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Document 61994TJ0178

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Primeira Secção Alargada) de 18 de Dezembro de 1997.
Asociación Telefónica de Mutualistas (ATM) contra Comissão das Comunidades Europeias.
Auxílios de Estado - Redução de encargos sociais - Arquivamento da denúncia - Interesse em agir - Inadmissibilidade.
Processo T-178/94.

European Court Reports 1997 II-02529

ECLI identifier: ECLI:EU:T:1997:210

61994A0178

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Primeira Secção Alargada) de 18 de Dezembro de 1997. - Asociación Telefónica de Mutualistas (ATM) contra Comissão das Comunidades Europeias. - Auxílios de Estado - Redução de encargos sociais - Arquivamento da denúncia - Interesse em agir - Inadmissibilidade. - Processo T-178/94.

Colectânea da Jurisprudência 1997 página II-02529


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Recurso de anulação - Pessoas singulares ou colectivas - Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito - Decisão de arquivamento de uma denúncia apresentada por uma associação de beneficiários de uma mutualidade de previdência social de uma empresa e que denuncia auxílios de Estado a favor dessa empresa - Decisão que não afecta a esfera jurídica da associação - Inadmissibilidade

(Tratado CE, artigo 173._, quarto parágrafo)

Sumário


Uma associação constituída pelos beneficiários de uma mutualidade de previdência social de uma empresa integrada no regime geral de segurança social não tem legitimidade para impugnar a decisão através da qual a Comissão determina o arquivamento de uma denúncia apresentada pela referida associação sobre os auxílios de Estado a favor dessa empresa, que consistiriam no facto de as autoridades públicas lhe terem permitido beneficiar da diferença entre o montante que efectivamente pagou à mutualidade a título de contribuições e o montante das contribuições que, graças a um coeficiente de redução, não teve de pagar ao regime geral de segurança social, e de aquelas autoridades terem também permitido a anulação de um aval que a empresa estava obrigada a manter em vigor para que a mutualidade pudesse continuar a contar com uma cobertura suficiente das prestações que deve pagar durante determinado período.

Com efeito, a decisão de arquivamento, que na realidade tem como destinatário o Estado-Membro em causa, não produz efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar os interesses dessa associação, modificando de forma nítida a sua situação jurídica, uma vez que, por um lado, na hipótese de ser ordenada uma restituição ao Estado, este, nos termos da legislação nacional em causa, não teria qualquer dever de pagar posteriormente as contribuições aos membros da associação, e, por outro, nada permite considerar que a mutualidade poderia ser ressuscitada.

Além disso, uma associação de trabalhadores da empresa pretensamente beneficiária de um auxílio de Estado não é de modo algum uma concorrente dessa empresa e também não pode demonstrar que tem um interesse em agir resultante de efeitos concorrenciais.

Partes


No processo T-178/94,

Asociación Telefónica de Mutualistas (ATM), associação de direito espanhol, com sede em Madrid, representada por Juan Eugenio Blanco Rodríguez, Bernardo Vicente Hernández Bataller, advogados no foro de Madrid, e Lydie Lorang, advogada no foro do Luxemburgo, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado André Sérébriacoff, 11, rue Goethe,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada, na fase escrita, inicialmente por Francisco Enrique González Diaz e Michel Nolin, e posteriormente por Francisco Santaolalla e Michel Nolin, e na audiência por Fernando Castillo de la Torre, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão, comunicada à Asociación Telefónica de Mutualistas pelo ofício D/30508 da Comissão, de 15 de Fevereiro de 1994, de arquivar a denúncia apresentada pela referida associação quanto aos auxílios de Estado de que teria beneficiado a sociedade anónima Compañia Telefónica de España,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS

(Primeira Secção Alargada),

composto por: A. Saggio, presidente, A. Kalogeropoulos, V. Tiili, R. M. Moura Ramos e J. Pirrung, juízes,

secretário: B. Pastor, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 30 de Setembro de 1997,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


Factos na origem da denúncia

1 A associação recorrente, denominada Asociación Telefónica de Mutualistas (ATM), foi criada em 1987 para assegurar a defesa dos direitos dos filiados na Institución Telefónica de Previsión (a seguir «ITP»), mutualidade de previdência social criada pela Compañia Telefónica de España, SA (a seguir «TESA») para os seus trabalhadores e reformados.

