COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 30.9.2020
SWD(2020) 322 final
DOCUMENTO DE TRABALHO DOS SERVIÇOS DA COMISSÃO
Relatório de 2020 sobre o Estado de Direito
Capítulo relativo à Roménia
que acompanha o documento
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
Relatório de 2020 sobre o Estado de Direito
Situação na União Europeia
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Resumo
Desde a adesão da Roménia à UE, em 2007, as reformas nacionais em domínios como a justiça e a luta contra a corrupção têm sido acompanhadas pela Comissão através do Mecanismo de Cooperação e de Verificação (MCV), como principal enquadramento para avaliar a realização de progressos quanto ao cumprimento dos objetivos de referência estabelecidos.
Em 2020, o Governo romeno reafirmou o seu compromisso de prosseguir na via da reforma do aparelho judicial após os retrocessos observados entre 2017 e 2019, o que levou a uma diminuição significativa das tensões com o poder judicial. As recentes nomeações de novos responsáveis para os principais serviços de ação penal poderão abrir o caminho a uma ação mais eficaz por parte do Ministério Público. Contudo, os progressos realizados quanto à alteração da legislação aplicável foram adiados devido à pandemia de Covid-19, conjugada com a realização das próximas eleições legislativas. Subsistem as medidas controversas com impacto negativo na independência judicial, nomeadamente a secção especial para a investigação dos crimes cometidos por magistrados, encarregada exclusivamente do julgamento dos crimes cometidos por juízes e procuradores. A persistência destas medidas agrava a incerteza quanto ao funcionamento do sistema judicial, sobretudo devido ao seu efeito conjugado. Além disso, algumas dessas medidas podem afetar negativamente os recursos humanos no quadro do sistema de justiça, com repercussões na sua eficácia.
A Roménia dispõe de um quadro estratégico nacional global de luta contra a corrupção assente na ampla participação dos intervenientes institucionais a nível nacional e local. Apesar dos progressos realizados e dos resultados obtidos neste domínio na última década, os desafios colocados ao poder judicial entre 2017 e 2019 suscitaram dúvidas quanto à sustentabilidade das reformas em matéria de luta contra a corrupção. Mesmo que o atual contexto político implique menos confrontação, as principais instituições enfrentam uma conjuntura muito conturbada, com consequências na aplicação do quadro jurídico e nas capacidades institucionais. Embora as principais instituições competentes tenham prosseguido a sua atividade, esta situação prejudica os esforços envidados para manter os bons resultados em matéria de processos judiciais e de obtenção de condenações nos processos por grande corrupção. As alterações pendentes do Código Penal e do Código de Processo Penal aumentam a incerteza quanto à eficácia do quadro jurídico de luta contra a corrupção, pelo que é importante que se encontrem soluções jurídicas e políticas para responder às principais questões suscitadas pelo Tribunal Constitucional. O atual Governo tem demonstrado um empenho renovado em realizar progressos na vertente preventiva através da estratégia nacional global de luta contra a corrupção.
Estão previstas as salvaguardas jurídicas necessárias quanto à liberdade e ao pluralismo dos meios de comunicação social. No entanto, colocam-se algumas questões em relação à aplicação e ao cumprimento do atual quadro legislativo. A transparência da propriedade dos meios de comunicação social não é absoluta, e a autoridade reguladora do setor audiovisual não dispõe dos recursos necessários para exercer plenamente as suas funções. Os meios de comunicação social podem ver-se sujeitos a pressões políticas, uma vez que praticamente não existem garantias jurídicas específicas quanto à independência editorial, com exceção de uma certa auto-regulação a nível das redações e dos editores.
O processo ordinário de elaboração e promulgação de legislação encontra-se bem regulamentado, existindo um sistema institucional de equilíbrio de poderes alargado, mas de eficácia variável. O Governo continua a recorrer demasiado aos decretos de emergência e a constante descoordenação nas alterações legislativas tem igualmente impacto na qualidade da legislação e na segurança jurídica, nomeadamente para as empresas. Existe um quadro legislativo favorável à sociedade civil, que é uma força ativa e tem sido capaz de reagir às tentativas de limitar a sua intervenção. A sociedade civil tem desempenhado um importante papel na defesa do Estado de direito na Roménia.
Uma particularidade da Roménia, assim como da Bulgária, prende-se com o facto de, aquando da adesão destes países à União Europeia, em 2007, ter sido criado um Mecanismo de Cooperação e de Verificação (MCV) enquanto medida transitória para facilitar a prossecução dos esforços dos mesmos na reforma dos respetivos sistemas judiciais, assim como para intensificar a luta contra a corrupção
. Em conformidade com a decisão que estabelece o MCV, este cessará de vigorar quando todos os objetivos de referência aplicáveis à Roménia tiverem sido cumpridos de forma satisfatória
. No seu relatório de janeiro de 2017, a Comissão aprovou uma avaliação global dos progressos da Roménia ao longo dos dez anos do MCV. Definiu ainda um roteiro para a conclusão do Mecanismo baseado em 12 recomendações-chave finais que, se respeitadas, serão suficientes para cumprir os objetivos do MCV. Tendo em conta a evolução registada na Roménia, em novembro de 2018, a Comissão decidiu emitir oito recomendações adicionais. No último relatório sobre o MCV, aprovado em outubro de 2019, a Comissão concluiu que a Roménia ainda tinha de realizar progressos no que respeita à aplicação das recomendações dos relatórios de janeiro de 2017 e novembro de 2018. Em 2019, os tribunais romenos apresentaram ao Tribunal de Justiça da UE vários pedidos de decisões prejudiciais relativamente às obrigações da Roménia ao abrigo do MCV e destinadas a dar seguimento às recomendações do mesmo
. Os processos correspondentes encontram-se atualmente pendentes.
