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Document 52012AE2041

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre as avaliações exaustivas de risco e segurança ( «testes de resistência» ) das centrais nucleares na União Europeia e atividades correlatas [COM(2012) 571 final]

OJ C 44, 15.2.2013, p. 140–146 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

15.2.2013   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 44/140


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre as avaliações exaustivas de risco e segurança («testes de resistência») das centrais nucleares na União Europeia e atividades correlatas

[COM(2012) 571 final]

2013/C 44/25

Relator-geral: André MORDANT

Em 12 de outubro de 2012, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre as avaliações exaustivas de risco e segurança («testes de resistência») das centrais nucleares na União Europeia e atividades correlatas

COM(2012) 571 final.

Em 17 de setembro de 2012, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu decidiu incumbir da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação.

Dada a urgência dos trabalhos (artigo 59.o do Regimento), o Comité Económico e Social Europeu, na 485.a reunião plenária de 12 e 13 de dezembro de 2012 (sessão de 13 de dezembro) decidiu designar relator-geral André MORDANT e adotou, por 98 votos a favor e 6 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

Ainda que a gestão de riscos dependa em grande medida da robustez das centrais nucleares, o CESE considera necessário ter em conta todos os riscos das centrais, incluindo os riscos externos para as populações, o ambiente e a economia.

1.2

O CESE considera que é indispensável integrar, em cada central, a gestão de acidentes no âmbito da formação do pessoal, da informação e da consulta à população local, permitindo-lhes participar na elaboração de instruções e tirando partido dos seus conhecimentos do terreno, prevendo, igualmente, uma gestão pós-acidentes (abordagem a longo prazo).

1.3

O CESE apoia a vontade da Comissão de elaborar uma ambiciosa revisão da Diretiva Segurança Nuclear e apela para que a mesma tome em consideração, além dos aspetos técnicos, tudo o que diz respeito aos aspetos humanos (saúde, stresse, psicologia, perigos, etc.) dos trabalhadores e dos cidadãos.

1.4

O CESE observa que os Estados-Membros não dispõem de uma autoridade de segurança independente com responsabilidade de regulamentação, não existindo, igualmente, entre os Estados-Membros, uma abordagem comum em matéria de regulamentação da segurança nuclear. O CESE recomenda, por conseguinte, que a diretiva preveja uma harmonização nessa matéria.

1.5

O CESE considera que a informação ao público e a participação dos cidadãos poderão ter como base a Convenção de Aarhus relativamente à energia nuclear, que prevê a informação, a participação/concertação e o acesso à justiça. A Convenção foi assinada pela UE e pelos Estados-Membros.

1.6

O CESE defende que a UE, na sequência dos testes de resistência e das recomendações emitidas pela Comissão, deve implementar mecanismos de controlo e verificação que incluam a apresentação periódica de relatórios por parte dos Estados-Membros a nível europeu.

1.7

O CESE considera que a cooperação estreita e a partilha de informações entre operadores, fornecedores, autoridades nacionais e instituições europeias preconizadas pela comunicação são importantes e devem ser alargadas aos cidadãos, bem como aos trabalhadores e seus representantes, em particular nas zonas fronteiriças onde é necessário harmonizar os procedimentos.

1.8

O CESE recomenda que o encerramento de todos os reatores de uma central devido à perda simultânea de arrefecimento e de alimentação elétrica conste imperativamente da análise às eventuais situações de acidente. O CESE recomenda, igualmente, a revisão dos procedimentos que envolvem a alimentação do reator danificado utilizando um outro reator da central, bem como a revisão dos equipamentos de emergência: iluminação exterior, que permite que o pessoal se desloque, geradores de emergência a gasóleo, reforço da alimentação de água das piscinas de armazenamento dos elementos de combustível irradiados.

