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Document 52021PC0762

Proposta de DIRETIVA DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO relativa à melhoria das condições de trabalho nas plataformas digitais

COM/2021/762 final

Bruxelas, 9.12.2021

COM(2021) 762 final

2021/0414(COD)

Proposta de

DIRETIVA DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO

relativa à melhoria das condições de trabalho nas plataformas digitais

(Texto relevante para efeitos do EEE)

{SEC(2021) 581 final} - {SWD(2021) 395 final} - {SWD(2021) 396 final} - {SWD(2021) 397 final}


EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1.CONTEXTO DA PROPOSTA

Razões e objetivos da proposta

Um dos objetivos da União é promover o bem-estar dos seus povos e o desenvolvimento sustentável da Europa, com base numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social 1 . O direito de todos os trabalhadores a condições de trabalho saudáveis, seguras e dignas e o direito de informação e consulta dos trabalhadores estão consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. O Pilar Europeu dos Direitos Sociais afirma que «independentemente do tipo e da duração da relação de trabalho, os trabalhadores têm direito a um tratamento justo e equitativo em matéria de condições de trabalho» e ao «acesso à proteção social 2 ».

Nas suas orientações políticas, a presidente Ursula von der Leyen salientou que a «transformação digital introduz mudanças rápidas que afetam os nossos mercados de trabalho» e assumiu o compromisso de «analisar formas de melhorar as condições de trabalho dos trabalhadores de plataformas» 3 . A diretiva proposta cumpre esse compromisso e apoia a aplicação do Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, aprovado pelos Estados-Membros, os parceiros sociais e a sociedade civil na Cimeira Social do Porto, em maio de 2021, abordando as alterações introduzidas pela transformação digital nos mercados de trabalho.

Acelerada pela pandemia de COVID-19, a transição digital está a moldar a economia da UE e os seus mercados de trabalho. As plataformas de trabalho digitais 4 tornaram-se um elemento importante deste novo panorama social e económico. Continuaram a expandir-se na sua dimensão, estimando-se que as receitas da economia das plataformas de trabalho digitais na UE tenham crescido cerca de 500 % nos últimos cinco anos 5 . Atualmente, mais de 28 milhões de pessoas na UE trabalham em plataformas de trabalho digitais. Em 2025, prevê-se que este número atinja 43 milhões 6 . As plataformas de trabalho digitais estão presentes numa variedade de setores económicos. Algumas oferecem serviços num local físico («baseadas na localização»), como o transporte privado de passageiros, a entrega de mercadorias e os serviços de limpeza ou de prestação de cuidados. Outras operam exclusivamente em linha («baseadas na Internet») e incluem serviços como a codificação de dados, a tradução e o design. O trabalho nas plataformas digitais varia em termos de nível de competências exigido, bem como na forma como o trabalho é organizado e monitorizado pelas plataformas.

As plataformas de trabalho digitais promovem serviços inovadores e novos modelos de negócio e criam muitas oportunidades para os clientes e as empresas. Permitem conciliar eficazmente a oferta e a procura de mão de obra e obter um rendimento de subsistência ou complementar, em benefício, nomeadamente, de pessoas que enfrentam obstáculos no acesso ao mercado de trabalho, como os jovens, as pessoas com deficiência, os migrantes, as pessoas de origem racial ou étnica minoritária ou os cuidadores informais. O trabalho realizado através das plataformas digitais oferece oportunidades para criar ou alargar a base de clientes, por vezes além-fronteiras. Proporciona às empresas um acesso muito mais vasto aos consumidores, bem como a possibilidade de diversificarem as receitas e desenvolverem novas áreas de negócio, ajudando-as assim a crescer. Para os consumidores, as plataformas significam um acesso mais fácil a produtos e serviços que, de outro modo, seriam difíceis de obter, e uma oferta nova e mais variada de serviços. No entanto, ao introduzirem novas formas de organização do trabalho, as plataformas de trabalho digitais puseram em causa os direitos e obrigações estabelecidos em matéria de laboral e de proteção social.

Atualmente, estima-se que nove em cada dez plataformas ativas na UE classifiquem as pessoas que trabalham nessas plataformas como trabalhadores por conta própria 7 . A maioria dessas pessoas goza de verdadeira autonomia no seu trabalho e pode utilizar o trabalho nas plataformas digitais para desenvolver as suas atividades empresariais 8 . Esse «verdadeiro» trabalho por conta própria contribui de forma positiva para a criação de emprego, o desenvolvimento das empresas, a inovação, a acessibilidade dos serviços e a digitalização na UE.

No entanto, muitas outras são objeto de subordinação e diferentes graus de controlo por parte das plataformas de trabalho digitais em que trabalham, nomeadamente no que diz respeito aos níveis de remuneração ou às condições de trabalho. De acordo com uma estimativa, poderão existir até 5,5 milhões pessoas que trabalham em plataformas digitais incorretamente classificadas quanto ao seu estatuto profissional 9 . Estas pessoas têm maior probabilidade de enfrentar condições de trabalho precárias e um acesso inadequado à proteção social 10 . Devido à classificação incorreta, não podem beneficiar dos direitos e da proteção a que teriam direito enquanto trabalhadores por conta de outrem. Esses direitos incluem o direito a um salário mínimo, à regulamentação do tempo de trabalho, à proteção da saúde e segurança no trabalho, à igualdade de remuneração entre homens e mulheres e o direito a férias remuneradas, bem como um melhor acesso à proteção social contra os acidentes de trabalho, o desemprego, a doença e a velhice.

As plataformas de trabalho digitais utilizam sistemas automatizados para conciliar a oferta e a procura de trabalho. Embora de formas diferentes, as plataformas digitais usam esses sistemas para atribuir as tarefas, monitorizar, avaliar e tomar decisões sobre as pessoas que trabalham nas plataformas. Estas práticas são frequentemente designadas por «gestão algorítmica». A gestão algorítmica é utilizada de formas cada vez mais diversas no mercado de trabalho mais vasto, mas é claramente inerente ao modelo de negócio das plataformas de trabalho digitais. Garante maior eficiência na correspondência entre a oferta e a procura, mas tem um impacto significativo nas condições de trabalho das plataformas digitais. Além disso, a gestão algorítmica pode ocultar práticas de subordinação e controlo por parte das plataformas de trabalho digitais sobre as pessoas que executam as tarefas. A possibilidade de incorporação de preconceitos de género e discriminação na gestão algorítmica pode também acentuar as desigualdades entre homens e mulheres. É essencial compreender de que forma os algoritmos influenciam ou determinam certas decisões (como a atribuição de futuras tarefas ou prémios, a aplicação de sanções ou a eventual suspensão ou restrição de contas pessoais), dadas as implicações para o rendimento e as condições de trabalho das pessoas que trabalham nas plataformas digitais. Atualmente, porém, não existe transparência suficiente relativamente à utilização de sistemas automatizados de monitorização e de tomada de decisões, e as pessoas que trabalham nas plataformas não dispõem de mecanismos eficientes de recurso no caso de decisões tomadas ou apoiadas por tais sistemas. A gestão algorítmica é um fenómeno relativamente novo na economia das plataformas e — além das regras da UE em matéria de proteção de dados —, em grande medida, não regulamentado, que gera desafios tanto para os trabalhadores por conta de outrem como para os trabalhadores por conta própria que trabalham nas plataformas de trabalho digitais.

As dificuldades relacionadas com o controlo da aplicação e a falta de rastreabilidade e transparência, incluindo nas situações transfronteiriças, também agravam em certos casos as más condições de trabalho ou o acesso inadequado à proteção social. As autoridades nacionais nem sempre têm acesso suficiente aos dados sobre as plataformas de trabalho digitais e as pessoas que trabalham nas plataformas, como o número destas pessoas, a sua situação contratual ou o estatuto profissional, ou os termos e condições aplicados pelas plataformas. O problema da rastreabilidade coloca-se especialmente quando as plataformas operam além-fronteiras, tornando-se pouco claro onde é realizado e por quem é realizado o trabalho nas plataformas digitais. Tal dificulta, por sua vez, o controlo do cumprimento das obrigações existentes por parte das autoridades nacionais, incluindo em termos de contribuições sociais.

O objetivo geral da diretiva proposta é melhorar as condições de trabalho e os direitos sociais das pessoas que trabalham nas plataformas, tendo em vista, nomeadamente, promover condições propícias ao crescimento sustentável das plataformas de trabalho digitais na União Europeia.

Os objetivos específicos que permitirão alcançar o objetivo geral são os seguintes:

(1)garantir que as pessoas que trabalham nas plataformas tenham — ou possam obter — um estatuto profissional correto, com base na sua relação efetiva com a plataforma, e que tenham acesso aos direitos laborais e de proteção social aplicáveis;

(2)assegurar a equidade, a transparência e a responsabilização ao aplicar a gestão algorítmica no contexto do trabalho nas plataformas digitais; e

(3)melhorar a transparência, a rastreabilidade e o conhecimento dos desenvolvimentos do trabalho nas plataformas digitais, bem como o cumprimento das regras aplicáveis, para todas as pessoas que trabalham em plataformas, incluindo além-fronteiras.

O primeiro objetivo específico será alcançado através de um quadro abrangente para combater a classificação incorreta do estatuto profissional no contexto do trabalho realizado nas plataformas digitais. Este quadro inclui procedimentos adequados destinados a garantir a correta determinação do estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas, em conformidade com o princípio do primado dos factos, bem como uma presunção ilidível de relação de trabalho (com inversão do ónus da prova) para as pessoas que trabalham em plataformas digitais que controlam certos elementos da execução do trabalho. Essa presunção legal aplica-se a todos os processos judiciais e procedimentos administrativos, incluindo os iniciados pelas autoridades nacionais competentes em matéria de execução de normas laborais e de proteção social, e pode ser ilidida, mediante prova de inexistência de relação de trabalho por referência às definições nacionais. Espera-se que este quadro beneficie tanto os falsos como os verdadeiros trabalhadores por conta própria que trabalham nas plataformas de trabalho digitais. Aqueles que, em resultado da correta determinação do seu estatuto profissional, sejam reconhecidos como trabalhadores por conta de outrem beneficiarão de melhores condições de trabalho — incluindo em matéria de saúde e segurança, proteção do emprego, salários mínimos legais ou sujeitos a negociação coletiva e acesso a oportunidades de formação —, e terão acesso à proteção social de acordo com as regras nacionais. Em contrapartida, os verdadeiros trabalhadores por conta própria que trabalham através das plataformas beneficiarão indiretamente de uma maior autonomia e independência, graças a uma adaptação das práticas pelas plataformas de trabalho digitais para evitarem o risco de reclassificação. As plataformas de trabalho digitais beneficiarão igualmente de maior segurança jurídica, nomeadamente no que diz respeito a eventuais impugnações judiciais. As outras empresas do mesmo setor que concorrem com as plataformas de trabalho digitais beneficiarão das condições mais justas de concorrência em termos de custos das contribuições sociais. Os Estados-Membros beneficiarão de um aumento das receitas sob a forma de contribuições sociais e fiscais adicionais.

A diretiva proposta pretende alcançar o segundo objetivo específico de garantir a equidade, a transparência e a responsabilização na gestão algorítmica através da introdução de novos direitos materiais para as pessoas que trabalham nas plataformas. Tal inclui o direito à transparência no que diz respeito à utilização e ao funcionamento dos sistemas automatizados de monitorização e de tomada de decisões, que especifica e complementa os direitos existentes em matéria de proteção de dados pessoais. A diretiva proposta visa igualmente assegurar o controlo humano do impacto desses sistemas automatizados nas condições de trabalho, a fim de salvaguardar os direitos fundamentais dos trabalhadores e a saúde e segurança no trabalho. A fim de garantir a equidade e a responsabilização em caso de decisões importantes tomadas ou apoiadas por sistemas automatizados, a diretiva proposta prevê igualmente a criação de canais adequados para analisar e solicitar a revisão dessas decisões. Com algumas exceções, estas disposições aplicam-se a todas as pessoas que trabalham nas plataformas, incluindo os verdadeiros trabalhadores por conta própria. No que diz respeito aos trabalhadores por conta de outrem, a diretiva proposta pretende também promover o diálogo social sobre os sistemas de gestão algorítmica, introduzindo direitos coletivos em matéria de informação e consulta sobre decisões importantes relacionadas com a utilização de sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões. Consequentemente, todas as pessoas que trabalham nas plataformas e os seus representantes beneficiarão de uma maior transparência e compreensão das práticas de gestão algorítmica, e poderão aceder mais facilmente aos mecanismos de recurso contra decisões automatizadas, melhorando, desta forma, as condições de trabalho. Estes direitos têm como base e desenvolvem as salvaguardas existentes em matéria de tratamento de dados pessoais por sistemas automatizados de tomada de decisões, estabelecidos no regulamento geral sobre a proteção de dados, bem como as obrigações previstas para os prestadores e utilizadores de sistemas de inteligência artificial em matéria de transparência e de supervisão humana de certos sistemas na proposta legislativa sobre a inteligência artificial (ver pormenores mais abaixo).

Por último, são propostas medidas concretas para alcançar o terceiro objetivo de reforçar a transparência e a rastreabilidade do trabalho nas plataformas digitais, para ajudar as autoridades competentes a garantir o cumprimento dos direitos e obrigações aplicáveis em matéria de condições de trabalho e proteção social. Tal inclui a clarificação da obrigação por parte das plataformas de trabalho digitais que são empregadores de declararem o trabalho realizado nas plataformas às autoridades competentes do Estado-Membro onde o trabalho é realizado. A diretiva proposta ajudará igualmente as autoridades laborais e de proteção social a identificarem as plataformas de trabalho digitais operacionais nos respetivos Estados-Membros, permitindo-lhes aceder a informações básicas pertinentes sobre o número de pessoas que trabalham nas plataformas digitais, o seu estatuto profissional e os termos e condições de trabalho aplicáveis. Estas medidas ajudarão as autoridades a garantir o respeito dos direitos laborais e a cobrar as contribuições para a segurança social, melhorando assim as condições de trabalho das pessoas que trabalham nas plataformas digitais.

Coerência com as disposições em vigor no mesmo domínio

A fim de evitar a deterioração das práticas de emprego e das normas sociais em detrimento dos trabalhadores, a UE estabeleceu direitos laborais mínimos que são aplicáveis aos trabalhadores em todos os Estados-Membros. O acervo laboral e social da UE estabelece normas mínimas através de um certo número de instrumentos fundamentais.

Apenas os trabalhadores abrangidos pelo âmbito de aplicação específico desses instrumentos jurídicos beneficiam da proteção que proporcionam 11 . Os trabalhadores por conta própria, incluindo aqueles que trabalham nas plataformas, não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação e, regra geral, não gozam desses direitos, tornando o estatuto de trabalhador por conta de outrem na «porta de acesso» ao acervo laboral e social da UE. (A única exceção são as diretivas relativas à igualdade de tratamento, que também abrangem o trabalho por conta própria 12 porque a base jurídica é mais alargada.)

Os instrumentos jurídicos relevantes que são aplicáveis às pessoas por conta de outrem que trabalham nas plataformas digitais incluem:

A diretiva relativa a condições de trabalho transparentes e previsíveis 13 prevê medidas para proteger as condições de trabalho das pessoas com relações de trabalho atípicas. Tal inclui regras em matéria de transparência, direito à informação, períodos probatórios, emprego paralelo, previsibilidade mínima do trabalho e medidas aplicáveis ao trabalho a pedido. Estas regras mínimas são particularmente importantes para as pessoas que trabalham nas plataformas digitais, dada a sua organização e os padrões de trabalho atípicos. No entanto, embora a diretiva assegure a transparência relativamente às condições de trabalho básicas, o dever de informação dos empregadores não abrange a utilização de algoritmos no local de trabalho nem a forma como afetam os trabalhadores individuais.

A diretiva relativa à conciliação entre a vida profissional e a vida familiar dos progenitores e cuidadores 14  estabelece requisitos mínimos em matéria de licença parental, de paternidade e de cuidador, bem como regimes de trabalho flexíveis para os progenitores ou cuidadores. Complementa a diretiva relativa à segurança e à saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho 15 , que prevê um período mínimo de licença de maternidade, a par de outras medidas.

A diretiva relativa ao tempo de trabalho 16 estabelece requisitos mínimos para a organização do tempo de trabalho e define certos conceitos como «tempo de trabalho» e «períodos de descanso». Embora o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) tenha tradicionalmente interpretado o conceito de «tempo de trabalho» exigindo que o trabalhador esteja fisicamente presente num local determinado pelo empregador, em processos recentes o TJUE alargou este conceito, em especial em caso de sistema de «tempo de prevenção» (ou seja, quando o trabalhador não é obrigado a permanecer no seu local de trabalho, mas deve permanecer disponível para trabalhar sempre que solicitado pelo empregador). Em 2018, o TJUE esclareceu que o «tempo de prevenção», durante o qual estão significativamente restringidas as possibilidades de o trabalhador exercer outras atividades, deve ser considerado tempo de trabalho 17 .

A diretiva relativa ao trabalho temporário 18 define um quadro geral aplicável às condições de trabalho dos trabalhadores temporários. Estabelece o princípio da não discriminação, em relação às condições essenciais de trabalho e de emprego, entre os trabalhadores temporários e os trabalhadores recrutados pela empresa utilizadora. Devido à relação contratual tipicamente triangular do trabalho nas plataformas digitais, esta diretiva pode ser relevante para esta forma de trabalho. Dependendo do seu modelo de negócios e do facto de os clientes serem consumidores privados ou empresas, uma plataforma de trabalho digital pode ser considerada uma agência de trabalho temporário que coloca os seus trabalhadores em empresas utilizadoras. Em alguns casos, a própria plataforma poderá ser a empresa utilizadora que recorre aos serviços de trabalhadores colocados por agências de trabalho temporário.