I. Sistema judicial
A estrutura do sistema judicial romeno contempla quatro instâncias, tanto civis como militares: os tribunais de comarca de primeira instância, os tribunais de competência genérica e especializados, os tribunais de recurso
e o Supremo Tribunal de Cassação e Justiça. O Supremo Tribunal de Cassação e Justiça julga os processos de primeira instância e os recursos interpostos em matéria penal relativos a determinadas categorias de pessoas
, bem como os recursos relativos a certos processos civis e administrativos. Cabe a este tribunal assegurar que os outros tribunais interpretam e aplicam a lei de maneira uniforme. O Conselho Superior da Magistratura é responsável por garantir a independência judicial e está dividido em duas secções: a dos juízes e a dos procuradores. O recrutamento e a gestão da carreira dos juízes e dos procuradores é da competência exclusiva da respetiva secção, que atua ainda na qualidade de tribunal disciplinar em questões disciplinares. O Ministério Público é dirigido pelo procurador-geral (Procuradoria-Geral), que está adstrito ao Supremo Tribunal de Cassação e Justiça. O Ministério Público inclui estruturas especializadas com jurisdição e organização especiais: a Direção Nacional Anticorrupção (DNA) e a Direção de Investigação e Combate à Criminalidade Organizada e ao Terrorismo (DIICOT), encabeçadas por procuradores principais, e, desde 2018, a Secção do Ministério Público para a Investigação de Infrações na Magistratura (SIIJ)
. Existem igualmente procuradorias militares. O procurador-geral e os procuradores que dirigem as estruturas especializadas, DNA e DIICOT, são nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do ministro da Justiça e após parecer não vinculativo do Conselho Superior da Magistratura
. A Associação Nacional das Ordens dos Advogados da Roménia (UNBR) é uma entidade de interesse público que abrange as 41 ordens existentes no país. O Tribunal Constitucional é responsável por fiscalizar a constitucionalidade das leis e por resolver os eventuais conflitos de natureza constitucional entre autoridades públicas.
Independência
Algumas das alterações à legislação judicial introduzidas em 2018 e 2019 continuam a suscitar preocupação quanto ao seu impacto na independência judicial. A legislação judicial regulamenta o estatuto dos juízes e procuradores, a organização do sistema judicial e o funcionamento do Conselho Superior da Magistratura. As alterações, que entraram em vigor em julho e outubro de 2018, foram posteriormente objeto de nova alteração por meio de decretos de emergência do Governo. As medidas suscitaram alguma preocupação, em particular porque o seu efeito combinado foi considerado por várias partes interessadas nacionais e internacionais uma séria ameaça à independência do sistema judicial
. Foram identificados problemas graves relacionados com a criação da secção especial para a investigação dos crimes cometidos por magistrados (SIIJ), o sistema de responsabilidade civil dos juízes e procuradores, os regimes de reforma antecipada, o acesso à profissão e o estatuto e nomeação dos procuradores de grau superior. Desde o início, o seu funcionamento confirmou as preocupações quanto à pressão sobre juízes e procuradores e quanto à independência, eficiência e qualidade do sistema judicial
. Além disso, a aplicação continuada da legislação veio evidenciar novos problemas, para além dos identificados inicialmente
.
A aplicação prolongada da legislação judicial alterada aumenta a incerteza quanto ao funcionamento do sistema judicial. Embora tenha manifestado interesse em encetar um diálogo com o poder judicial e os partidos políticos com vista a reverter as medidas controversas, o atual Governo salientou que a atual situação política não reúne as condições adequadas para se alcançar um amplo consenso e a maioria necessária no Parlamento para garantir o apoio a reformas profundas
. É pouco provável que tais reformas sejam levadas a cabo antes das próximas eleições legislativas. O facto de as alterações permanecerem em vigor cria incerteza quanto ao funcionamento do sistema judicial no seu conjunto e aos magistrados individualmente, nomeadamente quanto à respetiva independência, estatuto e carreira. Essa incerteza é agravada por fortes divisões dentro do sistema judicial quanto às soluções para alterar a legislação judicial. Neste contexto, e embora de acordo com as suas funções devesse assumir a liderança e procurar um consenso, o trabalho recente do Conselho Superior da Magistratura tem sido marcado por divisões e controvérsias internas.
A perceção da independência judicial entre a população é baixa, mostrando uma tendência decrescente nos últimos anos. O grau de perceção da independência judicial entre a população permanece baixo (37 %) e continua a diminuir
. Entre as empresas, o nível de perceção da independência judicial é médio (53 %)
. Em ambos os casos, o motivo mais frequentemente invocado para esta perceção de falta de independência judicial prende-se com a ingerência ou pressão do governo e dos políticos
. O debate público sobre o poder judicial tem sido marcado por fortes tensões e por ataques públicos ao poder judicial por parte de políticos e da comunicação social
, embora as tensões tenham diminuído significativamente com o atual Governo. Apesar de o Conselho Superior da Magistratura ter reagido a algumas queixas que lhe foram apresentadas relativamente à defesa da independência, reputação e imparcialidade dos magistrados, a atividade global do Conselho neste domínio foi limitada
.
A secção especial para a investigação dos crimes cometidos por magistrados (SIIJ) permanece em funções, apesar das críticas generalizadas. Esta secção
tem como tarefa exclusiva julgar crimes cometidos por juízes e procuradores. Além disso, pode intentar processos contra pessoas investigadas em conjunto com os juízes ou magistrados em causa
. A Comissão de Veneza observou que a lógica subjacente à criação desta secção não parece justificada por provas factuais
e que a sua criação e prática têm sido criticadas tanto pelos seus efeitos sobre a independência dos magistrados como pelo impacto negativo na eficácia da ação penal
. Além disso, a perceção de que a pressão da secção pode afetar a independência judicial também tem um impacto negativo na imagem de independência, que é, por si só, um requisito essencial da independência judicial
. O atual ministro da Justiça iniciou consultas sobre uma proposta para dissolver a secção e restabelecer o modelo organizacional anterior do Ministério Público
, mas tanto a pandemia de Covid-19 como a situação política impediram que estas medidas avançassem, pelo que a secção continua operacional. Em 21 de julho de 2020, o Parlamento rejeitou um projeto da iniciativa de um grupo de deputados com vista à dissolução da secção, que já havia recebido um parecer consultivo negativo por parte do Conselho Superior da Magistratura
. Embora as autoridades e partes interessadas afirmem que, desde outubro de 2019, a secção abandonou a prática de retirar recursos e que o número de ações intentadas contra magistrados diminuiu, o receio de que possa ser utilizada como instrumento de pressão sobre os magistrados mantém-se. Em 2019, os tribunais romenos apresentaram vários pedidos de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça da UE, questionando a compatibilidade da criação da secção com o direito da União, em particular com o artigo 19.º, n.º 1, do TUE e com o artigo 47.º da Carta
. Os processos correspondentes encontram-se atualmente pendentes.
Em 2019, foram nomeados novos chefes dos serviços do Ministério Público, mas subsistem as antigas preocupações com o processo de nomeação e destituição de procuradores de alto nível. Em outubro de 2019, nenhum dos organismos responsáveis pela ação penal tinha uma liderança nomeada
. Uma das primeiras medidas tomadas pelo atual ministro da Justiça foi organizar os processos de seleção, com maior transparência, e avançar com um processo de nomeação da chefia do Ministério Público
. No entanto, enquanto o novo procurador-geral da DNA foi nomeado na sequência de um parecer positivo do Conselho Superior da Magistratura, o procurador-geral e o procurador-geral da DIICOT foram nomeados apesar do parecer negativo do Conselho. Esta situação pôs em evidência as deficiências de longa data anteriormente expostas pela Comissão, que, no contexto do MCV, recomendou a adoção de um processo de nomeação mais rigoroso e independente e que seria mais fácil alcançar uma solução sustentável com o apoio da Comissão de Veneza
.
