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Document 52016AE3545

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Uma Agenda Europeia para a Economia Colaborativa» [COM(2016) 356 final]

OJ C 75, 10.3.2017, p. 33–39 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

10.3.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 75/33


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Uma Agenda Europeia para a Economia Colaborativa»

[COM(2016) 356 final]

(2017/C 075/06)

Relator:

Carlos Trias PINTÓ

Correlator:

Mihai MANOLIU

Consulta

Comissão Europeia, 8 de dezembro de 2016

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

17 de novembro de 2016

Adoção em plenária

15 de dezembro de 2016

Reunião plenária n.o

521

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

157/1/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O cenário emergente de uma economia digital descentralizada sugere que uma parte significativa das novas trocas económicas entre pares estará intimamente ligada às relações sociais e implantada nas comunidades, o que conduzirá à transformação daquilo que significa exercer uma atividade ou um emprego, numa ótica de «democratização do modo como produzimos, consumimos, governamos e resolvemos os problemas sociais», devendo evitar-se a todo o custo que tal se faça à custa da precarização do trabalho e da evasão fiscal e que o valor acrescentado se transfira maciçamente dos agentes industriais para os proprietários de plataformas digitais privadas (1).

1.2.

Confrontado com este novo paradigma, o CESE exorta a Comissão a levar a cabo uma abordagem conceptual mais detalhada e abrangente da economia colaborativa, a fim de evitar tendências para a equiparar à economia digital. Assim, a economia colaborativa, que, à semelhança da economia social, adota dinâmicas democráticas e participativas, apresenta as seguintes características:

a)

não se desenvolve necessariamente num ambiente digital, mas também em ambientes de proximidade que permitem enfatizar as relações interpessoais (por exemplo, a troca de bens);

b)

muitas vezes não tem fins lucrativos, inspirando-se, com frequência, em princípios cooperativos e solidários (por exemplo, determinadas modalidades de financiamento colaborativo, ou crowdfunding, como o financiamento colaborativo através de donativo);

c)

nem sempre existe à escala mundial ou transnacional, encontrando também, frequentemente, o seu ecossistema em áreas territoriais mais reduzidas e circunscritas (por exemplo, grupos de consumo);

d)

não se cinge apenas aos interesses económicos, abrangendo também questões ambientais e sociais (por exemplo, a mobilidade sustentável);

e)

não se limita a uma nova forma de prestação de serviços a pedido, em que o bem que se partilha é a capacidade de trabalho, antes enfatizando o acesso a esses serviços (por exemplo, o uso partilhado de bens);

f)

não se circunscreve a ativos corpóreos e de elevado valor económico, operando com qualquer tipo de produto ou serviço (por exemplo, «bancos de tempo»).

1.3.

Em última análise, a economia colaborativa abrange diferentes modalidades com contributos e desafios específicos. Por exemplo, «a economia do acesso» coloca no mercado bens subutilizados, o que proporciona maior oferta para os consumidores e uma utilização mais eficiente dos recursos, mas acarreta o risco de estimular a produção mundial através do efeito de ricochete. Na «economia a pedido» atomiza-se a força de trabalho, proporcionando mais flexibilidade, mas aumentando o risco de precariedade laboral. E a «economia da dádiva» (gift economy), em que se partilham bens e serviços de forma altruísta, permite o reforço das comunidades, mas é frequentemente invisível aos olhos das administrações.

1.4.

Por seu lado, as plataformas digitais, em particular as que desenvolvem uma atividade lucrativa, merecem toda a atenção da Comissão Europeia, que deve regulamentar e harmonizar as suas atividades e garantir condições de concorrência equitativas, com base na transparência, na informação, no acesso sem restrições, na não discriminação e na utilização adequada dos dados. Mais especificamente, é imperativo redefinir o conceito de subordinação jurídica no contexto da dependência económica dos trabalhadores e garantir os direitos laborais, independentemente dos formatos de que se revista a atividade.

1.5.