A diretiva-quadro sobre a saúde e segurança no trabalho 19 estabelece princípios fundamentais destinados a promover a melhoria da saúde e da segurança no trabalho. As suas disposições garantem condições mínimas de segurança e saúde em toda a Europa. A diretiva-quadro é acompanhada de outras diretivas centradas em aspetos específicos da segurança e da saúde no trabalho.

A diretiva que estabelece um quadro geral para a informação e consulta dos trabalhadores 20 é fundamental para a promoção do diálogo social, estabelecendo um certo número de princípios mínimos, conceitos e regras em matéria de informação e consulta dos representantes dos trabalhadores, a respeitar pelas empresas nos Estados-Membros.

Uma vez adotada, a proposta de diretiva relativa a salários mínimos adequados 21 estabelecerá um quadro para melhorar a adequação dos salários mínimos e aumentar o acesso dos trabalhadores à proteção do salário mínimo.

Uma vez adotada, a proposta de diretiva relativa à transparência salarial 22 reforçará a aplicação do princípio da igualdade de remuneração por trabalho igual ou de valor igual entre homens e mulheres.

Além disso, a regulamentação relativa à coordenação dos sistemas nacionais de segurança social aplica-se tanto aos trabalhadores por conta de outrem como aos trabalhadores por conta própria que trabalham nas plataformas em situação transfronteiriça 23 .

Por último, a recomendação do Conselho relativa ao acesso à proteção social dos trabalhadores por conta de outrem e por conta própria 24 recomenda aos Estados-Membros que tanto os trabalhadores por conta de outrem como os trabalhadores por conta própria tenham acesso a uma proteção social efetiva e adequada. A recomendação abrange as prestações por desemprego, doença e cuidados de saúde, maternidade e paternidade, invalidez, velhice e sobrevivência, e acidentes de trabalho e doenças profissionais.

Coerência com as outras políticas da União

Os instrumentos da UE em vigor e propostos sobre o mercado interno e a proteção de dados contêm disposições relevantes para as operações das plataformas de trabalho digitais e para as pessoas que nelas trabalham. No entanto, nem todos os desafios identificados que estão relacionados com o trabalho nas plataformas digitais são suficientemente tratados por esses instrumentos jurídicos. Embora a gestão algorítmica seja considerada em determinados aspetos, não é abordada especificamente a perspetiva dos trabalhadores nem as especificidades do mercado de trabalho ou os direitos laborais coletivos.

Os instrumentos pertinentes da UE sobre o mercado interno e a proteção de dados incluem:

O regulamento relativo à promoção da equidade e da transparência para os utilizadores profissionais de serviços de intermediação em linha (ou «regulamento sobre os serviços de intermediação em linha») 25 visa garantir que os «utilizadores profissionais» independentes de serviços de intermediação em linha de uma plataforma sejam tratados de forma transparente e justa e que tenham acesso a mecanismos eficazes de recurso em caso de litígio. As disposições relevantes incidem, nomeadamente, na transparência dos termos e condições aplicáveis aos «utilizadores profissionais», nas garantias processuais em caso de restrição, suspensão e encerramento de contas pessoais, na transparência dos sistemas de classificação e nos mecanismos de tratamento de reclamações. Estas questões estão relacionadas com a gestão algorítmica, mas o regulamento não abrange outros aspetos fundamentais, como a transparência dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões (para além da classificação/notação), o controlo humano desses sistemas e os direitos específicos de revisão de decisões significativas que afetem as condições de trabalho. O regulamento não se aplica aos trabalhadores por conta de outrem nem às plataformas de trabalho digitais relativamente às quais, em resultado de uma avaliação global, se estabeleça que não prestam «serviços da sociedade da informação», mas outros, como os serviços de transporte.

O regulamento geral sobre a proteção de dados (RGPD) 26 estabelece regras para a proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos seus dados pessoais. Concede às pessoas que trabalham nas plataformas um conjunto de direitos relacionados com os seus dados pessoais, independentemente do seu estatuto profissional. Esses direitos incluem, em especial, o direito de não ser objeto de decisões baseadas unicamente no tratamento automatizado que produzam efeitos jurídicos relativamente ao titular dos dados ou que o afetem de modo significativo de forma similar (com algumas exceções), bem como o direito à transparência sobre a utilização de decisões automatizadas. Nos casos excecionais em que o tratamento automatizado é permitido, o responsável pelo tratamento deve tomar medidas adequadas para salvaguardar os direitos e liberdades e os legítimos interesses do titular dos dados, a saber, pelo menos, o direito à intervenção humana por parte do responsável pelo tratamento, a manifestar a sua opinião e a contestar a decisão. Embora estes direitos sejam particularmente relevantes para as pessoas que trabalham nas plataformas que estão sujeitas à gestão algorítmica, alguns processos judiciais recentes revelaram as limitações e dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores (e sobretudo pelas pessoas que trabalham nas plataformas) ao procurarem defender os seus direitos relativos à proteção de dados no contexto da gestão algorítmica 27 . É sobretudo difícil distinguir entre decisões algorítmicas que afetam ou não afetam os trabalhadores de forma suficientemente «significativa». Além disso, embora o RGPD conceda direitos individuais às pessoas afetadas, não considera aspetos coletivos importantes inerentes ao direito do trabalho, incluindo o papel dos representantes dos trabalhadores, o direito de informação e consulta dos trabalhadores e o papel dos serviços de inspeção do trabalho no cumprimento dos direitos laborais. Por conseguinte, o legislador previu a possibilidade de adotar regras mais específicas para assegurar a proteção dos dados pessoais dos trabalhadores no contexto do trabalho por conta de outrem, incluindo para efeitos de organização do trabalho (artigo 88.º do RGPD).

Uma vez adotada, a legislação proposta sobre a inteligência artificial 28 eliminará os riscos associados à utilização de certos sistemas de inteligência artificial. A referida legislação visa garantir que os sistemas de inteligência artificial disponibilizados no mercado e utilizados na UE sejam seguros e respeitem os direitos fundamentais, como o princípio da igualdade de tratamento. Considera as questões relacionadas com o desenvolvimento, a implementação, a utilização e a supervisão regulatória dos sistemas de inteligência artificial e procura responder aos desafios que lhes são inerentes, como os preconceitos (incluindo os preconceitos de género) e a falta de responsabilização, nomeadamente através de obrigações para garantir a elevada qualidade dos dados, que ajudarão a combater o risco de discriminação. A regulamentação proposta no domínio da inteligência artificial identifica os sistemas de inteligência artificial utilizados nas práticas de emprego, gestão dos trabalhadores e acesso ao trabalho por conta própria que devem ser considerados de alto risco. Impõe requisitos obrigatórios aos sistemas de inteligência artificial de alto risco, bem como obrigações para os fornecedores e utilizadores destes sistemas. A legislação proposta no mesmo domínio prevê requisitos específicos em matéria de transparência para certos sistemas de inteligência artificial e garantirá que as plataformas de trabalho digitais, enquanto utilizadores de sistemas de inteligência artificial de alto risco, tenham acesso às informações necessárias para utilizarem os sistemas de forma lícita e responsável. Sempre que as plataformas de trabalho digitais sejam fornecedores de sistemas de inteligência artificial de alto risco, terão de testar e documentar adequadamente esses sistemas. Além disso, a referida legislação exige que os fornecedores de sistemas de inteligência artificial permitam a supervisão humana e forneçam instruções nesse sentido. Ao garantir a transparência e a rastreabilidade dos sistemas de inteligência artificial de alto risco, a legislação proposta neste domínio procura facilitar a aplicação das regras em vigor em matéria de proteção dos direitos fundamentais, sempre que esses sistemas sejam utilizados. No entanto, não tem em conta a diversidade de regras existentes sobre as condições de trabalho nos diferentes Estados-Membros e setores nem prevê salvaguardas relacionadas com o respeito das condições de trabalho para as pessoas diretamente afetadas pela utilização dos sistemas de inteligência artificial, como os trabalhadores.

2.BASE JURÍDICA, SUBSIDIARIEDADE E PROPORCIONALIDADE

Base jurídica

A diretiva proposta baseia-se no artigo 153.º, n.º 1, alínea b), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que confere à União o poder de apoiar e complementar a ação dos Estados-Membros com vista a melhorar as condições de trabalho. Neste domínio, o artigo 153.º, n.º 2, alínea b), do TFUE autoriza o Parlamento Europeu e o Conselho a adotarem, de acordo com o processo legislativo ordinário, e por meio de diretivas, prescrições mínimas progressivamente aplicáveis, tendo em conta as condições e as regulamentações técnicas existentes em cada um dos Estados-Membros. Essas diretivas devem evitar impor restrições administrativas, financeiras e jurídicas contrárias à criação e ao desenvolvimento de pequenas e médias empresas.

A referida base jurídica permite à União estabelecer normas mínimas no que diz respeito às condições de trabalho das pessoas que trabalham nas plataformas, quando se encontram numa relação de trabalho e, por conseguinte, são classificadas como «trabalhadores». Nesta perspetiva, o TJUE deliberou que a qualificação de «trabalhador independente», à luz do direito nacional, não exclui que uma pessoa deva ser qualificada de «trabalhador», na aceção do direito da UE, se a sua independência for meramente fictícia, ou seja, quando oculte uma relação de trabalho 29 . Por conseguinte, os falsos trabalhadores por conta própria estão também abrangidos pela legislação laboral da UE baseada no artigo 153.º do TFUE.

A diretiva proposta tem igualmente por base o artigo 16.º, n.º 2, do TFUE, na medida em que abrange a situação das pessoas que trabalham na plataformas digitais no que diz respeito à proteção de dados pessoais tratados por sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões. Este artigo habilita o Parlamento Europeu e o Conselho a estabelecerem normas relativas à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais.

Subsidiariedade (no caso de competência não exclusiva)

A flexibilidade e a adaptação constante dos modelos de negócio são características fundamentais da economia das plataformas, cujos principais meios de produção são os algoritmos, os dados e a computação em nuvem. Uma vez que não dependem de ativos fixos e instalações físicas, as plataformas de trabalho digitais podem facilmente circular e operar além-fronteiras, rapidamente iniciando as suas operações em determinados mercados, por vezes encerrando por razões comerciais ou regulamentares, e reabrindo noutro país com regras mais flexíveis.

Embora os Estados-Membros operem num mercado único, adotaram abordagens diferentes quanto à questão de regulamentar ou não o trabalho nas plataformas digitais, e suas modalidades. Foram adotadas mais de 100 decisões judiciais e 15 decisões administrativas nos Estados-Membros sobre o estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas, com resultados variáveis, mas predominantemente a favor da reclassificação destas pessoas como trabalhadores por conta de outrem 30 . Além da insegurança jurídica que tal implica para as plataformas de trabalho digitais e para as pessoas que nelas trabalham, o elevado número de processos judiciais mostra a dificuldade de manter condições justas de concorrência entre os Estados-Membros, e entre as plataformas de trabalho digitais e as outras empresas, e também de evitar um efeito de degradação das normas laborais e das condições de trabalho. Certas plataformas de trabalho digitais podem adotar práticas comerciais injustas para as outras empresas, por exemplo, não cumprindo as mesmas regras e não funcionando nas mesmas condições. Por conseguinte, é necessária uma ação da UE para garantir que a economia altamente móvel e em rápida evolução das plataformas digitais se desenvolva paralelamente aos direitos laborais das pessoas que trabalham nas plataformas.

As plataformas de trabalho digitais estão frequentemente localizadas num determinado país, mas operam através de pessoas situadas noutro país. 59 % de todas as pessoas que trabalham em plataformas na UE têm clientes localizados noutro país 31 . Isto aumenta a complexidade das relações contratuais. As condições de trabalho e a cobertura da proteção social das pessoas que executam trabalho transfronteiriço nas plataformas digitais são também incertas e dependem fortemente do seu estatuto profissional. Muitas vezes, as autoridades nacionais (como os serviços de inspeção do trabalho, as instituições de proteção social e as autoridades fiscais) não sabem quais as plataformas de trabalho digitais ativas no seu país, quantas pessoas trabalham nessas plataformas e sob que estatuto profissional é executado o trabalho. Os riscos de incumprimento das regras aplicáveis e os obstáculos à eliminação do trabalho não declarado são mais elevados em situações transfronteiriças, em especial quando o trabalho é realizado através das plataformas digitais. Neste contexto, afigura-se mais adequado que as ações pertinentes para responder aos desafios transfronteiriços do trabalho nas plataformas digitais, incluindo a insuficiência dos dados necessários para garantir uma melhor aplicação das regras, sejam adotadas a nível da UE.

A ação isolada dos Estados-Membros não permite alcançar os objetivos fundamentais da UE, baseados no Tratado, de promover um crescimento económico sustentável e o progresso social, uma vez que os Estados-Membros poderão hesitar em adotar regras mais rigorosas ou aplicar estritamente as normas laborais em vigor, ao mesmo tempo que concorrem entre si para atrair o investimento das plataformas de trabalho digitais.

Só uma iniciativa da UE pode estabelecer regras comuns aplicáveis a todas as plataformas de trabalho digitais que operam na UE, evitando simultaneamente a fragmentação do mercado único, em rápido desenvolvimento, das plataformas de trabalho digitais. Tal garantirá condições justas, no que diz respeito às condições de trabalho e à gestão algorítmica, entre plataformas de trabalho digitais que operam em diferentes Estados-Membros. Por conseguinte, o valor acrescentado específico da UE reside no estabelecimento de normas mínimas nestes domínios, que promoverão uma convergência ascendente dos resultados em matéria de emprego e de proteção social em toda a União e que facilitarão o desenvolvimento da economia das plataformas digitais na UE.

Proporcionalidade

A diretiva proposta estabelece normas mínimas, garantindo assim que o grau de intervenção seja limitado ao mínimo necessário para alcançar os objetivos fixados na proposta. Os Estados-Membros que já disponham de disposições mais favoráveis do que as previstas na presente proposta de diretiva não terão de as alterar ou limitar. Os Estados-Membros podem igualmente decidir ir além das normas mínimas estabelecidas na proposta de diretiva.

O princípio de proporcionalidade foi respeitado, tendo em conta a dimensão e a natureza dos problemas identificados. Nomeadamente, a presunção ilidível proposta para resolver o problema da classificação incorreta do estatuto profissional aplicar-se-á apenas às plataformas de trabalho digitais que exerçam um certo nível de controlo sobre a execução do trabalho. As restantes plataformas de trabalho digitais não serão, por conseguinte, afetadas por esta presunção. Do mesmo modo, as disposições relativas aos sistemas automatizados de monitorização e de tomada de decisões não excedem o necessário para garantir os objetivos de equidade, transparência e responsabilização na gestão algorítmica.

Escolha do instrumento

O artigo 153.º, n.º 2, alínea b), do TFUE, em conjugação com o artigo 153.º, n.º 1, alínea b), do TFUE, determina explicitamente que podem ser utilizadas diretivas para estabelecer prescrições mínimas relacionadas com as condições de trabalho, progressivamente aplicáveis nos Estados-Membros. As regras baseadas no artigo 16.º, n.º 2, do TFUE também podem ser estabelecidas por meio de diretivas.3.RESULTADOS DAS CONSULTAS DAS PARTES INTERESSADAS E DAS AVALIAÇÕES DE IMPACTO

Consulta das partes interessadas

Em conformidade com o artigo 154.º do TFUE, a Comissão realizou uma consulta em duas fases junto dos parceiros sociais sobre uma possível ação da UE para melhorar as condições da trabalho nas plataformas digitais. Na primeira fase, entre 24 de fevereiro e 7 de abril de 2021, a Comissão consultou os parceiros sociais sobre a necessidade de uma iniciativa relativa ao trabalho nas plataformas digitais e sua possível orientação 32 . Na segunda fase, entre 15 de junho e 15 de setembro de 2021, a Comissão consultou os parceiros sociais sobre o conteúdo e o instrumento jurídico da proposta considerada 33 .

Tanto os sindicatos como as organizações patronais concordaram com os desafios gerais identificados no documento de consulta da segunda fase, mas divergiram quanto à necessidade de adotar medidas concretas a nível da UE.

Os sindicatos apelaram a uma diretiva baseada no artigo 153.º, n.º 2, do TFUE estabelecendo uma presunção ilidível de relação de trabalho com inversão do ónus da prova e um conjunto de critérios para determinar o estatuto profissional. Defenderam que esse instrumento se deveria aplicar tanto às plataformas baseadas na Internet como às plataformas baseadas na localização. Os sindicatos também apoiaram a introdução de novos direitos relacionados com a gestão algorítmica no contexto laboral e, de um modo geral, opuseram-se a um terceiro estatuto para as pessoas que trabalham nas plataformas digitais. Salientaram a necessidade de diálogo social.

As organizações patronais concordaram que há questões que devem ser abordadas, tais como as condições de trabalho, a incorreta classificação do estatuto profissional ou o acesso à informação. No entanto, devem ser tomadas medidas a nível nacional, caso a caso e no quadro dos diferentes sistemas nacionais de relações sociais e laborais. No que diz respeito à gestão algorítmica, salientaram que importa sobretudo garantir a eficiência da aplicação e do controlo da aplicação dos instrumentos jurídicos em vigor e futuros.

Não houve acordo entre os parceiros sociais para encetar negociações com vista à celebração de um acordo a nível da União, tal como previsto no artigo 155.º do TFUE.

Além disso, a Comissão procedeu a um intercâmbio com numerosas partes interessadas para recolher informações sobre esta iniciativa, incluindo reuniões específicas e bilaterais com empresas responsáveis por plataformas digitais, associações de trabalhadores das plataformas, sindicatos, representantes dos Estados-Membros, peritos do meio académico e de organizações internacionais e representantes da sociedade civil 34 . Em 20 e 21 de setembro de 2021, a Comissão realizou duas reuniões específicas com operadores de plataformas digitais e representantes dos trabalhadores das plataformas, a fim de conhecer a sua posição sobre as possíveis modalidades de ação da UE.