1.9

O CESE sublinha que, tendo em conta que não é expectável que num futuro próximo se produza eletricidade de base em quantidades suficientes e com reduzidas emissões de carbono, a energia nuclear deve continuar a fazer parte integrante do cabaz energético da UE sem comprometer o abastecimento de eletricidade devido a problemas tecnológicos ou acidentes. Por conseguinte, convida a Comissão a realizar um estudo sobre os fatores organizacionais e humanos, já que estes constituem os pilares da segurança nuclear, intrínseca e extrínseca.

1.10

O CESE apoia a intenção da Comissão de propor legislação em matéria de seguros e responsabilidade nuclear, uma vez que a legislação em vigor não cobre efetivamente todos os riscos. Com efeito, o CESE entende que importa cobrir em particular os aspetos sociais, ambientais e económicos mediante fundos a constituir pelos produtores de eletricidade nuclear na Europa. Além disso, as potenciais vítimas correm o risco de não serem suficientemente protegidas ou indemnizadas.

1.11

O CESE manifesta preocupação quanto ao recurso à subcontratação (representando, por vezes, 80 % do pessoal) na ausência de uma avaliação da segurança desta prática. A perda de competências daí resultantes fragiliza as equipas. O CESE considera que deve haver uma maior preocupação com a formação do pessoal que trabalha nas várias instalações nucleares.

1.12

A vida útil das centrais nucleares não é abordada, apesar da sua relevância em termos de segurança. O CESE considera que esta questão é determinante para a avaliação da segurança das instalações e da sua eventual substituição por centrais de nova geração, bem como para uma programação imediata desta substituição. O prolongamento da vida útil das centrais nucleares, pelos reguladores nacionais, só deve ser autorizado quando conforme às melhores práticas reconhecidas a nível internacional.

1.13

O CESE recomenda à Comissão que instaure, em caso de acidente grave, uma profilaxia harmonizada das alterações da tiroide através de administração de iodo estável aplicável em todo o território da UE e, retirando as devidas lições da experiência de Fucoxima, que alargue entre 20 e 30 km as zonas de evacuação em torno das centrais europeias situadas em áreas densamente povoadas

2.   Introdução

2.1

O acidente de Fucoxima (11 de março de 2011) teve como resultado esforços inéditos para rever a segurança das instalações nucleares na Europa e em todo o mundo. A União Europeia conta, no seu território, com 145 reatores, dos quais 13 se encontram encerrados ou em desmantelamento, o que equivale a 132 reatores em funcionamento em 58 instalações nucleares, algumas situadas em zonas fronteiriças. Ainda que não se tenha produzido um acidente comparável na UE, dever-se-ia ter revisto o conjunto dos dispositivos que visam garantir uma segurança nuclear intrínseca e extrínseca e uma proteção contra as radiações máximas. Entre os países vizinhos, a Suíça e a Ucrânia participaram nos testes de resistência.

2.2

Na UE, o Conselho Europeu concluiu, em março de 2011, que «a segurança de todas as centrais nucleares da UE deve ser reapreciada, com base numa avaliação exaustiva e transparente dos riscos e da segurança (“testes de resistência”)». Em consequência, deu-se início a um processo de revisão em todos os países europeus, organizado em três fases:

«Autoavaliações pelos operadores nucleares;

Revisão das autoavaliações pelas entidades reguladoras nacionais;

Análises pelos pares dos relatórios nacionais, realizadas por peritos nacionais e da Comissão Europeia, entre janeiro e abril de 2012;

Em conformidade com os prazos, todos os Estados-Membros participantes apresentaram os seus relatórios de progresso e finais à Comissão» (COM(2011)784 final).

2.3

O Conselho Europeu solicitou ainda à Comissão que convidasse os países vizinhos da UE a participarem no processo dos testes de resistência e à UE que procedesse a «uma revisão do quadro jurídico e regulamentar vigente em matéria de segurança das instalações nucleares» e propusesse, até ao final de 2011, «os melhoramentos que forem necessários». Convém lembrar que esta reavaliação em matéria de segurança só pôde ser realizada após um mandato conferido pelo Conselho Europeu à Comissão.