O desafio consiste, portanto, em definir as diferentes modalidades desta economia e propor abordagens regulatórias diversificadas (2), privilegiando as iniciativas digitais assentes numa governação democrática, solidária e inclusiva, com base na inovação social, donde decorre a necessidade de informar os consumidores sobre os seus valores identitários e as suas fórmulas de organização e gestão. A este respeito, o Comité recomenda uma pesquisa qualitativa sobre a rede de relações estabelecidas pelos seus agentes no próprio contexto da economia colaborativa.

1.6.

Assim, o CESE está empenhado na elaboração de uma metodologia específica para regulamentar e medir uma nova economia com padrões diferentes. Nesta perspetiva, o valor da confiança — do ponto de vista da simetria informativa — ocupa um lugar central. Cabe também reforçar os critérios de transparência, honestidade e objetividade na avaliação do produto ou serviço, indo além da mera utilização automática de algoritmos.

1.7.

O Comité recomenda ainda a criação de uma agência europeia independente de notação das plataformas digitais, com competências harmonizadas em todos os Estados-Membros, com vista a avaliar a sua governação nos domínios da concorrência, do emprego e da fiscalidade.

1.8.

Além disso, a abordagem da economia colaborativa adotada na comunicação ignora aspetos importantíssimos neste domínio, como as questões relativas às moedas virtuais e sociais enquanto instrumentos operacionais deste tipo de economia, ou ao conhecimento, à informação e à energia como objetos da sua atividade, ou ainda o papel que desempenham na economia colaborativa a criação partilhada e a inovação tecnológica, nomeadamente.

1.9.

Perante a complexidade da abordagem da economia colaborativa no contexto atual, o CESE recomenda que se assegure que possam coexistir de forma equilibrada modelos que garantam o seu pleno desenvolvimento sem provocar impactos negativos no mercado, sobretudo no que se refere à defesa da concorrência, da fiscalidade e do emprego de qualidade. Para o efeito, é necessário prever a elaboração de um quadro adequado de acompanhamento e monitorização dos novos parâmetros da economia colaborativa, com a participação das partes interessadas (organizações empresariais, organizações sindicais, associações de consumidores, etc.).

1.10.

Por fim, tendo em vista abordar a transição para uma nova economia com consequências sistémicas significativas, recomenda-se que o CESE crie uma estrutura permanente de caráter horizontal com o objetivo de analisar estes fenómenos emergentes, unindo os seus esforços aos da Comissão Europeia, o Comité das Regiões e o Parlamento Europeu.

2.   Introdução e antecedentes

2.1.

A cultura social, os hábitos de consumo e as formas de satisfazer as necessidades dos consumidores encontram-se num processo de profunda transformação, revisão e racionalização dos consumos, numa perspetiva mais inclusiva, estando o fator preço intimamente ligado ao impacto ambiental e à pegada social dos produtos e serviços, e tudo isto marcado pelo efeito disruptivo da Internet e das redes sociais.

2.2.

A posse de bens de uso pessoal, as divisas fortes e o emprego in situ , fixo e remunerado, vão ceder terreno às trocas virtuais, ao acesso partilhado, ao dinheiro digital e a uma maior flexibilidade da mão de obra.

2.3.

Na transição para novas formas de produção e consumo, certos setores da atividade económica viram-se arrastados por um poderoso tsunami desencadeado pelo aparecimento de novos intervenientes, alguns deles motivados pela cooperação e pelo compromisso para com a comunidade, outros simplesmente guiados pela oportunidade negocial (nem sempre respeitando condições de concorrência equitativas).

2.4.

Face aos numerosos apelos para um novo quadro de regulação (3) do consumo colaborativo (que incentive o uso da tecnologia digital para tirar partido da capacidade excedentária descentralizada, em vez de criar novos monopólios centralizados), a Comissão Europeia decidiu lançar «Uma Agenda Europeia para a Economia Colaborativa», após verificar que os órgãos de poder nacional e local da União estavam a abordar a questão com uma panóplia de medidas de regulação diversas. Tal deve-se ao facto de o consumo colaborativo apresentar contornos diferentes conforme o setor em causa.

2.5.

Esta abordagem fragmentada dos novos modelos empresariais gera insegurança (a nível económico e regulamentar, no que respeita à mão de obra, etc.) e incerteza (no que se refere à confiança, aos novos instrumentos digitais como as blockchains — cadeias de blocos —, às redes de segurança e à privacidade) junto dos operadores tradicionais, dos novos prestadores de serviços e dos consumidores, o que limita a inovação, a criação de emprego e o crescimento.

