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Document 61989CC0113
Opinion of Mr Advocate General Van Gerven delivered on 7 March 1990. # Rush Portuguesa Ldª v Office national d'immigration. # Reference for a preliminary ruling: Tribunal administratif de Versailles - France. # Act of Accession - Transitional period - Freedom of movement for workers - Freedom to provide services. # Case C-113/89.
Conclusões do advogado-geral Van Gerven apresentadas em 7 de Março de 1990.
Rush Portuguesa Ldª contra Office national d'immigration.
Pedido de decisão prejudicial: Tribunal administratif de Versailles - França.
Acto de Adesão - Período de transição - Livre circulação de trabalhadores - Livre prestação de serviços.
Processo C-113/89.
Conclusões do advogado-geral Van Gerven apresentadas em 7 de Março de 1990.
Rush Portuguesa Ldª contra Office national d'immigration.
Pedido de decisão prejudicial: Tribunal administratif de Versailles - França.
Acto de Adesão - Período de transição - Livre circulação de trabalhadores - Livre prestação de serviços.
Processo C-113/89.
European Court Reports 1990 I-01417
ECLI identifier: ECLI:EU:C:1990:107
WALTER VAN GERVEN
apresentadas em 7 de Março de 1990 ( *1 )
Senhor Presidente,
Senhores Juízes,
1. |
O acto relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa (adiante «acto de adesão») dispõe que, no respeitante à livre circulação dos trabalhadores entre, por um lado, a Espanha e Portugal e, por outro, os outros Estados-membros, o artigo 48.° do Tratado CEE só é aplicável sob determinadas condições. O acto de adesão não inclui, no entanto, qualquer restrição quanto à aplicação dos artigos 59.° e seguintes do Tratado CEE em matéria de livre circulação dos serviços. As questões prejudiciais apresentadas pelo tribunal administratif de Versalhes (adiante «tribunal de reenvio») pretendem que o Tribunal especifique as implicações que as referidas disposições do acto de adesão têm em relação aos prestadores de serviços da Comunidade (no caso submetido ao tribunal de reenvio, trata-se de Portugal) que contratam trabalhadores portugueses ou espanhóis. |
Contexto
2. |
A sociedade portuguesa Rush Portuguesa Lda (adiante «Rush») é uma empresa de construção e de obras públicas. Celebrou com uma empresa francesa um determinado número de contratos de subempreitada para trabalhos a efectuar em França em diferentes estaleiros do TGV Atlantique. Para efectuar esses trabalhos, a Rush trouxe de Portugal para França um determinado número de trabalhadores de nacionalidade portuguesa. O tribunal de reenvio solicita ao Tribunal que, para responder às questões prejudiciais, parta da hipótese de que esses trabalhadores voltarão a Portugal imediatamente depois de terem terminado a prestação de serviços. Os serviços da «inspection du travail» franceses procederam a dois controlos em Setembro e Dezembro de 1986 que lhes permitiram verificar que Rush empregava no total 58 trabalhadores portugueses que não dispunham de uma autorização de trabalho como o exige o artigo L 41.6 do código do trabalho francês. Para mais detalhes sobre as funções exercidas por esses trabalhadores, remeto para o relatório para audiência, capítulo I, n.° 2. O referido artigo do código do trabalho faz parte do capítulo I do título quarto do livro terceiro do código do trabalho que diz respeito à «mão-de-obra estrangeira e (à) protecção da mão-de-obra nacional». Proíbe empregar em França estrangeiros que não disponham de autorização de trabalho quando essa autorização seja exigida pelo direito francês ou pelos tratados internacionais. Rush seria também culpada de uma infracção ao artigo L 341.9 que confere ao Office national d'immigration (actualmente «Office de migration internationale», adiante «ONI») o monopólio para a contratação e a admissão em França dos trabalhadores estrangeiros. Com base nos autos de notícia que foram levantados no decurso desses controlos, o ONI aplicou à Rush uma «contribuição especial» nos termos do artigo L 341.7 do código do trabalho. Como o representante do Governo francês explicou no decorrer da audiência, essa contribuição tem a natureza de uma multa administrativa. O seu montante mínimo é igual a 500 vezes o montante do salário mínimo garantido, tal como é definido no artigo L 141.8 do código do trabalho. Além disso, resulta dos autos que a multa total imposta à Rush é de 1,5 milhões de FF. A Rush solicitou ao tribunal de reenvio a anulação dessa multa. |
3. |
E necessario não perder de vista, para a sequência desta exposição, que a questão que se coloca no processo principal diz apenas respeito à legalidade da contribuição especial aplicada à Rush. O tribunal de reenvio deseja saber, mais precisamente, se um prestador de serviços pode ser condenado por ter contratado trabalhadores portugueses sem autorização de trabalho. Assim, o presente processo não diz respeito à questão de saber se a actividade da Rush é autorizada e/ou pode ser sujeita a uma autorização prévia pelas autoridades francesas. A qualificação e a licitude em direito francês da actividade da sociedade Rush enquanto «agência de trabalho temporário» ou mesmo de «fornecedor de mão-de-obra» (independentemente da nacionalidade das pessoas que emprega), bem como a compatibilidade da legislação francesa na matéria com o direito comunitário não constituem elementos pertinentes para a resposta a dar às questões prejudiciais. O litígio no processo principal também não parece dizer respeito à questão de saber se um Estado-membro pode cobrar uma imposição na altura da emissão de uma autorização. Apesar disso, se se atentar na parte final da segunda questão prejudicial, parece, de certo modo, que o tribunal de reenvio deseja saber se um Estado-membro pode subordinar o fornecimento de um serviço ao pagamento de uma determinada contribuição ao serviço de imigração para a concessão de autorizações de trabalho aos operários do prestador de serviços. A julgar pelas observações que foram apresentadas perante o Tribunal, essa questão teria sido colocada a propósito do referido monopólio do ONI no que diz respeito à contratação e à entrada de mão-de-obra estrangeira em França, e respeitaria, além disso, à taxa (módica) imposta pelo artigo L 341.8 do código do trabalho no caso de renovação de uma autorização de trabalho. Voltarei de modo muito breve a essa questão no fim das conclusões (ver n.° 22). |