A destituição, em 2018, do antigo procurador-geral da Direção Anticorrupção foi analisada pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), que considerou que a Roménia havia violado os artigos 6.º, n.º 1, («Direito a um processo equitativo») e 10.º («Liberdade de expressão») da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, no contexto da destituição do antigo procurador-geral da DNA
. O TEDH considerou que o antigo procurador-geral não teve condições para impugnar eficazmente em tribunal as razões da sua destituição
. Nesse contexto, o TEDH chamou a atenção para a crescente importância atribuída à intervenção de uma autoridade independente do executivo e do legislativo nas decisões que afetam a nomeação e a destituição de procuradores
. No que diz respeito à liberdade de expressão, o TEDH sublinhou que a destituição pode ter um efeito inibidor, na medida em que desincentiva outros procuradores e juízes de participarem no debate público sobre as reformas legislativas que afetam o sistema judicial e, de um modo mais geral, sobre questões relativas à independência do poder judicial
. Relativamente à participação dos magistrados no debate público, os relatórios no âmbito do MCV revelaram preocupações quanto à prática da Inspeção Judicial
de instaurar processos disciplinares contra juízes e procuradores com base na tomada de posições públicas sobre as reformas judiciais
.
As alterações à Lei relativa ao estatuto dos juízes e procuradores modificaram as regras que regem a responsabilidade civil dos juízes
. As novas regras conferem ao Ministério das Finanças o direito de avaliar se um erro judicial foi cometido de má-fé ou por negligência grosseira e de, posteriormente, instaurar ações de recuperação contra os juízes pelos danos causados por sentenças proferidas. O novo regime prevê que, para apurar a responsabilidade civil de um juiz, tribunal deve estabelecer primeiramente que a sentença em causa continha um erro judicial e que o lesado deve receber uma indemnização, sem que o juiz que proferiu a decisão impugnada participe neste primeiro processo judicial. Seguidamente, o Ministério das Finanças pode instaurar uma ação judicial de recuperação contra o juiz, com base na sua própria avaliação do facto de que o erro judicial resultou do exercício de deveres e prerrogativas de má-fé ou por negligência grosseira
. Embora o Ministério tenha a obrigação de consultar a Inspeção Judicial sobre esta matéria, o parecer desta última não é vinculativo. O Conselho da Europa reconheceu que, embora possa ser legítimo prever a responsabilidade pessoal de um juiz pelos danos causados por uma decisão proferida de má-fé ou por negligência grosseira, tal possibilidade deve ser circunscrita com salvaguardas claras
, a fim de proteger os juízes contra abusos e impedir que o executivo exerça pressões indevidas sobre os mesmos. Foi manifestada preocupação quanto ao poder atribuído ao Ministério das Finanças neste contexto
. O Conselho da Europa assinalou o potencial efeito inibidor que este novo regime pode ter sobre os juízes e os procuradores, especialmente em conjugação com a criação da nova Secção do Ministério Público para a Investigação de Infrações na Magistratura
. Encontra-se pendente no Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial relativo ao novo regime de responsabilidade civil dos magistrados
.
Qualidade
O défice de recursos humanos no sistema judicial tem-se vindo a agravar. Em dezembro de 2019, estavam por preencher mais de 12 % dos cargos de juízes
e quase 20 % dos cargos de procuradores
. Há a preocupação de que o sistema judicial possa ficar com cada vez menos pessoal quando o novo regime de reforma antecipada dos juízes de grau superior
entrar em vigor
. Embora a entrada em vigor do regime de reforma antecipada tenha sido adiada
, esta é uma solução temporária, que não dissipa completamente as preocupações
. Além disso, os tribunais de instância inferior são igualmente suscetíveis de ser afetados pela falta de pessoal, uma vez que as novas disposições prolongaram o período de formação e de estágio dos candidatos a juízes
e que a pandemia de Covid-19 atrasou os novos processos de recrutamento, não tendo sido apresentadas estratégias de recursos humanos pelo Conselho Superior da Magistratura. Além disso, o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional a disposição que atribui ao Conselho Superior da Magistratura a função de aprovar o regulamento relativo à organização e realização do concurso de admissão à magistratura
, o que poderá gerar mais atrasos nos novos recrutamentos
.
A criação da Gestão Estratégica Judicial não produziu os resultados esperados. Em 2017, foi estabelecida a Gestão Estratégica Judicial com o objetivo de abordar os problemas estratégicos mais importantes do sistema judicial, reunindo as principais instituições com responsabilidade no funcionamento do sistema
. Era ainda responsável por assegurar a execução do plano de ação da estratégia para o desenvolvimento do poder judicial de 2015-2020
, o qual viria a tornar-se o principal motor da reforma judicial, internalizando a dinâmica do processo de reformas do MCV. O plano de ação incluía soluções para as questões relacionadas com a escassez de funcionários judiciais, o volume de trabalho excessivo e os atrasos na fundamentação das decisões. No entanto, após a sua criação, a Gestão Estratégica Judicial não tem funcionado como previsto e o plano de ação continua, em grande medida, por executar.
A Roménia tem um bom nível geral de digitalização da justiça e continua a envidar esforços nesse sentido. Atualmente, é possível transmitir convocatórias e acompanhar as diferentes fases dos processos pela Internet, assim como intentar uma ação por via eletrónica na maioria dos tribunais
. No entanto, só algumas sentenças estão acessíveis na Internet
. Estão a ser envidados esforços no sentido de melhorar o sistema de gestão de processos, que será utilizado para identificar o número de sentenças transitadas em julgado em que as instituições públicas são devedoras ou credoras. Atualmente, está a ser desenvolvida uma análise para identificar os passos necessários para a modernização do sistema, incluindo funcionalidades como a acessibilidade eletrónica dos documentos processuais, um arquivo eletrónico e a assinatura eletrónica. Essa análise deverá estar concluída até ao final de 2020.
Eficiência
De um modo geral, o sistema judicial gere o volume de processos de forma eficaz. Em 2018, a duração dos processos civis e comerciais nos tribunais de primeira instância diminuiu ligeiramente em comparação com 2017
, embora se tenha mantido quase inalterada relativamente aos processos administrativos
. A taxa de resolução de processos aumentou, estando agora acima dos 100 %
, o que significa que o sistema judicial tem condições de resolver mais processos do que aqueles que entram. De um modo geral, a duração dos processos relativos a domínios específicos da legislação da UE é comparativamente baixa
, exceto nos processos por branqueamento de capitais
.