3.   Resumo da Comunicação da Comissão

3.1

O relatório final constatou que as normas de segurança das centrais nucleares na Europa são, em geral, elevadas, porém recomenda melhoramentos em diversos aspetos da segurança intrínseca em praticamente todas as centrais nucleares europeias.

3.2

Os organismos de regulamentação nacionais concluíram, contudo, que não era necessário o encerramento de qualquer central nuclear.

3.3

Os testes demonstraram que as normas de segurança prescritas pela Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) e as boas práticas internacionais não são aplicadas na íntegra pelos Estados-Membros.

3.4

A Comissão deverá assegurar a devida aplicação das recomendações e propor, simultaneamente, medidas legislativas que visem um maior reforço da segurança na Europa.

3.5

Além das recomendações relativas a inúmeros melhoramentos técnicos específicos nas centrais nucleares, os testes de resistência demonstraram que as normas e práticas internacionais não são aplicadas sistematicamente. É necessário retirar, igualmente, ensinamentos da experiência de Fucoxima, nomeadamente no que respeita: aos riscos relacionados com sismos e inundações, à existência e utilização de instrumentos sísmicos in situ, à instalação de sistemas de ventilação filtrada dos dispositivos de contenção e à disponibilização de equipamentos específicos destinados a emergências em caso de acidente e de uma sala de controlo de emergência fora do local.

3.6

Os planos de ação nacionais com calendários para a sua aplicação deverão ser elaborados pelos organismos de regulamentação nacionais e disponibilizados até ao final de 2012. A Comissão tenciona projetar um relatório sobre a aplicação das recomendações dos testes de resistência em junho de 2014, em parceria integral com os organismos de regulamentação nacionais.

3.7

A Comissão analisou o quadro jurídico europeu em vigor no domínio da segurança nuclear e apresentará, no início de 2013, uma revisão da Diretiva Segurança Nuclear. As alterações propostas incidirão sobretudo nos requisitos de segurança, no papel, na independência e nas prerrogativas dos organismos de regulamentação nacionais, bem como na transparência e na monitorização.

3.8

Posteriormente, serão elaboradas outras propostas sobre os seguros e a responsabilidade nuclear e sobre os níveis máximos tolerados de contaminação radioativa dos géneros alimentícios e alimentos para animais. O processo dos testes de resistência evidenciou a necessidade de envidar esforços adicionais relativamente à segurança nuclear (ou seja, a prevenção de ações hostis), cuja principal responsabilidade cabe aos Estados-Membros.

4.   Observações na generalidade

4.1

É de realçar a dimensão dos esforços e dos recursos financeiros consagrados a estes testes e à sua correta realização. Através do processo dos testes de resistência, os 14 Estados-Membros da UE que operam reatores participaram nas avaliações a título voluntário, contribuindo fortemente para a aplicação das normas comuns de segurança intrínseca e extrínseca. Não obstante, as avaliações têm por base uma autoavaliação dos operadores e são seguidas de análises efetuadas pelos organismos nacionais de regulamentação e pelos pares. Em resposta aos testes de resistência e às recomendações emitidas pela Comissão, a UE deve implementar mecanismos de controlo e verificação.

4.2   Constatações sobre o quadro jurídico

4.2.1

Apesar da Diretiva Segurança Nuclear, não existe, por parte dos Estados-Membros, uma abordagem verdadeiramente conforme em matéria de regulamentação da segurança nuclear intrínseca e extrínseca. É necessário que a revisão da diretiva europeia aborde de maneira mais exaustiva a segurança nuclear, devendo zelar-se pela sua aplicação e prever-se procedimentos rigorosos em caso de infração.