2 A TESA é uma sociedade comercial anónima com participação do Estado. Obteve do Estado espanhol a concessão do serviço público telefónico de base. Em 1992, a participação do Estado atingiu 32% do capital social da sociedade, estando o capital restante repartido por 300 000 outros accionistas, cada um dos quais detém menos de 0,5% das participações sociais. A recorrente explicou na audiência que o Estado detém actualmente 21% do capital social. Além disso, o Estado nomeia a maioria dos membros dos órgãos administrativos da TESA.

3 A ITP foi criada pela TESA em 1944, com base numa lei de 6 de Dezembro de 1941, relativa aos montepios e às mutualidades de previdência social, e no seu regulamento de aplicação, aprovado por decreto de 26 de Maio de 1943. Nos termos do referido regulamento, esses montepios e mutualidades eram regidos pelas suas disposições estatutárias e regulamentares, na condição de estas serem conformes com o previsto na lei e no regulamento de aplicação. Além disso, aquela regulamentação previa que as prestações pagas por esses organismos se consideravam compatíveis com os benefícios que os seus membros podiam obter do regime obrigatório de segurança social instituído pelo Estado, a menos que disposições legislativas de teor contrário ou disposições expressas do Ministério do Trabalho declarassem que tais prestações substituíam as da segurança social obrigatória.

4 Desde 1966, no que respeita à segurança social em matéria de velhice, de incapacidade permanente, de morte e sobrevivência resultantes de uma doença corrente, a ITP tem a natureza de organismo de substituição em relação à segurança social geral. Além disso, as prestações concedidas pela ITP teriam sido superiores às prestações do regime público.

5 As prestações pagas pelas mutualidades, assim como as contribuições que lhes eram pagas, estavam fixadas no seu próprio regulamento. A contribuição da TESA para a ITP foi inicialmente fixada no regulamento da ITP em 7%, e mais tarde sucessivamente aumentada para 8% e 9% dos salários pagos aos trabalhadores.

6 Resulta também dos autos que os organismos e empresas que, tendo uma mutualidade que em certa medida substitui o regime geral de segurança social, estão excluídos da cobertura de certos riscos pelo regime geral, beneficiam da aplicação de um coeficiente de redução sobre a taxa geral da contribuição. Os coeficientes eram determinados anualmente por despacho do ministro encarregado da segurança social. Não foi contestado que a redução podia chegar a 14% dos salários.

7 O objectivo da lei geral de segurança social de 1966 foi coordenar e unificar a segurança social geral. Essa lei prevê, em princípio, que são integrados no regime geral da segurança social os grupos incluídos no âmbito de aplicação do regime de segurança social, mas ainda não abrangidos por esse regime.

8 Um decreto real de 20 de Novembro de 1985 dispõe que as instituições de que dependem os grupos a integrar serão obrigadas a transferir para a segurança social a compensação financeira correspondente aos encargos e obrigações que serão assumidos por esta e que, na hipótese de os recursos disponíveis para assegurar o pagamento das obrigações relativamente às quais aquelas instituições substituem a segurança social não serem suficientes para cobrir os custos da integração, a diferença seria paga pelos organismos ou empresas obrigados a cobrir financeiramente o pagamento das prestações que as instituições em questão concediam.

9 Entretanto, em 1977, o Ministério do Trabalho aprovou o regulamento modificado da ITP. O n._ 4 das disposições transitórias passou a conter a indicação de que a TESA «garante com o seu aval o pagamento das prestações que a ITP deva assegurar durante um período de dez anos e, para concretizar essa responsabilidade, o montante máximo garantido será fixado anualmente e o aval será renovado anualmente, de modo que a sua duração abranja o período de dez anos a partir de cada renovação». Segundo a recorrente, a constituição do aval foi mesmo exigida pela administração pública para que o regulamento fosse aprovado.

10 Segundo a acta da reunião de 24 de Julho de 1979 do comité de direcção da ITP, este verificou que, no âmbito da compra pela ITP de um lote de acções da TESA, esta garantira assumir determinados compromissos para com a ITP. Esses compromissos consistiam, designadamente, «no aumento do aval referido para cobrir as reservas técnicas evidenciadas nos estudos actuariais» e na obrigação de manter esse aval, actualizado anualmente, como se indica na disposição transitória citada no número anterior.

11 A recorrente alegou, sem neste aspecto ser desmentida pela Comissão, que a TESA só fixou o montante do aval no seu orçamento para o exercício de 1977, tendo-o quantificado em 8 mil milhões de PTA.