2.6.

Assim, a Comissão emitiu as seguintes orientações com vista a ajudar os operadores de mercado e os poderes públicos dos diferentes Estados-Membros:

Requisitos de acesso ao mercado: os prestadores de serviços só devem ser obrigados a obter autorizações ou licenças para a consecução de objetivos de interesse público pertinentes. A proibição absoluta de uma atividade só deve ser imposta em último recurso. As plataformas colaborativas não devem estar sujeitas à obtenção de autorizações ou licenças quando a sua atividade consiste exclusivamente em servir de intermediário entre os consumidores e os prestadores do serviço em questão (por exemplo, serviços de transporte ou alojamento). Os Estados-Membros devem também distinguir entre os cidadãos que prestam um serviço ocasional e os prestadores que atuam como profissionais, por exemplo definindo limites com base no volume de atividade.

Regimes de responsabilidade: as plataformas colaborativas podem estar isentas de responsabilidade pela informação que armazenam em nome daqueles que prestam um serviço. No entanto, não devem estar isentas de responsabilidade pelos serviços que elas próprias prestam, por exemplo, serviços de pagamento.

Proteção dos utilizadores: os Estados-Membros devem assegurar que os consumidores gozam da máxima proteção contra práticas comerciais desleais, sem impor obrigações de informação desproporcionadas aos particulares que prestem serviços ocasionais.

Relações de emprego (por conta própria e de outrem): o direito do trabalho é, em grande medida, da competência nacional; é complementado pela jurisprudência e por normas sociais mínimas a nível da União. Os Estados-Membros podem ter em consideração critérios como a relação de subordinação com a plataforma, a natureza do trabalho ou a remuneração na altura de decidir se uma determinada pessoa pode ser considerada como trabalhador de uma plataforma.

Fiscalidade: os prestadores de serviços da economia colaborativa devem pagar impostos. Os impostos aplicáveis incluem o rendimento das pessoas singulares, o imposto sobre as sociedades e o imposto sobre o valor acrescentado. Exortam-se os Estados-Membros a continuarem a simplificar e clarificar a aplicação das regras fiscais à economia colaborativa. As plataformas colaborativas devem colaborar plenamente com as autoridades nacionais no registo da atividade económica e na facilitação da cobrança de impostos.

3.   Observações na generalidade sobre a proposta da Comissão

3.1.

A Comissão introduz alguma confusão ao abordar num mesmo plano as plataformas digitais e a economia colaborativa, sem proceder a uma definição conceptual que relacione a economia colaborativa e o interesse geral, a partir do reconhecimento dos seus impactos positivos na implementação dos valores da cooperação e da solidariedade.

3.2.

Na sua comunicação a Comissão falha o que deveria ser o seu objetivo principal e não responde às legítimas expectativas das partes interessadas — a definição do modelo e dos parâmetros de um quadro jurídico claro e transparente em que as múltiplas formas da economia colaborativa se possam desenvolver e atuar no espaço europeu e sejam apoiadas, implementadas e ganhem credibilidade e confiança.

3.3.

O modelo de economia digital, por seu lado, apresenta quatro especificidades: a deslocalização das atividades, o papel central das plataformas digitais, a importância das redes e a exploração maciça de dados (4). Embora se trate de âmbitos de natureza distinta, economia digital e economia colaborativa têm pontos de interceção, pois operam frequentemente em ambientes semelhantes: redes participativas, com fronteiras pouco nítidas entre dimensão pessoal e profissional, entre trabalho estável e ocasional, entre trabalho por conta própria e por conta de outrem, etc.

3.4.

Para facilitar essa delimitação conceptual, o CESE propõe que a Comissão Europeia integre a noção de «comportamento pró-social não recíproco» da economia colaborativa, distinga claramente a utilização partilhada sem fins lucrativos e ofereça um espaço interativo para o consumo, a produção, o financiamento e o conhecimento colaborativos.

3.5.

Em suma, o modelo de economia colaborativa pressupõe uma transformação não só económica, mas também social e ambiental. A comunicação assim o entende ao referir-se à sustentabilidade e à transição para uma economia circular ou ao descrever os mercados sociais como espaços próprios da economia colaborativa.

