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Document 52017IE4769

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As empresas da economia social como motor da integração dos migrantes» (parecer de iniciativa)

EESC 2017/04769

OJ C 283, 10.8.2018, p. 1–8 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

10.8.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 283/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As empresas da economia social como motor da integração dos migrantes»

(parecer de iniciativa)

(2018/C 283/01)

Relator:

Giuseppe GUERINI

Decisão da Plenária

21.1.2016

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

27.4.2018

Adoção em plenária

23.5.2018

Reunião plenária n.o

535

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

186/1/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A recente evolução do fenómeno migratório pôs à prova o sistema de entrada na União Europeia, constituindo um verdadeiro teste de esforço das políticas migratórias, sociais e de segurança pública da União e dos Estados-Membros.

1.2.

O CESE considera fundamental que as instituições europeias, juntamente com os governos dos Estados-Membros, promovam políticas coordenadas para tornar mais claras, sustentáveis e eficazes as modalidades de entrada e estabelecimento na Europa, de trabalho, de aquisição de cidadania e de obtenção de proteção internacional das pessoas provenientes de países terceiros. O Comité exorta a que se preste especial atenção aos migrantes potencialmente em risco de exclusão social, como, por exemplo, as pessoas doentes ou com perturbações mentais, as pessoas com deficiência e os idosos.

1.3.

O CESE observou que as empresas da economia social souberam integrar os princípios comuns da sua ação (1) (inclusiva, subsidiária e de proteção das pessoas mais desfavorecidas) enfrentando o desafio da assistência aos migrantes de forma proativa e mobilizando as respetivas comunidades e os cidadãos.

1.4.

Dada a sua apetência para a inclusão, as empresas da economia social merecem mais reconhecimento. O CESE espera, pois, que a Comissão Europeia dê prioridade a este tipo de empresas na definição das políticas da UE e na programação dos fundos europeus, em particular no âmbito do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, como já foi aliás assinalado tanto na conferência sobre a economia social de 16 de novembro de 2017 como na cimeira europeia de 17 de novembro de 2017, ambas realizadas em Gotemburgo.

1.5.

As empresas da economia social criam postos de trabalho de qualidade em setores com grande intensidade do fator trabalho e, em especial, com elevada incidência de mão de obra não europeia. Nestas empresas da economia social, a dimensão participativa tem importância no âmbito da segurança e proteção no momento da estruturação da atividade económica, porque conduz ao aparecimento da economia informal e do trabalho irregular.

1.6.

As empresas da economia social estão a ter, assim, um papel fundamental, intervindo em quatro aspetos fundamentais para o processo de integração dos migrantes: a saúde e a assistência; a habitação; o ensino e a formação (nomeadamente acompanhando a sensibilização para os direitos e deveres decorrentes do seu estabelecimento na União Europeia); o trabalho e a inserção ativa dos migrantes nas sociedades de acolhimento.

1.7.

O CESE considera que, tendo em conta a sua tendência particular para operarem nos setores dos cuidados e da assistência e nas atividades da economia da partilha e da economia circular, as empresas da economia social podem favorecer e apoiar não só novos postos de trabalho, mas também o empreendedorismo e o acesso dos migrantes e refugiados às atividades económicas. A União Europeia deve continuar a promover as empresas da economia social, enquanto alavanca do crescimento e da inclusão laboral e social dos migrantes. Por conseguinte, o Comité solicita às instituições europeias que confiram prioridade às políticas direcionadas para as empresas da economia social, como também preconiza no seu contributo para o programa de trabalho da Comissão para 2018 (2).

1.8.

À luz dos dados que comprovam a eficácia das empresas da economia social na promoção da inclusão laboral e social dos migrantes, o Comité exorta a União, os Estados-Membros e a comunidade internacional a criarem incentivos ao emprego acessíveis às empresas da economia social que desenvolvem atividades de inserção profissional.

1.9.

Face ao relatório sobre o progresso das ações empreendidas, apresentado em novembro de 2017, o Comité confirma a necessidade de uma abordagem coordenada da União e dos Estados-Membros (3). Em particular, é evidente que, na ausência de um sistema de entrada eficaz para os migrantes, persistirá o recurso abusivo aos pedidos de proteção internacional observado nos últimos anos. O Comité reitera com convicção que os casos de utilização indevida do sistema de proteção internacional não justificam a introdução, por parte de alguns Estados-Membros, de restrições à possibilidade de os cidadãos de países terceiros apresentarem pedidos de asilo no seu território.