12 A recorrente alega ainda que o conselho de administração da TESA, na sua reunião de 28 de Janeiro de 1987, considerou que expirara o período de dez anos durante o qual devia vigorar o aval inicialmente concedido em 1977, tendo anulado o aval.

13 Em 27 de Dezembro de 1991, o Conselho de Ministros espanhol decidiu integrar no regime geral da segurança social os grupos dos activos e dos pensionistas da ITP. Em seguida, o Ministério do Trabalho e da segurança social determinou em despacho de 30 de Dezembro de 1991 os efeitos da integração. A Direcção-Geral da Planificação e Ordenamento Económico da segurança social, habilitada para esse efeito, fixou em resolução de 25 de Maio de 1992 os custos dessa integração. A resolução dispunha ainda que, se os recursos da ITP se revelassem insuficientes, a TESA seria obrigada a suportar a diferença entre os pagamentos efectuados pela ITP e o montante total a pagar aos pensionistas. No que respeita ao regime complementar de previdência, foi celebrado em 8 de Julho de 1992 um acordo nos termos do qual a TESA se comprometeu a pagar determinadas prestações aos beneficiários.

14 Em 10 de Junho de 1992, o Ministério da Economia e Finanças decretou oficiosamente a dissolução e a liquidação da ITP. No entanto, a recorrente observou, sem neste aspecto ser desmentida pela recorrida, que o procedimento de dissolução não estava ainda definitivamente concluído.

Procedimento administrativo

15 Foi nestas condições que, em 1 de Julho de 1993, foi apresentada uma denúncia à Comissão, em nome da ATM, acusando os poderes públicos espanhóis de terem permitido uma diminuição dos encargos sociais da TESA, o que constitui um auxílio de Estado. As medidas criticadas na denúncia, descritas à luz dos esclarecimentos fornecidos durante o procedimento administrativo e contencioso, são as seguintes.

16 Em primeiro lugar, o auxílio consistiria no facto de as autoridades públicas terem permitido que a TESA beneficiasse, entre 1982 e finais de 1991, da diferença entre o montante que efectivamente pagou à ITP a título de contribuições, por um lado, e o montante das contribuições que, graças a um coeficiente de redução, não teve de pagar ao regime geral de segurança social, por outro lado. Esse auxílio elevar-se-ia a 270 mil milhões de PTA. Além disso, a recorrente pediu à Comissão que ordenasse à TESA que pagasse essa diferença à ITP.

17 Em segundo lugar, as autoridades públicas teriam permitido a anulação de um aval que a TESA estaria obrigada a manter em vigor para que a ITP pudesse continuar a contar com uma cobertura suficiente das prestações que deve pagar nos dez anos seguintes. Essa medida estatal teria proporcionado à TESA um lucro de 8 mil milhões de pesetas.

18 Na denúncia, a recorrente afirmou ainda que as referidas medidas de auxílio tinham colocado a ITP em situação deficitária, o que, em consequência, levara à sua liquidação.

19 Por ofício de 12 de Agosto de 1993, a Comissão convidou a recorrente a apresentar observações adicionais à sua denúncia. Após uma reunião realizada em 15 de Setembro de 1993, a recorrente comunicou informações adicionais por carta de 29 de Outubro de 1993. Por ofício de 12 de Novembro de 1993, a Comissão voltou a convidar a recorrente a completar as suas informações, o que esta fez por carta de 3 de Dezembro de 1993.

20 Segundo a resposta da Comissão a uma pergunta do Tribunal, não houve troca de correspondência com o Estado espanhol nem qualquer decisão formal dirigida a esse Estado.

21 Após a troca de correspondência entre a Comissão e a recorrente, a Comissão, por ofício D/30508 de 15 de Fevereiro de 1994 (a seguir «ofício de 15 de Fevereiro de 1994»), dirigido ao representante da recorrente, Molina del Pozo, comunicou que da análise de todas as informações apresentadas não resultara qualquer prova da existência de um auxílio de Estado a favor da TESA. Assim, a Comissão arquivou a denúncia da recorrente sem lhe dar seguimento.

22 A fundamentação do ofício de 15 de Fevereiro de 1994 está assim redigida:

«Não existe qualquer intervenção do Estado na anulação [do aval... Embora] a TESA seja uma empresa detida maioritariamente pelo Estado, nem o Estado nem qualquer outro dos seus accionistas é em princípio responsável pelos actos ou compromissos assumidos pela TESA, que tem personalidade jurídica autónoma.