4.2.2

Revisão da Diretiva Segurança Nuclear. Dois países, a Polónia e Portugal, ainda não concluíram à transposição (sendo 22 julho de 2011 o prazo limite) da Diretiva Segurança Nuclear (Diretiva 2009/71/Euratom do Conselho, de 25 junho de 2009, que estabelece um quadro comunitário para a segurança nuclear das instalações nucleares). «É fundamental assegurar que as lições do acidente de Fucoxima e as conclusões dos testes de resistência são adequadas e consistentemente aplicadas na UE e refletidas no quadro legislativo» (COM(2012) 571 final). O CESE apoia o processo de revisão em curso e solicita responsabilidades acrescidas para a UE em matéria de controlo. Porém, é necessário ir além da componente técnica abrangida pelos testes de resistência. A segurança depende também do fator humano: dos cidadãos, bem como dos trabalhadores e dos seus representantes. É conveniente que as cláusulas de transparência e de participação do público constantes da Diretiva Segurança Nuclear se apoiem na Convenção de Aarhus, assinada pela UE e por quase todos os Estados-Membros, pelo menos no que diz respeito à participação dos cidadãos.

4.2.3

É importante realçar a necessidade de harmonizar as normas de proteção contra as radiações e de preparação para emergências fora das instalações entre os Estados-Membros da UE. «Na UE, há 47 centrais nucleares, com 111 reatores, com mais de 100 000 habitantes num raio de 30 km, o que demonstra a importância primordial das medidas preventivas fora das instalações. A responsabilidade por tais medidas é partilhada por diversas autoridades nacionais, regionais e locais» (COM (2012) 571 final). Por conseguinte, o CESE apoia veementemente a revisão da legislação da UE nesta matéria e solicita a participação da população local.

4.2.4

Seguro e responsabilidade nuclear. O presente ponto não é contemplado no atual quadro legislativo da UE, «contudo, o artigo 98.o do Tratado Euratom prevê a adoção de diretivas do Conselho que estabeleçam medidas vinculativas nesta matéria. Portanto, com base numa avaliação de impacto, a Comissão irá analisar até que ponto a situação das potenciais vítimas de um acidente nuclear na Europa deve ser melhorada, dentro dos limites da competência da UE» (COM(2012) 571 final). O CESE apoia a intenção da Comissão de propor legislação nesta matéria, uma vez que presentemente os seguros não cobrem suficientemente os riscos. A proposta legislativa deverá cobrir nomeadamente os aspetos sociais, ambientais e económicos e a indemnização de «última instância» que é, presentemente, uma responsabilidade do Estado.

4.2.5

Revisão da legislação relativa aos géneros alimentícios e alimentos para animais.«A experiência obtida com os acontecimentos de Fucoxima e de Tchernobil demonstrou a necessidade de diferenciar os instrumentos que regulam a importação de géneros alimentícios de países terceiros e os instrumentos de colocação no mercado de géneros alimentícios em caso de acidente dentro do território de UE» (COM(2012) 571 final). É conveniente rever a legislação existente nesta matéria.

4.3

As especificações dos testes de resistência descrevem os aspetos contemplados na análise, não indicando, contudo, os aspetos não contemplados. Deste modo, o envelhecimento e o impacto do prolongamento da vida útil das centrais nucleares, a cultura da segurança e a independência, as normas e a coerência dos organismos nacionais de regulamentação foram excluídos e, por conseguinte, não foram avaliados. Alguns destes aspetos poderão ser considerados mais-valias para o alcance e o impacto da catástrofe de Fucoxima – a motivação inicial para a realização dos testes de resistência.

4.4

Desta feita, o CESE não pode deixar de apoiar a proposta de ativação do centro comum de investigação e também de criação de um laboratório europeu de segurança nuclear, com caráter permanente, embora estes estejam ainda a ser objeto de análise técnica. Uma vez mais o CESE assinala que é necessário desenvolver formações de alto nível adaptadas à atividade nuclear. Ademais, é necessária uma autoridade administrativa competente para a segurança nuclear na Europa para além da autoridade para a proteção contra as radiações e da autoridade para o controlo da proliferação nuclear.