1.10.

O CESE encoraja a Comissão e o Conselho a reforçar a coordenação com os países de origem e de trânsito das migrações, com o intuito de desenvolver perspetivas de melhoria das condições de vida, em especial para as populações que se deslocam por razões económicas ou devido à fome ou às alterações climáticas, sendo desejável uma política externa europeia mais incisiva relativamente aos países em que são a guerra, a ditadura e a perseguição os causadores da fuga.

1.11.

O Comité solicita, em particular, que a União aborde o fenómeno migratório do ponto de vista das causas que determinam a necessidade de deslocação das pessoas: pobreza, conflitos, discriminação, alterações climáticas. Uma tal ação passa inevitavelmente por um compromisso renovado da União Europeia no âmbito da diplomacia e da cooperação internacional para o desenvolvimento, nomeadamente mediante um verdadeiro «plano extraordinário de investimento na cooperação para o desenvolvimento».

2.   Observações gerais

2.1.

As empresas da economia social são um interveniente fundamental da economia e da sociedade europeia, constituem uma riqueza da diversidade da União e contribuem para a consecução dos objetivos da Estratégia Europa 2020, construindo uma Europa mais inteligente, sustentável e inclusiva (4).

2.2.

As empresas da economia social têm contribuído de forma significativa para enfrentar as mudanças ocorridas na sociedade. As empresas da economia social estão presentes em muitos setores da sociedade e criaram iniciativas inovadoras para responder à necessidade crescente de assistência e de cuidados a pessoas dependentes, especialmente os idosos e as pessoas com deficiência. Em muitos casos, fizeram-no aumentando a participação das mulheres no mundo do trabalho, não só devido ao seu envolvimento direto nas empresas da economia social, mas também criando novos serviços para a infância e para a família (5). Ao mesmo tempo, as empresas da economia social promovem a criação de oportunidades de trabalho para pessoas desfavorecidas, atendendo em particular às que estão potencialmente em grave risco de exclusão social, como as pessoas com deficiência, com perturbações mentais e com problemas de alcoolismo ou de toxicodependência. As empresas da economia social assumem um papel-chave na promoção do modelo social europeu (6).

2.3.

Entre os desafios que a União teve de enfrentar nos últimos anos, assumiu particular importância a gestão do crescente fluxo migratório que fez chegar à Europa milhões de pessoas em fuga da guerra, da fome, da perseguição e de condições de vida que as alterações climáticas tornaram extremas. Este fenómeno pôs à prova o sistema de entrada dos Estados-Membros e as políticas migratórias, sociais e de segurança pública. De certo modo, as políticas migratórias da União estão a ser sujeitas a um teste de esforço: é importante aproveitar esta oportunidade para analisar atentamente as reações do sistema e os sinais que emitiu para poder promover intervenções orientadas e aumentar a eficiência e a eficácia das políticas da UE.

2.4.

A integração dos migrantes recém-chegados é um processo dinâmico, que evolui ao longo do tempo a par do contexto económico, social e cultural dos países em que as pessoas se estabelecem. Este processo obriga a interrogar a União, os Estados-Membros e a sociedade europeia acima de tudo quanto ao modo como os cidadãos não europeus poderão entrar, estabelecer-se, viver e trabalhar na União, bem como obter proteção internacional.

2.5.

As empresas da economia social, não obstante as suas diferentes articulações em função dos diferentes contextos nacionais, souberam pôr em prática os princípios comuns da sua ação — inclusiva, subsidiária e de proteção das pessoas mais desfavorecidas — enfrentando o desafio da assistência aos migrantes de forma proativa.

2.6.

Entre as características principais das intervenções efetuadas pelas empresas da economia social, destaca-se a capacidade para mobilizar e envolver as respetivas comunidades locais, ativando redes e parcerias que melhoram as relações com as administrações centrais e locais para prever possibilidades de assistência e inclusão mais bem aceites pelas populações locais.

2.7.

As empresas da economia social estão assim a ter um papel determinante, intervindo em quatro aspetos fundamentais para o processo de integração dos migrantes: a saúde e a assistência; a habitação; o ensino e a formação (em particular acompanhando a sensibilização para os direitos e os deveres decorrentes do seu estabelecimento na União Europeia); o trabalho e a inserção ativa dos migrantes nas sociedades de acolhimento. Neste processo, as empresas da economia social e as organizações da sociedade civil criam pontos de encontro entre os cidadãos europeus e os recém-chegados, favorecendo o diálogo e contribuindo assim para reduzir os preconceitos e os medos.