As alterações legislativas que afetam os recursos humanos podem entravar os esforços da Roménia para reduzir a duração dos processos judiciais. Algumas alterações legislativas de 2018 podem pôr em risco os esforços para reduzir a duração excessiva dos processos civis e penais
. Foram suprimidas as disposições do Código de Processo Civil relativas aos processos conduzidos pelas secções, com o objetivo de melhorar a eficácia da sua tramitação
. Não obstante, a principal preocupação prende-se com as alterações da legislação judicial que correm o risco de contribuir para o aumento do défice de recursos humanos (ver acima), mas que também exigem juízes adicionais em determinados coletivos
ou com mais antiguidade nos serviços especializados do Ministério Público. As partes interessadas manifestaram igualmente preocupação no que se refere à eficiência do sistema judicial
. Em resposta a estas preocupações, o Conselho Superior da Magistratura lançou dois projetos destinados a identificar os instrumentos necessários para o desenvolvimento do sistema judicial e a abordar as causas do excessivo volume de trabalho dos tribunais
.
II. Combate à corrupção
O quadro legislativo e institucional de combate à corrupção da Roménia já está, em grande medida, em vigor. Tem estado a ser aplicada a estratégia nacional de luta contra a corrupção, que abrange o período de 2016 a 2020. A coordenação da aplicação dessa estratégia é assegurada pelo Ministério da Justiça. Cabe ao serviço especializado anticorrupção do Ministério Público, a Direção Nacional Anticorrupção (DNA), investigar os casos de corrupção de médio e alto nível e à Procuradoria-Geral investigar todos os outros casos de corrupção. Existe uma direção especializada anticorrupção no Ministério do Interior, com competência em questões de integridade e de corrupção relativas ao pessoal do Ministério, incluindo os agentes da polícia. A Agência Nacional para a Integridade (ANI) é responsável pelo controlo e verificação das declarações de património, dos conflitos de interesses e das incompatibilidades, nomeadamente de todos os funcionários eleitos. A Agência Nacional de Gestão dos Bens Apreendidos (ANABI) assegura a gestão dos bens de origem criminosa que tenham sido apreendidos ou confiscados.
No Índice de Perceção da Corrupção da Transparência Internacional, a Roménia obteve uma pontuação de 44 pontos em 100, tendo ficado classificada em 19.º lugar na União Europeia e em 70.º a nível mundial
. Entre os inquiridos, 83 % consideram que a corrupção é generalizada no seu país (média da UE: 71 %) e 64 % sentem-se pessoalmente afetados pela corrupção no seu quotidiano (média da UE: 26 %)
. No que respeita às empresas, 97 % consideram que a corrupção é generalizada (média da UE: 63 %), e 88 % que a corrupção é um problema para a atividade empresarial (média da UE: 37 %). Ao mesmo tempo, 58 % dos inquiridos consideram ter sido instaurado um número suficiente de ações penais bem-sucedidas para dissuadir as pessoas de práticas corruptas (média da UE: 36 %), enquanto 37 % das empresas consideram que as pessoas e as empresas julgadas por subornar um funcionário superior são devidamente punidas (média da UE: 31 %)
.
A Roménia dispõe de um quadro estratégico nacional global de luta contra a corrupção assente na ampla participação dos intervenientes institucionais a nível nacional e local. A atual estratégia nacional de luta contra a corrupção, que abrange o período 2016-2020, prevê a participação voluntária de uma grande parte da administração pública, incluindo as autarquias locais, e das empresas públicas, bem como as forças policiais, o Ministério Público, os tribunais e a sociedade civil. Os instrumentos de prevenção baseiam-se nos planos de prevenção da corrupção elaborados por cada instituição participante, através de autoavaliações e avaliações de risco, bem como em metodologias desenvolvidas em comum e avaliações pelos pares. A eficácia da estratégia dependerá fortemente do empenho político, tendo a sua aplicação sido bastante moderada no período 2017-2019, apesar dos prazos estabelecidos pelo Governo em agosto de 2016. Em 2019, o empenho do atual Governo em combater a corrupção traduziu-se num ímpeto renovado para aplicar a estratégia nacional de luta contra a corrupção. A estratégia tem sido mais bem aplicada e as ações preventivas estão a ser seguidas tanto a nível nacional como a nível local. O Ministério da Justiça está também a avaliá-la a fim de conceber a estratégia futura
.
A eficácia da investigação e o sancionamento dos crimes de corrupção foi afetada pela pressão exercida sobre o enquadramento jurídico e institucional. No período entre 2013 e 2017, o historial das instituições envolvidas na investigação, repressão e decisão em processos de corrupção de alto e médio nível manteve-se sólido e coerente. Em 2018 e 2019, embora as instituições tenham continuado a investigar e sancionar crimes de grande corrupção, os relatórios no âmbito do MCV registaram um padrão de pressão sobre as principais instituições anticorrupção, bem como a preocupação crescente de que essa pressão constante tivesse um impacto negativo. Tanto a DNA como o procurador-geral
mencionaram um recuo nos resultados da luta contra a corrupção em 2019. A direção interina durante um período prolongado afetou a sua capacidade de lidar com a pressão constante e os constantes problemas encontrados. A sua capacidade institucional foi ainda afetada pelas disposições prejudiciais das alterações à legislação judicial em matéria de recursos humanos
. A criação da secção especial para a investigação dos crimes cometidos por magistrados (SIIJ) também teve impacto nos resultados obtidos em matéria de luta contra a corrupção de alto nível
. Além disso, algumas decisões do Tribunal Constitucional tiveram especial impacto nos casos de corrupção de alto nível, designadamente as decisões relativas à criação dos coletivos penais de três e cinco juízes no Supremo Tribunal de Cassação e Justiça
, aos métodos de supervisão técnica (escutas telefónicas)
e ao crime de abuso de poder relacionado com a corrupção
. De acordo com a DNA, as implicações combinadas destas decisões são particularmente graves, na medida em que levam ao abandono de investigações e à anulação de processos em tribunal, à anulação de decisões transitadas em julgado e à reabertura de processos sobre o mérito dos processos em questão, com o risco de permitir a fuga à responsabilidade penal por delitos de corrupção. Nos primeiros meses de 2020, a situação parece ter melhorado com a redução da pressão política e a nomeação de equipas de direção estáveis. No entanto, subsiste a incerteza quanto às investigações e julgamentos em curso em casos de grande corrupção. Durante o período 2015-2019, a Roménia teve o segundo maior número de investigações do OLAF (40) encerradas com uma recomendação financeira de todos os Estados-Membros
.