4.5

O CESE considera que deve haver também uma preocupação com a formação do pessoal que trabalha nas várias instalações nucleares. O recurso à subcontratação ocorre sistematicamente em alguns países sem que seja realizada uma avaliação para averiguar o seu contributo em termos de segurança. A perda de competências daí resultante fragiliza as equipas.

4.6

Intensificar a colaboração internacional e melhorar o quadro legislativo mundial de segurança nuclear.«Na sua maioria, os países participantes neste grupo de trabalho sublinharam a necessidade de ter em conta as normas de segurança da AIEA, independência e eficácia regulamentares, utilização alargada de análises pelos pares e maior abertura e transparência» (COM (2012) 571 final). Note-se que os conceitos de independência, transparência e abertura são orientadores dos princípios de partilha e reforço das normas, mas serão suficientes se essas normas não forem aplicadas?

5.   Observações específicas

5.1   Transparência

5.1.1

Pese embora estar subjacente à Convenção de Aarhus, que, nos seus três pilares, recomenda a concertação, a participação e o acesso à justiça, não se pode deixar de constatar que, salvo uma alusão à transparência, a informação da população não está contemplada no processo dos testes de resistência. Porém, os cidadãos constituem igualmente um elemento indispensável da segurança nuclear intrínseca e extrínseca. O envolvimento dos cidadãos da UE não correspondeu às expectativas. Na verdade, a intervenção do público não foi fácil. Os prazos eram demasiado curtos para se poder examinar os diversos dossiês. As reuniões públicas nem sempre asseguraram serviços de interpretação, nem tão-pouco puderam contar com a participação de várias associações por motivos de ordem financeira. Ainda assim, o nível de transparência obtido possibilitou uma análise circunstanciada dos relatórios por parte de algumas organizações da sociedade civil.

5.1.2

«A ocorrência de incidentes nas centrais nucleares, mesmo em Estados-Membros com boas folhas de segurança geral, confirma a necessidade de análises de segurança exaustivas e regulares e de uma avaliação da experiência operacional e realça a necessidade de cooperação estreita e partilha de informações entre operadores, vendedores, reguladores e instituições europeias, como o European Clearinghouse of Operating Experience, mantido pelo Centro Comum de Investigação (JRC) da Comissão». A partilha das informações não pode ficar reservada aos «operadores, vendedores, reguladores e instituições europeias» (COM(2012) 571 final). Os cidadãos da UE devem ser envolvidos num processo desta natureza, já que tal se enquadra num dos pilares (informação, concertação/participação, acesso à justiça) da Convenção de Aarhus.

À guisa de exemplo, existem três instâncias em França para ajudar os cidadãos: o Alto Comité para a Transparência e a Informação sobre a Segurança Nuclear (HCTISN), as Comissões Locais de Informação (CLI) e a Associação Nacional dos Comités e das Comissões Locais de Informação (ANCCLI) (Lei de junho de 2006). As instâncias foram associadas às «Avaliações Complementares de Segurança» realizadas em França. O HCTISN participou na elaboração das especificações e encarregou um grupo de trabalho de aferir, através de audições no terreno, as condições de trabalho do pessoal. Os CLI e a ANCCLI forneceram análises dos relatórios dos operadores, integrados no relatório da Autoridade de Segurança Nuclear francesa.

No que diz respeito aos incidentes, é reservado o acesso das instâncias referidas às cartas pós-inspeção, podendo igualmente obter as cartas de resposta dos operadores. Neste sentido e à luz das possibilidades existentes no caso da França, a participação do público nas análises aos incidentes permite nutrir um diálogo construtivo com a população.