O Parlamento Europeu apelou 35 a uma ação enérgica da UE para combater a classificação incorreta do estatuto profissional e melhorar a transparência na utilização de algoritmos, incluindo para os representantes dos trabalhadores. O Conselho de Ministros da UE 36 , o Comité Económico e Social Europeu 37 e o Comité das Regiões 38 apelaram igualmente a uma ação específica sobre o trabalho nas plataformas digitais.

Obtenção e utilização de competências especializadas

A Comissão contratou peritos externos que elaboraram vários estudos reunindo evidência importante, que contribuiu para a elaboração da avaliação de impacto e da presente proposta:

39    PPMI (2021), «Study to support the impact assessment on improving working conditions in platform work».

CEPS (2021), «Digital labour platforms in the EU: Mapping and Business Models» 40 .

CEPS (2021), «Study to gather evidence on the working conditions of platform workers» 41 .

A Comissão baseou igualmente a sua avaliação nos estudos realizados pelo Centro Europeu de Especialização no domínio do Direito do Trabalho, Emprego e Políticas do Mercado de Trabalho (ECE).

«Thematic Review 2021 on Platform work» (2021), com base no artigos por país relativos a 27 Estados-Membros da UE 42 .

«Case Law on the Classification of Platform Workers: Cross-European Comparative Analysis and Tentative Conclusions» (2021) 43 .

«Jurisprudence of national Courts in Europe on algorithmic management at the workplace» (2021) 44 .

Além disso, a Comissão recorreu a peritos externos e utilizou os seguintes estudos e relatórios para elaborar a avaliação de impacto:

Relatórios Eurofound: «Employment and Working Conditions of Selected Types of Platform Work» (2018) 45 .

Relatórios JRC: «Platform Workers in Europe — Evidence from the COLLEEM Survey» (2018) 46 e «New evidence on platform workers in Europe — Results from the second COLLEEM survey» (2020) 47 .

Relatório OIT: «The role of digital labour platforms in transforming the world of work» (2021) 48 .

A avaliação da Comissão baseou-se igualmente na sua análise das políticas dos Estados-Membros, na literatura académica pertinente e na jurisprudência do TJUE.

Avaliação de impacto

Em 27 de outubro de 2021, a avaliação de impacto 49 foi debatida com o Comité de Controlo da Regulamentação (CCR). O CCR emitiu um parecer favorável com observações, que foram tidas em conta através de uma clarificação da coerência da avaliação de impacto com as iniciativas conexas, explicando por que motivo e de que modo as questões relacionadas com a gestão algorítmica são particularmente relevantes para a economia das plataformas digitais e considerando mais adequadamente a posição das diferentes partes interessadas, incluindo as plataformas de trabalho digitais e as pessoas que trabalham nas plataformas. A avaliação de impacto considerou que a combinação de medidas prevista na presente proposta consiste na opção mais eficaz, eficiente e coerente. A análise quantitativa e qualitativa da combinação de medidas preferida prevê uma melhoria substancial das condições de trabalho e do acesso à proteção social para as pessoas que trabalham nas plataformas digitais. As plataformas de trabalho digitais beneficiarão igualmente de maior segurança jurídica e de melhores condições para um crescimento sustentável, em consonância com o modelo social da UE. Outro efeito positivo decorre do facto de passarem a existir condições de concorrência mais justas para as outras empresas, que concorrem com as plataformas de trabalho digitais.

Em resultado das ações destinadas a eliminar o risco de classificação incorreta, entre 1,72 milhões e 4,1 milhões de pessoas deverão ser reclassificadas como trabalhadores por conta de outrem (cerca de 2,35 milhões em plataformas baseadas na localização e 1,75 milhões em plataformas baseadas na Internet, tendo em conta os valores mais elevados das estimativas). Tal permitir-lhes-á aceder aos direitos e proteção garantidos pelo acervo nacional e da UE no domínio laboral. As pessoas que atualmente auferem um salário inferior ao salário mínimo beneficiarão de um aumento anual dos rendimentos até 484 milhões de euros, uma vez que as disposições legais e/ou convenções coletivas setoriais abrangerão também estas pessoas. Tal significa um aumento médio anual de 121 EUR por trabalhador, variando entre 0 EUR (para aqueles que já recebem mais do que o salário mínimo antes da reclassificação) e 1 800 EUR (para os que auferem rendimentos inferiores ao salário mínimo). A pobreza e a precariedade no trabalho diminuirão em resultado da reclassificação e do acesso acrescido à proteção social. Consequentemente, a estabilidade e a previsibilidade dos rendimentos também melhorarão. Cerca de 3,8 milhões de pessoas verão confirmado o seu estatuto de trabalhador por conta própria e, em resultado das medidas que serão adotadas pelas plataformas para limitar o controlo e evitar a reclassificação, gozarão de maior autonomia e flexibilidade. Os novos direitos relacionados com a gestão algorítmica do trabalho nas plataformas digitais podem proporcionar melhores condições de trabalho a mais de 28 milhões de pessoas (tanto trabalhadores por conta de outrem como por conta própria), bem como uma maior transparência na utilização da inteligência artificial no local de trabalho, com efeitos positivos no mercado mais vasto dos sistemas de inteligência artificial. Além disso, a iniciativa melhorará a transparência e a rastreabilidade do trabalho nas plataformas digitais, nomeadamente em situações transfronteiriças, com efeitos positivos para as autoridades nacionais que poderão garantir mais facilmente o cumprimento das regras laborais e fiscais em vigor e melhorar a cobrança dos impostos e contribuições sociais. Neste contexto, os Estados-Membros poderão beneficiar de um aumento até 4 mil milhões de EUR em impostos e contribuições sociais por ano.

As medidas destinadas a eliminar o risco de classificação incorreta poderão originar um aumento até 4,5 mil milhões de EUR em custos anuais para as plataformas de trabalho digitais. As empresas que dependem destas plataformas e os consumidores ver-se-ão confrontados com uma parte dos custos, que dependerá da forma como as plataformas de trabalho digitais decidirem repercutir esses custos nos custos de terceiros. Os novos direitos relacionados com a gestão algorítmica e as medidas previstas para melhorar o controlo da aplicação, a transparência e a rastreabilidade terão custos insignificantes ou baixos para as plataformas de trabalho digitais. A iniciativa pode afetar negativamente a flexibilidade apreciada pelas pessoas que trabalham nestas plataformas. No entanto, essa flexibilidade, especialmente em termos de organização do horário de trabalho, pode ser já hoje apenas aparente, uma vez que o tempo de trabalho efetivo depende da procura em tempo real dos serviços, da oferta de trabalhadores e de outros fatores. Não foi possível quantificar de forma significativa as implicações em termos de alteração dos equivalentes a tempo inteiro e potenciais perdas de postos de trabalho, dado o número muito elevado de variáveis que tal cálculo implicaria (por exemplo, a evolução dos contextos regulamentares nacionais, alterações nas fontes de investimento das plataformas, a reafetação de tarefas de falsos trabalhadores por conta própria a tempo parcial para trabalhadores por conta de outrem a tempo inteiro). Para algumas pessoas que trabalham nas plataformas digitais e que atualmente auferem um salário superior ao salário mínimo, a reclassificação pode resultar num salário mais baixo, uma vez que algumas plataformas de trabalho digitais poderão compensar os custos mais elevados da proteção social através da redução dos salários.

A avaliação de impacto analisou outras medidas, nomeadamente: orientações não vinculativas sobre a forma de tratar os casos de classificação incorreta do estatuto profissional; a combinação da inversão do ónus da prova com procedimentos administrativos extrajudiciais para abordar a classificação incorreta do estatuto profissional; orientações não vinculativas em matéria de gestão algorítmica; direitos em matéria de gestão algorítmica apenas para os trabalhadores por conta de outrem; obrigações em matéria de interoperabilidade dos dados para as plataformas de trabalho digitais; criação de registos nacionais para melhorar a recolha de dados pertinentes e acompanhar a evolução do trabalho nas plataformas digitais, incluindo em situações transfronteiriças. De um modo geral, estas medidas foram consideradas menos eficientes, menos eficazes e menos coerentes com os objetivos enunciados na iniciativa, bem como com os valores globais, metas, objetivos e iniciativas atuais e próximas da UE.

Adequação da regulamentação e simplificação

A iniciativa inclui diferentes medidas, algumas das quais destinadas a reduzir os custos de conformidade para as micro, pequenas e médias empresas (PME). Embora as medidas que visam eliminar o risco de classificação incorreta não possam ser adaptadas, uma vez que dizem diretamente respeito a direitos fundamentais dos trabalhadores, os procedimentos administrativos exigidos pelas medidas relativas à gestão algorítmica e à melhoria do controlo da aplicação, da rastreabilidade e da transparência permitem adaptações para reduzir os custos das PME. Nomeadamente, será possível estabelecer prazos mais longos para responder aos pedidos de revisão de decisões algorítmicas e reduzir a frequência da atualização de informações pertinentes.

Direitos fundamentais

A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia («Carta») protege um vasto leque de direitos num contexto de emprego. Tal inclui o direito dos trabalhadores a condições de trabalho justas e equitativas (artigo 31.º), o direito à informação e consulta dos trabalhadores na empresa (artigo 27.º), o direito à proteção dos dados pessoais (artigo 8.º) e o direito à liberdade de empresa (artigo 16.º). A diretiva proposta promove os direitos consagrados na Carta no contexto laboral das plataformas digitais, ao eliminar a classificação incorreta do estatuto profissional e através de disposições específicas sobre a utilização de sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões pelas plataformas digitais. Reforça, igualmente, o direito de informação e consulta dos trabalhadores das plataformas e dos seus representantes relativamente a decisões que visem introduzir ou alterar de forma substancial a utilização de sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões.

4.INCIDÊNCIA ORÇAMENTAL

A proposta não requer recursos suplementares do orçamento da União Europeia.

5.OUTROS ELEMENTOS

Planos de execução e acompanhamento, avaliação e prestação de informações

Os Estados-Membros devem transpor a diretiva no prazo de dois anos após a sua entrada em vigor e comunicar à Comissão as medidas nacionais de execução através da base de dados MNE. Em conformidade com o artigo 153.º, n.º 3, do TFUE, podem confiar aos parceiros sociais a execução da diretiva. A Comissão prestará o apoio técnico necessário aos Estados-Membros para a aplicação da diretiva.

A Comissão avaliará a aplicação da diretiva cinco anos após a sua entrada em vigor e proporá, se for caso disso, alterações legislativas. Os progressos alcançados no cumprimento dos objetivos da iniciativa serão monitorizados através de um conjunto de indicadores (enumerados no relatório da avaliação de impacto). O quadro de monitorização será ajustado em função das obrigações jurídicas e de execução finais e do calendário definitivo.

Documentos explicativos (para as diretivas)

A diretiva proposta diz respeito ao direito do trabalho, especifica e complementa as regras em matéria de proteção de dados e contém regras substantivas e processuais. Os Estados-Membros podem utilizar diferentes instrumentos jurídicos para a sua transposição. Por conseguinte, justifica-se que os Estados-Membros façam acompanhar a notificação das suas medidas de transposição de um ou vários documentos que expliquem a relação entre as partes componentes da diretiva e as partes correspondentes dos instrumentos nacionais de transposição, em conformidade com a Declaração Política Conjunta, de 28 de Setembro de 2011, dos Estados-Membros e da Comissão sobre os Documentos Explicativos 50 .

Explicação pormenorizada das disposições específicas da proposta

Capítulo I – Disposições gerais 

Artigo 1.º – Objeto e âmbito de aplicação

Esta disposição estabelece o objetivo da diretiva, a saber, melhorar as condições de trabalho das pessoas que trabalham nas plataformas digitais, assegurando a correta determinação do seu estatuto profissional, promovendo a transparência, a equidade e a responsabilização na gestão algorítmica do trabalho nas plataformas digitais, e melhorando a transparência do trabalho nas plataformas digitais, incluindo em situações transfronteiriças.

Este artigo define igualmente o âmbito de aplicação pessoal da diretiva, que inclui as pessoas que trabalham nas plataformas digitais na União, independentemente do seu estatuto profissional, embora em diferente medida de acordo com as disposições em causa. Regra geral, a diretiva abrange as pessoas que têm um contrato de trabalho ou uma relação de trabalho, ou, com base numa apreciação dos factos, relativamente às quais se possa determinar a existência de um contrato de trabalho ou relação de trabalho, tal como definidos pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor em cada Estado-Membro, tendo em conta a jurisprudência do TJUE. A abordagem baseada na apreciação dos factos pretende incluir as situações em que o estatuto profissional da pessoa que trabalha nas plataformas não é claro, incluindo os casos de falso trabalho por conta própria, de modo a permitir a correta determinação desse estatuto.

Não obstante a regra geral, as disposições do capítulo sobre a gestão algorítmica, que estão relacionadas com o tratamento de dados pessoais e, por conseguinte, abrangidas pela base jurídica do artigo 16.º, n.º 2, do TFUE, são também aplicáveis às pessoas que trabalham em plataformas na União sem uma relação de trabalho, ou seja, aos verdadeiros trabalhadores por conta própria, e às pessoas com outro estatuto profissional que possa eventualmente existir em alguns Estados-Membros.

As plataformas de trabalho digitais abrangidas pela presente proposta são as plataformas que organizam o trabalho realizado através das plataformas na União, independentemente do seu local de estabelecimento e da legislação de outra forma aplicável. O elemento decisivo para a aplicabilidade territorial é, portanto, o local onde o trabalho da plataforma é realizado e não o local onde a plataforma de trabalho digital está estabelecida ou onde o serviço é oferecido ou prestado ao destinatário.

Artigo 2.º – Definições

Esta disposição define um certo número de termos e conceitos que são necessários para interpretar as disposições da diretiva, como «plataforma de trabalho digital», «trabalho na plataforma digital» e «representantes». Distingue entre «pessoa que trabalha na plataforma» (independentemente do seu estatuto profissional) e «trabalhador da plataforma» (que têm uma relação de trabalho).

Capítulo II — Estatuto profissional

Artigo 3.º — Determinação correta do estatuto profissional

Este artigo exige que os Estados-Membros adotem procedimentos adequados para verificar e assegurar a determinação correta do estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas digitais, de modo a garantir às pessoas que possam ter sido classificadas incorretamente como trabalhadores por conta própria (ou qualquer outro estatuto) a possibilidade de determinarem se estão ou não abrangidas por uma relação de trabalho — em conformidade com as definições nacionais — e, em caso afirmativo, de serem reclassificadas como trabalhadores por conta de outrem. Tal permitirá aos falsos trabalhadores por conta própria aceder às condições de trabalho garantidas na legislação da União ou nacional, de acordo com o seu estatuto profissional correto.

A disposição clarifica igualmente que a correta determinação do estatuto profissional deve basear-se no princípio do primado dos factos — ou seja, orientar-se principalmente pelos factos relativos à execução efetiva do trabalho e à remuneração, tendo em conta a utilização de algoritmos no contexto do trabalho nas plataformas digitais —, e não na forma como a relação é definida no contrato. Sempre que exista uma relação de trabalho, os procedimentos adotados devem também identificar claramente quem assume as obrigações do empregador.

Artigo 4.º — Presunção legal

Esta disposição estabelece uma presunção legal de existência de relação de trabalho entre a plataforma de trabalho digital e a pessoa trabalha na plataforma, se a plataforma de trabalho digital controlar determinados elementos da execução do trabalho. Os Estados-Membros deverão estabelecer um quadro que permita garantir que a presunção legal é aplicável em todos os processos judiciais e procedimentos administrativos relevantes e que as autoridades responsáveis pela execução das leis, como os serviços de inspeção do trabalho ou os organismos de proteção social, também podem invocar essa presunção.

O artigo define critérios que determinam se a plataforma de trabalho digital controla ou não a execução do trabalho. Para que a presunção seja aplicável, devem estar reunidos, pelo menos, dois critérios.

Os Estados-Membros deverão igualmente garantir a aplicação efetiva da presunção legal através de medidas de apoio, como a divulgação de informações ao público, a definição de orientações e o reforço dos controlos e inspeções no terreno, que são essenciais para garantir a segurança jurídica e a transparência a todas as partes envolvidas.

A disposição clarifica igualmente que a presunção legal não deve ter efeitos retroativos, ou seja, não deve ser aplicável a situações factuais anteriores ao prazo de transposição da diretiva.

Artigo 5.º — Ilidibilidade da presunção legal

Esta disposição garante a possibilidade de ilidir a presunção legal nos processos judiciais e procedimentos administrativos pertinentes, ou seja, a possibilidade de provar que a relação contratual em causa não é, de facto, uma «relação de trabalho», de acordo com a definição em vigor no Estado-Membro em causa. O ónus da prova de inexistência de relação de trabalho recai sobre a plataforma de trabalho digital.

Capítulo III — Gestão algorítmica

Artigo 6.º — Transparência e utilização de sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões

Esta disposição exige que as plataformas de trabalho digitais informem os trabalhadores das plataformas sobre a utilização e as principais características dos sistemas automatizados de monitorização — utilizados para monitorizar, supervisionar ou avaliar a execução do trabalho pelos trabalhadores das plataformas através de meios eletrónicos — e dos sistemas automatizados de tomada de decisões — utilizados para tomar ou apoiar decisões que afetem significativamente as condições de trabalho dos trabalhadores das plataformas.

As informações a fornecer incluem as categorias de ações monitorizadas, supervisionadas e avaliadas (incluindo pelos clientes), e os principais parâmetros utilizados por esses sistemas nas decisões automatizadas. O artigo especifica de que forma e em que momento essa informação deve ser fornecida e exige a sua disponibilização às autoridades do trabalho e aos representantes dos trabalhadores das plataformas, quando solicitada.

Além disso, o artigo estabelece que as plataformas de trabalho digitais não podem tratar dados pessoais dos trabalhadores das plataformas que não estejam intrinsecamente relacionados com e que não sejam estritamente necessários para a execução dos respetivos contratos. Tal inclui os dados sobre conversas privadas, sobre o estado de saúde, psicológico ou emocional dos trabalhadores das plataformas e o tratamento de quaisquer dados pessoais fora dos períodos de trabalho na plataforma.