3.   A migração na Europa: enquadramento dos últimos anos

3.1.

O enquadramento do fenómeno migratório é uma operação complexa, uma vez que se caracteriza por uma evolução constante. A guerra, a presença de regimes ditatoriais, as alterações climáticas, as condições de extrema pobreza e a privação abriram caminho para a situação em que vivemos hoje.

3.2.

Segundo as Nações Unidas, em 2015, mais de 244 milhões de pessoas (3,3 % da população mundial) atravessaram as fronteiras do país de origem em busca de refúgio político, trabalho ou condições económicas e climáticas mais favoráveis (7).

3.3.

Nos últimos anos, assistiu-se a um aumento do número de pessoas que procuram chegar à Europa. Em termos absolutos, os dados do Eurostat relativos a 2015 mostram que 2,7 milhões de cidadãos de países terceiros imigraram para a UE-28, 56 % dos quais do sexo masculino e 44 % do sexo feminino.

3.4.

Este fluxo extraordinário é influenciado em particular pela instabilidade resultante da guerra, seja em países em situação de conflito, como a Síria, seja em países em que o processo de estabilização pós-conflito enfrenta ainda graves dificuldades, como o Iraque e o Afeganistão. Na verdade, foi destes países que provieram em 2016 cerca de 54 % dos migrantes que procuraram refúgio nos países da União (8).

3.5.

Por outro lado, continua a ser importante a migração de pessoas que no próprio país de origem enfrentam graves condições económicas ou ambientais. Trata-se, em muitos casos, de pessoas provenientes do continente africano, um fluxo para o qual contribuiu a crescente instabilidade dos países da costa meridional do Mediterrâneo.

3.6.

Neste contexto, o sistema de regras previstas da União Europeia evidenciou algumas lacunas e dificuldades, revelando a insuficiente gestão das fronteiras externas da União e a inadequação da regulação das entradas, refletindo a necessidade de uma revisão dos princípios e das modalidades de orientação das ações dos Estados-Membros.

3.7.

O Comité abordou em inúmeras ocasiões o tema das políticas migratórias (9) e acolhe com agrado a iniciativa da Comissão Europeia, que adotou a Agenda Europeia da Migração. Em particular, no relatório de novembro de 2017, a Comissão diligenciou no sentido de promover uma maior coordenação entre os países da UE e de relançar o diálogo com os países de origem e de trânsito dos fluxos migratórios (10). O Comité espera que se preveja uma revisão do mecanismo das quotas, atendendo à dificuldade da sua execução.

3.8.

É, pois, importante rever o conjunto de regras que permite aos migrantes explorar vias legais de entrada na União, seja velando pela proteção dos requerentes de asilo, seja dando a oportunidade a quem está em fuga de condições climáticas e económicas adversas de encontrar na Europa um porto de abrigo e de contribuir para o crescimento da União, garantindo os seus direitos. Semelhante ação consubstanciaria as recomendações das Nações Unidas no sentido de garantir que um fenómeno migratório que é do interesse de todos decorra em modalidades seguras e legais, de uma forma regulada e não ilegal (11).

3.9.

O Comité acolhe com agrado as conclusões da cimeira informal dos Chefes de Estado e de Governo realizada em 17 de novembro de 2017 em Gotemburgo, por cuja ocasião se abordou o tema da construção de um futuro para a Europa centrado na equidade do trabalho e no crescimento. Sublinha igualmente a importância do evento paralelo intitulado «O papel da economia social no futuro do trabalho», que marcou a abertura dos trabalhos da reunião de Gotemburgo, salientando o contributo da economia social para o acompanhamento das políticas da União.

3.10.

Além disso, é encorajador o acordo entre o Conselho e o Parlamento Europeu, o qual, no atinente ao orçamento da União para 2018, reconhece, entre as prioridades de intervenção, a necessidade de «promover o crescimento económico e a criação de emprego, reforçar a segurança e dar resposta aos desafios colocados pela migração» (12).

3.11.

O Comité exorta as instituições europeias a abordar os problemas detetados na aplicação do Regulamento de Dublim. Em 16 de novembro de 2017, o Parlamento Europeu adotou uma resolução que propõe linhas de trabalho para a revisão do referido regulamento, fazendo particular referência à participação de todos os Estados-Membros no mecanismo automático e permanente de colocação.