Se a ITP e os seus trabalhadores se consideram lesados nos seus direitos pelo incumprimento de um compromisso imputável à TESA, podem pedir o respectivo ressarcimento, como fizeram, nos tribunais nacionais competentes, que, se assim o entenderem, restabelecerão os autores da denúncia nos seus direitos.»

«A dispensa do pagamento de determinados montantes à segurança social [geral] foi decidida pelo Governo espanhol em conformidade com a legislação geral espanhola em matéria social, preenchendo a TESA as condições exigidas por essas disposições. Quanto à questão do eventual incumprimento pela TESA dos compromissos que assumira nos termos da legislação geral citada, o Tribunal Supremo espanhol decidiu, por acórdão de 26 de Dezembro de 1990, que, à luz da legislação geral aplicável, a TESA não estava obrigada a fazer na ITP entradas superiores àquelas que efectivamente fez. Por conseguinte, a Comissão não pode concluir que a diferença mencionada constituiu um auxílio de Estado, uma vez que tal situação não é contrária à legislação geral aplicável.

... de qualquer modo, o pedido da autora da denúncia para que a Comissão ordene à TESA que pague à ITP o montante da diferença não é conforme com o direito comunitário, uma vez que a Comissão, no caso de existir um auxílio e de este ser incompatível, exigiria a sua restituição ao Estado.»

Tramitação processual

23 Foi nestas circunstâncias que, por petição entrada na Secretaria do Tribunal em 22 de Abril de 1994, a recorrente interpôs o presente recurso.

24 Em requerimento separado, nos termos do artigo 114._, n._ 1, do Regulamento de Processo, a recorrida suscitou uma questão prévia de admissibilidade, que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 28 de Julho de 1994.

25 A recorrente apresentou as suas observações sobre a questão de admissibilidade em 12 de Setembro de 1994.

26 Por despacho de 14 de Junho de 1995, o Tribunal decidiu apreciar a questão de admissibilidade juntamente com o mérito.

27 As partes apresentaram contestação, réplica e tréplica na Secretaria do Tribunal respectivamente em 21 de Agosto de 1995, 9 de Outubro de 1995 e 15 de Dezembro de 1995.

28 Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal (Primeira Secção Alargada) deu início à fase oral. No âmbito das medidas de organização do processo, o Tribunal dirigiu algumas perguntas escritas às partes, que responderam na forma devida.

29 As partes foram ouvidas em alegações e em resposta às perguntas orais do Tribunal na audiência de 30 de Setembro de 1997.

Pedidos das partes 30 A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- julgar o recurso admissível e procedente;

- anular o ofício de 15 de Fevereiro de 1994 em que a Comissão declara ter arquivado a denúncia apresentada pela recorrente;

- condenar a Comissão nas despesas.

31 A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- a título principal, julgar o recurso inadmissível;

- a título subsidiário, negar-lhe provimento por improcedente;

- condenar a recorrente nas despesas.

Quanto à admissibilidade

Argumentação das partes

32 A recorrida invoca dois fundamentos de inadmissibilidade contra o recurso. Em primeiro lugar, a recorrente não teria interesse em agir. Em segundo lugar, não existiria um acto que a recorrente pudesse impugnar e, de qualquer modo, esta não teria legitimidade processual, na acepção do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado CE.

33 Quanto ao primeiro fundamento de inadmissibilidade, a inexistência de interesse em agir resultaria em primeiro lugar do facto de, mesmo na hipótese de as intervenções financeiras do Estado espanhol a favor da TESA serem efectivamente auxílios de Estado incompatíveis com o mercado comum, uma eventual exigência de restituição em nada beneficiaria a recorrente, atendendo a que os encargos sociais não cobrados deveriam ser restituídos ao Estado espanhol e não à ITP ou à ATM. No entender da recorrida, a ordem jurídica espanhola não prevê a possibilidade de se compensar a diferença entre a contribuição normal para a segurança social e a contribuição inferior paga pela TESA à ITP, como o Tribunal Supremo teria declarado no mencionado acórdão.

34 A recorrida acrescenta que, tendo em conta a dissolução da ITP, uma restituição a seu favor é mesmo juridicamente impossível desde 1992. Ainda que os pretensos auxílios a restituir devessem ser pagos às caixas da ITP, o seu montante deveria, devido à liquidação, ser pago à segurança social para suportar o custo da sua integração no regime geral de segurança social.