3.6.

Se estas circunstâncias não forem tidas em conta, só parcialmente se poderá compreender a atual importância das iniciativas colaborativas, como acontece também se limitarmos a análise à troca de serviços ou às plataformas colaborativas, independentemente de aspetos como a recirculação e troca de bens, a otimização do uso de ativos ou a construção de conexões sociais.

3.7.

No que respeita às questões relacionadas com a incerteza na aplicação dos quadros jurídicos com vista à regulamentação das iniciativas de economia colaborativa, embora as dificuldades assinaladas pela Comissão sejam reais, a vontade de «normalizar» e «ajustar» um novo modelo económico aos «critérios de avaliação tradicionais» também o é. Tal poderá exigir um esforço para definir novos critérios e normas para o seu tratamento jurídico, laboral e fiscal, sobretudo na perspetiva da transição para um novo modelo de produção e consumo, que implica uma redefinição dos intervenientes.

3.8.

Além disso, só poderemos falar de uma nova economia mais inclusiva geradora de coesão social se dotarmos todos os cidadãos de competências digitais e financeiras para a ela poderem aceder e nela poderem operar. Também as políticas públicas devem assegurar o pleno acesso das pessoas mais vulneráveis à exclusão digital, em especial, das pessoas com deficiência.

3.9.

Por último, o CESE não pode ignorar os seguintes aspetos não abrangidos pela comunicação da Comissão:

A necessidade de abordar os instrumentos operacionais de ação, como as moedas digitais, virtuais e sociais, não pode ser ignorada no debate sobre a economia colaborativa. Devido ao fator das blockchains, a segunda geração de utilizadores da Internet, os empresários e os operadores tradicionais estão a criar novas formas de cumprir as oito funções básicas dos intermediários financeiros através de registos contabilísticos dispersos a nível mundial, da tecnologia e das bitcoins.

Se considerarmos que os pilares básicos da transformação colaborativa são a energia e a informação, em caso algum devemos conceber uma análise da economia colaborativa que ignore a transferência da propriedade intelectual que deriva do conhecimento partilhado e dos códigos de acesso aberto, bem como as questões relativas ao setor da energia.

Importa examinar mais aprofundadamente os efeitos no mundo do trabalho — como a tendência para um mercado de trabalho excessivamente flexibilizado, a erosão do poder de negociação coletiva para os trabalhadores da economia colaborativa, o risco de individualização no mercado de trabalho, a falta de formação, os potenciais efeitos (negativos) dos sistemas de notação e o tratamento dos algoritmos.

4.   Observações na especialidade sobre a proposta da Comissão: questões essenciais

4.1.    Requisitos de acesso ao mercado, economias de escala e «efeitos de rede» locais

4.1.1.

O Comité considera que, em conformidade com a legislação vigente na UE, nomeadamente a Diretiva Serviços e a Diretiva Comércio Eletrónico, os Estados-Membros devem promover o acesso aos mercados colaborativos, já que uma oferta mais variada estimula o consumo, estabelecendo, se for caso disso, restrições, devidamente justificadas, que tenham exclusivamente por base razões de interesse público. É de esperar que venha a existir um conflito legislativo, pois a economia colaborativa cria novas formas de prestar serviços já conhecidos que, tradicionalmente, são muito regulamentados.

4.1.2.

Note-se, a este respeito, que, sendo uma amálgama de iniciativas não limitadas no espaço ou no tempo, a economia colaborativa deve ser objeto de um tratamento aberto e descentralizado, pelo que qualquer limitação baseada em critérios territoriais restritivos pode gerar uma concorrência fiscal e social que distorça os seus efeitos positivos.

4.1.3.

Daí que, mais do que um fator transnacional de acesso ao mercado, a economia colaborativa deva ser vista como uma expressão de capacitação dos cidadãos (ganhos de capital humano) que deve traduzir-se em dois aspetos fundamentais: por um lado, num princípio de harmonização que evite tratamentos desiguais que gerem novas assimetrias de mercado; e, por outro, na necessidade de estabelecer práticas de regulação partilhada (5) (modelos: regulação entre pares, organismos de autorregulação e regulação delegada mediante dados).