Artigo 7.º — Controlo humano dos sistemas automatizados

Esta disposição exige que as plataformas de trabalho digitais monitorizem e avaliem regularmente o impacto nas condições de trabalho das decisões individuais tomadas ou apoiadas por sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões. Em especial, as plataformas de trabalho digitais terão de avaliar os riscos dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões para a segurança e a saúde dos trabalhadores das plataformas e garantir que esses sistemas não exercem pressões indevidas sobre os seus trabalhadores nem colocam de outro modo em risco a sua saúde física e mental.

O artigo exige igualmente que as plataformas de trabalho digitais garantam recursos humanos suficientes para controlar os sistemas automatizados. As pessoas encarregadas desse controlo pela plataforma de trabalho digital devem dispor da competência, formação e autoridade necessárias para exercer essa função, e devem ser protegidas contra consequências desfavoráveis (como o despedimento ou outras sanções) que resultem da anulação de decisões automatizadas.

Artigo 8.º — Revisão humana de decisões importantes

Esta disposição salvaguarda o direito de os trabalhadores das plataformas obterem uma explicação da plataforma de trabalho digital sobre decisões tomadas ou apoiadas por sistemas automatizados que afetem significativamente as suas condições de trabalho. Para o efeito, a plataforma de trabalho digital deve permitir que os seus trabalhadores analisem e clarifiquem os factos, as circunstâncias e os motivos das decisões tomadas, assistidos por uma pessoa de contacto da plataforma.

Além disso, o artigo exige que as plataformas de trabalho digitais exponham por escrito os motivos de qualquer decisão de restringir, suspender ou encerrar contas pessoais dos trabalhadores da plataforma, ou de recusar a remuneração de trabalho realizado pelos seus trabalhadores, ou qualquer decisão que afete a situação contratual do trabalhador da plataforma.

Se a explicação obtida não for satisfatória ou se os trabalhadores das plataformas considerarem que os seus direitos foram violados, têm também o direito de solicitar à plataforma de trabalho digital que reveja a decisão e de obter uma resposta fundamentada no prazo de uma semana. As plataformas de trabalho digitais devem retificar a decisão sem demora ou, se tal não for possível, pagar uma indemnização adequada, caso a decisão viole os direitos dos trabalhadores da plataforma.

Artigo 9.º — Informação e consulta

Esta disposição exige que as plataformas de trabalho digitais informem e consultem os representantes dos trabalhadores das plataformas ou, caso não existam representantes, os próprios trabalhadores das plataformas sobre decisões de gestão algorítmica, nomeadamente se pretenderem introduzir novos sistemas automatizados de monitorização ou tomada de decisões ou alterar substancialmente esses sistemas. O objetivo desta disposição é promover o diálogo social sobre a gestão algorítmica. Dada a complexidade da matéria, os representantes ou os trabalhadores das plataformas em causa podem ser assistidos por um especialista da sua escolha. O presente artigo não prejudica os requisitos aplicáveis em matéria de informação e consulta ao abrigo da Diretiva 2002/14/CE.

Artigo 10.º — Pessoas que trabalham nas plataformas digitais sem relação de trabalho

Este artigo garante que as disposições relativas à transparência, ao controlo humano e à revisão dos artigos 6.º, 7.º e 8.º — que dizem respeito ao tratamento de dados pessoais pelos sistemas automatizados — também sejam aplicáveis às pessoas que trabalham nas plataformas sem contrato de trabalho ou relação de trabalho, ou seja, aos verdadeiros trabalhadores por conta própria. Tal não inclui as disposições em matéria de saúde e segurança no trabalho, que são específicas dos trabalhadores por conta de outrem.

As disposições deste artigo não prejudicam as disposições do regulamento sobre a intermediação em linha (2019/1150). As suas disposições prevalecem se abrangerem aspetos específicos da diretiva relacionados com os «utilizadores profissionais» independentes, na aceção do regulamento. O artigo 8.º não se aplica aos «utilizadores profissionais».

Capítulo IV — Transparência do trabalho nas plataformas digitais

Artigo 11.º — Declaração do trabalho nas plataformas digitais

Esta disposição clarifica que as plataformas de trabalho digitais que são empregadores têm de declarar o trabalho realizado pelos trabalhadores das plataformas às autoridades competentes em matéria laboral e de proteção social do Estado-Membro em que o trabalho é realizado e partilhar os dados pertinentes com essas autoridades, em conformidade com as regras e os procedimentos nacionais. Esta clarificação é particularmente relevante para as plataformas de trabalho digitais estabelecidas num país diferente daquele em que o trabalho é realizado.

Artigo 12.º — Acesso a informações pertinentes sobre o trabalho nas plataformas digitais

Esta disposição exige que as plataformas de trabalho digitais disponibilizem determinadas informações às autoridades laborais, de proteção social e outras autoridades competentes que garantam o cumprimento das obrigações legais, e aos representantes das pessoas que trabalham nas plataformas. Essas informações incluem o número de pessoas trabalham regularmente nas plataformas e a sua situação contratual ou estatuto profissional, bem como os termos e condições gerais aplicáveis às relações contratuais. As informações devem ser atualizadas regularmente e, quando solicitado, devem ser fornecidos esclarecimentos e informações adicionais.

Capítulo V – Vias de recurso e execução

Artigo 13.º — Direito de recurso

Esta disposição exige que os Estados-Membros garantam o acesso a mecanismos eficazes e imparciais de resolução de litígios e ao direito de recurso e, se for caso disso, a uma indemnização adequada, em caso de violação dos direitos estabelecidos na diretiva.

Artigo 14.º — Procedimentos em nome ou em apoio de pessoas que trabalham nas plataformas

Esta disposição permite que os representantes das pessoas que trabalham nas plataformas, ou outras entidades legais com interesse legítimo em defender os direitos destas pessoas, tomem parte em qualquer processo judicial ou procedimento administrativo para fazer valer os direitos ou obrigações decorrentes da presente proposta. Essas entidades devem ter o direito não só de agir em nome ou em apoio de uma pessoa que trabalhe numa plataforma, com autorização do próprio, nesses processos e procedimentos, mas também de intentar ações em nome de várias pessoas que trabalhem numa plataforma. O objetivo é superar os obstáculos processuais e relacionados com os custos com que se deparam as pessoas que trabalham nas plataformas, em especial quando procuram obter a determinação correta do seu estatuto profissional.

Artigo 15.º — Canais de comunicação para as pessoas que trabalham nas plataformas

Este artigo exige que as plataformas de trabalho digitais ofereçam a possibilidade às pessoas que trabalham nas plataformas de contactarem e comunicarem entre si, e de ser contactadas pelos seus representantes, através das infraestruturas digitais das próprias plataformas ou outros meios igualmente eficazes. O objetivo é permitir que as pessoas que trabalham nas plataformas digitais se familiarizem e comuniquem entre si, também com vista a defender os seus interesses, apesar de não disporem de um local comum de trabalho.

Artigo 16.º – Acesso aos elementos de prova

Este artigo garante que os tribunais nacionais ou outras autoridades competentes possam exigir a uma plataforma de trabalho digital que divulgue elementos de prova pertinentes que estejam sob o seu controlo, no âmbito de qualquer processo relativo a um pedido para a determinação correta do estatuto profissional de uma pessoa que trabalhe na plataforma. Tal inclui os elementos de prova que contenham informações confidenciais — tais como dados relevantes sobre algoritmos —, sempre tal seja considerado pertinente para o pedido e desde que tenham sido adotadas medidas eficazes para proteger essas informações.

Artigo 17.º — Proteção contra formas de tratamento ou consequências desfavoráveis

De acordo com esta disposição, os Estados-Membros devem garantir às pessoas que trabalham em plataformas, que apresentem uma queixa relacionada com violações das disposições adotadas nos termos da diretiva, uma proteção judicial adequada contra qualquer tratamento ou consequências desfavoráveis por parte da plataforma de trabalho digital.

Artigo 18.º — Proteção contra o despedimento

De acordo com esta disposição, sempre que uma pessoa que trabalhe numa plataforma considerar que foi despedida ou sujeita a uma penalização equivalente (como seja, a desativação da sua conta pessoal) pelo facto de ter exercido um direito estabelecido na diretiva, e quando possa apresentar factos que sustentem essa alegação, recai sobre a plataforma de trabalho digital o ónus da prova de que o despedimento ou alegado tratamento penalizador teve por base outras razões objetivas.

Artigo 19.º — Supervisão e sanções

Esta disposição clarifica que o quadro processual que visa garantir o cumprimento das regras do RGPD, em especial no que diz respeito à supervisão, à cooperação e aos mecanismos de coerência, às vias de recurso, à responsabilidade e às sanções, é aplicável às disposições em matéria de gestão algorítmica que se baseiam no artigo 16.º do TFUE e que as autoridades de controlo em matéria de proteção de dados são competentes para controlar a aplicação dessas disposições, incluindo para aplicar coimas.

A disposição prevê a cooperação das autoridades laborais, de proteção social e de controlo da proteção de dados, nomeadamente através do intercâmbio de informações pertinentes.

Esta disposição exige igualmente que os Estados-Membros apliquem sanções efetivas, proporcionadas e dissuasivas em caso de incumprimento das obrigações decorrentes da diretiva, e velem por que as mesmas sejam aplicadas.

Capítulo VI — Disposições finais

Artigo 20.º — Disposições mais favoráveis

Esta disposição permite aos Estados-Membros assegurar um nível de proteção mais elevado dos trabalhadores do que a proteção proporcionada pela diretiva, e impede a sua utilização para desagravar as normas em vigor nos mesmos domínios. Isto aplica-se aos trabalhadores independentes apenas na medida em que as regras mais favoráveis sejam compatíveis com as regras do mercado interno.

Artigo 21.º — Execução

Esta disposição fixa o prazo máximo até ao qual os Estados-Membros deverão transpor a diretiva para o direito nacional e comunicar à Comissão os textos correspondentes. Este período é fixado em dois anos, a partir da data de entrada em vigor. Além disso, sublinha que os Estados-Membros podem confiar a execução da presente diretiva aos parceiros sociais, caso estes o solicitem e desde que os Estados-Membros tomem todas as medidas necessárias para que os parceiros sociais possam garantir em todos os momentos os resultados pretendidos no âmbito da diretiva.

Artigo 22.º — Reexame pela Comissão

Trata-se de uma disposição-tipo que prevê o reexame pela Comissão da aplicação da presente diretiva, cinco anos após a sua entrada em vigor, e a avaliação da necessidade de rever e atualizar a diretiva.

Artigos 23.º e 24.º — Entrada em vigor e destinatários

Esta disposição estabelece que a diretiva entra em vigor no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial e tem como destinatários os Estados-Membros.

2021/0414 (COD)

Proposta de

DIRETIVA DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO

relativa à melhoria das condições de trabalho nas plataformas digitais

(Texto relevante para efeitos do EEE)

O PARLAMENTO EUROPEU E O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 153.º, n.º 2, alínea b), em conjugação com o artigo 153.º, n.º 1, alínea b), e o artigo 16.º, n.º 2,

Tendo em conta a proposta da Comissão Europeia,

Após transmissão do projeto de ato legislativo aos parlamentos nacionais,

Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Social Europeu 51 ,

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões 52 ,

Deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário,

Considerando o seguinte:

(1)Nos termos do artigo 3.º do Tratado da União Europeia, a União tem como objetivos, nomeadamente, promover o bem-estar dos seus povos e empenhar-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente numa economia social de mercado altamente competitiva, que tem como meta o pleno emprego e o progresso social.

(2)A presente diretiva respeita os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos, nomeadamente, pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir, designada por «Carta»). Em especial, o artigo 31.º da Carta estabelece que todos os trabalhadores têm direito a condições de trabalho saudáveis, seguras e dignas. O artigo 27.º da Carta protege o direito dos trabalhadores à informação e à consulta na empresa. O artigo 8.º da Carta estabelece que todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito. O artigo 16.º da Carta reconhece a liberdade de empresa.

(3)Do mesmo modo, o quinto princípio do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, proclamado em Gotemburgo, em 17 de novembro de 2017 53 , afirma que: i) independentemente do tipo e da duração da relação de trabalho, os trabalhadores têm direito a um tratamento justo e equitativo em matéria de condições de trabalho, acesso à proteção social e formação; ii) deve ser garantida a flexibilidade necessária para permitir que os empregadores se adaptem rapidamente às evoluções do contexto económico, em conformidade com a legislação e com os acordos coletivos; iii) devem ser promovidas formas inovadoras de trabalho que garantam condições de trabalho de qualidade, devem ser incentivados o empreendedorismo e o trabalho por conta própria e deve ser facilitada a mobilidade profissional. A Cimeira Social do Porto, realizada em maio de 2021, aprovou o plano de ação que acompanha o Pilar Social 54 como documento de orientação para a sua execução.

(4)A digitalização está a mudar o mundo do trabalho, a melhorar a produtividade e a flexibilidade, mas comporta também alguns riscos para o emprego e as condições de trabalho. As tecnologias baseadas em algoritmos, incluindo os sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões, permitiram a emergência e o crescimento de plataformas de trabalho digitais.

(5)O trabalho nas plataformas digitais é realizado por indivíduos através da infraestrutura digital das plataformas, que prestam um serviço aos seus clientes. Através dos algoritmos, as plataformas de trabalho digitais podem controlar, em menor ou maior grau — dependendo do seu modelo de negócio — a execução do trabalho, a sua remuneração e a relação entre os clientes e as pessoas que executam o trabalho. O trabalho nas plataformas digitais pode ser realizado exclusivamente em linha através de ferramentas eletrónicas («baseado na Internet») ou de forma híbrida, combinando formas de comunicação em linha com uma atividade subsequente no mundo físico («baseado na localização»). Muitas das plataformas de trabalho digitais existentes são entidades comerciais internacionais que desenvolvem as suas atividades e modelos de negócio em vários Estados-Membros ou além-fronteiras.

(6)O trabalho nas plataformas digitais pode criar oportunidades para aceder mais facilmente ao mercado de trabalho, obter rendimentos adicionais através de uma atividade secundária ou beneficiar de alguma flexibilidade na organização do tempo de trabalho. Simultaneamente, o trabalho nas plataformas digitais cria alguns desafios, uma vez que pode dificultar a distinção entre «relação de trabalho» e «atividade independente», e a separação de responsabilidades entre empregadores e trabalhadores. A classificação incorreta do estatuto profissional tem consequências para as pessoas afetadas, na medida em que pode restringir o acesso aos direitos laborais e sociais existentes. Além disso, gera condições injustas de concorrência para as empresas que classificam corretamente os seus trabalhadores e tem implicações nos sistemas de relações laborais dos Estados-Membros, na sua base tributável e na cobertura e sustentabilidade dos seus sistemas de proteção social. Embora excedam o contexto do trabalho nas plataformas digitais, estes desafios são especialmente significativos e prementes na economia das plataformas.

(7)Os processos judiciais em vários Estados-Membros revelam uma classificação incorreta persistente do estatuto profissional em certos tipos de trabalho nas plataformas digitais e que ocorre sobretudo nos setores em que as plataformas exercem um certo grau de controlo sobre a remuneração e a execução do trabalho. Embora as plataformas de trabalho digitais classifiquem frequentemente as pessoas que trabalham nas plataformas como trabalhadores por conta própria ou «contratados independentes», muitos tribunais concluíram que as plataformas exercem de facto uma direção e controlo sobre essas pessoas, integrando-as muitas vezes nas suas atividades comerciais principais e determinando unilateralmente o nível de remuneração. Por essa razão, os tribunais reclassificaram os alegados trabalhadores por conta própria como trabalhadores assalariados das plataformas. No entanto, a jurisprudência nacional produziu resultados diversos e as plataformas de trabalho digitais adaptaram os seus modelos de negócio de várias formas, o que acentuou a falta de segurança jurídica relativamente ao estatuto profissional.

(8)Os sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões que utilizam algoritmos substituem cada vez mais as funções que os gestores normalmente desempenham nas empresas, como a atribuição de tarefas, a comunicação de instruções, a avaliação do trabalho realizado, a concessão de incentivos ou a imposição de sanções. As plataformas de trabalho digitais utilizam esses sistemas algorítmicos como prática normal de organização e gestão do trabalho realizado nas plataformas, através das suas infraestruturas. As pessoas que trabalham nas plataformas digitais e que estão sujeitas a essa gestão algorítmica carecem, muitas vezes, de informações sobre o funcionamento dos algoritmos, os dados pessoais utilizados e a forma como o seu comportamento afeta as decisões tomadas pelos sistemas automatizados. Os representantes dos trabalhadores e os serviços de inspeção do trabalho também não têm acesso a estas informações. As pessoas que trabalham nas plataformas também não conhecem muitas vezes os motivos das decisões tomadas ou apoiadas pelos sistemas automatizados nem têm a possibilidade de analisar essas decisões com uma pessoa de contacto ou de as contestar.

(9)Quando as plataformas operam em vários Estados-Membros ou além-fronteiras, muitas vezes não é claro em que local é realizado o trabalho da plataforma e por quem. Além disso, as autoridades nacionais não podem aceder facilmente aos dados sobre as plataformas de trabalho digitais, incluindo o número de pessoas que trabalham nas plataformas, o seu estatuto profissional e as condições de trabalho. Tal dificulta o controlo da aplicação das regras em vigor, nomeadamente em matéria de legislação laboral e proteção social.