35 A inexistência de interesse em agir resultaria, em segundo lugar, do facto de o pretenso auxílio de Estado beneficiar apenas a TESA, empresa com a qual nem a recorrente nem os seus membros se encontrariam, directa ou indirectamente, em relação de concorrência. A recorrida invoca a este respeito os despachos do Tribunal de Justiça de 30 de Setembro de 1992, Landbouwschap/Comissão (C-295/92, Colect., p. I-5003), e de 8 de Abril de 1981, Ludwigshafener Walzmühle Erling e o./CEE (197/80, 198/80, 199/80, 200/80, 243/80, 245/80 e 247/80, Recueil, p. 1041), alegando que a análise das relações de concorrência, para determinar a existência ou a inexistência de interesse em agir, deve ser feita em relação à parte recorrente e não em relação a pessoas ou empresas que poderiam eventualmente ser efectiva ou potencialmente afectadas pelo acto em causa. No caso vertente, nem a ATM nem os seus membros se encontrariam directa ou indirectamente em relação de concorrência com a TESA, nem em qualquer outra relação relevante da perspectiva da protecção da livre concorrência. Daí resulta, segundo a recorrida, que a manutenção ou anulação da decisão impugnada em nada afecta os interesses da ATM.

36 O segundo fundamento de inadmissibilidade baseia-se na inexistência de um acto impugnável pela recorrente. A recorrida alega, em primeiro lugar, que o ofício de 15 de Fevereiro de 1994 não é uma decisão dirigida à recorrente, pois, diversamente do que está previsto no Regulamento n._ 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 85._ e 86._ do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), não existe, no sector dos auxílios de Estado, qualquer procedimento de denúncia que permita, se o requerente pretender, levar a uma decisão de que ele poderia ser o destinatário e que seria susceptível de recurso de anulação. Segundo a Comissão, esta posição é claramente confirmada pelos acórdãos do Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão (C-313/90, Colect., p. I-1125), e de 19 de Maio de 1993, Cook/Comissão (C-198/91, Colect., p. I-2487), e sintetizada nas conclusões do advogado-geral G. Tesauro no processo Cook/Comissão, já referido (Colect., p. I-2502).

37 Na realidade, um ofício como o do caso vertente apenas seria uma informação relativa a uma decisão dirigida ao Estado-Membro, único destinatário das decisões no sector dos auxílios de Estado. Ela mais não faria do que levar o conteúdo de uma decisão propriamente dita ao conhecimento daqueles que denunciaram a existência do auxílio. Portanto, o ofício de 15 de Fevereiro de 1994 em si não poria termo ao procedimento, que poderia aliás ser reaberto se a empresa autora da denúnica apresentasse novos elementos de direito ou de facto que justificassem essa reabertura.

38 Além disso, a recorrida considera que, de qualquer modo, a recorrente não é directamente afectada, como exige o artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado. Enquanto associação privada actuando no presente processo no interesse dos seus membros e não no seu próprio interesse, não diria directamente respeito à recorrente uma decisão que declara que a pretensa intervenção financeira do Estado a favor da TESA não é um auxílio de Estado, na acepção do artigo 92._ do Tratado. Mais precisamente, ela não teria desempenhado o papel de interlocutor privilegiado, na acepção do acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Fevereiro de 1988, Van der Kooy e o./Comissão (67/85, 68/85 e 70/85, Colect., p. 219). De igual modo, embora o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Julho de 1995 AITEC e o./Comissão (T-447/93, T-448/93 e T-449/93, Colect., p. II-1971), tenha confirmado que uma associação profissional podia considerar-se individualmente afectada se pudesse provar que a posição concorrencial de alguns dos seus membros fora sensivelmente afectada pelos auxílios em questão e se um eventual recurso desses membros fosse admissível, na acepção do acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de Janeiro de 1986, Cofaz e o./Comissão (169/84, Colect., p. I-391), a Comissão considera contudo que não é o que acontece no caso presente.

39 A recorrente também não seria directamente afectada, como exige o artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado, uma vez que não existiria qualquer nexo de causalidade entre a decisão de não levantar objecções, não existindo auxílios de Estado, e o prejuízo eventualmente decorrente da legislação espanhola em matéria de segurança social. Com efeito, admitindo que a Comissão tenha cometido um erro na sua qualificação da intervenção financeira do Estado espanhol a favor da TESA e deva portanto ordenar a restituição do auxílio, a ordem jurídica espanhola não prevê qualquer mecanismo que torne possível a reparação do prejuízo invocado pela recorrente.