Disposições aplicáveis do direito comunitário
4. |
Em princípio, não se pode recusar a uma empresa da Comunidade que presta um serviço num Estado-membro (o «Estado-membro de acolhimento») diferente daquele em que está estabelecida (o «Estado de origem») o direito de contratar, para efeitos dessa prestação de serviços, trabalhadores originários de outros Estados-membros e de os empregar no Estado de acolhimento. O n.° 3 do artigo 6.° da Directiva 68/360/CEE ( 1 ) (ver também n.° 5 infra, in finé) dispõe que o Estado-membro em que o serviço é prestado é obrigado a conceder a esses trabalhadores uma autorização de residência (cujo prazo de validade pode ser limitado à duração prevista para o emprego). |
5. |
No caso de empresas que desejem contratar trabalhadores espanhóis e portugueses para uma prestação de serviços, é necessário, no entanto, ter em consideração, até 1993, as regras ( 2 ) que estão inseridas no acto de adesão. No respeitante aos movimentos migratórios entre Portugal e os dez «antigos» Estados-membros, o artigo 215.° do acto de adesão contém uma restrição à livre circulação de trabalhadores garantida pelo artigo 48.° do Tratado CEE. Nos termos dessa disposição, o artigo 48.° do Tratado CEE só é aplicável com as restrições constantes das disposições transitórias previstas nos artigos 216.° a 219.° do acto de adesão. O artigo 216.° do acto de adesão tem a seguinte redacção:
Os artigos 1.° a 6.° do referido Regulamento (CEE) n.° 1612/68 reconhecem a todos os nacionais de um Estado-membro, de acordo com o artigo 49.° do Tratado CEE, o direito de aceitar e de efectuar um trabalho assalariado num outro Estado-membro nas mesmas condições que os nacionais deste. Trata-se, noutros termos, de disposições que concretizam o princípio da igualdade de tratamento enunciado nos n.os 2 e 3 do artigo 48.° do Tratado CEE. O artigo 218.° do acto de adesão dispõe que, na medida em que certas disposições da Directiva 68/360 sejam indissociáveis das do Regulamento n.° 1612/68, cuja aplicação é adiada por força do artigo 216.° do mesmo acto de adesão, os dez «antigos» Estados-membros têm a faculdade de derrogar essas disposições, desde que tal seja necessário à aplicação do artigo 216.° O artigo 1.° da Directiva 68/360 impõe aos Estados-membros a obrigação de suprimir as restrições à deslocação e à permanência dos nacionais dos Estados-membros e seus familiares aos quais se aplica o Regulamento (CEE) n.° 1612/68. Como já foi dito, o n.° 3 do artigo 6.° da directiva contém uma aplicação concreta da referida norma no respeitante aos trabalhadores que estão ao serviço de um prestador de serviços ou que trabalhem por sua conta. |
A primeira e a segunda questão prejudicial
6. |
E com base nas disposições do acto de adesão que foram citadas no número anterior que o ONI opôs à Rush as referidas disposições do código do trabalho e lhe aplicou a multa prevista no artigo L 341.7 por as ter infringido. Perante o tribunal de reenvio, a sociedade Rush declarou que essa multa é incompatível com a livre circulação de serviços garantida pelos artigos 59.° a 66.° do Tratado CEE, livre circulação cuja aplicação não é limitada ou adiada pelo acto de adesão. Para resolver este diferendo, o tribunal de reenvio apresentou ao Tribunal de Justiça três questões prejudiciais cujo texto figura no capítulo I, n.° 4, do relatório para audiência. Abordarei apenas a primeira e a segunda questões; quanto à terceira questão, que, na minha opinião, não é pertinente para a solução a dar ao presente litígio, abordá-la-ei de modo breve no n.° 23. Essencialmente, o que se pede ao Tribunal é que especifique em que medida as restrições à livre circulação dos trabalhadores resultantes do acto de adesão são oponíveis às empresas da Comunidade que pretendam ir para um dos «antigos» Estados-membros com trabalhadores de nacionalidade portuguesa a fim de aí efectuar uma prestação de serviços. O tribunal de reenvio pergunta em particular, se um «antigo» Estado-membro pode i) proibir a uma empresa da Comunidade que assegure prestações de serviços no seu território nacional que empregue pessoal português para esse efeito ou ii) subordinar essa prestação de serviços a determinadas condições, em particular à condição de a empresa contratar pessoal no local, obter autorizações de trabalho para o seu pessoal português ou pagar contribuições ao serviço de imigração. As questões do tribunal de reenvio respeitam literalmente ao direito de prestadores de serviços portugueses introduzirem trabalhadores portugueses num «antigo» Estado-membro. Desde já sublinho que a solução dada pelo direito comunitário não pode diferir consoante os prestadores de serviços sejam originários de Portugal ou de um outro Estado-membro da Comunidade, uma vez que o acto de adesão não formula qualquer restrição à aplicação dos artigos 59.° a 66.° do Tratado CEE, limitando as disposições referidas do acto de adesão apenas o direito de residência de trabalhadores portugueses, seja qual for o seu empregador. |
7. |
A minha exposição está construída segundo a seguinte estrutura. Na primeira parte, recordarei a jurisprudência do Tribunal que especifica o alcance das normas do Tratado relativas à livre circulação de serviços e darei especial atenção à situação jurídica dos prestadores de serviços que se deslocam para o local em que a prestação dos serviços deve ser efectuada com pessoal que não pode invocar a livre circulação de trabalhadores (n.os 8 a 11). É necessário comentar de modo breve essa jurisprudência, que também foi invocada pelas partes no processo principal, porque dá o contexto em que se situa o presente litígio. Na segunda parte, que é a mais importante, examinarei as repercussões que os artigos 216.° e seguintes do acto de adesão têm sobre esse «direito comum» (n.os 12 a 18). Numa terceira parte, tirarei as conclusões dessa apreciação no respeitante ao poder dos «antigos» Estados-membros imporem uma multa administrativa (n.os 19 a 21). Por último, tomarei posição sobre a questão de saber se um Estado-membro pode exigir de um empregador prestador de serviços uma contribuição pela emissão de uma autorização de trabalho ou de residência (n.° 22). |
O acervo comunitário em matéria de livre circulação de serviços