(10)Atualmente, existem vários instrumentos jurídicos que estabelecem normas mínimas para as condições de trabalho e os direitos laborais em toda a União. Tal inclui, em especial, a Diretiva (UE) 2019/1152 do Parlamento Europeu e do Conselho 55 relativa a condições de trabalho transparentes e previsíveis, a Diretiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho 56 relativa ao tempo de trabalho, a Diretiva 2008/104/CE do Parlamento Europeu e do Conselho 57 relativa ao trabalho temporário, e outros instrumentos específicos relacionados, entre outros, com a saúde e a segurança no trabalho, as trabalhadoras grávidas, a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar, o trabalho a termo, o trabalho a tempo parcial, o destacamento de trabalhadores, e a informação e consulta dos trabalhadores. Embora estes instrumentos garantam um certo nível de proteção dos trabalhadores, não se aplicam aos verdadeiros trabalhadores por conta própria.

(11)A Recomendação 2019/C 387/01 do Conselho 58 , relativa ao acesso à proteção social dos trabalhadores por conta de outrem e por conta própria, recomenda aos Estados-Membros a adoção de medidas para assegurar uma cobertura formal e efetiva, a adequação e a transparência dos regimes de proteção social a todos os trabalhadores por conta de outrem e por conta própria. Atualmente, os Estados-Membros garantem níveis diferentes de proteção social aos trabalhadores por conta própria.

(12)O Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho 59 («regulamento geral sobre a proteção de dados») assegura a proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e, em especial, prevê determinados direitos e obrigações, bem como salvaguardas para o tratamento lícito, equitativo e transparente dos dados pessoais, incluindo nas decisões individuais automatizadas. O Regulamento (UE) 2019/1150 do Parlamento Europeu e do Conselho 60 promove a equidade e a transparência para os «utilizadores profissionais» que recorrem aos serviços de intermediação em linha fornecidos pelos operadores das plataformas digitais. A Comissão Europeia propôs nova legislação que estabelece regras harmonizadas para os fornecedores e os utilizadores de sistemas de inteligência artificial 61 .

(13)Embora os atos jurídicos da União, em vigor ou propostos, incluam certas salvaguardas gerais, os desafios suscitados pelo trabalho nas plataformas digitais exigem medidas específicas adicionais. A fim de enquadrar adequadamente, e de forma sustentável, o desenvolvimento do trabalho nas plataformas digitais, a União deve estabelecer novas normas mínimas em matéria de condições de trabalho que respondam aos desafios do trabalho nas plataformas. As pessoas que trabalham nas plataformas na União devem poder beneficiar de um certo número de direitos mínimos, que garantam a correta determinação do seu estatuto profissional, promovam a transparência, a equidade e a responsabilização na gestão algorítmica, e melhorem a transparência do trabalho nas plataformas digitais, incluindo em situações transfronteiriças. Importa salvaguardar esses direitos para melhorar a segurança jurídica, garantir condições justas de concorrência entre as plataformas de trabalho digitais e os prestadores de serviços fora de linha promover um crescimento sustentável das plataformas de trabalho digitais na União.

(14)A Comissão realizou uma consulta em duas fases junto dos parceiros sociais, em conformidade com o artigo 154.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, relativa à melhoria das condições de trabalho nas plataformas digitais. Os parceiros sociais não chegaram a acordo quanto à necessidade de encetar negociações sobre estas questões. No entanto, é essencial tomar medidas a nível da União neste domínio e adaptar o atual quadro jurídico ao novo contexto do trabalho nas plataformas digitais.

(15)Além disso, a Comissão procedeu a um amplo intercâmbio com as partes interessadas relevantes, incluindo plataformas de trabalho digitais, associações das pessoas que trabalham nas plataformas, peritos do meio académico, dos Estados-Membros e de organizações internacionais e representantes da sociedade civil.

(16)A diretiva deve aplicar-se às pessoas que trabalham em plataformas na União que têm um contrato de trabalho ou uma relação de trabalho, ou, com base numa apreciação dos factos, relativamente às quais se possa determinar a existência de um contrato de trabalho ou relação de trabalho, tal como definidos pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor em cada Estado-Membro, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia. Tal deve incluir as situações em que o estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas digitais não é claro, para permitir a correta determinação desse estatuto. As disposições em matéria de gestão algorítmica que estão relacionadas com o tratamento de dados pessoais devem aplicar-se igualmente aos verdadeiros trabalhadores por conta própria e outras pessoas que trabalhem em plataformas na União sem uma relação de trabalho.

(17)A presente diretiva deve aplicar-se a todas as plataformas de trabalho digitais, independentemente do seu local de estabelecimento e de legislação de outra forma aplicável, desde que o trabalho organizado através das plataformas seja executado na União. Deve ser estabelecido um conjunto específico de regras obrigatórias a nível da União, a fim de garantir os direitos mínimos em matéria de condições de trabalho nas plataformas digitais.

(18)A plataforma de trabalho digital difere das outras plataformas em linha pelo facto de organizar um trabalho efetuado por um indivíduo, de forma pontual ou repetida, a pedido de um cliente, que consiste num serviço prestado pela plataforma. A organização pela plataforma do trabalho executado por esse indivíduo deve envolver, pelo menos, um papel significativo da plataforma na correspondência entre procura do serviço e oferta de mão de obra, sendo o trabalho executado por uma pessoa que tem uma relação contratual com a plataforma e está disponível para executar uma tarefa específica, e pode incluir outras atividades como o processamento dos pagamentos. As plataformas em linha que não organizam o trabalho realizado pelas pessoas que trabalham nas plataformas, mas que apenas fornecem os meios para estabelecer a relação entre os prestadores de serviços e os utilizadores finais, por exemplo, publicitando as ofertas ou os pedidos de serviço, ou agregando e divulgando os prestadores de serviços disponíveis numa determinada zona, sem qualquer outro envolvimento, não devem ser consideradas plataformas de trabalho digitais. A definição de «plataforma de trabalho digital» não deve incluir os prestadores de um serviço cujo principal objetivo seja explorar ou partilhar ativos, como o arrendamento de alojamento de curta duração. Deve limitar-se aos prestadores de serviços relativamente aos quais a organização do trabalho efetuado pelo indivíduo, como o transporte de pessoas ou bens ou os serviços de limpeza, constitua uma componente necessária e essencial, e não menor e meramente acessória.

(19)A fim de combater o falso trabalho por conta própria no trabalho em plataformas digitais e facilitar a correta determinação do estatuto profissional, os Estados-Membros devem dispor de procedimentos adequados para prevenir e eliminar a classificação incorreta do estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas digitais. Esses procedimentos devem ter como objetivo determinar a existência de uma relação de trabalho, tal como definida pela legislação nacional, por convenções coletivas ou pelas práticas nacionais, tendo em conta a jurisprudência do TJUE, e, caso essa relação de trabalho exista, assegurar a plena conformidade com o direito da União aplicável aos trabalhadores, bem como com a legislação laboral nacional, as convenções coletivas e as normas de proteção social. Nos casos em que o trabalho por conta própria ou um estatuto profissional intermédio — tal como definido a nível nacional — seja o estatuto profissional correto, devem aplicar-se os direitos e obrigações decorrentes desse estatuto.

(20)Na sua jurisprudência, o TJUE definiu critérios para determinar o estatuto de um trabalhador 62 . A interpretação desses critérios pelo TJUE deve ser tida em conta na aplicação da presente diretiva. O abuso do estatuto de trabalhador por conta própria, tal como definido no direito nacional, tanto à escala nacional como em situações transfronteiriças, constitui uma forma de trabalho falsamente declarado frequentemente associada ao trabalho não declarado. A situação de falso trabalho por conta própria ocorre quando uma pessoa preenche as condições típicas de uma relação de trabalho, mas está declarada como trabalhador por conta própria, para evitar o cumprimento de certas obrigações legais ou fiscais.

(21)O princípio do primado dos factos, segundo o qual a determinação da existência de uma relação de trabalho se deve basear principalmente nos factos relacionados com a execução efetiva do trabalho, incluindo a sua remuneração, e não na descrição da relação de trabalho pelas partes, em conformidade com a Recomendação n.º 198 sobre a Relação de Trabalho, de 2006, da Organização Internacional do Trabalho, é particularmente relevante para o trabalho nas plataformas digitais, em que as condições contratuais são frequentemente determinadas unilateralmente por uma das partes.

(22)Quando a existência de uma relação de trabalho for estabelecida com base nos factos, a parte que atua na qualidade de empregador deve ser claramente identificada e essa parte deve cumprir todas as obrigações decorrentes do seu estatuto de empregador.

(23)A correta determinação do estatuto profissional não deve impedir a melhoria das condições de trabalho dos verdadeiros trabalhadores por conta própria que trabalham nas plataformas. Caso uma plataforma de trabalho digital decida — numa base puramente voluntária ou de acordo com as pessoas em causa — pagar a proteção social, o seguro contra acidentes ou outras formas de seguro, medidas de formação ou prestações similares a trabalhadores por conta própria que trabalhem na plataforma, essas prestações em si mesmas não devem ser consideradas um elemento determinante indiciador da existência de uma relação de trabalho.

(24)Quando as plataformas de trabalho digitais controlam certos elementos da execução do trabalho, atuam enquanto empregadores numa relação de trabalho. A direção e o controlo, ou a subordinação jurídica, constituem um elemento essencial da definição de uma relação de trabalho nos Estados-Membros e na jurisprudência do TJUE. Por conseguinte, com base numa presunção legal, deve considerar-se que qualquer relação contratual em que a plataforma de trabalho digital exerça um certo nível de controlo sobre determinados elementos da execução do trabalho constitui uma relação de trabalho entre a plataforma e a pessoa que trabalha na plataforma. Consequentemente, essa pessoa deve ser classificada como trabalhador e beneficiar de todos os direitos e obrigações decorrentes desse estatuto, tal como previsto pela legislação nacional e da União, por convenções coletivas e pelas práticas em vigor. A presunção legal deve aplicar-se em todos os procedimentos administrativos e processos judiciais relevantes e deve beneficiar a pessoa que trabalha na plataforma. As autoridades responsáveis pela verificação do cumprimento ou execução da legislação pertinente, como os serviços de inspeção do trabalho, os organismos de proteção social ou as autoridades fiscais, também devem poder basear-se nessa presunção. Os Estados-Membros devem estabelecer um quadro nacional, a fim de reduzir os litígios e melhorar a segurança jurídica.

(25)Devem ser incluídos na diretiva critérios para determinar os casos em que as plataformas de trabalho digitais controlam a execução do trabalho, para que a presunção legal se torne operacional e facilitar a aplicação dos direitos dos trabalhadores. Esses critérios devem inspirar-se na jurisprudência nacional e da União e ter em conta os conceitos nacionais de «relação de trabalho». Os critérios devem incluir elementos concretos que demonstrem que a plataforma de trabalho digital, por exemplo, determina na prática, e não recomenda meramente, as condições de trabalho, a remuneração ou ambas, dá instruções sobre a forma como o trabalho deve ser executado ou impede a pessoa que trabalha na plataforma de desenvolver contactos comerciais com potenciais clientes. Para ser efetiva na prática, têm de estar sempre preenchidos dois critérios para desencadear a aplicação da presunção. Simultaneamente, os critérios não devem abranger as situações em que as pessoas que trabalham nas plataformas são genuinamente trabalhadores por conta própria. Numa situação de verdadeiro trabalho por conta própria, os próprios trabalhadores são responsáveis perante os seus clientes pela forma como executam o trabalho e pela qualidade dos resultados. A liberdade de escolher o horário de trabalho ou os períodos de ausência, de recusar tarefas, de recorrer a subcontratantes ou substitutos ou de trabalhar para terceiros é característica do verdadeiro trabalho por conta própria. Por conseguinte, qualquer restrição de facto dessa liberdade através da imposição de um certo número de condições ou de um sistema de sanções deve também ser considerada um elemento de controlo da execução do trabalho. A supervisão rigorosa da execução do trabalho, ou a verificação rigorosa da qualidade dos resultados do trabalho, nomeadamente através de meios eletrónicos que não consistam meramente em avaliações ou classificações dos destinatários dos serviços, também deve ser considerada um elemento de controlo da execução do trabalho. Em contrapartida, as plataformas de trabalho digitais devem ter a possibilidade de conceber as suas interfaces técnicas de forma a assegurar uma boa experiência dos consumidores. As medidas ou regras exigidas por lei ou necessárias para salvaguardar a saúde e a segurança dos destinatários dos serviços também não devem ser entendidas como um controlo da execução do trabalho.

(26)A aplicação efetiva da presunção legal através de medidas adequadas, como a divulgação de informações ao público, orientações e o reforço dos controlos e inspeções no terreno, é essencial para garantir a segurança jurídica e a transparência a todas as partes envolvidas. Essas medidas devem ter em conta a situação específica das empresas em fase de arranque, apoiando o potencial empreendedor e as condições propiciadoras de um crescimento sustentável das plataformas de trabalho digitais na União.

(27)Por razões de segurança jurídica, a presunção legal não deve produzir efeitos jurídicos retroativos anteriores à data de transposição da presente diretiva, devendo, por conseguinte, aplicar-se apenas ao período com início nessa data, incluindo para as relações contratuais concluídas anteriormente e ainda vigentes nessa data. Por conseguinte, as reclamações relativas à eventual existência de uma relação de trabalho anterior a essa data, bem como os direitos e obrigações decorrentes da relação até essa data, devem ser apreciadas unicamente com base no direito nacional e da União anterior à presente diretiva.

(28)A relação entre a pessoa que trabalha nas plataformas e a plataforma de trabalho digital pode não satisfazer os requisitos de uma relação de trabalho em conformidade com a definição estabelecida pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor no respetivo Estado-Membro, tendo em conta a jurisprudência do TJUE, apesar de a plataforma de trabalho digital controlar a execução do trabalho num determinado aspeto. Os Estados-Membros devem garantir a possibilidade de ilidir a presunção legal nos processos judiciais ou procedimentos administrativos, ou ambos, provando, com base na definição acima referida, que a relação em causa não constitui uma relação de trabalho. A inversão do ónus da prova, que recai sobre as plataformas de trabalho digitais, justifica-se pelo facto de terem uma visão completa de todos os elementos factuais que determinam a relação, em especial os algoritmos através dos quais gerem as suas operações. Os processos judiciais e os procedimentos administrativos iniciados pelas plataformas de trabalho digitais para ilidir a presunção legal não devem ter um efeito suspensivo no que diz respeito à aplicação da presunção legal. O facto de se obter a ilisão de uma presunção num processo administrativo não deve obstar à aplicação da presunção num processo judicial subsequente. Quando a pessoa que trabalha na plataforma, que é objeto da presunção, pretende refutar a presunção legal, a plataforma de trabalho digital deve prestar-lhe assistência, nomeadamente disponibilizando todas as informações pertinentes na sua posse sobre a pessoa em causa. Os Estados-Membros devem fornecer as orientações necessárias sobre os procedimentos de ilisão da presunção legal.

(29)Embora o Regulamento (UE) 2016/679 estabeleça um quadro geral para a proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais, é necessário estabelecer regras que respondam às preocupações específicas do tratamento de dados pessoais no contexto do trabalho nas plataformas digitais. A presente diretiva prevê regras mais específicas no contexto do trabalho realizado nas plataformas digitais, nomeadamente para garantir a proteção dos direitos e liberdades em matéria de tratamento de dados pessoais dos trabalhadores na aceção do artigo 88.º do Regulamento (UE) 2016/679. Neste contexto, os termos relativos à proteção de dados pessoais na presente diretiva devem ser entendidos à luz das definições constantes do Regulamento (UE) 2016/679.

(30)Além dos direitos e obrigações previstos na presente diretiva, os direitos e obrigações estabelecidos no Regulamento (UE) 2016/679 continuam a ser aplicáveis em caso de tratamento de dados pessoais. Os artigos 13.º, 14.º e 15.º do Regulamento (UE) 2016/679 exigem que os responsáveis pelo tratamento dos dados assegurem a transparência para com os titulares dos dados em matéria de recolha e tratamento de dados pessoais. Além disso, de acordo com o artigo 22.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 2016/679, o titular dos dados tem o direito de não ficar sujeito a nenhuma decisão tomada exclusivamente com base no tratamento automatizado, incluindo a definição de perfis, que produza efeitos na sua esfera jurídica ou que o afete significativamente de forma similar, exceto nos casos previstos no n.º 2 do mesmo artigo. Estas obrigações aplicam-se, igualmente, às plataformas de trabalho digitais.

(31)A presente diretiva não prejudica os artigos 13.º, 14.º, 15.º e 22.º do Regulamento (UE) 2016/679, com exceção dos artigos 13.º, n.º 2, alínea f), 14.º, n.º 2, alínea g), e 15.º, n.º 1, alínea h), em relação aos quais o artigo 6.º da presente diretiva prevê regras mais específicas no contexto do trabalho nas plataformas digitais, nomeadamente para garantir a proteção dos direitos e liberdades em matéria de tratamento de dados pessoais dos trabalhadores na aceção do artigo 88.º do Regulamento (UE) 2016/679.

(32)As plataformas de trabalho digitais devem estar sujeitas a obrigações de transparência no que diz respeito aos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões utilizados para monitorizar, supervisionar ou avaliar a execução do trabalho através de meios eletrónicos. Tal aplica-se igualmente aos sistemas automatizados de tomada de decisões utilizados para tomar ou apoiar decisões que afetem significativamente as condições de trabalho, nomeadamente a atribuição de tarefas às pessoas que trabalham nas plataformas, a remuneração, a segurança e saúde no trabalho, o tempo de trabalho, as decisões de promoção e a situação contratual, incluindo a restrição, suspensão ou encerramento de contas pessoais. Além das obrigações previstas no Regulamento (UE) 2016/679, devem também ser fornecidas informações sobre esses sistemas sempre que as decisões não se baseiem exclusivamente no tratamento automatizado, mas sejam apoiadas por sistemas automatizados. Importa igualmente especificar o tipo de informações sobre os sistemas automatizados que devem ser fornecidas às pessoas que trabalham nas plataformas, bem como a forma e o momento dessa informação. A obrigação do responsável pelo tratamento dos dados, nos termos dos artigos 13.º, 14.º e 15.º do Regulamento (UE) 2016/679, de fornecer ao titular dos dados determinadas informações relativas ao tratamento de dados pessoais que lhe digam respeito, e de lhe garantir o acesso a esses dados, deve continuar a aplicar-se no contexto do trabalho nas plataformas digitais. Devem também ser fornecidas informações sobre os sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões aos representantes das pessoas que trabalham nas plataformas digitais e às autoridades nacionais do trabalho, a pedido destas, a fim de lhes permitir exercer as suas funções.