4.   Transformar os problemas em oportunidades: as empresas da economia social como motores da assistência e da inclusão

4.1.

Um dos elementos que impedem os recém-chegados de tomar o caminho da inclusão e contribuir assim para a vida económica e social das comunidades em que se estabelecem é a incerteza sobre o seu estatuto e a morosidade do exame dos pedidos de asilo.

4.2.

O confinamento dos migrantes ao sistema de assistência humanitária durante anos, sem acesso a educação, formação profissional ou oportunidades de rendimento impede o desenvolvimento do seu capital humano e limita a sua capacidade de contribuir de forma positiva para a economia e a sociedade dos países de acolhimento (13). Neste contexto, o Comité salientou recentemente o papel decisivo das empresas da economia social na prevenção da radicalização e na promoção de valores partilhados, da paz e da não violência (14).

4.3.

O Comité espera que o debate aborde a necessidade de verificar a eficácia dos atuais mecanismos que permitem a apresentação de pedidos de entrada por parte de cidadãos de países terceiros para se estabelecerem na União Europeia por motivos de trabalho.

4.4.

É igualmente fundamental que a União aborde o fenómeno migratório do ponto de vista das causas que determinam a necessidade de deslocação das pessoas: pobreza, conflitos, discriminação, alterações climáticas. Uma tal ação passa inevitavelmente por um compromisso renovado da União Europeia no âmbito da diplomacia e da cooperação internacional para o desenvolvimento.

4.5.

A revisão do sistema do Cartão Azul — não obstante a sua utilização até à data limitada — também pode responder às exigências de novas possibilidades legais de entrada no território da União. Na verdade, o Comité recordou que é necessária uma estratégia europeia para atrair mão de obra externa, a fim de garantir o crescimento e a prosperidade da União. Para o efeito, importa ter em conta as consequências da migração nos países de origem dos imigrantes, países esses que cumpre apoiar no plano do desenvolvimento e da educação (15). O Comité propõe que se pondere a possibilidade de alargar o leque dos potenciais beneficiários do Cartão Azul, atendendo em particular a quem pretenda iniciar uma atividade empresarial e promovendo também o interesse no empreendedorismo social.

4.6.

Em muitos casos, a sociedade civil mobilizou-se para promover vias legais e transparentes, colaborando com as instituições em contexto local, nacional e internacional e emitindo sinais encorajadores. Em Itália, o projeto «Corridoi umanitari» [Corredores humanitários], levado a cabo por várias organizações (Comunidade de Santo Egídio, Federação Italiana das Igrejas Evangélicas, Tavola Valdese) e pelo Governo italiano, é um importante exemplo de uma ação-piloto. Com efeito, desde fevereiro de 2016, permitiu a mais de mil pessoas requerer proteção internacional e receber assistência na gestão dos pedidos antes de partirem para um país da União (16).

4.7.

Espera-se que estas ações-piloto mereçam a consideração devida aquando da elaboração das futuras políticas de imigração. Em particular, seria oportuna uma maior coordenação entre as instituições internacionais, por um lado na ótica de uma gestão continuada destas formas de entrada e, por outro, a fim de evitar a discriminação entre o número reduzido de migrantes «privilegiados», que podem beneficiar dos corredores humanitários e usufruir de vasta proteção também na fase pós-acolhimento, e os muitos excluídos que permanecem à mercê dos traficantes e de esquemas ilegais.

4.8.

O papel das empresas da economia social é determinante para a realização de ações de inclusão social e laboral, explorando as potencialidades dos migrantes que, na maioria dos casos, decidem abandonar os respetivos países de origem em busca de melhores condições de vida e de oportunidades de trabalho.

4.9.

Já se reconheceu em inúmeras ocasiões o importante papel que os migrantes têm a desempenhar na União, além de se preconizar, por exemplo, o reforço da sua criatividade e da sua capacidade inovadora. A concretização de tal objetivo é uma condição necessária para fomentar o emprego, mas, ao mesmo tempo, reforça a internacionalização dos setores produtivos e favorece a criação de laços, inclusive comerciais, com os países de origem dos migrantes (17). Por conseguinte, é fundamental reforçar a capacidade inclusiva do tecido económico e social europeu dos migrantes, nomeadamente para melhorar a eficácia das políticas europeias em prol das PME, em particular a bem da sua capacidade para enfrentar mercados cada vez mais globalizados, conforme salientado no parecer do CESE sobre este tema (18).