A permanente incerteza sobre as alterações ao Código Penal e ao Código de Processo Penal pode comprometer a luta contra a corrupção. Há muito que se mostra necessário introduzir certas alterações no Código Penal e no Código de Processo Penal
. Estas alterações devem, sobretudo, encontrar soluções jurídicas e políticas para uma série de decisões de grande alcance tomadas pelo Tribunal Constitucional desde 2014 e que anularam disposições dos códigos, afetando, em particular, a luta contra a corrupção e a criminalidade organizada
. No entanto, em abril de 2019, o Parlamento aprovou, através do procedimento de urgência, alterações ao Código Penal, ao Código de Processo Penal e à Lei especial relativa à corrupção, com potenciais consequências negativas para a luta contra a criminalidade em geral e a luta contra a corrupção em particular. Estas alterações, que se seguiram uma tentativa inicial abortada de enfraquecer os códigos penais em 2018
, foram objeto de críticas generalizadas e consideradas inconstitucionais, em julho de 2019
. Por conseguinte, não entraram em vigor. A tarefa de harmonizar o Código Penal e o Código de Processo Penal com todas as decisões do Tribunal Constitucional continua pendente. Em consequência, subsiste a incerteza jurídica e os riscos para a sustentabilidade da luta contra a corrupção.
Subsistem ainda alguns obstáculos a uma ação penal eficaz. Um problema específico diz respeito à responsabilidade do Parlamento nas suas decisões sobre pedidos do Ministério Público para autorizar medidas preventivas, como buscas ou detenções, e sobre pedidos de autorização para investigar deputados que sejam ou tenham sido ministros. Em resposta às recomendações no âmbito do MCV e do GRECO
, a Câmara dos Deputados alterou o seu regulamento interno em 2019, tendo esta passado a aplicar os critérios estabelecidos pela Comissão de Veneza. O novo procedimento ainda não foi testado e o Senado não tem um procedimento semelhante. Em 2019, foram rejeitados dois pedidos do Ministério Público para investigar dois ex-ministros membros do Parlamento.
A Agência Nacional para a Integridade (ANI) continua a realizar progressos, embora a sua eficácia seja comprometida pelo enfraquecimento do quadro legislativo e pela diminuição dos respetivos recursos. A ANI é responsável por examinar os casos de conflitos de interesses, incompatibilidades e enriquecimento injustificado na administração pública, tendo obtido bons resultados. O sancionamento das incompatibilidades e conflito de interesses é um elemento importante para prevenir a corrupção. A ANI dispõe de instrumentos eficazes para prevenir conflitos de interesse administrativos, nomeadamente em matéria de contratos públicos, levando a cabo campanhas globais de sensibilização, por exemplo relacionadas com as eleições nacionais e locais. Os relatórios no âmbito do MCV identificaram problemas persistentes no quadro jurídico para assegurar a integridade, assim como a necessidade de estabilidade e clareza e de um quadro sólido e estável
. Várias alterações legislativas que entraram em vigor em 2019 enfraqueceram o regime de incompatibilidades e conflitos de interesses
. Como resultado, a ANI teve de encerrar um número importante de investigações em curso, tendo outros processos judiciais sido arquivados. A ANI identificou igualmente um aumento dos entraves à aplicação de sanções na sequência de decisões judiciais transitadas em julgado relativas a funcionários eleitos localmente, o que resultou na não aplicação de sanções por incompatibilidades ou conflitos de interesses, com consequências na aplicação das regras de integridade aplicáveis às eleições. A ANI propôs trabalhar com o Ministério da Justiça e as partes interessadas no sentido de rever as leis da integridade, criando um quadro jurídico coerente e consolidado. Embora o volume de trabalho da ANI aumente consideravelmente nos períodos eleitorais, o seu orçamento foi reduzido.
Nos últimos anos, foram introduzidos códigos de ética e conduta para os deputados
e os membros do Governo
, para além dos já existentes para a função pública. No entanto, o mecanismo de aplicação do código de conduta dos parlamentares ainda não demonstrou a sua eficácia, uma vez que são muito poucos os casos em que deputados foram sancionados
.
A Agência Nacional de Gestão dos Bens Apreendidos (ANABI) está em pleno funcionamento. A missão da ANABI consiste em assegurar uma taxa de execução eficaz das decisões de confisco proferidas pelos tribunais criminais, mediante a gestão eficiente dos bens apreendidos que lhe forem atribuídos pelos procuradores e juízes. A agência tem feito progressos na criação de um sistema nacional integrado de acompanhamento das medidas adotadas pelas autoridades em cada etapa do processo de recuperação de ativos. Em dezembro de 2019, mais de 30 organizações não governamentais solicitaram ao Governo que restabelecesse as disposições do mandato da ANABI relativas à «reutilização social»
, o que asseguraria que parte do produto de atividades criminosas confiscado fosse utilizada para financiar projetos de prevenção do crime visíveis na sociedade
.
A Roménia dispõe, desde 2004, de uma lei específica para proteger os denunciantes. A atividade dos lóbis é regulamentada por instrumentos jurídicos não vinculativos, nomeadamente através de um registo de transparência voluntário. Os aspetos relativos à prática das «portas giratórias» são regulados por disposições específicas
. As disposições legislativas asseguram a proteção dos funcionários públicos que denunciem violações da lei cometidas por autoridades, instituições e outras entidades públicas
. Muitas instituições adotaram procedimentos operacionais para aplicar a legislação relativa à denúncia de irregularidades e outros instrumentos para garantir a integridade. O setor privado não é, contudo, abrangido pela legislação em vigor.
III.Pluralismo dos meios de comunicação social
A Constituição consagra o direito à liberdade de expressão, bem como o direito de acesso à informação de interesse público. A Lei do audiovisual determina as atribuições e a composição da entidade reguladora da comunicação social, exigindo-lhe que assegure a transparência da organização, funcionamento e financiamento dos meios de comunicação social do setor audiovisual
.
A autoridade reguladora dos meios de comunicação audiovisuais é o Conselho Nacional para o Audiovisual (CNA), cujas atribuições são definidas na Lei do audiovisual
. O CNA é uma autoridade pública autónoma, sob controlo parlamentar, sendo o garante do interesse público no domínio da comunicação audiovisual
. As decisões e os pareceres emitidos pelo CNA são publicados no seu sítio Web
. O Conselho é constituído por 11 membros nomeados pelo Parlamento (pela maioria dos senadores e deputados, por um mandato de seis anos), com base numa designação pelo Senado (3 membros); pela Câmara dos Deputados (3 membros); pelo Presidente da Roménia (2 membros); e pelo Governo (3 membros). O Observatório do Pluralismo dos Meios de Comunicação Social de 2020 (MPM 2020) avaliou a independência e a eficácia da autoridade dos meios de comunicação social como sendo de baixo risco. Não obstante, chamou a atenção para as limitações dos conhecimentos técnicos de alguns dos membros nomeados e a falta de consenso quanto às normas
. Da visita ao país, ressalta que o financiamento do Estado às atividades do CNA foi afetado pela crise da Covid-19 e que este tem falta de recursos humanos, nomeadamente atendendo às novas funções relacionadas com o ambiente digital
.