(33)As plataformas de trabalho digitais não devem ser obrigadas a divulgar o funcionamento detalhado dos seus sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões, incluindo os algoritmos, ou outros dados pormenorizados que contenham segredos comerciais ou estejam protegidos por direitos de propriedade intelectual. Todavia, tais considerações não devem resultar na recusa de fornecer todas as informações exigidas pela presente diretiva.

(34)Os artigos 5.º e 6.º do Regulamento (UE) 2016/679 exigem que os dados pessoais sejam tratados de forma lícita, leal e transparente. As plataformas de trabalho digitais não devem, por conseguinte, ser autorizadas a tratar dados pessoais sobre as pessoas que trabalham na plataforma que não estejam intrinsecamente relacionados com e sejam estritamente necessários para a execução dos contratos concluídos entre essas pessoas e as plataformas. O artigo 6.º, n.º 5, da presente diretiva prevê regras mais específicas no contexto do trabalho nas plataformas digitais, nomeadamente para garantir a proteção dos direitos e liberdades em matéria de tratamento de dados pessoais dos trabalhadores na aceção do artigo 88.º do Regulamento (UE) 2016/679.

(35)As plataformas de trabalho digitais recorrem amplamente à utilização de sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões para gerir os recursos humanos. A monitorização por meios eletrónicos pode ser intrusiva e as decisões tomadas ou apoiadas por esses sistemas afetam diretamente as pessoas que trabalham nas plataformas, que podem não ter contacto direto com um gestor ou supervisor humano. Consequentemente, as plataformas de trabalho digitais devem controlar e avaliar regularmente o impacto nas condições de trabalho das decisões individuais tomadas ou apoiadas por estes sistemas. As plataformas de trabalho digitais devem garantir recursos humanos suficientes para este efeito. As pessoas encarregadas do controlo pela plataforma de trabalho digital devem dispor da competência, formação e autoridade necessárias para exercer essa função e ser protegidas contra decisões de despedimento, medidas disciplinares e outro tratamento desfavorável, em caso de anulação de decisões automatizadas ou sugestão de decisões. Além das obrigações decorrentes do artigo 22.º do Regulamento (UE) 2016/679, o artigo 7.º, n.os 1 e 3, da presente diretiva prevê obrigações específicas para as plataformas de trabalho digitais relativas ao controlo humano do impacto de decisões individuais tomadas ou apoiadas por sistemas automatizados, que são aplicáveis enquanto regras específicas no contexto do trabalho nas plataformas digitais, nomeadamente para assegurar a proteção dos direitos e liberdades em matéria de tratamento de dados pessoais dos trabalhadores na aceção do artigo 88.º do Regulamento (UE) 2016/679.

(36)O artigo 22.º, n.º 3, do Regulamento (UE) 2016/679 exige que os responsáveis pelo tratamento dos dados apliquem medidas adequadas para salvaguardar os direitos, liberdades e interesses legítimos dos titulares dos dados, quando estes sejam objeto de decisões baseadas exclusivamente no tratamento automatizado. Esta disposição exige, no mínimo, que a pessoa em causa tenha direito à intervenção humana do responsável pelo tratamento dos dados, para poder expressar o seu ponto de vista e contestar a decisão. Estas obrigações aplicam-se, igualmente, às plataformas de trabalho digitais. O artigo 8.º da presente diretiva estabelece regras mais específicas no contexto do trabalho nas plataformas digitais, nomeadamente para garantir a proteção dos direitos e liberdades em matéria de tratamento de dados pessoais dos trabalhadores na aceção do artigo 88.º do Regulamento (UE) 2016/679.

(37)Assim, as pessoas que trabalham nas plataformas devem ter o direito de obter uma explicação da plataforma de trabalho digital sobre qualquer decisão, ausência de decisão ou conjunto de decisões tomado ou apoiado por sistemas automatizados que afetem significativamente as suas condições de trabalho. Para o efeito, a plataforma de trabalho digital deve conceder aos seus trabalhadores a possibilidade de analisarem e clarificarem os factos, as circunstâncias e os motivos das decisões com uma pessoa de contacto designada pela plataforma de trabalho digital. Além disso, as plataformas de trabalho digitais devem expor por escrito às pessoas que trabalham nas plataformas os motivos subjacentes a qualquer decisão de restringir, suspender ou encerrar contas pessoais, de recusar a remuneração de trabalho realizado por essas pessoas ou que afete a sua situação contratual, uma vez que tais decisões podem ter efeitos negativos significativos para as pessoas que trabalham nas plataformas, em especial em termos de potenciais rendimentos. Se a explicação obtida não for satisfatória ou se as pessoas que trabalham nas plataformas considerarem que os seus direitos foram violados, têm também o direito de solicitar à plataforma de trabalho digital que reveja a decisão e de obter uma resposta devidamente fundamentada no prazo de uma semana. Se tais decisões violarem os direitos dessas pessoas, nomeadamente os seus direitos laborais ou o direito à não discriminação, a plataforma de trabalho digital deve retificar as decisões sem demora ou, se tal não for possível, oferecer uma indemnização adequada.

(38)A Diretiva 89/391/CEE do Conselho 63 introduz medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho, incluindo a obrigação de as entidades patronais avaliarem os riscos profissionais para a saúde e a segurança. Uma vez que os sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões podem ter um impacto significativo na saúde física e mental das pessoas que trabalham nas plataformas, as plataformas de trabalho digitais devem avaliar esses riscos, analisar se as salvaguardas previstas pelos sistemas são adequadas para eliminar os riscos e adotar medidas de prevenção e proteção adequadas.

(39)A Diretiva 2002/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho 64 estabelece um quadro geral para a informação e consulta dos trabalhadores na União. A introdução ou alteração substancial da utilização de sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões pelas plataformas de trabalho digitais tem um impacto direto na organização do trabalho e nas condições de trabalho individuais dos trabalhadores das plataformas. São necessárias medidas adicionais para garantir que as plataformas de trabalho digitais informam e consultam os trabalhadores das plataformas ou os seus representantes, antes de tais decisões serem tomadas, ao nível adequado e, dada a complexidade técnica dos sistemas de gestão algorítmica, com a assistência de um especialista escolhido por esses trabalhadores ou pelos seus representantes, de forma concertada, se necessário.

(40)As pessoas que não têm uma relação de trabalho representam uma parte significativa das pessoas que trabalham nas plataformas. O impacto dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões utilizados pelas plataformas de trabalho digitais nas condições de trabalho e na possibilidade de remuneração destas pessoas é semelhante ao ao impacto sofrido pelos trabalhadores das plataformas. Por conseguinte, os direitos previstos nos artigos 6.º, 7.º e 8.º da presente diretiva relativos à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais no contexto da gestão algorítmica, nomeadamente os relativos à transparência dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões, às restrições ao tratamento ou recolha de dados pessoais, ao controlo humano e à revisão de decisões significativas, devem aplicar-se igualmente às pessoas na União que trabalham nas plataformas sem um contrato de trabalho ou uma relação de trabalho. Os direitos relativos à saúde e segurança no trabalho e à informação e consulta dos trabalhadores das plataformas ou dos seus representantes, que são específicos dos trabalhadores por conta de outrem à luz do direito da União, não devem ser-lhes aplicáveis. O Regulamento (UE) 2019/1150 prevê salvaguardas em matéria de equidade e transparência para os trabalhadores por conta própria que trabalham nas plataformas, desde que sejam considerados «utilizadores profissionais» na aceção desse regulamento. Sempre que tais salvaguardas digam respeito a elementos relativos a direitos e obrigações específicos estabelecidos na presente diretiva, as disposições pertinentes do Regulamento (UE) 2019/1150 devem prevalecer no que diz respeito aos utilizadores profissionais.

(41)A fim de assegurar que as plataformas de trabalho digitais cumprem a legislação e a regulamentação laboral, as obrigações em matéria de contribuições para a segurança social, a coordenação dos sistemas de segurança social e outras regras pertinentes, em especial quando estejam estabelecidas num país diferente do Estado-Membro onde o trabalhador da plataforma executa o trabalho, essas devem declarar o trabalho realizado pelos seus trabalhadores às autoridades competentes em matéria de trabalho e proteção social do Estado-Membro em que o trabalho é executado, em conformidade com as regras e os procedimentos previstos na legislação do Estado-Membro em causa.

(42)As informações relativas ao número de pessoas que trabalham regularmente nas plataformas digitais, a sua situação contratual ou estatuto profissional e os termos e condições gerais aplicáveis às relações contratuais são essenciais para os serviços de inspeção do trabalho, os organismos de proteção social e outras autoridades competentes, ao procurarem determinar o estatuto profissional correto das pessoas que trabalham nas plataformas e garantir o cumprimento das obrigações legais, bem como para os representantes das pessoas que trabalham nas plataformas, ao exercerem as suas funções representativas, devendo, por conseguinte, ser-lhes facultadas. Essas autoridades e representantes devem também ter o direito de solicitar às plataformas de trabalho digitais esclarecimentos e informações adicionais, incluindo dados básicos sobre as condições de trabalho em matéria de tempo de trabalho e remuneração.

(43)Foi desenvolvido um vasto sistema de disposições de execução do acervo social da União, cujos elementos deverão ser aplicados à presente diretiva, a fim de garantir que as pessoas que trabalham nas plataformas tenham acesso a mecanismos eficazes e imparciais de resolução de litígios e a vias de recurso, incluindo uma indemnização adequada. Mais especificamente, e tendo em conta o caráter fundamental do direito a uma proteção jurídica eficaz, as pessoas que trabalham nas plataformas deverão continuar a beneficiar dessa proteção mesmo após o termo da relação de trabalho ou outra relação contratual que deu azo à alegada violação de direitos ao abrigo da presente diretiva.

(44)Os representantes devem poder representar uma ou várias pessoas que trabalhem numa plataforma em qualquer processo judicial ou procedimento administrativo para fazer valer os direitos ou obrigações decorrentes da presente diretiva. A possibilidade de intentarem ações em nome ou em apoio de várias pessoas que trabalhem numa plataforma digital visa facilitar esses processos e procedimentos que, de outro modo, não teriam lugar devido a barreiras processuais e financeiras ou pelo receio de represálias.

(45)O trabalho nas plataformas digitais caracteriza-se pela inexistência de um local comum de trabalho onde os trabalhadores se possam conhecer e possam comunicar entre si e com os seus representantes, também com vista a defender os seus interesses perante o empregador. É, pois, necessário estabelecer canais de comunicação digitais que sejam adequados à organização do trabalho nas plataformas digitais, e que permitam às pessoas que trabalham nas plataformas comunicar entre si e ser contactadas pelos seus representantes. As plataformas de trabalho digitais devem criar esses canais de comunicação através da sua própria infraestrutura digital ou outros meios igualmente eficazes, respeitando, simultaneamente, a proteção dos dados pessoais e abstendo-se de aceder ou monitorizar essas comunicações.

(46)Nos processos judiciais ou procedimentos administrativos relativos à correta determinação do estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas digitais, as informações relativas à organização do trabalho que permitem estabelecer o estatuto profissional e, em especial, se a plataforma de trabalho digital controla determinados elementos da execução do trabalho, poderão estar na posse da plataforma de trabalho digital e não ser facilmente acessíveis a estas pessoas ou às autoridades competentes. Por conseguinte, os tribunais nacionais ou as autoridades competentes devem poder exigir que a plataforma de trabalho digital divulgue os elementos de prova pertinentes que estejam sob o seu controlo, incluindo informações confidenciais, desde que sejam tomadas medidas efetivas de proteção dessas informações.

(47)Uma vez que o artigo 6.º, o artigo 7.º, n.os 1 e 3, e o artigo 8.º da presente diretiva preveem regras específicas no contexto do trabalho nas plataformas digitais para assegurar a proteção dos dados pessoais dos trabalhadores na aceção do artigo 88.º do Regulamento (UE) 2016/679, e que o artigo 10.º da presente diretiva aplica essas salvaguardas também no caso de pessoas sem contrato de trabalho ou relação de trabalho, as autoridades de controlo nacionais a que se refere o artigo 51.º do Regulamento (UE) 2016/679 devem ter competência para controlar a aplicação dessas salvaguardas. Os capítulos VI, VII e VIII do Regulamento (UE) 2016/679 devem ser aplicáveis enquanto quadro processual para a aplicação das referidas salvaguardas, em especial no que diz respeito à supervisão, aos mecanismos de cooperação e coerência, e às vias de recurso, à responsabilidade e sanções, incluindo a a competência para impor coimas até ao montante referido no artigo 83.º, n.º 5, do referido regulamento.

(48)Os sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões utilizados no contexto do trabalho das plataformas digitais envolvem o tratamento de dados pessoais e afetam as condições de trabalho e os direitos das pessoas que trabalham nas plataformas. Consequentemente, suscitam questões relacionadas com a legislação relativa à proteção de dados, bem como com a legislação laboral e de proteção social. As autoridades de controlo da proteção de dados e as autoridades competentes em matéria laboral e de proteção social devem, por conseguinte, cooperar na aplicação da presente diretiva, nomeadamente através do intercâmbio de informações pertinentes, sem prejuízo da independência das autoridades de controlo da proteção de dados.

(49)Atendendo a que o objetivo da presente diretiva, a saber, melhorar as condições de trabalho nas plataformas de trabalho digitais, não pode ser suficientemente alcançado pelos Estados-Membros, mas pode, devido à necessidade de estabelecer requisitos mínimos comuns, ser alcançado de forma mais adequada ao nível da União, a União pode tomar medidas, em conformidade com o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.º do Tratado da União Europeia. Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no mesmo artigo, a presente diretiva não excede a ação necessária para alcançar esse objetivo.

(50)A presente diretiva estabelece requisitos mínimos, deixando aos Estados-Membros a prerrogativa de introduzirem ou manterem disposições mais favoráveis aos trabalhadores das plataformas. Os direitos adquiridos ao abrigo do atual quadro jurídico devem continuar a ser aplicáveis, salvo quando a diretiva introduza disposições mais favoráveis. A aplicação da presente diretiva não pode ser utilizada para reduzir os direitos previstos na legislação da União ou na legislação nacional em vigor neste domínio nem pode constituir um motivo válido para diminuir o nível geral de proteção no domínio abrangido pela presente diretiva.

(51)Ao dar execução à presente diretiva, os Estados-Membros devem evitar a imposição de restrições administrativas, financeiras e jurídicas que obstem à criação e ao desenvolvimento das micro, pequenas e médias empresas. Do mesmo modo, os Estados-Membros devem avaliar o impacto do respetivo ato de transposição nas empresas em fase de arranque e nas pequenas e médias empresas, com vista a garantir que não são afetadas de forma desproporcionada, concedendo especial atenção às microempresas e aos encargos administrativos. Os Estados-Membros devem também publicar os resultados dessas avaliações.

(52)Os Estados-Membros podem atribuir a execução da presente diretiva aos parceiros sociais, caso estes o solicitem em conjunto e desde que tenham sido tomadas todas as medidas necessárias pelos Estados-membros para assegurar que os parceiros sociais poderão sempre garantir os resultados pretendidos no âmbito da diretiva. Os Estados-Membros devem, igualmente, em conformidade com a legislação e as práticas nacionais, adotar medidas adequadas para garantir a participação efetiva dos parceiros sociais, e promover e reforçar o diálogo social, tendo em vista a aplicação das disposições da presente diretiva.

(53)De acordo com a Declaração Política Conjunta dos Estados-Membros e da Comissão, de 28 de setembro de 2011, sobre os Documentos Explicativos 65 , os Estados-Membros assumiram o compromisso de fazer acompanhar a notificação das suas medidas de transposição, nos casos em que tal se justifique, de um ou vários documentos que expliquem a relação entre as partes componentes da diretiva e as partes correspondentes dos instrumentos nacionais de transposição. Em relação à presente diretiva, o legislador considera que a transmissão desses documentos se justifica.

(54)A Autoridade Europeia para a Proteção de Dados foi consultada em conformidade com o artigo 42.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 2018/1725 do Parlamento Europeu e do Conselho 66 e emitiu um parecer XX XXXX 67 ,

ADOTARAM A PRESENTE DIRETIVA:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Artigo 1.º

Objeto e âmbito de aplicação

1.A presente diretiva visa melhorar as condições de trabalho das pessoas que trabalham nas plataformas, garantindo a correta determinação do seu estatuto profissional, promovendo a transparência, a equidade e a responsabilização na gestão algorítmica do trabalho nas plataformas, melhorando a transparência do trabalho nas plataformas, incluindo em situações transfronteiriças, e promovendo simultaneamente condições favoráveis ao crescimento sustentável das plataformas de trabalho digitais na União.

2.A diretiva estabelece direitos mínimos aplicáveis a todas as pessoas que trabalham em plataformas na União que têm um contrato de trabalho ou relação de trabalho, ou, com base numa apreciação dos factos, relativamente às quais se possa determinar a existência de um contrato de trabalho ou relação de trabalho, tal como definidos pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor em cada Estado-Membro, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Em conformidade com o artigo 10.º, os direitos previstos na presente diretiva relativos à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais no contexto da gestão algorítmica também se aplicam a todas as pessoas que trabalham em plataformas na União sem contrato de trabalho ou relação de trabalho.

3. A presente diretiva aplica-se às plataformas de trabalho digitais cujo trabalho seja executado na União, independentemente do seu local de estabelecimento e da legislação que seja de outra forma aplicável.