4.10.

Em muitos casos, as empresas da economia social desempenharam um papel importante em prol do reconhecimento do papel económico e social positivo dos migrantes, uma vez que criam postos de trabalho de qualidade, seja em setores com grande intensidade do fator trabalho, seja em áreas de inovação tecnológica e digital. As atividades mais importantes neste domínio incluem, sem dúvida, os cuidados pessoais, a garantia do acesso a serviços sociais e à assistência à infância e, de um modo geral, a assistência às pessoas dependentes e em risco de exclusão social. Em muitos casos, estes setores são aqueles que têm um maior número de trabalhadores provenientes de países terceiros.

4.11.

Todavia, em alguns setores, como o da assistência, do trabalho agrícola sazonal, da construção e da restauração, subsistem muitos focos de emprego irregular, pelo que é importante promover a presença de empresas da economia social que se tenham revelado aptas a desempenhar uma importante função inclusiva e de regularização dos contratos de trabalho, valorizando o papel dos migrantes e garantindo os direitos dos trabalhadores nestes domínios, em consonância com as políticas europeias na matéria e combatendo o recurso abusivo ao estatuto de trabalhador independente (19).

4.12.

Nos setores da assistência ao domicílio, em que predominam as mulheres diretamente empregadas junto das famílias, geram-se amiúde condições que impedem o crescimento profissional. Um estudo recente sobre os fatores determinantes no empreendedorismo das mulheres migrantes demonstrou que a falta de reconhecimento das suas competências é um dos elementos que levam à criação da própria empresa (20). As empresas da economia social nestes setores podem desempenhar um papel importante no âmbito da regularização do trabalho e da exploração das oportunidades de crescimento dos migrantes, desde que apoiadas por políticas públicas adequadas.

4.13.

Muitas empresas da economia social que se ocupam da inserção de pessoas desfavorecidas no mercado de trabalho operam em setores que fazem parte da chamada economia circular: recolha e tratamento diferenciado de resíduos, recuperação e reutilização de materiais, agricultura social e manutenção dos espaços públicos verdes. Estes setores constituem uma importante fonte de emprego. A metodologia das empresas de inserção profissional também se afigura particularmente eficaz em relação à integração laboral dos migrantes.

4.14.

O emprego dos migrantes permite amiúde inverter processos de exclusão social e de empobrecimento cultural da União, contribuindo para revitalizar ofícios tradicionais e o artesanato em contextos de difícil renovação geracional (21). Com efeito, são muitas as pequenas empresas artesanais e do pequeno comércio que nascem por iniciativa de cidadãos migrantes.

4.15.

No âmbito de projetos de acolhimento dos migrantes, muitas organizações da economia social promoveram acordos com as instituições centrais e as administrações locais para resolver os problemas do sistema e favorecer a distribuição dos recém-chegados no território, introduzindo o conceito de «acolhimento disperso», com o objetivo de facilitar mecanismos justos de acolhimento pelas comunidades locais (22).

4.16.

Nestes projetos, priorizou-se a ativação dos processos de inclusão dos migrantes, prevendo cursos de língua, modalidades de avaliação das competências e cursos de formação profissional. Deste modo, é possível favorecer mecanismos de reconhecimento das habilitações escolares e académicas ou de experiências profissionais anteriores, que são úteis para aumentar as possibilidades de emprego dos recém-chegados.

4.17.

Algumas destas experiências de «acolhimento disperso» estão a contribuir para o repovoamento de territórios periféricos, sobretudo nas zonas de montanha, onde a presença de migrantes contribui para a manutenção das atividades económicas e dos serviços (a começar pelas escolas) que limitam o risco de despovoamento destas regiões. Em todo o caso, o êxito de tais intervenções exige que elas se façam acompanhar de políticas de emprego e de habitação.

4.18.

Em tais contextos, as empresas da economia social podem atuar em rede com o mundo das empresas tradicionais, permitindo aos migrantes entrar no mundo do trabalho através de formações e de estágios específicos (23).

4.19.