5.2

Uma das observações importantes da Comissão reside no facto de que «os organismos de regulamentação nacionais concluíram que não há razões técnicas que obriguem ao encerramento de qualquer central nuclear na Europa e identificaram uma série de boas práticas» (COM(2012) 571 final). Ainda assim, esta afirmação é acompanhada por recomendações e pedidos de melhoramentos, a serem efetuados num prazo determinado: o que sucede caso os prazos não sejam cumpridos? Alguns requisitos técnicos – aumento da espessura da base de um reator (na central de Fessenheim, em França), confinamento de unidades através de casamatas (piscinas de armazenamento de combustível) – podem revelar-se inaplicáveis: qual será a decisão dos países? Convém igualmente lembrar que algumas centrais não aplicaram as medidas de proteção preconizadas na sequência dos acidentes de Three Mile Island e Tchernobil.

5.3   Constatações sobre procedimentos e quadros de segurança

Após o acidente de Fucoxima, os pontos essenciais dizem respeito a:

5.3.1   Avaliação e gestão dos riscos externos

Nunca fora encarada a possibilidade de se verificar uma perda simultânea da fonte fria e de todas as alimentações elétricas em todos os reatores de um complexo. Por este motivo, as proteções (geradores de emergência a gasóleo e bombeamento de água) revelaram-se inoperantes, até porque os restantes reatores da central deveriam ter assumido as funções do reator defeituoso.

5.3.2

As avaliações probabilísticas de segurança«diferem consideravelmente» (COM(2012) 571 final). Dever-se-ia proceder a uma harmonização e à adoção da abordagem mais penalizadora. Não é aconselhável manter uma postura ilusória quanto às probabilidades reduzidas, uma vez que um acidente advém geralmente da acumulação de pequenas falhas sucessivas ou, ainda mais grave, que se sobrepõem. Além disso, a análise do acidente de Fucoxima demonstrou que os riscos de sismo e de maremoto tinham sido minimizados, não obstante as intervenções de especialistas no sentido de lembrar que estes casos, além de possíveis, já se tinham produzido na década de 1930. Verificou-se uma tendência para considerar que determinados acidentes seriam «impossíveis».

Porém, o acidente de Three Mile Island já provara que é possível ocorrer a fusão do núcleo de um reator. Os exames realizados vários anos após o acidente permitiriam constatar que a cuba apresentava fissuras, tendo, no entanto, resistido. Em contrapartida, no caso de Tchernobil, a lava (corium) dispersou-se por todo o lado. Quanto a Fucoxima, os três núcleos (1, 2 e 3) derreteram parcialmente, tendo provavelmente afetado as bases dos reatores.

5.3.3   Gestão de acidentes graves

Todos os cenários devem ser ponderados por forma a tentar implementar mecanismos paliativos que permitam, tanto quanto possível, minimizar o acidente, sendo a formação do pessoal um dos mais importantes neste contexto. Ainda no sentido de poder assegurar uma gestão externa, é necessário preparar a gestão de acidentes em conjunto com a população local, permitindo-lhe participar na elaboração de instruções, tirando partido dos seus conhecimentos do terreno.

O caso de Fucoxima demonstrou igualmente, e mais uma vez, a importância da gestão pós-acidentes, que, naturalmente, deve ficar sob a responsabilidade das autoridades locais, regionais e nacionais. Mesmo assim, a população local deve ser consultada, participar em exercícios e transmitir os seus conhecimentos. A abordagem pós-acidentes é estabelecida a longo prazo.

5.4   Recomendações fundamentais dos testes de resistência relativos à segurança intrínseca

5.4.1   Recomendações sobre as medidas de segurança nas centrais nucleares existentes:

Seguimento dado pelos países participantes

A aquisição de equipamento móvel deverá permitir a prevenção ou atenuação de acidentes graves. É, igualmente, necessário reforçar o equipamento (os referidos «núcleos ultraprotegidos») e melhorar a formação do pessoal.

Plano de ação destinado a assegurar a aplicação das recomendações

Desde logo, importa aferir a importância relativa das diversas recomendações, no intuito de «atribuir prioridades e financiar os domínios que tragam os maiores benefícios em termos de segurança» (COM(2012) 571 final). Por seu lado, os reatores de nova geração são concebidos para, em princípio, responder ao conjunto das medidas associadas às recomendações. Todavia, há que reforçar a capacidade de regulação da segurança nuclear na Europa.