No que respeita à autorregulação no setor da imprensa, as normas profissionais são estabelecidas ao nível das redações ou das editoras. O MPM 2020 indica que a inexistência de salvaguardas específicas em matéria de independência editorial e normas profissionais, quer através de legislação ou de autorregulação, é motivo de preocupação.
A transparência da propriedade dos meios de comunicação social não é absoluta. A Lei do audiovisual
prevê que o Conselho Nacional para o Audiovisual assegure a transparência quanto à organização, funcionamento e financiamento dos meios de comunicação social neste setor. As normas que regem a transparência da propriedade dos meios de comunicação social são também contempladas no direito das sociedades
.
A publicidade estatal tem sido, alegadamente, utilizada como método de ingerência estatal. O MPM 2020 identificou um elevado risco para o pluralismo dos meios de comunicação social a este respeito. As partes interessadas afirmam que existem lacunas na legislação em termos de requisitos de divulgação, o que é visto como um fator que contribui para a falta de transparência e para o potencial de utilização indevida
. Além disso, a repartição dos fundos destinados a publicidade estatal de forma discricionária é um instrumento utilizado pelas autoridades do Estado para interferir nos meios de comunicação social, sobretudo a nível local
.
Embora a liberdade de expressão esteja consagrada na Constituição
e exista livre acesso à profissão de jornalista, algumas das questões assinaladas resultam da aplicação do quadro jurídico. O MPM 2020 assinala algumas questões relacionadas com a proteção da liberdade de expressão, considerando que as mesmas tendem a estar relacionadas com problemas de aplicação do quadro legislativo e não com o quadro legislativo em si mesmo. A legislação destinada a proteger a dignidade e a reputação das pessoas exige que esses interesses sejam contrabalançados com a liberdade de expressão. O MPM 2020 salienta incoerências na interpretação da legislação e na gravidade das sanções aplicadas a jornalistas nesse contexto
. No entanto, a «calúnia» e o «insulto» foram descriminalizados aquando da revisão do Código Penal, em 2014.
O exercício do direito constitucional de acesso à informação de interesse público depara com obstáculos. O MPM 2020 assinala problemas com a aplicação desse direito quando se trata de aceder a documentos na posse de organismos públicos. As partes interessadas informaram que as respostas chegam frequentemente tarde
e/ou incompletas. No entanto, o MPM 2020 também revela que, em todos os processos litigiosos relativos a questões como o acesso e utilização jornalísticos de documentos ou a proteção de fontes, as decisões são tomadas pelo tribunal de acordo com a jurisprudência do TEDH
. Várias partes interessadas
referiram a alegada utilização abusiva da legislação em matéria de proteção de dados para restringir a liberdade dos meios de comunicação social. A derrogação relativa ao tratamento de dados pessoais para fins jornalísticos está limitada na legislação romena em matéria de proteção de dados
. O MPM 2020 constata que a versão nacional do Regulamento geral sobre a proteção de dados (RGPD) não garante uma proteção adequada do trabalho jornalístico e menciona um caso em que a autoridade responsável pela proteção dos dados alegadamente solicitou a um órgão noticioso a divulgação das suas fontes.
Têm sido reportadas ameaças a jornalistas romenos devido à sua atividade profissional. Em 2019 e 2020, a Plataforma do Conselho da Europa para promover a proteção do jornalismo e a segurança dos jornalistas publicou quatro alertas relativos à Roménia: dois relacionados com processos por difamação abusivos, um com uma ameaça de morte contra um jornalista de investigação
e outro com a suspensão da transmissão de uma estação de televisão
.
IV.Outras questões institucionais relacionadas com o equilíbrio de poderes
A Roménia é uma república democrática representativa semipresidencial. O Parlamento romeno é composto por duas câmaras: o Senado (Câmara Alta) e a Câmara dos Deputados (Câmara Baixa). O Governo, os deputados, os senadores ou um grupo de, no mínimo, 100 000 cidadãos têm o direito de iniciativa legislativa
. O Tribunal Constitucional é o garante da supremacia da Constituição, sendo responsável por fiscalizar a constitucionalidade da legislação
.
O processo de elaboração e promulgação de legislação encontra-se bem regulamentado, prevendo um sistema complexo para garantir o equilíbrio de poderes. Segundo a Constituição romena, o Parlamento detém o poder legislativo, enquanto o Governo só dispõe de competências delegadas no processo legislativo. O processo legislativo ordinário prevê que o projeto de legislação seja aprovado pelas autoridades públicas com responsabilidades na sua aplicação e objeto de consulta pública
. Além disso, o Conselho Legislativo, órgão consultivo especializado do Parlamento, emite um parecer sobre todos os novos projetos de legislação, assegura a unificação e coordenação sistemáticas de todo o corpus legislativo e mantém o registo oficial da legislação romena
. Quando o direito de iniciativa legislativa é exercido pelo Governo, o projeto de lei deve ser apresentado ao Parlamento, onde deve ser discutido e aprovado por ambas as câmaras. O Presidente da Roménia promulga as leis, podendo devolvê-las ao Parlamento uma vez, para a sua reapreciação
. A fiscalização prévia da constitucionalidade pode ser requerida por um grupo de deputados, pelo Supremo Tribunal de Cassação e Justiça, pelo Presidente da Roménia ou pelo Provedor de Justiça.
O processo legislativo ordinário é frequentemente contornado através do recurso generalizado a decretos de emergência do Governo
. A Constituição estipula que a aprovação de decretos de emergência pelo Governo só é possível em casos excecionais e urgentes devidamente fundamentados, e nunca para certas categorias de leis, como as leis constitucionais ou que afetem os direitos fundamentais. No entanto, os sucessivos governos têm utilizado decretos de emergência para legislar em muitos domínios, incluindo em questões de justiça e eleitorais e em domínios que afetam os direitos fundamentais, o que suscita preocupações quanto à qualidade da legislação, à segurança jurídica e ao respeito pela separação de poderes
. Contrariamente ao processo legislativo ordinário, não existe qualquer obrigação de consulta, não podendo ser exercido qualquer controlo institucional
. Embora o Provedor de Justiça (Avocatul Poporului) possa impugnar a utilização de decretos de emergência do Governo perante o Tribunal Constitucional, tal prerrogativa raramente é utilizada. Num referendo consultivo, organizado em maio de 2019 por iniciativa do Presidente da República
, a maioria dos cidadãos apoiou a proibição da aprovação de decretos de emergência do Governo no domínio da justiça, bem como o alargamento a outras autoridades além do Provedor de Justiça do direito a impugná-los diretamente junto do Tribunal Constitucional.