8. |
Em primeiro lugar, é necessário observar que as disposições do direito francês em causa não fazem qualquer discriminação (formal) em relação aos prestadores de serviços que não tenham a nacionalidade francesa. Com efeito, as referidas disposições prevêem uma multa administrativa para todos os empregadores que empreguem em França trabalhadores que não possuam uma autorização de residência. A sanção aplica-se, assim, de modo idêntico, quer se trate de empregadores fornecedores de serviços de nacionalidade francesa ou de empregadores fornecedores de serviços não tendo a nacionalidade francesa. No entanto, o Tribunal precisou que uma disposição legal nacional, à primeira vista não discriminatória, que visa habitualmente uma actividade permanente das empresas estabelecidas no Estado-membro em questão não pode ser sempre aplicada integralmente às actividades temporárias exercidas nesse Estado-membro por empresas estabelecidas noutros Estados-membros. Foi assim que, no acórdão Webb, o Tribunal considerou (ao fazer referência ao acórdão Van Wesemael ( 3 ) que tinha proferido anteriormente) que: «... a livre prestação de serviços, enquanto princípio fundamental no Tratado, só pode ser limitada por regulamentações justificadas pelo interesse geral e incumbindo a qualquer pessoa ou empresa que exerça uma actividade no território do referido Estado, na medida em que esse interesse näo seja salvaguardado pelas normas às quais o prestador está sujeito no Estado-membro em que está estabelecido ( 4 ) (tradução provisória). Num acórdão posterior, o Tribunal acrescentou que a restrição instaurada por uma regulamentação nacional deve ser objectivamente necessária para assegurar a protecção de um interesse aceitável de um ponto de vista comunitário ( 5 ). No acórdão Webb, o Tribunal declarou ainda que a aplicação de medidas nacionais, mesmo quando sejam inspiradas pelo interesse geral e quando forem, à primeira vista, de aplicação geral, não pode aplicar-se simultaneamente com as regras em vigor no Estado de estabelecimento. O Tribunal pretendia deste modo evitar as discriminações disfarçadas dos prestadores de serviços originários de outros Estados-membros em relação aos prestadores de serviços nacionais ( 6 ). E interessante observar que, no mesmo dia, o Tribunal também decidiu o processo Frans-Nederlandse Maatschappij voor Biologische Producten e extraiu um princípio anàlogo no respeitante à livre circulação das mercadorias: os Estados-membros não podem impor inutilmente a um importador de mercadorias a repetição de análises técnicas ou químicas quando essas análises foram já efectuadas num outro Estado-membro ( 7 ). |
9. |
Os princípios enunciados no acórdão Webb foram precisados no acórdão Seco proferido em 1982 ( 8 ). Os factos em causa nesse processo têm uma certa analogia com os que estão em causa no presente processo. O litígio no processo Seco era relativo aos seguintes factos: empresas francesas tinham efectuado diversos trabalhos no Grão-Ducado do Luxemburgo e tinham, para o efeito, deslocado temporariamente operários não nacionais de um Estado-membro. Durante a realização dos trabalhos no Luxemburgo, esses operários eram obrigatoriamente inscritos na segurança social francesa. O litígio respeitava às disposições de direito luxemburguês que, em caso de trabalhos temporários efectuados no território luxemburguês, impunham ao empregador dos trabalhadores estrangeiros o pagamento da parte patronal das quotizações sociais de segurança, de velhice e invalidez que lhes compete pessoalmente sem que, no entanto, essas quotizações dêem direito a um benefício social para os trabalhadores em questão ( 9 ). A questão que então se punha era a de saber se essa regulamentação era compatível com o direito comunitário, tendo em consideração, nomeadamente, o facto de essas normas neutralizarem as vantagens económicas que o empregador podia tirar do não respeito da regulamentação relativa ao salário mínimo no Estado em que o serviço é prestado. |
10. |
No seu acórdão, o Tribunal reafirmou o princípio, já enunciado no acórdão Webb, que as disposições do Tratado em matéria de livre circulação dos serviços proíbem não somente as discriminações claras baseadas na nacionalidade do fornecedor de serviço mas também todas as formas dissimuladas de discriminação que, embora baseadas em critérios aparentemente neutros, conduzem, de facto, ao mesmo resultado ( 10 ). O Tribunal declarou em seguida: «Tal é o caso ... quando a obrigação de pagar a parte patronal das quotizações de segurança social, imposta aos prestadores estabelecidos no território nacional, é extensiva aos empregadores estabelecidos num outro Estado-membro e já devedores de quotizações similares relativamente aos mesmos trabalhadores e em relação aos mesmos períodos de actividade, por força da legislação desse Estado. Com efeito, nessas condições, a regulamentação do Estado em que se efectue a prestação revela-se economicamente como um encargo suplementar para os empregadores estabelecidos num outro Estado-membro, os quais, de facto, são mais onerados do que os prestadores estabelecidos no território nacional» ( 11 ). O Tribunal declarou ainda que, embora o Estado-membro seja livre de recusar totalmente aos trabalhadores nacionais de países terceiros tanto a entrada no seu território como o exercício de uma actividade assalariada, não pode utilizar esse poder para impor um encargo discriminatório a um fornecedor de serviços originário de um outro Estado-membro ( 12 ). |
11. |