40 A recorrente sustenta que o seu recurso é admissível. No âmbito do primeiro fundamento de inadmissibilidade, afirma o seu interesse em agir. Em primeiro lugar, teria sido devido à anulação do aval e às contribuições demasiado baixas, isto é, aos auxílios denunciados, que a ITP não pôde assumir as prestações aos beneficiários e foi integrada no regime geral de segurança social. A restituição pela TESA dos auxílios de Estado que a recorrente considera incompatíveis com o mercado comum beneficiá-la-ia porque a administração espanhola pagaria esses montantes à ITP, em benefício, em definitivo, dos membros da recorrente.

41 A recorrente alega que o mencionado acórdão do Tribunal Supremo foi erradamente interpretado pela Comissão. Segundo a recorrente, aquele acórdão não incide sobre a questão de saber se deve ou não haver restituição. O órgão jurisdicional nacional teria baseado a sua decisão apenas numa norma processual e considerado que quem deveria ter formulado o pedido não eram os trabalhadores e pensionistas recorrentes, mas os órgãos directivos da ITP.

42 A afirmação da Comissão, de que a restituição de montantes à ITP é juridicamente impossível desde 1992, também não poderia ser juridicamente sustentada, pois a liquidação da ITP não estaria iminente. Mesmo no caso de estarem preenchidas as exigências legais e de serem tomadas as decisões jurídicas relativas à liquidação, um acórdão favorável do Tribunal de Primeira Instância no presente caso poderia levar à revisão dos actos administrativos que provocaram a dissolução da ITP.

43 No que respeita à situação concorrencial no mercado, a recorrente afirma ter sofrido um prejuízo real e certo devido ao auxílio de Estado à TESA, atendendo a que a diminuição das contribuições sociais afectou os direitos dos seus membros. Neste contexto, a recorrente invoca o acórdão Cook/Comissão, já referido, segundo o qual os interessados, na acepção do artigo 93._, n._ 2, do Tratado, foram definidos como sendo as pessoas, empresas ou associações eventualmente afectadas nos seus interesses pela concessão do auxílio, isto é, as empresas concorrentes e as associações profissionais. Como a recorrente é uma associação profissional criada para assegurar a defesa dos mutualistas, tudo o que afecta a ITP ou a TESA tem interesse directo para ela.

44 A recorrente teria também interesse em agir no caso presente, porque teria sido constituída para defender os direitos da ITP, em circunstâncias em que a defesa desses direitos seria de outro modo impossível, devido ao domínio exercido pela TESA sobre a ITP.

45 A recorrente alega, no âmbito do segundo fundamento de inadmissibilidade, que é destinatária do ofício de 15 de Fevereiro de 1994, que é uma decisão que produz efeitos jurídicos obrigatórios. Efectivamente, aquele acto poria termo ao procedimento de denúncia e conteria uma apreciação dos auxílios contestados e, portanto, impediria que os interesses dos membros da recorrente fossem satisfeitos no futuro.

46 A este respeito, a recorrente invoca o acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Junho de 1993, França/Comissão (C-325/91, Colect., p. I-3283, n._ 9), alegando que a existência de um acto impugnável, na acepção do artigo 173._ do Tratado, depende da questão de saber se ele produz efeitos jurídicos, e o acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Dezembro de 1988, Irish Cement/Comissão (166/86 e 220/86, Colect., p. 6473, n._ 11), em que o Tribunal de Justiça qualificara como medida que produz efeitos jurídicos a recusa de iniciar um procedimento nos termos do artigo 93._, n._ 2. A recorrente remete também para o acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Junho de 1994, SFEI e o./Comissão (C-39/93 P, Colect., p. I-2681, n.os 27 e 28), segundo o qual uma instituição que dispõe do poder de declarar uma infracção e de a punir e a quem podem ser submetidas denúncias pelos particulares, como é o caso da Comissão em matéria de direito da concorrência, adopta necessariamente um acto que produz efeitos jurídicos quando põe termo a um inquérito que iniciou na sequência dessa queixa, e o acto que determina o arquivamento de uma denúncia não pode ser qualificado como preliminar ou preparatório, pois constitui a última fase do procedimento: não será seguido de qualquer outro acto susceptível de originar um recurso de anulação.

47 A recorrente afirma além disso que interveio activamente no procedimento iniciado pela Comissão na sequência da sua denúncia. Isso permitir-lhe-ia impugnar a decisão tomada no final do procedimento (acórdão Cofaz e o./Comissão, já referido).