4.1.4.

Tal como a Comissão, o CESE defende uma regulamentação mais flexível dos mercados de serviços (novas definições de trabalho na economia colaborativa) e, portanto, insta a uma avaliação, em cada Estado-Membro, da justificação e proporcionalidade da legislação aplicável à economia colaborativa em conformidade com os objetivos de interesse público (regulamentação destinada a corrigir as deficiências do mercado, facilitando o reforço da confiança), tendo em conta as características específicas dos diferentes modelos de negócio e os instrumentos em matéria de acesso, qualidade e segurança.

4.1.5.

O CESE realça também que a especificidade do modelo gera ferramentas de notação e de reputação dos prestadores que, embora cumpram o objetivo de interesse público de reduzir os riscos para os consumidores associados a assimetrias de informação, podem também conduzir a uma «seleção adversa» e a um «risco moral». A este respeito, os poderes públicos e os gestores das plataformas digitais devem garantir a qualidade e a fiabilidade das informações, avaliações e notações das plataformas colaborativas, recorrendo a organismos independentes de controlo.

4.1.6.

O CESE partilha da ideia de que o estabelecimento de limites destinados a distinguir, setor a setor, a prestação de serviços profissionais dos não profissionais, pode constituir uma metodologia útil para superar a fragmentação dos mercados da UE. No entanto, pode não ser tão eficaz como se prevê para a integração das atividades não profissionais entre pares.

4.2.    Regimes de responsabilidade e seguros

4.2.1.

O CESE considera que a manutenção do atual regime de responsabilidade (6) dos intermediários é essencial para o desenvolvimento da economia digital da União Europeia.

4.2.2.

Para reforçar a credibilidade e a confiança, cruciais para o desenvolvimento da economia colaborativa, o CESE apela, tal como a Comissão na sua comunicação, para a adoção de medidas voluntárias restritivas com vista a combater os conteúdos ilegais em linha através de atividades conexas ou subjacentes, sem, no entanto, renunciar ao benefício da exoneração de responsabilidade.

4.2.3.

Contudo, o CESE reitera a importância de abordar de forma abrangente a atividade colaborativa, independentemente da centralidade concedida às plataformas digitais, para não a afastar do espírito de cidadania que a inspira.

4.3.    Proteção dos utilizadores

4.3.1.

Num cenário novo em que se esfuma a fronteira entre produtor e consumidor (agentes de capacitação de pessoas, criadores conjuntos, microfinanciadores coletivos, pares, clientes), o CESE defende um sistema que garanta os direitos dos consumidores. Todavia, dadas as peculiaridades da economia colaborativa, não devemos limitar a pluralidade de iniciativas que ela oferece.

4.3.2.

Assim, às relações multilaterais que gera devemos acrescentar outras decorrentes da emergência da figura do prossumidor (trata-se da contribuição económica mais importante para a economia colaborativa, pelo que deve ser protegida, assegurada e definida), chamado a desempenhar um papel muito importante na economia colaborativa, bem como os processos de criação de valor partilhado, sobretudo na perspetiva da economia circular e da funcionalidade.

4.3.3.

O CESE sempre defendeu condições de concorrência equitativas. De acordo com os princípios orientadores das práticas comerciais desleais, os fatores que se devem avaliar para distinguir as figuras do consumidor e do comerciante de forma não restritiva (7) são os seguintes: frequência dos serviços, fins lucrativos e volume de negócios.

4.3.4.

O CESE secunda esta abordagem, mas adverte que será necessário rever a sua análise, bem como a pertinência de outros fatores na aplicação dos critérios com vista a uma classificação adequada, sem pretensões de ser exaustiva dada a complexidade e variabilidade com que a economia colaborativa se pode exprimir e a dificuldade em prever o seu futuro (um modelo que deve ser independente, transferível, universal e propício à inovação).

4.3.5.