Artigo 2.º

Definições

1.Para efeitos do disposto na presente diretiva, entende-se por:

1.«plataforma de trabalho digital», uma pessoa singular ou coletiva que presta um serviço comercial que satisfaz cumulativamente os seguintes requisitos:

(a)é fornecido, pelo menos em parte, à distância, através de meios eletrónicos, como um sítio Web ou uma aplicação móvel;

(b)é prestado a pedido de um destinatário do serviço;

(c)implique, como componente necessária e essencial, a organização do trabalho realizado pelas pessoas que trabalham nas plataformas, independentemente de esse trabalho ser executado em linha ou num local físico;

2.«trabalho na plataforma digital», qualquer trabalho organizado através de uma plataforma de trabalho digital e executado na União por uma pessoa, com base numa relação contratual entre a plataforma de trabalho digital e essa pessoa, independentemente da existência ou não de relação contratual entre a pessoa e o destinatário do serviço;

3.«pessoa que trabalha na plataforma», qualquer pessoa que realiza um trabalho na plataforma digital, independentemente da designação contratual da relação entre essa pessoa e a plataforma de trabalho digital pelas partes envolvidas;

4.«trabalhador da plataforma», uma pessoa que executa um trabalho na plataforma digital com base num contrato de trabalho ou relação de trabalho, conforme definido pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor em cada Estado-Membro, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia;

5.«representantes», as organizações de trabalhadores ou os representantes, tal como previstos na legislação ou nas práticas nacionais, ou ambos;

6.«micro, pequenas e médias empresas», as micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas no anexo da Recomendação 2003/361/CE da Comissão 68 ;

2. A definição das plataformas de trabalho digitais estabelecida no n.º 1, ponto 1, não inclui os prestadores de um serviço cujo principal objetivo seja explorar ou partilhar ativos. Limita-se aos prestadores de serviços relativamente aos quais a organização do trabalho executado pelo indivíduo não constitua uma componente menor e meramente acessória.

CAPÍTULO II

ESTATUTO PROFISSIONAL

Artigo 3.º

Determinação correta do estatuto profissional

1. Os Estados-Membros devem dispor de procedimentos adequados para verificar e assegurar a correta determinação do estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas, a fim de verificar a existência de uma relação de trabalho, tal como definida pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor nos Estados-Membros, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça, e garantir que essas pessoas gozam dos direitos decorrentes do direito da União aplicáveis aos trabalhadores.

2. A determinação da existência de uma relação de trabalho deve basear-se primeiramente nos factos relativos à execução efetiva do trabalho, tendo em conta a utilização de algoritmos na organização do trabalho nas plataformas digitais, independentemente da forma como a relação é classificada em qualquer acordo contratual que possa ter sido concluído entre as partes envolvidas. Sempre que a existência de uma relação de trabalho seja estabelecida com base nos factos, a parte que assume as obrigações que incumbem ao empregador deve ser claramente identificada de acordo com os sistemas jurídicos nacionais.

Artigo 4.º

Presunção legal

1. A relação contratual existente entre uma plataforma de trabalho digital, que controla a execução do trabalho, na aceção do n.º 2, e uma pessoa que executa um trabalho através dessa plataforma deve ser considerada juridicamente uma relação de trabalho. Para o efeito, os Estados-Membros devem estabelecer um quadro de medidas aplicáveis, em conformidade com os respetivos sistemas jurídicos e judiciais nacionais.

A presunção legal é aplicável em todos os processos judiciais e procedimentos administrativos relevantes. As autoridades competentes responsáveis pelo controlo da aplicação e execução da legislação pertinente devem poder aplicar essa presunção.

2. Para que exista controlo da execução do trabalho, na aceção do n.º 1, devem aplicar-se, pelo menos, dois dos seguintes critérios:

(a)Efetiva determinação, ou fixação de limites máximos, do nível de remuneração;

(b)Imposição à pessoa que trabalha na plataforma de regras específicas de aparência ou conduta em relação ao destinatário ou relativas à execução do trabalho;

(c)Supervisão da execução do trabalho ou verificação da qualidade dos resultados do trabalho, incluindo por meios eletrónicos;

(d)Restrição efetiva, incluindo através de sanções, da liberdade de organizar o trabalho, em especial o poder para determinar o horário de trabalho ou os períodos de ausência, aceitar ou recusar tarefas ou recorrer a subcontratantes ou substitutos;

(e)Restrição efetiva da possibilidade de desenvolver uma carteira de clientes ou de executar trabalho para terceiros.

3. Os Estados-Membros devem adotar medidas que garantam a aplicação efetiva da presunção legal a que se refere o n.º 1, considerando simultaneamente o impacto das medidas nas empresas em fase de arranque, evitando práticas que restrinjam a livre atividade dos verdadeiros trabalhadores por conta própria e promovendo o crescimento sustentável das plataformas de trabalho digitais. Em especial, devem:

(a)Assegurar a divulgação pública das informações relativas à aplicação da presunção legal, de uma forma clara, completa e facilmente acessível;

(b)Emitir orientações destinadas às plataformas de trabalho digitais, às pessoas que trabalham nas plataformas e aos parceiros sociais, para que compreendam e apliquem a presunção legal, incluindo os procedimentos de ilisão, em conformidade com o artigo 5.º;

(c)Emitir orientações destinadas às autoridades responsáveis pelo controlo e execução da legislação, para que identifiquem proativamente e sancionem as plataformas de trabalho digitais incumpridoras;

(d)Reforçar os controlos e inspeções no terreno realizados pelos serviços de inspeção do trabalho ou pelos organismos responsáveis que garantem o cumprimento da legislação laboral, assegurando simultaneamente a proporcionalidade e a não discriminação dos controlos e inspeções efetuados.

4. No que diz respeito às relações contratuais que entraram em vigor antes da data estabelecida no artigo 21.º, n.º 1, e estejam ainda em vigor nessa data, a presunção legal a que se refere o n.º 1 só é aplicável ao período iniciado a partir dessa data.

Artigo 5.º

Ilidibilidade da presunção legal

Os Estados-Membros devem garantir que qualquer das partes possa ilidir a presunção legal a que se refere o artigo 4.º, num processo judicial ou num procedimento administrativo, ou ambos.

Sempre que a plataforma de trabalho digital alegar que uma relação contratual não constitui uma relação de trabalho, como definida pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor no Estado-Membro em causa, tendo em conta a jurisprudência do TJUE, o ónus da prova recai sobre a plataforma de trabalho digital. Estes processos não têm efeito suspensivo sobre a aplicação da presunção legal.

Sempre que uma pessoa que trabalhe numa plataforma alegar que a sua relação contratual não constitui uma relação de trabalho, como definida pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor no Estado-Membro em causa, tendo em conta a jurisprudência do TJUE, a plataforma de trabalho digital deve assistir essa pessoa tendo em vista uma resolução adequada do processo, nomeadamente disponibilizando todas as informações pertinentes que tenha em sua posse.

CAPÍTULO III

GESTÃO ALGORÍTMICA

Artigo 6.º

Transparência e utilização dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões

1. Sem prejuízo das obrigações e dos direitos das plataformas de trabalho digitais e dos trabalhadores das plataformas ao abrigo da Diretiva (UE) 2019/1152, os Estados-Membros devem exigir que as plataformas de trabalho digitais informem os seus trabalhadores sobre:

(a)Os sistemas automatizados de monitorização utilizados para monitorizar, supervisionar ou avaliar a execução do trabalho pelos trabalhadores das plataformas através de meios eletrónicos;

(b)Os sistemas automatizados de tomada de decisões utilizados para tomar ou apoiar decisões que afetem significativamente as condições de trabalho dos trabalhadores das plataformas, nomeadamente a atribuição de tarefas, a remuneração, a segurança e saúde no trabalho, o tempo de trabalho, as decisões de promoção e a situação contratual, incluindo a restrição, suspensão ou encerramento de contas pessoais.

2. As informações referidas no n.º 1 devem indicar:

(a)No que diz respeito aos sistemas automatizados de monitorização:

i)se esses sistemas estão a ser utilizados ou se foram tomadas medidas para a sua introdução,

ii)as categorias de ações monitorizadas, supervisionadas ou avaliadas por esses sistemas, incluindo qualquer avaliação pelo destinatário do serviço,

(b)No que diz respeito aos sistemas automatizados de tomada de decisões:

i)se esses sistemas estão a ser utilizados ou se foram tomadas medidas para a sua introdução,

ii)as categorias de decisões tomadas ou apoiadas por tais sistemas,

iii)os principais parâmetros aplicados por esses sistemas e a importância relativa desses parâmetros nas decisões automatizadas, incluindo a forma como o comportamento ou os dados pessoais dos trabalhadores da plataforma influenciam as decisões,

iv)os motivos subjacentes a qualquer decisão de restringir, suspender ou encerrar contas pessoais dos trabalhadores da plataforma, de recusar remuneração por trabalho efetuado pelos trabalhadores, e que altere a sua situação contratual ou produza efeitos semelhantes.

3. As plataformas de trabalho digitais devem fornecer as informações referidas no n.º 2 sob a forma de documento, que pode ser em formato eletrónico. Devem fornecer essas informações, o mais tardar, no primeiro dia de trabalho, bem como, em caso de alterações substanciais, em qualquer momento, caso sejam solicitadas pelos trabalhadores da plataforma. As informações devem ser apresentadas de uma forma concisa, transparente, inteligível e facilmente acessível, utilizando uma linguagem clara e simples.

4. As plataformas de trabalho digitais devem facultar as informações referidas no n.º 2 aos representantes dos trabalhadores das plataformas e às autoridades nacionais do trabalho, a pedido destes.

5. As plataformas de trabalho digitais não podem tratar dados pessoais sobre os trabalhadores das plataformas que não estejam intrinsecamente relacionadas com ou não sejam estritamente necessárias para a execução dos contratos concluídos entre esses trabalhadores e as plataformas. Em especial, não podem:

(a)Tratar dados pessoais sobre o estado emocional ou psicológico dos trabalhadores da plataforma;

(b)Tratar dados pessoais relacionados com a saúde dos trabalhadores da plataforma, exceto nos casos referidos no artigo 9.º, n.º 2, alíneas b) a j), do Regulamento (UE) 2016/679;

(c)Tratar dados pessoais relacionados com conversas privadas, incluindo intercâmbios com representantes dos trabalhadores das plataformas;

(d)Recolher dados pessoais quando os trabalhadores da plataforma não estejam a oferecer ou a executar um trabalho na plataforma digital.

Artigo 7.º

Controlo humano dos sistemas automatizados

1. Os Estados-Membros devem garantir que as plataformas de trabalho digitais controlam e avaliam regularmente o impacto nas condições de trabalho das decisões individuais tomadas ou apoiadas por sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões, tal como referido no artigo 6.º, n.º 1.

2. Sem prejuízo da Diretiva 89/391/CEE do Conselho e das diretivas conexas no domínio da segurança e saúde no trabalho, as plataformas de trabalho digitais devem:

(a)Avaliar os riscos dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões para a segurança e a saúde dos trabalhadores das plataformas, em especial no que diz respeito aos riscos de acidentes de trabalho, riscos psicossociais e ergonómicos;

(b)Avaliar se as salvaguardas previstas por esses sistemas são adequadas aos riscos identificados, tendo em conta as características específicas do contexto de trabalho;

(c)Introduzir medidas de prevenção e proteção adequadas.

As referidas plataformas não podem utilizar os sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões de nenhuma forma que possa exercer pressão indevida sobre os trabalhadores das plataformas ou que ponha em risco a saúde física e mental dos trabalhadores.

3. Os Estados-Membros devem exigir que as plataformas de trabalho digitais garantam os recursos humanos necessários para controlar o impacto nas condições de trabalho das decisões individuais tomadas ou apoiadas por sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões. As pessoas encarregadas do controlo pela plataforma de trabalho digital devem dispor da competência, formação e autoridade necessárias para exercer essa função. Beneficiam de proteção contra o despedimento, medidas disciplinares ou qualquer outro tratamento desfavorável motivados pela anulação de decisões automatizadas ou sugestão de decisões.

Artigo 8.º

Revisão humana de decisões importantes

1. Os Estados-Membros devem assegurar que os trabalhadores das plataformas têm o direito de obter uma explicação da plataforma de trabalho digital sobre qualquer decisão tomada ou apoiada por um sistema automatizado de tomada de decisões que afete significativamente as condições de trabalho dos trabalhadores da plataforma, tal como referido no artigo 6.º, n.º 1, alínea b). Em especial, os Estados-Membros devem assegurar que as plataformas de trabalho digitais garantem o acesso dos seus trabalhadores a uma pessoa de contacto, designada pela plataforma, para analisar e clarificar os factos, as circunstâncias e os motivos que levaram à decisão. As plataformas de trabalho digitais devem assegurar que essas pessoas de contacto dispõem da competência, formação e autoridade necessárias para exercer essa função.

A plataforma de trabalho digital deve fornecer ao trabalhador da plataforma uma declaração escrita dos motivos de qualquer decisão tomada ou apoiada por um sistema automatizado de tomada de decisões que restrinja, suspenda ou encerre a sua conta pessoal, qualquer de decisão de não pagamento de remuneração por trabalho realizado pelo trabalhador, qualquer decisão relativa à sua situação contratual ou qualquer decisão com efeitos semelhantes.

2. Se os trabalhadores das plataformas considerarem que a explicação ou declaração escrita dos motivos apresentada pela plataforma não é suficiente, ou se considerarem que a decisão a que se refere o n.º 1 viola os seus direitos, têm o direito de solicitar à plataforma de trabalho digital que reveja essa decisão. A plataforma de trabalho digital deve responder a esse pedido através de resposta devidamente fundamentada, sem demora injustificada, e, em qualquer caso, no prazo de uma semana a partir da data de receção do pedido.

No que diz respeito às plataformas de trabalho digitais que sejam micro, pequenas ou médias empresas, os Estados-Membros podem prever que o prazo de resposta referido no primeiro parágrafo seja de duas semanas.

3. Caso a decisão a que se refere o n.º 1 viole os direitos dos trabalhadores da plataforma, a plataforma de trabalho digital deve retificá-la sem demora ou, se tal retificação não for possível, oferecer uma indemnização adequada.

4. O presente artigo não prejudica os procedimentos aplicáveis ao despedimento previstos no direito nacional.

Artigo 9.º

Informação e consulta

1. Sem prejuízo dos direitos e obrigações decorrentes da Diretiva 2002/14/CE, os Estados-Membros devem assegurar a informação e consulta dos representantes dos trabalhadores das plataformas ou, na ausência desses representantes, dos trabalhadores em causa das plataformas, sobre decisões da plataforma de trabalho digital que visem introduzir ou alterar de forma substancial a utilização dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões a que se refere o artigo 6.º, n.º 1, em conformidade com o presente artigo.

2. Para efeitos do presente artigo, são aplicáveis as definições de «informação» e de «consulta» estabelecidas no artigo 2.º, alíneas f) e g), da Diretiva 2002/14/CE. São aplicáveis em conformidade as regras estabelecidas no artigo 4.º, n.os 1, 3 e 4, no artigo 6.º e no artigo 7.º da Diretiva 2002/14/CE.

3. Os representantes dos trabalhadores das plataformas ou os trabalhadores em causa das plataformas podem ser assistidos por um especialista da sua escolha, sempre que tal seja necessário para analisar a matéria que é objeto de informação e consulta e para formular um parecer. Sempre que uma plataforma de trabalho digital tenha mais de 500 trabalhadores num Estado-Membro, as despesas relativas a esse especialista serão suportadas pela plataforma desde que sejam proporcionadas.

Artigo 10.º

Pessoas que trabalham nas plataformas digitais sem relação de trabalho

1. O artigo 6.º, o artigo 7.º, n.os 1 e 3, e o artigo 8.º também são aplicáveis às pessoas que trabalham nas plataformas sem contrato de trabalho ou relação de trabalho.

2. O presente artigo aplica-se sem prejuízo do disposto no Regulamento (UE) 2019/1150. Em caso de conflito entre as disposições da presente diretiva e as disposições do Regulamento (UE) 2019/1150 no que diz respeito aos «utilizadores profissionais», como definidos nesse regulamento, as disposições do referido prevalecem e são aplicáveis a esses «utilizadores profissionais». O artigo 8.º da presente diretiva não se aplica aos «utilizadores profissionais», na aceção dada pelo Regulamento (UE) 2019/1150.

CAPÍTULO IV

TRANSPARÊNCIA DO TRABALHO NAS PLATAFORMAS DIGITAIS

Artigo 11.º

Declaração do trabalho nas plataformas digitais

Sem prejuízo do disposto nos Regulamentos (CE) n.º 883/2004 69 e (CE) n.º 987/2009 70 do Parlamento Europeu e do Conselho, os Estados-Membros devem exigir que as plataformas de trabalho digitais que sejam empregadores declarem o trabalho realizado pelos trabalhadores das plataformas às autoridades competentes em matéria laboral e de proteção social do Estado-Membro em que o trabalho é executado, e partilhem os dados pertinentes com essas autoridades, em conformidade com as regras e os procedimentos estabelecidos na legislação do Estado-Membro em causa.

Artigo 12.º

Acesso a informações pertinentes sobre o trabalho nas plataformas digitais

1. Caso as autoridades laborais e de proteção social e outras autoridades competentes exerçam as suas funções de garantia do cumprimento das obrigações legais aplicáveis ao estatuto profissional das pessoas que trabalham nas plataformas digitais, e sempre que os representantes das pessoas que trabalham nas plataformas digitais desempenhem as suas funções representativas, os Estados-Membros devem assegurar que as plataformas de trabalho digitais lhes disponibilizam as seguintes informações:

(a)O número de pessoas que trabalham regularmente na plataforma de trabalho digital em causa, e a situação contratual ou estatuto profissional dessas pessoas;

(b)Os termos e condições gerais aplicáveis às relações contratuais, quando sejam fixados unilateralmente pela plataforma de trabalho digital e se apliquem a um grande número de relações contratuais.