Responsabilidade da monitorização e do controlo

Esta responsabilidade compete aos Estados. No entanto, os mesmos terão de fornecer relatórios periódicos a nível europeu.

5.4.2   Recomendação relativa a procedimentos

a nível europeu, estabelecer «orientações europeias sobre a avaliação dos riscos naturais, como sismos, inundações e condições meteorológicas extremas, bem como margens de segurança, a fim de aumentar a consistência entre os Estados-Membros» (COM(2012) 571 final). A Comissão recomenda que esta tarefa seja atribuída à Associação dos Organismos de Regulamentação Nuclear da Europa Ocidental (WENRA – Western European Nuclear Regulatory Association). Seria interessante poder utilizar um processo de consulta como a Convenção de Aarhus para garantir um envolvimento mínimo da população local na elaboração dessas orientações;

efetuar visitas e avaliações sistemáticas de dez em dez anos, assegurando, simultaneamente, programas de manutenção adaptados à importância do equipamento;

aperfeiçoar os relatórios relativos à segurança dos reatores, pelo menos, de dez em dez anos;

prever equipamento de emergência, criar centros de resposta a emergências protegidos, implementar equipas de socorro apetrechadas com equipamento móvel.

5.5

A gestão do encerramento de todos os reatores de uma central devido à perda simultânea de arrefecimento e energia elétrica deve imperativamente constar da análise dos eventuais cenários de acidente. É necessário rever não só os procedimentos que envolvem o fornecimento de energia elétrica a reatores danificados utilizando reatores vizinhos, mas também os equipamentos de emergência: iluminação exterior, que permite que o pessoal se desloque, geradores de emergência a gasóleo. Naturalmente, é necessário rever o armazenamento dos elementos de combustível usados em piscinas, além de reforçar o abastecimento de água destas últimas.

5.6

«A Comissão considera que alargar a avaliação de segurança aos dispositivos de resposta e à preparação para emergências fora das instalações é uma atividade adicional importante em prol da segurança dos cidadãos» (COM(2012) 571 final). O CESE considera que é, igualmente, necessário harmonizar os procedimentos entre países fronteiriços. Relativamente às CLI: a CLIS de Fessenheim conta com membros suíços e alemães, ao passo que a de Cattenom integra membros alemães e luxemburgueses. As reuniões da CLI de Chooz são presenciadas por belgas, que poderão vir assistir às reuniões da CLI de Gravelines. A preparação da resposta em caso de incidente, em conjunto com a população local, é uma questão premente. Com efeito, em caso de acidente, a conjuntura pós-acidentes pode prolongar-se por um período muito alargado. Contudo, o impacto dos estragos recairá sobre a população local, que sofrerá consequências sociais, económicas e ambientais. Os seguros subscritos pelos operadores estão longe de cobrir as despesas de um acidente, as quais ficarão a cargo dos Estados (leia-se, dos cidadãos).

5.7   Constatações e recomendações fundamentais das avaliações de segurança extrínseca

5.7.1

O GSN (Grupo ad hoc de Segurança Nuclear do Conselho) (relatório final: http://register.consilium.europa.eu/pdf/en/12/st10/st10616.en12.pdf) apresentou as suas análises sobre cinco temas: proteção física, impactos intencionais de aeronaves, ciberataques, emergências nucleares e ainda exercícios e formação. Todavia, a segurança nacional mantém-se sob a responsabilidade dos Estados-Membros. Será necessário:

ratificar a Convenção sobre a Proteção Física dos Materiais Nucleares (proliferação);

prosseguir os trabalhos relativos à segurança nuclear extrínseca;

definir relações entre a segurança nuclear intrínseca, a proteção contra as radiações e a segurança nuclear extrínseca.