O CESE reitera que a forma mais útil de melhorar a confiança dos consumidores consiste em reforçar a credibilidade e a confiança dos serviços entre pares (um «porto seguro» para plataformas específicas de economia colaborativa que permita prestações, formação, garantias e outras formas de proteção) mediante serviços de avaliação em linha adequados (8) e certificações externas (rótulo de qualidade) e um novo sistema de «arbitragem civil». Esta afirmação está intimamente relacionada com a confiança e a reputação do desenvolvimento harmonioso da economia colaborativa num novo sistema de referências a nível económico, social e ambiental.

4.4.    Trabalhadores por contra de outrem e por conta própria na economia colaborativa

4.4.1.

No contexto do pilar europeu dos direitos sociais, o CESE apoia inequivocamente a revisão do acervo jurídico com vista a assegurar condições de trabalho justas e uma proteção social adequada, com base nos critérios — cumulativos — de subordinação do prestador do serviço, de natureza do trabalho e de remuneração.

4.4.2.

Mais especificamente, importa criar, no respeito das competências nacionais, um quadro jurídico para os trabalhadores que determine com exatidão os estatutos laborais correspondentes: um salário digno e o direito a participar na negociação coletiva, a proteção contra a arbitrariedade e o direito de «desconectar», a fim de confinar o tempo de trabalho digital dentro dos parâmetros da dignidade, etc.

4.4.3.

Além disso, o CESE defende uma análise mais aprofundada dos modelos de trabalho da economia colaborativa ligados ao comportamento pró-social não recíproco.

4.4.4.

A particularidade da economia colaborativa como motor do emprego deve ser abordada de forma convergente em todos os Estados-Membros, para que as políticas adotadas não desvirtuem a prática colaborativa e reflitam um espírito mais empreendedor em matéria de incubação, independência e infraestrutura.

4.5.    Fiscalidade

4.5.1.

O CESE, ciente dos riscos do planeamento fiscal agressivo e da opacidade tributária no domínio da economia digital, defende o reforço de um sistema de controlo dos fluxos comerciais através das plataformas digitais, já que estas permitem rastrear o produto ou serviço e facilitar a coleta de impostos. O caso da Estónia no que respeita às plataformas de partilha de veículos constitui um exemplo a ser replicado nos restantes Estados-Membros.

4.5.2.

A adaptação das formas de tributação, nomeadamente do IVA, aos modelos da economia colaborativa exigirá alterações substanciais. Além disso, as plataformas digitais — cujos lucros têm origem, em grande parte, na venda dos dados de natureza privada a empresas comerciais — devem ser integralmente sujeitas ao imposto sobre as sociedades no local onde a atividade é realizada, evitando assim a concorrência fiscal entre Estados-Membros.

4.5.3.

O CESE, consciente da importância de uma boa governação fiscal, advoga a criação de instrumentos ad hoc (balcões únicos e troca de informações em linha), bem como a adoção de medidas de simplificação administrativa, harmonização, transparência e cooperação entre as administrações fiscais.

4.6.    Monitorização

4.6.1.

As atividades de monitorização propostas na comunicação são adequadas ao objetivo em vista. Em particular, o CESE está empenhado em reforçar o diálogo entre as partes interessadas (organizações sindicais, organizações empresariais, associações de consumidores, etc.), com vista a identificar boas práticas e a desenvolver iniciativas de autorregulação e regulação conjunta que abranjam os novos parâmetros da economia colaborativa (9) a nível europeu (por exemplo, nos setores do alojamento, dos transportes, do imobiliário comercial, dos cuidados de saúde e do aprovisionamento energético).

Bruxelas, 15 de dezembro de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 389 de 21.10.2016, p. 50.

(2)  JO C 51 de 10.2.2016, p. 28.

(3)  O CESE foi um dos primeiros a lançar o apelo (JO C 177 de 11.6.2014, p. 1).

(4)  J. Charrié e L. Janin (2015), Le numérique: comment réguler une économie sans frontière [A tecnologia digital: como regular uma economia sem fronteiras].

(5)  JO C 303 de 19.8.2016, p. 36.

(6)  Em conformidade com a Diretiva relativa ao comércio eletrónico.

(7)  Como salienta a Comissão, nenhum destes fatores seria suficiente por si só para um prestador poder ser considerado comerciante.

(8)  Devem ser sujeitos a uma supervisão e a um controlo rigorosos.

(9)  JO C 303 de 19.8.2016, p. 36.


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