Verifica-se uma certa similitude entre a situação no processo Seco e a que agora está em causa. Também no presente processo se trata de saber qual a competência que os Estados-membros (na ocorrência os «antigos» Estados-membros) têm quanto à adopção de medidas relativas à execução de um trabalho assalariado que constituem um entrave à prestação de serviços por uma empresa que utiliza pessoal que não pode invocar a livre circulação de trabalhadores. O critério enunciado no acórdão Seco a este respeito é o de que a aplicação de uma regulamentação nacional, à primeira vista geral, não pode conduzir a uma discriminação disfarçada dos fornecedores de serviços estabelecidos num outro Esţado-membro. No processo Seco tratava-se de uma discriminação desse tipo porque a obrigação de os empregadores estabelecidos num outro Estado-membro pagarem uma quotização patronal para os trabalhadores em relação aos quais tinham já sido pagas quotizações no Estado-membro de estabelecimento constituía, para esses empregadores, um encargo mais pesado do que o encargo incumbindo aos seus concorrentes estabelecidos no território nacional que só estavam, efectivamente, sujeitos a quotizações para um único Estado-membro. No entanto, essa não é a situação de que se trata no presente processo: as normas do tipo das disposições francesas em causa não são «aplicadas concomitantemente» com as quotizações já pagas no Estado-membro de origem ou com condições já preenchidas nesse Estado; enquanto tais, não ocasionam, assim, para os fornecedores de serviços estrangeiros uma desvantagem concorrencial em relação aos fornecedores de serviços franceses. Esta distinção não retira nada à validade do princípio invocado mais acima que foi baseado na jurisprudência do Tribunal em matéria de livre circulação de serviços: qualquer restrição a esta liberdade deve ser justificada de um interesse geral e deve ser necessaria para assegurar a protecção dos interesses que visa. Além disso, os Estados-membros não podem utilizar a sua competência em matéria de imigração e de acesso ao trabalho assalariado para impor um encargo discriminatório a um fornecedor de serviços estabelecido num outro Estado-membro. Por outro lado, também no respeitante às outras liberdades garantidas pelo Tratado, admite-se que os Estados-membros conservam uma determinada competência regulamentar e repressiva, mas a aplicação de medidas nacionais adoptadas por força dessa competência não pode destruir uma liberdade garantida pelo Tratado ou dificultá-la sem necessidade ( 13 ). E nesta perspectiva de um respeito tão grande quanto possível de uma liberdade garantida pelo Tratado que iremos examinar agora que medidas os «antigos» Estados-membros podem, sem infringir o acto de adesão, aplicar em relação a fornecedores de serviços estabelecidos num outro Estado-membro. |
Influência do acto de adesão na livre circulação de serviços
12. |
Como já o referimos anteriormente (no n.° 5), o acto de adesão autoriza até 1993 os «antigos» Estados-membros a manter as normas nacionais que sujeitam a uma autorização prévia a imigração de nacionais portugueses, bem como o seu acesso ao trabalho assalariado. Para este efeito, mantêm o poder de recusar aos trabalhadores portugueses a autorização de residência prevista pela Directiva 68/360. Parece-nos evidente que um sistema de autorização prévia de residência só pode funcionar de modo eficaz quando o respeito desse esquema for igualmente imposto aos empregadores de nacionais portugueses, independentemente de se tratar de empregadores «nacionais» ou de empregadores nacionais de um outro Estado-membro. Na maior parte dos casos, efectivamente, é o empregador que solicitará a autorização de residência. Além disso, parece evidente que é a pedido do seu empregador que a maior parte dos trabalhadores empregados por um fornecedor de serviços que opera num outro Estado-membro vêm trabalhar para esse Estado-membro. Qual é a razão de ser dos artigos 216.° e seguintes do acto de adesão? Na jurisprudência do Tribunal, são interpretados como uma derrogação (de interpretação estrita) à livre circulação dos trabalhadores (portugueses) destinada a evitar perturbações nos mercados do emprego dos «antigos» Estados-membros devidas a uma chegada massiva de portugueses solicitando empregos ( 14 ). Foi para esse fim que o acto de adesão introduziu um período transitório no decurso do qual a deslocação de mão-de-obra é limitada. Trata-se agora de precisar o modo de conceber a interacção entre, por um lado, o princípio da livre circulação de serviços que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal que recordámos anteriormente, só pode ser restringida na medida estritamente necessária e, por outro, as medidas que podem ser adoptadas pelos «antigos» Estados-membros com base nas disposições do acto de adesão que o Tribunal declarou que eram de interpretação estrita. Antes de expor a minha própria opinião a este respeito, vamos examinar em primeiro lugar, as opiniões que foram defendidas perante o Tribunal. Há um aspecto que obteve o consenso geral: interpretar o acto de adesão no sentido de que os Estados-membros conservariam o poder discricionário de recusar uma autorização de residência a todos os trabalhadores portugueses empregados por um fornecedor de serviços e poderiam, assim, obrigá-lo a trabalhar apenas com a mão-de-obra originária dos «antigos» Estados-membros, equivaleria a suprimir a livre circulação de serviços em relação às prestações de serviços que impliquem a migração de trabalhadores. As restrições inseridas no acto de adesão não são, deste modo, oponíveis a uma determinada categoria de trabalhadores portugueses. E quando se trata de precisar essa categoria que as opiniões divergem fortemente. |
13. |
A posição mais radical a favor da livre circulação de serviços aparece nas observações apresentadas pela Rush. Com efeito, esta afirma que as disposições em causa do acto de adesão não contêm a menor restrição à contratação e ao emprego de nacionais portugueses por um fornecedor de serviços. Chega a essa conclusão após o seguinte raciocínio. A presença em França dos assalariados portugueses da Rush é perfeitamente estranha à aplicação do artigo 48.° do Tratado CEE: eles não procuraram trabalho em França e não tiveram acesso ao mercado do trabalho francês. Tendo um emprego em Portugal, vieram para França no âmbito desse emprego para aí efectuarem trabalhos — ao serviço da Rush — sem, todavia, pretenderem beneficiar do direito de residir em França como trabalhadores por tempo indeterminado. As suas relações de trabalho relevam do direito português. O seu salário foi recebido em Portugal, onde pagaram os seus impostos e continuam sujeitos ao regime português da segurança social. De todos estes elementos, a Rush conclui que esses trabalhadores não devem ser considerados «trabalhadores» na acepção do Regulamento (CEE) n.° 1612/68, de modo que as disposições do acto de adesão relativas aos trabalhadores portugueses não são aplicáveis. |
14. |