Neste sentido, o modelo criado pelas empresas cooperativas foi sem dúvida o que obteve mais atenção no âmbito da investigação, a qual examinou em profundidade o papel das cooperativas no que diz respeito aos migrantes. Nestas empresas da economia social, a dimensão participativa tem importância na segurança e proteção da estruturação da atividade económica, visto que conduz ao aparecimento da economia informal e do trabalho irregular.

4.20.

Uma análise específica realizada pela Organização Internacional do Trabalho isolou os domínios em que a intervenção das cooperativas incide positivamente na inclusão dos migrantes e refugiados: inserção no mercado de trabalho; cuidados e assistência; ensino e formação; apoio à vida quotidiana e à autonomia; acesso ao mercado; acesso ao financiamento; assistência jurídica e aconselhamento; e assistência para as necessidades básicas (24).

4.21.

Na primeira e segunda edições do Dia Europeu das Empresas da Economia Social, organizadas pelo Comité em 2016 e em 2017, os estudos de caso individuais refletiram a atenção dada ao tema dos migrantes (25), destacando a ativação de vias de formação profissional e inserção profissional, sobretudo para as mulheres migrantes.

4.22.

A Comissão Europeia também reconheceu a importância das empresas da economia social para a superação do desafio das migrações, consagrando o Concurso Europeu para a Inovação no Domínio Social de 2016 às ideias para o acolhimento e a integração dos refugiados (26). O Comité espera que a atenção da Comissão às iniciativas relativas às migrações tenha continuidade no tempo e se torne prioritária na definição das políticas da União.

4.23.

Além do importante papel desempenhado pela inserção no mercado de trabalho, pelo ensino e formação e pela assistência, muitas empresas da economia social exercem atividades também no âmbito de projetos que visam tornar a habitação acessível aos migrantes, sobretudo aos refugiados e requerentes de asilo. Este modelo de gestão de imóveis por parte das empresas da economia social adquiriu uma dimensão económica importante em países como Itália, com a disponibilização de milhares de imóveis a projetos de inclusão, que amiúde servem também para reabilitar bairros ou zonas periféricas.

4.24.

Por último, as empresas da economia social e a sociedade civil desempenham, no conjunto, uma ação decisiva no acesso à assistência e aos serviços de saúde, reduzindo significativamente as dificuldades de acesso aos cuidados de saúde. O Comité solicita que os Estados-Membros garantam aos migrantes o pleno acesso aos sistemas de saúde e aos serviços sociais, sem discriminar em função do seu estatuto.

5.   Outras considerações do Grupo de Estudo Permanente para as Empresas da Economia Social do CESE

5.1.

As empresas da economia social têm uma tendência e uma sensibilidade especiais para intervir nos setores do trabalho de assistência e cuidados e da gestão dos bens culturais e ambientais, bem como nas atividades da economia da partilha e da economia circular. Estas empresas podem ser um parceiro eficaz para promover políticas de «transição ecológica» do modelo de desenvolvimento europeu, enquanto estas áreas de atividade podem constituir uma importante fonte de novos postos de trabalho.

5.2.

As empresas da economia social apoiam e favorecem o empreendedorismo e promovem o acesso das pessoas às atividades económicas independentemente de disporem de capital inicial para iniciar uma atividade. Esse é em particular o caso das empresas do tipo cooperativo, sendo, pois, útil e importante que, nos programas de cooperação para o desenvolvimento realizados pela União Europeia nos países em desenvolvimento, se introduzam programas de promoção das empresas da economia social.

5.3.

À luz dos dados que apoiam a eficácia das empresas da economia social na promoção da inclusão laboral e social dos migrantes, os Estados-Membros devem ser convidados a criar incentivos ao emprego acessíveis às empresas da economia social que desenvolvam atividades de inserção profissional. Estes incentivos poderiam ser válidos por dois anos após o reconhecimento do estatuto de beneficiário de proteção internacional.

5.4.

Importa considerar que, nos próximos anos, o número de migrantes climáticos disparará com certeza, atendendo ao agravamento das alterações climáticas, que estão a provocar o aumento da desertificação, da fome e das catástrofes ambientais. Por outro lado, este fenómeno obrigará a uma revisão da distinção artificial e discriminatória entre refugiados, requerentes de asilo e migrantes económicos, pelo menos nos casos em que estes migrantes estejam em fuga da fome e das catástrofes ambientais.

5.5.

Por este motivo, cumpre prosseguir as ações de promoção de um desenvolvimento sustentável e de uma transição ecológica capaz de também ter incidências positivas na economia, valorizando o contributo que as empresas da economia social podem dar para a promoção do crescimento, da inclusão e do bem-estar, como sublinhado em pareceres recentes do Comité (27).