Na sequência da pandemia de Covid-19 foi declarado o estado de emergência. O estado de emergência foi declarado pelo Presidente da República da Roménia em 16 de março, após a aprovação do Parlamento
. Neste contexto, a Roménia notificou o Conselho da Europa de uma derrogação às obrigações decorrentes da Convenção Europeia dos Direitos Humanos
. Na sequência de um pedido do Provedor de Justiça relativo às coimas que poderiam ser aplicadas, nomeadamente pelo desrespeito das regras da quarentena
, o Tribunal Constitucional considerou que as disposições contestadas eram inconstitucionais, uma vez que restringiam ou afetavam os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos ou instituições fundamentais do Estado. Estas deveriam ser aprovadas através de uma lei, como ato formal do Parlamento, e não através de um decreto de emergência do Governo
.
As alterações legislativas carecem muitas vezes de previsibilidade e de qualidade, suscitando preocupação quanto ao interesse público. As partes interessadas institucionais referem que a legislação fundamental é alterada com demasiada frequência e que o objetivo dessas alterações é, muitas vezes, pouco claro, pelo que as leis resultantes podem ser contraditórias
. As rápidas alterações da legislação através de decretos de emergência do Governo e a falta de segurança jurídica prejudicam igualmente o enquadramento dos investimentos
. Em várias áreas, foram propostas e aprovadas pelo Parlamento, nos últimos três anos, inúmeras alterações legislativas às mesmas leis, incluindo alterações contraditórias. Durante o processo legislativo, o Conselho Legislativo exerce frequentemente a sua prerrogativa de realçar a natureza contraditória dos projetos de alteração, bem como as eventuais incompatibilidades com a Constituição, mas os seus pareceres têm um caráter meramente consultivo. Muitas das propostas legislativas aprovadas pelo Parlamento são impugnadas junto do Tribunal Constitucional antes de serem promulgadas.
Apesar do enquadramento em vigor, o recurso às avaliações de impacto e às consultas públicas é insuficiente. Embora os projetos de atos normativos apenas sejam transmitidos para análise e aprovação às autoridades públicas competentes após a conclusão da consulta pública, este procedimento de consulta é considerado formal
. No entanto, muitas autoridades locais e centrais não publicam a legislação proposta para debate público, sendo frequentemente invocadas razões de emergência ou de segurança nacional para restringir a transparência
.
O Governo tomou medidas para melhorar a transparência e a responsabilização. As medidas em causa, tomadas a nível nacional e local, visam a abertura da administração através da adoção de princípios e iniciativas governamentais abertas. O Governo criou ainda uma plataforma de dados aberta específica com uma lista de conjuntos de dados abertos disponível ao público
. No quadro de avaliação da Comissão relativo à administração pública e à governação, a Roménia obteve um resultado muito baixo quanto à qualidade dos dados relativos aos contratos públicos e à transparência nos contratos públicos
.
O Governo assumiu o compromisso de pôr em prática um plano de ação com vista a abordar a questão da aplicação das decisões judiciais e da jurisprudência dos tribunais por parte da administração pública. Após ter sido considerado que violou o artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, pelo facto de o Estado ou entidades jurídicas sob a responsabilidade do Estado não terem cumprido decisões dos tribunais nacionais transitadas em julgado
, a Roménia tem de adotar as medidas estruturais necessárias para garantir o cumprimento de sentenças pecuniárias e não pecuniárias por parte da administração pública. A Roménia está sob a supervisão reforçada do Comité de Ministros do Conselho da Europa no que se refere à execução deste acórdão
. Em 3 de abril de 2019, o Governo romeno aprovou um memorando sobre medidas destinadas a assegurar a execução das sentenças contra um devedor público, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos relativa à não execução ou ao atraso na execução de sentenças proferidas contra um devedor público. Este plano inclui um mecanismo para disponibilizar estatísticas rigorosas que permitam um acompanhamento futuro.
Existem autoridades independentes responsáveis por salvaguardar os direitos fundamentais e o Estado de direito. O Instituto Romeno para os Direitos Humanos (RIHR) é membro associado não acreditado da Rede Europeia de Instituições Nacionais de Direitos Humanos
, dispõe de mandato para promover os direitos humanos e aborda uma vasta panóplia de questões relativas aos direitos humanos na Roménia. Em 2020, foi iniciado um processo legislativo para clarificar o mandato e as atribuições do RIHR, que lhe confere competência para emitir, a pedido das comissões parlamentares, pareceres sobre projetos ou outras questões relativas aos direitos humanos debatidas no Parlamento
. O Provedor de Justiça
está mandatado para defender os direitos e liberdades individuais na sua relação com as autoridades públicas. Trata-se de uma autoridade pública, autónoma e independente, cujas prerrogativas incluem remeter leis e decretos governamentais, incluindo decretos de emergência do Governo, para o Tribunal Constitucional para fiscalização constitucional sucessiva
.
A sociedade civil romena é ativa na defesa do Estado de direito, tendo reagido às tentativas de limitar as atividades das organizações não governamentais. A liberdade de associação está consagrada na Constituição e o Decreto n.º 26/2000 do Governo estabelece as regras que regem a criação de associações e fundações
. Este diploma cria condições para facilitar o acesso das associações e fundações a recursos privados e públicos, bem como parcerias entre autoridades públicas e pessoas coletivas de direito privado sem fins lucrativos. O forte envolvimento da sociedade civil nos esforços de combate à corrupção tem sido fundamental para incentivar a realização de reformas. Entre 2017 e 2019, a sociedade civil criticou as reformas controversas
e apoiou fortemente o Estado de direito. As partes interessadas assinalam que houve várias tentativas de ingerência nas atividades de organizações não governamentais
, mas que a reação conjunta da sociedade civil impediu que se materializassem
. Mais concretamente, as partes interessadas manifestaram preocupação pelo facto de a transposição para a legislação romena das normas da UE em matéria de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo
poder ter impacto nas organizações não governamentais, nomeadamente ao exigir-lhes que publiquem no registo do Ministério da Justiça todos os beneficiários das suas atividades ou todos os seus doadores, ao que as organizações da sociedade civil se têm oposto
.
Anexo I: Lista de fontes por ordem alfabética.*
*A lista dos contributos recebidos no contexto da consulta para o Relatório de 2020 sobre o Estado de direito pode ser consultada em (sítio Web da Comissão).
Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2020), Apresentação à Comissão Europeia no contexto da preparação do primeiro relatório anual sobre o Estado de direito.
CEPEJ (2018), European judicial systems: efficiency and quality of justice [Sistemas judiciais europeus: eficiência e qualidade da Justiça].
CIVICUS (2020), Perfil da Roménia.
https://monitor.civicus.org/country/romania/
.