Este argumento deve ser rejeitado. Todavia, o Tribunal declarou com insistência que a noção comunitártia de «trabalhador» tem um conteúdo lato e refere-se a qualquer nacional de um Estado-membro que efectue um trabalho assalariado real e efectivo no território de um outro Estado-membro ( 15 ). Que este trabalho seja efectuado ao serviço de uma empresa que opera num outro Estado-membro ou ao serviço de uma empresa estabelecida no Estado-membro em que o trabalhador é contratado não tem qualquer incidência sobre essa noção. E nesta ordem de ideias que o preâmbulo do Regulamento (CEE) n.c 1612/68 dispõe que «é conveniente afirmar o direito de todos os trabalhadores dos Estados-membros de exercerem a actividade de sua escolha na Comunidade ... Este direito deve ser reconhecido indiferentemente aos trabalhadores «permanentes», sazonais, fronteiriços ou àqueles que exerçam a sua actividade aquando de uma prestação de serviços». Deste modo não há dúvidas de que as normas do Regulamento (CEE) n.° 1612/68 visam também proteger os trabalhadores de um fornecedor de serviços como a Rush. No entanto, como já foi dito, as normas relativas ao direito de os trabalhadores portugueses aceitarem ou efectuarem um trabalho assalariado no território de um dos «antigos» Estados-membros são suspensas até 1993 pelo artigo 216.° do acto de adesão (ver n.° 5). Assim, o artigo 216.° fundamenta-se na mesma noção, lata, de «trabalhador» do artigo 48.° do Tratado CEE. |
15. |
A interpretação mais restrita da livre circulação dos serviços aparece nas observações do Governo francês. Só exclui do âmbito de aplicação do acto de adesão os trabalhadores de um fornecedor de serviços que ocupem um «lugar de confiança» na empresa, porque equipara essas pessoas ao próprio fornecedor de serviços. Essas pessoas teriam nesse caso, pelo menos é assim que entendemos o raciocínio do Governo francês, um direito de residência enquanto fornecedor de serviços nos termos da Directiva 73/148/CEE ( 16 ). Segundo o Governo francês, trata-se apenas de uma categoria muito restrita de pessoas, isto é, as pessoas encarregadas de uma das funções características da dos dirigentes de uma sociedade, susceptíveis de obrigar a sociedade perante terceiros. Também não podemos concordar com essa concepção restritiva, como se mostrará a seguir quando expusermos a nossa própria opinião. Com efeito, essa concepção não reconhece de forma suficiente o princípio da livre prestação de serviços que a Rush pode invocar. |
16. |
Uma «solução mediana» é defendida pela Comissão que exceptua das disposições do acto de adesão o pessoal «especializado», bem como o pessoal que ocupa um «lugar de confiança» na empresa que executa a prestação de serviços. A Comissão propõe, nomeadamente, o recurso ao «programa geral para a supressão das restrições à livre prestação de serviços» adoptado pelo Conselho em 1962 ( 17 ). O texto do título II desse programa tem a seguinte redacção: «Antes do termo do segundo ano da segunda fase do período de transição, prevê-se, a adaptação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas ... na medida em que ... sejam de natureza a perturbar a prestação de serviços por esses nacionais (dos Estados-membros) ou pelo pessoal especializado ou pessoal que ocupe um lugar de confiança acompanhando o prestador ou executando a prestação por sua conta.» Esta disposição oferece um ponto de comparação interessante com o presente processo porque é inspirada pela ideia que deve ser permitido a um fornecedor de serviços — se ele pretende poder utilizar utilmente do seu direito à livre prestação de serviços — operar com determinadas categorias de pessoal, embora esse pessoal não possa aceder à livre circulação de trabalhadores (com efeito, o programa geral atrás referido foi adoptado em 1962, quer dizer antes da implementação da livre circulação de trabalhadores efectuada nos termos dos artigos 48.° e 49.° do Tratado CEE). Certamente esta comparação não pode ser levada ao extremo, porque a disposição invocada foi adoptada numa altura em que a livre circulação de serviços também não tinha sido realizada. No presente processo, estamos, de qualquer modo, numa fase mais adiantada: a livre circulação dos serviços está já plenamente em vigor, mas esbarra com restrições que resultam de uma aplicabilidade (temporariamente) incompleta da livre circulação de trabalhadores (portugueses). |
17. |
Os criterios enunciados no programa geral indicam, apesar disso, a boa direcção. E sobre eles que irei fazer a minha apreciação. Com efeito, os mesmos são baseados na ideia, correcta na minha opinião, de que a actividade de uma empresa não pode ser considerada de uma maneira totalmente independente das pessoas que constituem o suporte da actividade da empresa. Essa consideração é válida a fortiori para o fornecedor de serviços que, em princípio, não está presente de modo permanente no Estado-membro em que a prestação de serviços é efectuada ( 18 ). As actividades da sua empresa são, assim, largamente dependentes da sua mobilidade e da sua capacidade de transpor as fronteiras nacionais. Nessa óptica, se se quiser dar um conteúdo «útil» ao direito à livre prestação dos serviços de uma empresa, é necessário que o fornecedor de serviços tenha, na minha opinião, a possibilidade de utilizar, à sua vontade, o pessoal que constitui o «nó» da sua empresa, porque isso é indispensável para o exercício eficaz da actividade da empresa. Parece-me ser esse o caso do pessoal investido de uma função dirigente na empresa ou podendo ser considerado como fazendo parte do pessoal de confiança da empresa. Contrariamente àquilo que afirma o Governo francês, não se trata aqui apenas de pessoas capazes de obrigar a sociedade perante terceiros. Sob a denominação «pessoal dirigente» são também abrangidos, em minha opinião, os trabalhadores que estão encarregados pela empresa de velar pelo cumprimento da prestação de serviços e que dirigem e/ou controlam a actividade da empresa perante outros membros do pessoal empregados para o seu funcionamento. Parecem-me também fazer parte da denominação «pessoal de confiança» os trabalhadores titulares de um emprego cujo exercício exija relações especiais de confiança com a empresa e/ou o empregador ( 19 ). Na medida em que a presença dessas pessoas no Estado-membro de acolhimento é exigida