 14 de Dezembro de 1995, Van Schijndel e Van Veen, C-430/93 e C-431/93, Colect., p. I-4705, n. 13).
58 O mesmo se passa se o direito nacional conferir ao juiz a faculdade de aplicar oficiosamente a norma de direito vinculativa. Efectivamente, compete aos órgãos jurisdicionais nacionais, por aplicação do princípio da cooperação enunciado no artigo 5. do Tratado, garantir a protecção jurídica decorrente, para os particulares, do efeito directo das disposições do direito comunitário (v., nomeadamente, acórdãos de 19 de Junho de 1990, Factortame e o., C-213/89, Colect., p. I-2433, n. 19, e Van Schijndel e Van Veen, já referido, n. 14).
59 A circunstância de, no caso de figura, os Estados-Membros disporem, por força dos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva, de uma margem de apreciação, não exclui, no entanto, que possa ser efectuada uma fiscalização jurisdicional a fim de verificar se as autoridades nacionais não excederam a referida margem de apreciação (v., nomeadamente, acórdão Verbond van Nederlandse Ondernemingen, já referido, n.os 27 a 29).
60 Por conseguinte, quando, por força do direito nacional, um órgão jurisdicional tem a obrigação ou a faculdade de suscitar ex officio os fundamentos de direito decorrentes de uma norma interna de natureza coerciva, que não foram invocados pelas partes, compete-lhe verificar ex officio, no âmbito da sua competência, se as autoridades legislativas ou administrativas do Estado-Membro permaneceram dentro dos limites da margem de apreciação fixada nos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva e ter tal facto em conta no âmbito da apreciação do recurso de anulação.
61 No caso de essa margem de apreciação ter sido ultrapassada e de, portanto, deverem ser afastadas as disposições nacionais a esse respeito, compete às autoridades do Estado-Membro, no âmbito das suas competências, adoptar todas as medidas necessárias, gerais ou especiais, para que os projectos sejam examinados a fim de determinar se os mesmos são susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente e, na afirmativa, para que sejam submetidos a um estudo do impacte ambiental.
62 Por conseguinte, há que responder às terceira e quarta questões que:
° O artigo 4. , n. 2, da directiva e o Anexo II, ponto 10, alínea e), dessa directiva devem ser interpretados no sentido de que, quando um Estado-Membro fixe critérios e/ou limiares para determinar os projectos relativos aos diques a um nível tal que, na prática, a totalidade dos projectos relativos aos diques ficaria de antemão subtraída à obrigação de estudo do impacte ambiental, excede a margem de apreciação de que dispõe nos termos dos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, dessa directiva, salvo se a totalidade dos projectos excluídos podia ser considerada, com base numa apreciação global, não susceptível de ter efeitos significativos no ambiente.
° Quando, por força do direito nacional, um órgão jurisdicional tem a obrigação ou a faculdade de suscitar ex officio os fundamentos de direito decorrentes de uma norma interna de natureza coerciva, que não foram invocados pelas partes, compete-lhe verificar ex officio, no âmbito da sua competência, se as autoridades legislativas ou administrativas do Estado-Membro permaneceram dentro dos limites da margem de apreciação fixada nos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva e ter tal facto em conta no âmbito da apreciação do recurso de anulação.
° No caso de essa margem de apreciação ter sido ultrapassada e de, portanto, deverem ser afastadas as disposições nacionais a esse respeito, compete às autoridades do Estado-Membro, no âmbito das suas competências, adoptar todas as medidas necessárias, gerais ou especiais, para que os projectos sejam examinados a fim de determinar se os mesmos são susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente e, na afirmativa, para que sejam submetidos a um estudo do impacte ambiental.
Quanto às despesas
63 As despesas efectuadas pelos Governos neerlandês, italiano e do Reino Unido, bem como pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Nederlandse Raad van State, por acórdão de 8 de Março de 1995, declara:
1) A expressão "obras de canalização e de regularização de cursos de água", que figura no Anexo II, ponto 10, alínea e), da Directiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, deve ser interpretada no sentido de que engloba igualmente certos tipos de obras relativas a um dique ao longo de vias navegáveis.
2) A expressão "obras de canalização e de regularização de cursos de água", que figura no Anexo II, ponto 10, alínea e), da Directiva 85/337, deve ser interpretada no sentido de que engloba não apenas a construção de um novo dique mas igualmente a modificação de um dique existente através da sua deslocação, reforço ou alargamento, a substituição de um dique pela construção de um novo dique no mesmo local, independentemente de ser mais sólido ou mais largo que o anterior, ou ainda uma conjugação de várias destas situações.
3)
° O artigo 4. , n. 2, da Directiva 85/337 e o Anexo II, ponto 10, alínea e), dessa directiva devem ser interpretados no sentido de que, quando um Estado-Membro fixe critérios e/ou limiares para determinar os projectos relativos aos diques a um nível tal que, na prática, a totalidade dos projectos relativos aos diques ficaria de antemão subtraída à obrigação de estudo do impacte ambiental, excede a margem de apreciação de que dispõe nos termos dos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, dessa directiva, salvo se a totalidade dos projectos excluídos podia ser considerada, com base numa apreciação global, não susceptível de ter efeitos significativos no ambiente.
° Quando, por força do direito nacional, um órgão jurisdicional tem a obrigação ou a faculdade de suscitar ex officio os fundamentos de direito decorrentes de uma norma interna de natureza coerciva, que não foram invocados pelas partes, compete-lhe verificar ex officio, no âmbito da sua competência, se as autoridades legislativas ou administrativas do Estado-Membro permaneceram dentro dos limites da margem de apreciação fixada nos artigos 2. , n. 1, e 4. , n. 2, da directiva e ter tal facto em conta no âmbito da apreciação do recurso de anulação.
° No caso de essa margem de apreciação ter sido ultrapassada e de, portanto, deverem ser afastadas as disposições nacionais a esse respeito, compete às autoridades do Estado-Membro, no âmbito das suas competências, adoptar todas as medidas necessárias, gerais ou especiais, para que os projectos sejam examinados a fim de determinar se os mesmos são susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente e, na afirmativa, para que sejam submetidos a um estudo do impacte ambiental.