A ausência de estudos sobre os fatores organizacionais e humanos criam um vácuo. É indispensável abordar esta componente, que constitui um pilar da segurança intrínseca.

5.7.2

Foram levantadas questões que, no âmbito da problemática dos acidentes, dizem respeito à necessidade de ter em conta as ações hostis, bem como a possibilidade de impacto de aeronaves. Este aspeto foi analisado durante um seminário a nível europeu. Este ponto particular (impactos de aviões de grande porte) realçou as diferenças na abordagem dos vários Estados-Membros da UE. Ainda assim, as dúvidas suscitadas na sociedade são bem vincadas, sendo necessário levá-las em consideração. Na verdade, os dispositivos de contenção atualmente utilizados não resistiriam ao embate de um avião de grande porte. Em contrapartida, aqueles que confinam os novos reatores do tipo EPR deverão satisfazer novas exigências na sua construção: serão suficientes?

5.7.3   Medidas de reforço da segurança nuclear extrínseca:

redução da ameaça de incidentes químicos, biológicos, radiológicos e nucleares (QBRN) de origem intencional, incluindo atos de terrorismo e deteção de material radioativo e nuclear;

revisão da Diretiva 2008/114/CE relativa à identificação e designação das infraestruturas críticas europeias, prevista para 2013;

apresentação de uma proposta legislativa da Comissão sobre segurança extrínseca das redes e da informação, até ao final do ano;

adoção da proposta de revisão do Mecanismo da União no domínio da Proteção Civil destinado a facilitar a cooperação entre os Estados-Membros no quadro das intervenções de socorro da Proteção Civil na eventualidade de emergências graves, incluindo acidentes radiológicos e nucleares.

5.8   Perspetivas

5.8.1

Saliente-se que a catástrofe de Fucoxima teve como consequência a organização de testes de resistência, o que constituiu um exercício de uma dimensão inigualável. Por outro lado, um grande volume de documentação foi disponibilizado ao público. Ainda assim, não é menos verdade que se deve manter uma monitorização estreita. Constata-se, pois, que todos os países carecem de melhoramentos, impondo-se a supressão de pontos fracos em matéria de regulamentação.

5.8.2

Conclui-se ainda que os fatores humanos e organizacionais não foram objeto de uma análise adequada e que o seu impacto na segurança intrínseca não foi levado em consideração. Com respeito à organização face a uma situação de crise e à sua resolução a longo prazo, será necessário alargar a concertação a todos os atores e envolver os cidadãos.

5.8.3

A Comissão recomenda:

a aplicação tão rápida quanto possível dos pedidos formulados. Deverá monitorizar a aplicação desses requisitos e publicar, em conjunto com o ENSREG (Grupo de Reguladores Europeus em matéria de Segurança Nuclear), um relatório em 2014. A Comissão acrescenta ainda que o plano de ação deve visar a aplicação, até 2015, da maioria dos melhoramentos necessários no âmbito da segurança intrínseca;

que seja proposto ao Conselho um mandato para participar ativamente num grupo de trabalho sobre transparência (proposto também pela AIEA e modelizado pelo trabalho de investigação europeu RISCOM); neste particular, o CESE sugere que se tenha por base a Convenção de Aarhus;

a contribuição para o reforço da segurança nuclear extrínseca, apoiando-se nos Estados-Membros e instituições da UE.

Neste contexto, o CESE recomenda que as populações sejam envolvidas e consultadas.

5.8.4

O CESE considera que o processo de testes de resistência deve resultar na adoção de normas muito exigentes para a segurança da energia nuclear, que é responsável por 30 % da produção de eletricidade na UE. É essencial que assim o seja para que esta importante fonte de eletricidade com baixas emissões de carbono possa continuar a contribuir para o cabaz energético da Europa e para a consecução do objetivo de redução dos gases com efeito de estufa.

Bruxelas, 13 de dezembro de 2012

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


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