para a execução eficaz da prestação de serviços, esse Estado-membro não pode recusar-lhes uma autorização de residência (cuja duração de validade será eventualmente limitada à duração prevista do trabalho). Além disso, o Estado-membro de acolhimento também não pode, em nossa opinião, recusar uma autorização de residência aos trabalhadores que tenham uma especialização ou competências específicas que sejam essenciais para o cumprimento do serviço e que só possam ser contratados no mercado do trabalho dos «antigos» Estados-membros com grandes dificuldades ou despesas consideráveis. O termo «especialização» designa uma qualificação elevada ou uma qualificação pouco comum relativa a um trabalho ou a uma profissão que necessite de conhecimentos técnicos específicos ( 20 ). Essa qualificação específica pode resultar, nomeadamente, do facto de a empresa ter feito investimentos consideráveis para contratar ou formar o trabalhador em causa. Deve evidentemente ser apreciada tendo em consideração a actividade da empresa, bem como a natureza do serviço a prestar. |
18. |
A ideia que preside à interpretação acima mencionada é a de que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal que recordamos anteriormente, o direito à livre circulação de serviços (que näo é limitado pelo acto de adesão) não pode ser entendido de modo que perca o seu efeito útil por uma redução excessiva do dinamismo da empresa do fornecedor de serviços. Além disso, estou convencido que a limitação do direito à livre prestação de serviços não pode ir para além do que é necessário para preservar a razão de ser do acto de adesão. Sendo assim, uma regulamentação que permita às empresas da Comunidade chamar, para efectuar uma prestação de serviços num outro Estado-membro, pessoal com uma função dirigente ou ligada à empresa por relações de confiança e trabalhadores que disponham de qualificações especiais que sejam essenciais para o serviço a prestar e que não estejam facilmente disponíveis no mercado do trabalho local não constitui uma razão bastante para temer uma chegada considerável nem, a fortiori, uma chegada massiva de portugueses à procura de emprego que possa ocasionar perturbações no mercado do trabalho dos antigos Estados-membros. Com efeito, estes critérios aproveitarão sobretudo às empresas (no caso em preço) portuguesas que forneçam serviços e não terão, também, o efeito de abrir o potencial do mercado português do trabalho às empresas de serviços dos «antigos» Estados-membros. E verdade que a derrogação feita por meio dos critérios precedentes à proibição de princípio enunciada pelo acto de adesão é um pouco «selectiva» na medida em que beneficiará principalmente as empresas portuguesas que forneçam serviços que não exijam a deslocação de muitos trabalhadores. No entanto, esta é a consequência inevitável da opção consagrada no acto de adesão que consiste em travar a migração da mão-de-obra portuguesa durante um período de transição a fim de evitar perturbações nos mercados do trabalho dos «antigos» Estados-membros. |
Quais são as sanções permitidas?
19. |
A análise feita anteriormente dá uma resposta à questão de saber a que categorias de trabalhadores os «antigos» Estados-membros são obrigados a conceder uma autorização de residência. No entanto, resulta do processo que a Rush não solicitou uma autorização de residência para nenhum dos trabalhadores que levou para França e que os próprios trabalhadores não apresentaram qualquer pedido para esse efeito. Nessas circunstâncias, a licitude de uma multa administrativa sobre a forma de uma «contribuição especial», tal como foi aplicada pelo ONI, deve ser examinada distintamente em relação aos trabalhadores a quem não podia ser recusada autorização de residência e em relação aos trabalhadores a quem podia ser recusada. |
20. |
Em primeiro lugar, vejamos o caso dos trabalhadores a quem não podia ser recusada autorização de residência. No respeitante ao cumprimento do serviço em causa, o direito de efectuar um trabalho assalariado no lugar da prestação de serviços não pode ser recusado e eles têm, assim, direito à emissão de uma autorização de residência na acepção do n.° 3 do artigo 6.° da Directiva 68/360. O Tribunal decidiu várias vezes que a emissão dessa autorização de residência tem apenas um efeito declarativo e não pode ser equiparada a uma autorização como é prevista para os estrangeiros em geral ( 21 ). O Tribunal decidiu que as sanções ligadas ao não cumprimento das formalidades exigidas para a concessão do direito de residência de um trabalhador protegido pelo direito comunitário não podem ser mais severas do que as sanções que são aplicadas às infracções nacionais comparáveis de menor importância (condição de comparabilidade) ( 22 ). Além disso, o Tribunal declarou que não seria justificado aplicar uma sanção tão desproporcionada à gravidade da infracção que se tornasse um entrave à livre circulação de trabalhadores. Isso implica que penas como a prisão ou a expulsão não são justificadas ( 23 ). Os princípios enunciados nesses acórdãos parecem, também, poder ser transpostos para as sanções em que incorre o empregador que não solicita as autorizações (declarativas) para os trabalhadores. Daí resulta, em nossa opinião, que uma sanção como a que está em causa no processo principal não é lícita: ela visa, efectivamente, manter o poder discriminatório das autoridades nacionais de conceder ou de recusar a autorização solicitada. Seria lícito, em contrapartida, uma pena leve como a pena que o Estado-membro de acolhimento aplica aos seus próprios nacionais quando não solicitam ou não renovam o documento de identidade. |
21. |
Completamente diferente é a situação dos trabalhadores em relação aos quais o Estado-membro conserva o poder discricionário de recusar uma autorização de trabalho ou de residência. A condição de proporcionalidade invocada anteriormente não se aplica, na medida em que não podem invocar o direito à livre circulação de trabalhadores conferido e garantido pelo Tratado. Em contrapartida, é necessário respeitar o princípio segundo o qual a pena aplicada não pode ser tão desproporcionada em relação à gravidade da infracção que comprometa a livre circulação de serviços. |
Pode ser exigida uma contribuição para a emissão de uma autorização?