Bruxelas, 23 de maio de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  No que se refere ao papel das empresas da economia social, ver também JO C 117 de 26.4.2000, p. 52.

(2)  Contributo do Comité Económico e Social Europeu para o programa de trabalho da Comissão para 2018, nomeadamente o ponto 2.4.6 e seguintes.

(3)  Relatório intercalar sobre a Agenda Europeia da Migração.

(4)  JO C 318 de 23.12.2009, p. 22.

(5)  Em muitos contextos, a realização destas atividades decorreria em âmbito familiar e estaria quase exclusivamente a cargo da componente feminina dos agregados, impedindo a participação das mulheres no mundo do trabalho.

(6)  JO C 24 de 28.1.2012, p. 1.

(7)  https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/N17/002/18/PDF/N1700218.pdf?OpenElement.

(8)  Dados do Eurostat — no «Rapporto sulla protezione internazionale» [Relatório sobre a proteção internacional] elaborado por ANCI, Caritas italiana, Cittalia, Fondazione Migrantes, Servizio centrale dello SPRAR, em colaboração com o ACNUR; ver também http://ec.europa.eu/eurostat/web/asylum-and-managed-migration/data/main-tables.

(9)  https://www.eesc.europa.eu/pt/policies/policy-areas/migration-and-asylum/opinions.

(10)  Ver nota 2.

(11)  Report of the Special Representative on Migration of the Secretary General of UN [Relatório do Representante Especial para a Migração do Secretário-Geral das Nações Unidas], de 3 de fevereiro de 2017.

(12)  http://www.consilium.europa.eu/pt/press/press-releases/2017/11/18/2018-eu-budget-agreement-reached/.

(13)  ACNUR 2003, «Framework for durable solutions for refugees and persons of concern» [Quadro de soluções duradouras para os refugiados e as pessoas em dificuldade], maio, Genebra.

(14)  JO C 129 de 11.4.2018, p. 11.

(15)  JO C 75 de 10.3.2017, p. 75.

(16)  http://www.santegidio.org/pageID/11676/Corridoi-umanitari.html.

(17)  JO C 351 de 15.11.2012, p. 16.

(18)  JO C 345 de 13.10.2017, p. 15.

(19)  Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece uma Plataforma Europeia para reforçar a cooperação na prevenção e dissuasão do trabalho não declarado, COM(2014) 221 final; JO C 161 de 6.6.2013, p. 14; JO C 125 de 12.4.2017, p. 1.

(20)  Corsi, M., De Angelis, M., Frigeri, D., documento de trabalho, «The determinants of entrepreneurship for migrants in Italy. Do Italian migrants become entrepreneurs by “opportunity” or through “necessity”?» [Os fatores decisivos no empreendedorismo dos migrantes na Europa. Os migrantes italianos tornam-se empresários por «oportunidade» ou por «necessidade»?] Ver também Cooperatives and the world of work n. 2, «Cooperating out of isolation: domestic workers’ cooperatives» [Cooperar em resposta ao isolamento: cooperativas de trabalhadores domésticos], da OIT.

(21)  JO C 351 de 15.11.2012, p. 16.

(22)  http://www.interno.gov.it/it/notizie/carta-buona-accoglienza-nuovo-modello-integrazione.

(23)  Trabalhos internos — Consórcio «Veneto Insieme». Mais informações em: http://venetoinsieme.it/.

(24)  Literature review, «Cooperatives and Refugees» [Cooperativas e refugiados], OIT 2016 (não publicado).

(25)  Em particular, o projeto Okus Doma, na edição de 2016, e o projeto Solidarity Salt, em 2017 (ver igualmente https://www.eesc.europa.eu/en/agenda/our-events/events/2nd-european-day-social-economy-enterprises).

(26)  http://ec.europa.eu/growth/content/4-social-innovators-win-%E2%82%AC200000-2016-european-social-innovation-competition-0_pt; ver também http://eusic-2016.challenges.org/how-is-europe-supporting-the-integration-of-refugees-and-migrants/.

(27)  Parecer — Promover ações climáticas por intervenientes não estatais, JO C 227 de 28.6.2018, p. 35 e parecer — Novos modelos económicos sustentáveis, JO C 81 de 2.3.2018, p. 57.


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