48 Por fim, a recorrente alega que o presente recurso deveria ser admissível para garantir o direito da recorrente a um recurso efectivo, em conformidade com o artigo 13._ da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, pois em Espanha não existiria qualquer meio judicial adequado, em matéria de auxílios de Estado, que lhe permitisse contestar a diminuição dos encargos sociais autorizada por omissão pelo Reino de Espanha.

49 A recorrida responde, na tréplica, que o acórdão SFEI e o./Comissão, já referido, diz respeito ao procedimento de aplicação dos artigos 85._ e 86._ do Tratado, em que se prevê designadamente a possibilidade de apresentar denúncias. Essa jurisprudência não seria aplicável no caso em apreço. No que respeita ao acórdão do Tribunal de Justiça Irish Cement/Comissão, já referido, a recorrida observa que, se nesse acórdão o Tribunal de Justiça não tivesse considerado que o recurso fora interposto fora de prazo, teria que apreciar se o ofício da Comissão dizia directa e individualmente respeito à recorrente.

50 Por fim, quanto ao argumento da recorrente baseado na inexistência de possibilidade de fiscalização jurisdicional no caso de o presente recurso ser inadmissível, a recorrida observa que o artigo 92._, n._ 1, do Tratado é directamente aplicável e pode, por conseguinte, ser invocado pela recorrente nos tribunais nacionais, se assim o entender.

Apreciação do Tribunal

51 O Tribunal observa, antes de mais, que uma decisão que põe termo à apreciação da compatibilidade de uma medida de auxílio com o Tratado tem sempre como destinatário o Estado-Membro em questão e que um particular pode impugná-la no tribunal comunitário se estiverem preenchidas as condições do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado.

52 Deve observar-se, nesta fase, que o ofício de 15 de Fevereiro de 1994 constitui apenas, no que se refere à recorrente, uma comunicação que reflecte o conteúdo de uma decisão que tem como destinatário o Estado-Membro em causa. O Tribunal entende, portanto, que é razoável considerar o pedido da recorrente para anulação do ofício de 15 de Fevereiro de 1994, em que a Comissão declara ter arquivado a denúncia da recorrente, como pretendendo na realidade a anulação da decisão cujo destinatário é o Estado-Membro em causa, decisão essa que o ofício reproduz.

53 Ora, só podem ser impugnados por uma pessoa singular ou colectiva, nos termos do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado, os actos que produzem efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar os seus interesses, modificando de forma nítida a sua situação jurídica.

54 Assim, deve apreciar-se se a decisão de pôr termo à análise da compatibilidade com o Tratado dos auxílios de Estado denunciados pela recorrente, decisão essa comunicada à recorrente pelo ofício de 15 de Fevereiro de 1994, mas que na realidade tem como destinatário o Reino de Espanha, afecta os interesses da recorrente modificando de forma nítida a sua situação jurídica. Tem de ser esse o caso para que a recorrente possa ter interesse na anulação do acto impugnado.

55 No caso vertente, a recorrente alega que a decisão da Comissão contém uma apreciação dos auxílios contestados e, portanto, impede que os interesses dos seus membros sejam satisfeitos no futuro. Deve, portanto, resumir-se o quadro factual do presente caso para determinar qual é a relação entre a decisão da Comissão e o alegado prejuízo da recorrente.

56 A recorrente é uma associação constituída pelos beneficiários da mutualidade de previdência ITP. Todos esses beneficiários são trabalhadores ou pensionistas da TESA, sociedade que criou a ITP para organizar a previdência social dos seus trabalhadores. O Tribunal verifica, portanto, que, na realidade, os membros da associação recorrente se queixam dos pretensos auxílios de Estado que beneficiam a sua actual ou antiga entidade patronal.

57 A recorrente afirma que, não existindo os pretensos auxílios ilegais, a ITP não teria sido integrada no regime geral de segurança social e os beneficiários teriam podido continuar a beneficiar de prestações superiores às concedidas pelo regime geral. Acrescenta que, se o montante dos auxílios fosse restituído ao Estado, o que em seu entender a Comissão deveria ter ordenado, o Estado pagaria esses montantes à ITP. Consequentemente, esta seria ressuscitada e os beneficiários recuperariam o direito a prestações de nível elevado.