22. |
Como já o disse, vamos agora abordar sucintamente a questão de saber se os Estados-membros podem subordinar a concessão de uma autorização de trabalho ou de residência a nacionais portugueses ao pagamento de determinadas contribuições pelo seu empregador. E necessário fazer novamente uma distinção consoante se trate ou não de trabalhadores a quem uma autorização pode ser recusada. No respeitante aos trabalhadores que tinham direito a uma autorização de residência, pode fazer-se referência ao artigo 9.° da Directiva 68/360, que impõe aos Estados-membros a emissão dos documentos em causa quer a título gratuito quer mediante o pagamento de uma soma que não ultrapasse os impostos e taxas exigidos para a emissão dos bilhetes de identidade dos nacionais. No respeitante aos trabalhadores a quem os Estados-membros podem recusar uma autorização de residência, a emissão de uma autorização pode, em nossa opinião, ser acompanhada do pagamento de uma contribuição a cargo do empregador desses trabalhadores quando essa imposição seja cobrada indistintamente a empregadores nacionais e a empregadores de um outro Estado-membro, e quando o montante não seja exageradamente elevado em relação à sua finalidade. É evidentemente ao juiz nacional que compete aplicar esses critérios. |
A terceira questão
23. |
Através desta questão, o tribunal de reenvio deseja saber se os trabalhadores da Rush cujo emprego deu lugar à imposição de uma contribuição especial pelo ONI podem ser considerados pessoal especializado ou pessoal que ocupa um lugar de confiança na acepção do anexo do Regulamento (CEE) n.° 1612/68. Foi com bom fundamento que tanto a Rush como os governos português e francês observaram que esse anexo (bem como o n.° 3 do artigo 16.° do regulamento a que o anexo faz referência) apenas diz respeito ao funcionamento dos mecanismos intracomunitários de compensação da oferta e procura de emprego (ver artigos 15.° e 16.° do regulamento). O «mecanismo de compensação» é um processo intracomunitário de colocação que prevê a troca de informações entre os serviços competentes em matéria de emprego nos diferentes Estados-membros. As regras deste mecanismo não têm importância para a solução do presente processo. Em contrapartida, as definições que esse anexo dá das expressões «especialização» e «caracter de confiança inerente ao emprego» podem servir de fonte de inspiração para limitar as categorias de trabalhadores que uma empresa de serviços pode contratar no mercado português antes de 1993 (ver n.° 1). |
Conclusões
24. |
Proponho que o Tribunal responda às questões prejudiciais do tribunal administratif de Versalhes do seguinte modo: «Os artigos 59.° e 60.° do Tratado CEE, bem como os artigos 215.° a 218.° do acto relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa, assinado em 12 de Junho de 1985, devem ser interpretados no sentido de que um fornecedor de serviços estabelecido da Comunidade pode, para efeitos de uma prestação de serviços a efectuar noutro Estado-membro (o Estado-membro de acolhimento), fezer-se acompanhar por trabalhadores portugueses que fazem parte do pessoal dirigente da empresa ou por pessoal que com ela tenha relações de confiança particulares ou que possua qualificações especiais que sejam essenciais para a prestação de serviços a efectuar e que só com grandes dificuldades podem ser contratados no mercado de trabalho dos antigos Estados-membros, desde que a presença destes trabalhadores no Estado-membro de acolhimento seja necessária para o exercício eficaz da actividade da empresa do fornecedor de serviços. No que respeita a estes trabalhadores, o Estado-membro de acolhimento não pode sujeitar a qualquer condição a emissão de uma autorização de residência nos termos do n.° 3 do artigo 6.° da Directiva 68/360. A sanção a aplicar no caso de não ser pedido pelo empregador ou pelo trabalhador tal documento não pode ser mais severa do que as sanções aplicáveis aos nacionais por infracções ligeiras comparáveis. Em conformidade com o artigo 9.° da Directiva 68/360, o documento deve ser emitido a título gratuito ou mediante pagamento de urna soma que não seja superior aos direitos e taxas exigidos para a concessão de bilhetes de identidade aos nacionais. No que diz respeito às outras categorias de trabalhadores, os outros Estados-membros conservam, até 1 de Janeiro de 1993, o poder de subordinar a uma autorização prévia a imigração com vista a exercer uma actividade assalariada e de impor igualmente o respeito de tais regras aos fornecedores de serviços que empregam estes trabalhadores. À violação destas regras não pode, no entanto, ser aplicada uma sanção que seja de tal modo desproporcionada em relação à gravidade da infracção que comprometa a livre circulação de serviços. A concessão desta autorização pode ser acompanhada da cobrança de uma taxa a cargo do empregador destes trabalhadores quando tal taxa seja cobrada indistintamente aos empregadores nacionais e aos empregadores de um ou de outro Estado-membro, e desde que o montante não seja desmesuradamente elevado em relação à sua finalidade.» |
( *1 ) Lingua original: neerlandís.