2. As informações devem ser fornecidas para cada Estado-Membro onde as pessoas que trabalham na plataforma executem trabalho através dessa plataforma. As informações devem ser atualizadas, pelo menos, de seis em seis meses e, no que se refere à alínea b) do n.º 1, sempre que os termos e condições sejam alterados.

3. As autoridades laborais e de proteção social e outras autoridades competentes, e os representantes das pessoas que trabalham nas plataformas digitais, têm o direito de solicitar às plataformas de trabalho digitais esclarecimentos e informações adicionais sobre quaisquer dados fornecidos. As plataformas de trabalho digitais devem responder a esse pedido num prazo razoável através de uma resposta devidamente fundamentada.

4. No que diz respeito às plataformas de trabalho digitais que sejam micro, pequenas ou médias empresas, os Estados-Membros podem permitir que a frequência da atualização da informação, a que se refere o n.º 2, seja de um ano.

CAPÍTULO V

RECURSOS E EXECUÇÃO

Artigo 13.º

Direito de recurso

Sem prejuízo dos artigos 79.º e 82.º do Regulamento (UE) 2016/679, os Estados-Membros devem assegurar que as pessoas que trabalham nas plataformas, incluindo aquelas cujo emprego ou outra relação contratual tenha cessado, tenham acesso a mecanismos eficazes e imparciais de resolução de litígios e ao direito de recurso, incluindo uma indemnização adequada, em caso de violação de direitos decorrentes da presente diretiva.

Artigo 14.º

Procedimentos em nome ou em apoio de pessoas que trabalham nas plataformas digitais

1. Sem prejuízo do disposto no artigo 80.º do Regulamento (UE) 2016/679, os Estados-Membros devem assegurar que os representantes das pessoas que trabalham nas plataformas ou outras entidades jurídicas que, de acordo com critérios estabelecidos na legislação ou nas práticas nacionais, tenham um interesse legítimo na defesa dos direitos dessas pessoas, possam intervir em qualquer processo judicial ou procedimento administrativo para fazer valer direitos ou obrigações decorrentes da presente diretiva. Esses representantes ou entidades podem agir em nome ou em apoio de uma pessoa que trabalhe numa plataforma em caso de violação de qualquer direito ou obrigação decorrente da presente diretiva, mediante aprovação dessa pessoa.

2. Os representantes das pessoas que trabalham nas plataformas também têm o direito de agir em nome ou em apoio de várias pessoas que trabalham na plataforma, mediante aprovação dessas pessoas.

Artigo 15.º

Canais de comunicação para as pessoas que trabalham nas plataformas

Os Estados-Membros devem adotar as medidas necessárias para assegurar que as plataformas de trabalho digitais oferecem às pessoas que trabalham nas plataformas os canais necessários para contactarem e comunicarem entre si, e serem contactadas pelos seus representantes, através de infraestruturas digitais das próprias plataformas ou outros meios igualmente eficazes, cumprindo simultaneamente as disposições do Regulamento (UE) 2016/679. Os Estados-Membros devem exigir que as plataformas de trabalho digitais se abstenham de aceder ou monitorizar esses contactos e comunicações.

Artigo 16.º

Acesso aos elementos de prova

1. Os Estados-Membros devem garantir que, nos processos relativos a um pedido relativo à correta determinação do estatuto profissional de pessoas que trabalham nas plataformas, os tribunais nacionais ou as autoridades competentes possam exigir que a plataforma de trabalho digital divulgue todos os elementos de prova relevantes que estejam sob o seu controlo.

2. Os Estados-Membros devem assegurar que os tribunais nacionais têm competência para ordenar a divulgação dos elementos de prova que contenham informações confidenciais, sempre tal seja considerado pertinente para o processo. Devem garantir que, ao exigir a divulgação dessa informação, os tribunais nacionais adotaram medidas eficazes para proteger as informações.

3. O presente artigo não obsta à manutenção ou à introdução pelos Estados-Membros de regras mais favoráveis às pessoas que trabalham nas plataformas.

Artigo 17.º

Proteção contra formas de tratamento ou consequências desfavoráveis

Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para proteger as pessoas que trabalham nas plataformas, incluindo os seus representantes, contra qualquer tratamento desfavorável por parte da plataforma de trabalho digital ou consequências adversas decorrentes de uma queixa contra a plataforma ou de eventuais ações instauradas para garantir o cumprimento dos direitos previstos na presente diretiva.

Artigo 18.º

Proteção contra o despedimento     

1. Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para proibir o despedimento ou medida equivalente, bem como qualquer ação preparatória de despedimento de pessoas que trabalhem nas plataformas, ao procurarem exercer os direitos conferidos pela presente diretiva.

2. As pessoas que trabalham nas plataformas que considerem ter sido despedidas, ou sujeitas a medidas de efeito equivalente, por terem exercido os direitos conferidos pela presente diretiva, podem solicitar à plataforma de trabalho digital que exponha de forma devidamente fundamentada os motivos do despedimento ou da medida equivalente. A plataforma digital de trabalho apresentará esses motivos por escrito.

3. Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que, caso sejam estabelecidos por uma pessoa que trabalhe numa plataforma, a que se refere o n.º 2, perante um tribunal ou outra autoridade ou entidade competente, factos que permitam presumir que existiu tal despedimento ou medida equivalente, incumbe à plataforma de trabalho digital provar que o despedimento ou a medida equivalente se baseou noutros motivos que não os referidos no n.º 1.

4. O n.º 3 não obsta a que os Estados-Membros imponham um regime probatório mais favorável às pessoas que trabalham nas plataformas.

5. Os Estados-Membros podem não aplicar o n.º 3 nos processos em que a averiguação dos factos incumba ao tribunal ou a outra autoridade ou órgão competente.

6. O n.º 3 não é aplicável aos processos penais, salvo disposição em contrário dos Estados-Membros.

Artigo 19.º

Fiscalização e sanções

1. A autoridade ou autoridades de controlo responsáveis pelo controlo da aplicação do Regulamento (UE) 2016/679 são igualmente responsáveis pelo controlo da aplicação do artigo 6.º, do artigo 7.º, n.os 1 e 3, e dos artigos 8.º e 10.º da presente diretiva, em conformidade com as disposições pertinentes dos capítulos VI, VII e VIII do referido regulamento. São competentes para aplicar coimas até ao montante referido no artigo 83.º, n.º 5, do mesmo regulamento.

2.As autoridades a que se refere o n.º 1 e as autoridades nacionais em matéria laboral e de proteção social, cooperarão, ase for caso disso, na aplicação da presente diretiva, no âmbito das respetivas competências, em especial nas questões relacionadas com o impacto nas condições de trabalho dos sistemas automatizados de monitorização e tomada de decisões ou sobre os direitos das pessoas que trabalho nas plataformas. Para o efeito, essas autoridades devem trocar entre si informações pertinentes, incluindo informações obtidas no contexto de inspeções ou investigações, mediante pedido ou por sua própria iniciativa. 

3. Os Estados-Membros devem estabelecer regras sobre as sanções aplicáveis em caso de infração das disposições nacionais adotadas nos termos da presente diretiva, além das referidas no n.º 1, ou de disposições relevantes já em vigor sobre direitos abrangidos pelo âmbito de aplicação da presente diretiva. As sanções previstas deverão ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas.

CHAPTER VI

DISPOSIÇÕES FINAIS

Artigo 20.º

Cláusula de não regressão e disposições mais favoráveis

1. A presente diretiva não constitui um fundamento válido para reduzir o nível geral de proteção já concedido aos trabalhadores nos Estados-Membros.

2. A presente diretiva não prejudica a faculdade de os Estados-Membros aplicarem ou introduzirem disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores das plataformas, ou favorecerem ou permitirem a aplicação de convenções coletivas que sejam mais favoráveis aos trabalhadores das plataformas, em consonância com os objetivos da diretiva. No que diz respeito às pessoas que trabalham nas plataformas que não têm uma relação de trabalho, o presente número só é aplicável na medida em que essas regras nacionais sejam compatíveis com as regras de funcionamento do mercado interno.

3.A presente diretiva é aplicável sem prejuízo de quaisquer outros direitos conferidos às pessoas que trabalham nas plataformas por outros atos jurídicos da União.

Artigo 21.º

Transposição e aplicação

1. Os Estados-Membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até [2 anos após a entrada em vigor]. Do facto informarão imediatamente a Comissão.

As disposições adotadas pelos Estados-Membros devem fazer referência à presente diretiva ou ser acompanhadas dessa referência aquando da sua publicação oficial. Os Estados-Membros estabelecem o modo como deve ser feita a referência.

2.Os Estados-Membros devem comunicar à Comissão o texto das principais disposições de direito interno que adotarem no domínio abrangido pela presente diretiva.

3. Em conformidade com a legislação e as práticas nacionais, os Estados-Membros tomarão as medidas adequadas para assegurar a participação efetiva dos parceiros sociais, bem como para promover e reforçar o diálogo social, tendo em vista a aplicação da presente diretiva.

4. Os Estados-Membros podem atribuir a execução da presente diretiva aos parceiros sociais, caso estes o solicitem em conjunto, desde que tomem todas as medidas necessárias para garantirem a todo o tempo os resultados pretendidos pela presente diretiva.

Artigo 22.º

Reexame pela Comissão

Até [5 anos após a entrada em vigor], a Comissão, após consulta dos Estados-Membros e dos parceiros sociais a nível da União e as principais partes interessadas, e tendo em conta o impacto nas micro, pequenas e médias empresas, reexaminará a aplicação da presente diretiva e proporá, se for caso disso, as alterações legislativas necessárias.

Artigo 23.º

Entrada em vigor

A presente diretiva entra em vigor no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia.

Artigo 24.º

Destinatários

Os destinatários da presente diretiva são os Estados-Membros.

Feito em Bruxelas, em

Pelo Parlamento Europeu    Pelo Conselho

O Presidente    O Presidente

(1)    Artigo 3.º do Tratado da União Europeia.
(2)    Princípio 5 do Pilar Europeu dos Direitos Sociais.
(3)    Orientações Políticas para a Próxima Comissão Europeia 2019-2024. «Uma União mais ambiciosa — O meu programa para a Europa». Disponível em linha .
(4)    Tal como definido na presente proposta de diretiva.
(5)    De Groen W., Kilhoffer Z., Westhoff L., Postica D. e Shamsfakhr F. (2021). «Digital labour platforms in the EU: Mapping and business models». Disponível em linha :
(6)    PPMI (2021), «Study to support the impact assessment of an EU initiative to improve the working conditions in platform work». Disponível em linha :
(7)    De Groen W., et al. (2021).
(8)    PPMI (2021).
(9)    Ibid.
(10)    Ver avaliação de impacto que acompanha a proposta de diretiva, secção 2.1. SWD(2021) 396 final.
(11)    Alguns instrumentos definem o seu âmbito de aplicação por referência às definições nacionais de «trabalhador» ou «trabalhador por conta outrem», ao passo que outros não incluem essa referência. Existe uma extensa jurisprudência do TJUE que define o âmbito de aplicação específico destes instrumentos.
(12)    Diretivas 2000/43, 2000/78, 2006/54 e 2010/41.
(13)    Diretiva (UE) 2019/1152. Os Estados-Membros devem assegurar a transposição até 1 de agosto de 2022.
(14)    Diretiva (UE) 2019/1158.
(15)    Diretiva 92/85/CEE.
(16)    Diretiva 2003/88/CE.
(17)    Acórdão do TJUE de 21 de fevereiro de 2018, Ville de Nivelles/Rudy Matzak,  C-518/15 , ECLI: EU:C:2018:82; confirmado e desenvolvido nos acórdãos de 9 de março de 2021, RJ/Stadt Offenbach am Main, C-580/19, ECLI:EU:C:2021:183; e de 9 de março de 2021, D.J./Radiotelevizija Slovenija, C-344/19, ECLI:EU:C:2021:182.
(18)    Diretiva 2008/104/CE.
(19)    Diretiva 89/391/CEE.
(20)    Diretiva 2002/14/CE.
(21)    COM(2020) 682 final.
(22)    COM(2021) 93 final.
(23)    Regulamento (CE) n.º 883/2004, de 29 de maio de 2004, e respetivo Regulamento de Execução (CE) n.º 987/2009.
(24)    Recomendação do Conselho de 8 de novembro de 2019 (2019/C 387/01).
(25)    Regulamento (UE) 2019/1150.
(26)    Regulamento (UE) 2016/679.
(27)    Centro Europeu de Especialização (ECE), «Jurisprudence of national courts in Europe on algorithmic management at the workplace» (a publicar).
(28)    COM(2021) 206 final.
(29)    TJUE, processos C-256/01, Allonby, e C-413/13, FNV Kunsten Informatie en Media.
(30)    Centro Europeu de Especialização (ECE), «Case Law on the Classification of Platform Workers: Cross-European Comparative Analysis and Tentative Conclusions» (2021). Disponível em linha :
(31)    PPMI (2021), secção 7.1.
(32)    Documento de consulta C(2020)1127 final.
(33)    Documento de consulta C(2020)4230 final, acompanhado do documento de trabalho dos serviços da Comissão SWD(2021)143 final.
(34)    Ver anexo A.3.1 da avaliação de impacto, SWD(2021)396.
(35)    Relatório do Parlamento Europeu «Condições de trabalho justas, direitos e proteção social para os trabalhadores de plataformas – Novas formas de emprego associadas ao desenvolvimento digital» (2019/2186(INI)). Disponível em linha :
(36)    Conclusões do Conselho «O futuro do trabalho: a União Europeia promove a Declaração do
Centenário da OIT», outubro de 2019. Disponível
em linha : Em dezembro de 2020, os ministros do emprego e dos assuntos sociais da UE realizaram um debate sobre o trabalho nas plataformas digitais e reconheceram que se trata de um fenómeno internacional com uma forte dimensão transfronteiriça, assumindo portanto a UE um importante papel na resposta a esses desafios.
(37)    Parecer do CESE: «Trabalho digno na economia das plataformas
[parecer exploratório a pedido da Presidência alemã]». Disponível
em linha :
(38)    Parecer do Comité das Regiões: «O trabalho nas plataformas digitais — Questões regulamentares de caráter local e regional». Disponível em linha :
(39)    Disponível em linha :
(40)    Disponível em linha :
(41)    Disponível em linha :
(42)    Síntese disponível online .
(43)    Disponível em linha :
(44)    A publicar brevemente.
(45)    Disponível em linha :
(46)    Disponível em linha.
(47)    Disponível em linha.
(48)    Disponível em linha.
(49)    SWD(2021) 396.
(50)    JO C 369 de 17.12.2011, p. 14.
(51)    JO C de , p.    
(52)    JO C de , p. .
(53)    Proclamação Interinstitucional sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (JO C 428 de 13.12.2017, p. 10).
(54)    Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, «Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais», COM(2021)102 final de 4 de março de 2021.
(55)    Diretiva (UE) 2019/1152 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativa a condições de trabalho transparentes e previsíveis na União Europeia (JO L 186 de 11.7.2019, p. 105).
(56)    Diretiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de novembro de 2003, relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho (JO L 299 de 18.11.2003, p. 9).
(57)    Diretiva 2008/104/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa ao trabalho temporário (JO L 327 de 5.12.2008, p. 9).
(58)    Recomendação 2019/C 387/01 do Conselho, de 8 de novembro de 2019, relativa ao acesso à proteção social dos trabalhadores por conta de outrem e por conta própria (2019/C 387/01) (JO C 387 de 15.11.2019, p. 1).
(59)    Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) (JO L 119 de 4.5.2016, p. 1).
(60)    Regulamento (UE) 2019/1150 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativo à promoção da equidade e da transparência para os utilizadores profissionais de serviços de intermediação em linha (JO L 186 de 11.7.2019, p. 57).
(61)    COM(2021) 206 final de 21 de abril de 2021.
(62)    Acórdãos do TJUE de 3 de julho de 1986, Deborah Lawrie-Blum/Land Baden-Württemberg, C-66/85, ECLI:EU:C:1986:284; de 14 de outubro de 2010, Union Syndicale Solidaires Isère/Premier ministre e outros, C-428/09, ECLI:EU:C:2010:612; de 4 de dezembro de 2014, FNV Kunsten Informatie en Media/Staat der Nederlanden, C-413/13, ECLI:EU:C:2014:2411; de 9 de julho de 2015, Ender Balkaya/Kiesel Abbruch- und Recycling Technik GmbH, C-229/14, ECLI:EU:C:2015:455; de 17 de novembro de 2016, Betriebsrat der Ruhrlandklinik gGmbH/Ruhrlandklinik gGmbH, C-216/15, ECLI:EU:C:2016:883; de 16 de julho de 2020, UX/Governo della Repubblica italiana, C-658/18, ECLI:EU:C:2020:572; e despacho do TJUE de 22 de abril de 2020, B/Yodel Delivery Network Ltd, C-692/19, ECLI:EU:C:2020:288.
(63)    Diretiva 89/391/CEE do Conselho, de 12 de junho de 1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho (JO L 183 de 29.6.1989, p. 1).
(64)    Diretiva 2002/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2002, que estabelece um quadro geral relativo à informação e à consulta dos trabalhadores na Comunidade Europeia (JO L 80 de 23.3.2002, p. 29).
(65)    JO C 369 de 17.12.2011, p. 14.
(66)    Regulamento (UE) 2018/1725 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos e organismos da União e à livre circulação desses dados, e que revoga o Regulamento (CE) n.º 45/2001 e a Decisão n.º 1247/2002/CE (JO L 295 de 21.11.2018, p. 39).
(67)    
(68)    Recomendação da Comissão, de 6 de maio de 2003, relativa à definição de micro, pequenas e médias empresas (C(2003)1422) (JO L 124 de 20.5.2003, p. 36).
(69)    Regulamento (CE) n.º 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (JO L 166 de 30.4.2004, p. 1).
(70)    Regulamento (CE) n.º 987/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009, que estabelece as modalidades de aplicação do Regulamento (CE) n.º 883/2004 relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (JO L 284 de 30.10.2009, p. 1).
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