58 Ora, é forçoso notar que o Tribunal Supremo decidiu «que não existe qualquer direito para se pedir em favor [da ITP] pagamentos [...] que não sejam os legalmente previstos [pelo diploma] que a regula, e é notório que o desfasamento que existe entre a contribuição normal [para a caixa geral da segurança social], pelo facto de esta assumir integralmente os riscos segurados, e a contribuição parcial efectuada no presente caso para a [mutualidade da] TESA [...] constitui um problema de alteração normativa que não é susceptível de ser resolvido por via judicial» (n._ 3 da fundamentação do acórdão referido). O Tribunal verifica que a Comissão tinha razão em concluir que, nos termos da legislação nacional, a TESA não estava obrigada a fazer na ITP entradas superiores àquelas que efectivamente fez. Além disso, a legislação nacional não prevê o pagamento à ITP da diferença entre a contribuição normal para o regime geral de segurança social e a contribuição inferior que era devida àquela mutualidade, em conformidade com as disposições que lhe eram aplicáveis na época (v. supra, n.os 5 e 6).

59 Mesmo admitindo que a decisão seja anulada e que a Comissão deva tomar medidas de execução do acórdão, nada indica que tal processo possa razoavelmente resultar, no final, no pagamento da diferença em causa à ITP.

60 Efectivamente, como a Comissão afirma com razão, na hipótese de ser ordenada uma restituição, os encargos sociais não cobrados deveriam ser restituídos ao Estado espanhol, que, nos termos da legislação nacional, não tem qualquer dever de os pagar posteriormente à ITP. Mais ainda, atendendo a que a integração das caixas de previdência privadas no regime geral da segurança social prosseguia uma finalidade política (v. supra, n._ 7), nada permite considerar que a ITP poderia ser ressuscitada.

61 Quanto à outra parte do pretenso auxílio, o Tribunal observa que, mesmo que a Comissão tivesse concluído que a anulação do aval constituía um auxílio de Estado e tivesse ordenado a respectiva restituição, esta teria apenas consistido em fazer garantir pela TESA que fossem pagas as prestações sociais devidas aos beneficiários. Ora, por força dos diplomas nacionais referidos nos n.os 8 e 13, supra, a TESA já tem a obrigação de cobrir o custo da integração da ITP no regime geral de segurança social. Desde a integração da ITP, as prestações são pagas pelo regime geral de segurança social. Assim como a recorrente não demonstrou que a anulação do aval causara prejuízos concretos aos seus membros, também não demonstrou que uma eventual restituição criaria benefícios exigíveis pelos membros. E também não demonstrou que a ITP não teria sido integrada no regime geral se o aval tivesse sido mantido em vigor.

62 Nas circunstâncias acima expostas, embora a decisão tenha o efeito de arquivar a denúncia da recorrente, não afecta obviamente a sua esfera jurídica. Daí resulta que a manutenção ou anulação da decisão não é de modo algum susceptível de afectar os interesses da recorrente ou dos seus membros. Assim, a recorrente não tem qualquer interesse em obter a anulação da decisão que impugna e não preenche, portanto, as condições do artigo 173._, quarto parágrafo, do Tratado.

63 O Tribunal conclui além disso que a recorrente, sendo na realidade uma associação de trabalhadores da empresa pretensamente beneficiária de um auxílio de Estado, não é de modo algum uma concorrente dessa empresa e também não pode demonstrar que tem um interesse em agir resultante de efeitos concorrenciais (v., no que respeita à relação entre efeitos concorrenciais e admissibilidade, por exemplo, o despacho Landbouwschap/Comissão, já referido, n._ 12, e o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Abril de 1995, ASPEC e o./Comissão, T-435/93, Colect., p. II-1281, n._ 63).

64 Nestas circunstâncias, a recorrente não provou ter interesse na anulação da decisão que lhe foi comunicada pelo ofício de 15 de Fevereiro de 1994.

65 Resulta do que antecede que o presente recurso deve ser julgado inadmissível, sem que seja necessário analisar os outros argumentos expendidos pela recorrente e pela Comissão.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

66 Por força do disposto no n._ 2 do artigo 87._ do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Tendo a recorrente sido vencida, e em conformidade com o pedido da Comissão, há que condená-la a suportar as suas próprias despesas e as despesas efectuadas pela Comissão.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

(Primeira Secção Alargada)

decide:

67 O recurso é julgado inadmissível.

68 A recorrente é condenada a suportar as suas próprias despesas e as despesas efectuadas pela Comissão.

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