( 1 ) Directiva do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativa ä supressão das restrições à deslocação e permanência dos trabalhadores dos Estados-membros e suas famílias na Comunidade (JO L 257, p. 13; EE 05 Fl p. 88).
( 2 ) Na continuação do texto, falarei unicamente nos trabalhadores portugueses. Sendo o texto dos artigos 55.° a 58.° do acto de adesão idèntico ao dos artigos 215.° a 218.°, a minha exposição e do mesmo modo válida em relação aos trabalhadores espanhóis.
( 3 ) Acórdão de 18 de Janeiro de 1979, Van Wesemael (110/78 e 11/78, Recueil, p. 35).
( 4 ) Acórdão de 17 de Dezembro de 1981, décimo sétimo considerando (279/80, Recueil, p. 3305); ver igualmente acórdão de 18 de Janeiro de 1979, Van Wesemael, atrás refendo, e acórdão posterior de 4 de Dezembro de 1986, Comissão/República Federal da Alemanha, em especial o vigésimo sétimo considerando do acórdão (205/84, Colect., p. 3755).
( 5 ) Ver acórdão de 4 Dezembro de 1986, Comissão/República Federal da Alemanha, atrás referido, vigésimo sétimo considerando.
( 6 ) Ver o vigésimo considerando do acórdão.
( 7 ) Ver acórdão de 17 de Dezembro de 1981, em especial os décimo terceiro ao décimo quinto considerandos (272/80, Recueil, p. 3277).
( 8 ) Acórdão de 3 de Fevereiro de 1982 (62/81 e 63/81, Recueil, p. 223).
( 9 ) Ver o terceiro considerando do acórdão. Além disso, resulta do acórdão que as referidas disposições de direito luxemburgués Unham sido adoptadas para impedir que o empregador fosse incitado a recorrer a mão-de-obra estrangeira com o fim de diminuir os seus próprios encargos sociais (ver o quarto considerando do acóraão).
( 10 ) Oitavo considerando do acórdão.
( 11 ) Nono considerando do acórdão.
( 12 ) Décimo primeiro e decimo segundo considerandos do acórdão.
( 13 ) Citemos, cm matéria de livre circulação de pessoas, o acórdão de 7 de Julho de 1976, Watson e Beimann, especialmente os dćcimo sétimo e vigésimo primeiro considerandos (118/75, Recueil, p. 1185); acórdão de 3 de Junho de 1980, Pieck (157/79, Recueil, p. 2171), bem como o acórdão de 12 de Dezembro de 1989, Messner (C-265/88, Colect., p. 4209). No respeitante à livre circulação de mercadorias, refira-se o acórdão de 11 de Novembro de 1981, Casati, especialmente vigésimo sétimo considerando (203/80, Recueil, p. 2595), bem como o acórdão de 15 de Dezembro de 1976, Donckerwolcke, especialmente os trigésimo segundo a trigésimo oitavo considerandos (41/76, Recueil, p. 1921).
( 14 ) Ver acórdão de 27 de Setembro de 1989, Lopes da Veiga, em especial o décimo considerando (9/88, Colea, p. 2989), bem como o acórdão de 23 de Março de 1983, Peskeloglou, especialmente o décimo segundo considerando (77/82, Recueil p. 1085) (este processo era relativo ä interpretação de uma disposição análoga do acto de adesão da Grécia).
( 15 ) Ver, por exemplo, acórdão de 3 de Junho de 1986, Kempf, especialmente o oitavo a dècimo quarto considerandos (139/85, Colect., p. 1741), que faz referência ao acórdlo de 23 de Março de 1982, Levin (53/81, Recueil, p. 1035).
( 16 ) Directiva do Conselho, de 21 de Maio de 1973, relativa à supressão das restrições a deslocação e i permanencia dos nacionais dos Estados-membros na Comunidade, em matéria de estabelecimento e de prestação de serviços. O artigo 4.° dessa directiva reconhece o direito de residencia aos nacionais de um outro Estado-membro que desejem efectuar uma prestação de serviços num outro Estado-membro.
( 17 ) JO 1962, p. 32; EE 06 FI p. 3.
( 18 ) Ver acórdão de 4 de Dezembro de 1986, Comissão/República Federal da Alemanha, já citado na nota 4, especialmente os decimo nono e vigésimo primeiro considerandos.
( 19 ) Essa descrição inscreve-se na linha da definição do carácter de confiança ligado ao emprego que figura no anexo do Regulamento (CEE) n.° 1612/68. O n.° 3, alínea a), do artigo 16.° deste regulamento isenta do mecanismo de compensação enunciado nos artigos 15.° c 16.° do regulamento as ofertas de emprego nominativas e ligadas ao carácter de confiança inerente ao emprego oferecido.
( 20 ) Essa discrição e igualmente inspirada pela derrogação enunciada no n.° 3 do artigo 16.° do Regulamento (CEE) n.° 1612/68 que isenta do mecanismo de compensação as ofertas de emprego nominativas e ligadas à «especialização» do emprego oferecido.
( 21 ) Ver acórdão de 3 de Julho de 1980, Pieck, especialmente os considerandos decimo primeiro a decimo terceiro (157/79, Recueil, p. 2171), que fazem referencia ao acórdão de 14 de Julho de 1977, Sagulo (8/77, Recueil, p. 1495).
( 22 ) Acórdão Pieck, citado na nou anterior, decimo quinto a decimo nono considerandos.
( 23 ) Acórdão Pieck, ja citado, ibidem; acórdão Messner, citado na nou 13, decimo quarto considerando.