Comissão de Veneza (2012), Opinion on the compatibility with constitutional principles and the rule of law of actions taken by the government and the parliament of Romania in respect of other state institutions and on the government emergency ordinance on amendment to the law No. 47/1992 regarding the organisation and functioning of the Constitutional Court and on the government emergency ordinance on amending and completing the law No. 3/200 regarding the organisation of a referendum of Romania, CDL-AD(2012)026.
Comissão de Veneza (2019), Opinion on Emergency Ordinances No. 7 and GEO No. 12 Amending the Laws of Justice.
Comissão Europeia (2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020), Painel de Avaliação da Justiça na UE.
Comissão Europeia (2017), Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre os progressos realizados pela Roménia no âmbito do Mecanismo de Cooperação e de Verificação, COM(2017) 44 final.
Comissão Europeia (2017), Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre os progressos realizados pela Roménia no âmbito do Mecanismo de Cooperação e de Verificação, COM(2017) 751 final.
Comissão Europeia (2017), Relatório técnico sobre a Roménia - 2019 (SWD(2017) 25 final.
Comissão Europeia (2017), Relatório técnico sobre a Roménia - 2019 SWD(2017) 701 final.
Comissão Europeia (2018), Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre os progressos realizados pela Roménia no âmbito do Mecanismo de Cooperação e de Verificação, COM(2018) 851 final.
Comissão Europeia (2018), Relatório técnico sobre a Roménia - 2019 SWD(2018) 551 final.
Comissão Europeia (2019), Quadro de avaliação relativo à administração pública e à governação.
Comissão Europeia (2019), Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre os progressos realizados pela Roménia no âmbito do Mecanismo de Cooperação e de Verificação, COM(2019) 499 final.
Comissão Europeia (2019), Relatório técnico sobre a Roménia - 2019 SWD(2019) 393 final.
Comissão Europeia (2020), Relatório do OLAF de 2019.
Comissão Europeia (2020), Relatório por país no âmbito do Semestre Europeu – Roménia.
Conselho Consultivo dos Juízes Europeus (CCJE) (2019), Parecer da Mesa do CCJE no seguimento de um pedido da Associação do Fórum de Juízes da Roménia sobre a independência do poder judicial na Roménia.
Conselho Consultivo dos Procuradores Europeus (CCJE) (2019), Parecer da Mesa do CCPE no seguimento de um pedido do Movimento Romeno de Defesa do Estatuto dos Procuradores sobre a independência dos procuradores na Roménia.
Conselho da Europa: Comité de Ministros (2010), Recomendação CM/Rec(2010)12 do Comité de Ministros aos Estados-Membros relativa aos juízes: independência, eficiência e responsabilidade.
Conselho da Europa: Comité de Ministros (2016), Recomendação CM/Rec(2016)4 sobre a proteção do jornalismo e a segurança dos jornalistas e outros intervenientes nos meios de comunicação social.
Conselho Superior da Magistratura (2020), Contributo para a consulta das partes interessadas para o Relatório de 2020 sobre o Estado de direito.
Direção-Geral da Comunicação (2016, 2017, 2018, 2019, 2020), Eurobarómetro: Perceção da independência dos sistemas judiciais nacionais na UE entre o grande público.
Eurocommerce (2020), Relatório sobre os obstáculos ao mercado único.
Funky Citizens (2020), contributo para a consulta das partes interessadas para o Relatório de 2020 sobre o Estado de direito.
Governo da Roménia (2020), Contributo para o Relatório de 2020 sobre o Estado de direito.
GRECO (2014), Quarta ronda de avaliação – relatório de avaliação sobre a prevenção da corrupção de deputados, juízes e procuradores – Roménia.
GRECO (2019), Quarta ronda de avaliação – relatório de avaliação sobre a prevenção da corrupção de deputados, juízes e procuradores – Relatório de conformidade sobre a Roménia.
GRECO (2019), Relatório de acompanhamento do relatório ad hoc sobre a Roménia (Regra 34).
MEDEL (2020), Contributo para a consulta das partes interessadas para o Relatório de 2020 sobre o Estado de direito.
Rede Europeia de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (2020), Contributo da Rede Europeia de Instituições Nacionais de Direitos Humanos para o Relatório de 2020 sobre o Estado de direito.
Rede Europeia dos Conselhos de Justiça (2020), Independência e Responsabilidade do Sistema Judicial – Inquérito da RECJ sobre a independência dos juízes, 2019.
Tribunal de Justiça da União Europeia, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Processo C-64/16, acórdão de 27 de fevereiro de 2018.
União Nacional dos Juízes da Roménia e outros (2020), Relatório sobre o estado do sistema judicial e do Estado de direito na Roménia.
Visita virtual à Roménia no contexto do Relatório de 2020 sobre o Estado de direito.
Anexo II: Visita à Roménia
Em junho de 2020, os serviços da Comissão mantiveram reuniões virtuais com:
·Associação Romena de Juízes
·Associação Mișcarea pentru apărarea statutului procurorilor
·Centro para o Jornalismo Independente
·Expertforum
·Freedom House
·Funky citizens
·Supremo Tribunal de Cassação e Justiça
·Associação «Iniciativa pela Justiça»
·Comissão legislativa da Câmara dos Deputados
·Conselho Legislativo
·Associação de meios de comunicação social - Cluj
·Ministério da Justiça
·Agência Nacional de Gestão dos Bens Apreendidos
·Direção Nacional Anticorrupção (DNA)
·Estratégia nacional de luta contra a corrupção
·Conselho Nacional para o Audiovisual
·Agência Nacional para a Integridade
·União Nacional dos Juízes da Roménia
·Provedor de Justiça
·OCCRP
·Procuradoria junto do Supremo Tribunal de Cassação e Justiça
·Fórum de Juízes da Roménia
·Secretariado-geral do Governo
·Conselho Superior da Magistratura
* A Comissão reuniu ainda com as seguintes organizações no âmbito de reuniões de concertação:
·Amnistia Internacional
·União das Liberdades Civis na Europa
·Sociedade Civil Europa
·Conferência das Igrejas Europeias
·EuroCommerce
·European Center for Not-for-Profit Law
·Centro Europeu para a Liberdade de Imprensa e dos Meios de Comunicação Social
·Fórum Cívico Europeu
·Free Press Unlimited
·Front Line Defenders (Defensores da Primeira Linha)
·ILGA-Europa
·Comissão Internacional de Juristas
·Federação Internacional dos Direitos Humanos
·Instituto Internacional da Imprensa
·Plataforma de Aprendizagem ao Longo da Vida
·Open Society Justice Initiative/Instituto de Política Europeia da Sociedade Aberta
·Repórteres sem Fronteiras
·Transparência Internacional - UE