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Document 52009IP0238

Execução eficaz das decisões judiciais na UE: transparência do património dos devedores Resolução do Parlamento Europeu, de 22 de Abril de 2009 , sobre a execução eficaz das decisões judiciais na União Europeia: transparência do património dos devedores (2008/2233(INI))

OJ C 184E, 8.7.2010, p. 7–11 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

8.7.2010   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

CE 184/7


Quarta-feira, 22 de Abril de 2009
Execução eficaz das decisões judiciais na UE: transparência do património dos devedores

P6_TA(2009)0238

Resolução do Parlamento Europeu, de 22 de Abril de 2009, sobre a execução eficaz das decisões judiciais na União Europeia: transparência do património dos devedores (2008/2233(INI))

2010/C 184 E/02

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta o Artigo 65.o do Tratado CE,

Tendo em conta o Livro Verde da Comissão, de 6 de Março de 2008, sobre a execução eficaz das decisões judiciais na União Europeia: transparência do património dos devedores (COM(2008)0128),

Tendo em conta o Livro Verde da Comissão, de 24 de Outubro de 2006, sobre uma maior eficácia na execução das decisões judiciais na União Europeia: penhora de contas bancárias (COM(2006)0618) e a sua resolução de 25 de Outubro de 2007 sobre o mesmo (1),

Tendo em conta a sua resolução de 18 de Dezembro de 2008 com recomendações à Comissão em matéria de e-Justice (2),

Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Social Europeu de 3 de Dezembro de 2008,

Tendo em conta o parecer da Autoridade Europeia para a Protecção de Dados de 22 de Setembro de 2008,

Tendo em conta o artigo 45.o do Regimento,

Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Jurídicos e o parecer da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários (A6-0252/2009),

A.

Considerando que, à luz dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, apenas se poderá considerar a aprovação de um instrumento comunitário no domínio da cooperação judicial em matéria civil com incidência transfronteiriça, caso fique demonstrada a impossibilidade de resolver, a nível nacional, um obstáculo à realização do mercado interno,

B.

Considerando que os atrasos de pagamento e os pagamentos não efectuados prejudicam os interesses tanto das empresas como dos consumidores, em especial, quando o credor e as autoridades de execução não dispõem de informações sobre o paradeiro do devedor ou o seu património; considerando que isso é ainda exacerbado pelo actual clima económico, em que o cash flow é essencial para a sobrevivência das empresas,

C.

Considerando que os problemas da cobrança transfronteiriça de dívidas poderão constituir um sério obstáculo à livre circulação das injunções de pagamento na UE e impedem o acesso à justiça; considerando, além disso, que se as decisões judiciais não puderem ser executadas, a eficácia da justiça será prejudicada, juntamente com os padrões de moralidade comercial,

D.

Considerando que, em termos simples, a recuperação de dívidas constitui um grande problema, agravado quando as queixas são de natureza transfronteiriça, especialmente para as pequenas empresas que não dispõem de advogados especializados ou departamentos dedicados à cobrança de dívidas e que se vêem frequentemente na indesejável situação de ter de dedicar pessoal, recursos financeiros escassos e, acima de tudo, tempo a este problema, em vez de se concentrarem em actividades produtivas,

E.

Considerando que há indícios de que a directiva relativa aos atrasos de pagamento (3) não é suficientemente respeitada nem conhecida; considerando que, se essa directiva fosse hoje actualizada e devidamente aplicada, poderia ter um impacto considerável em termos de reduzir os atrasos de pagamento e os não pagamentos,

F.

Considerando que entre as legislações nacionais em matéria de insolvência existem importantes divergências sobre as formas como os credores podem, no acto da celebração do contrato, garantir o pagamento do seu crédito, nomeadamente mediante o recurso a cláusulas de retenção de título e outros mecanismos afins que são por vezes contornados devido a tais divergências,

G.

Considerando que a adopção de legislação comunitária sobre a execução eficaz das decisões judiciais deve dizer respeito ao conjunto dos devedores, sem distinção à partida dos devedores de boa ou de má-fé,

H.

Considerando que as situações de evasão ao pagamento, atraso de pagamento ou não pagamento de dívidas são amiúde agravadas pela insuficiência de cuidado das partes quando das suas negociações pré-contratuais e contratuais; considerando que se impõe colocar a tónica numa maior tomada de consciência dos problemas associados às transacções comerciais e no eventual recurso, no âmbito do Quadro Comum de Referência (QCR), a cláusulas opcionais ao estilo «europeu» tendentes a assegurar que as partes ponderem devidamente estas questões no início da sua relação comercial,

I.

Considerando que o Parlamento teve conhecimento de que pode existir um grave problema nos casos transfronteiriços envolvendo credores recalcitrantes, isto é, pessoas que poderiam pagar as suas dívidas ou saldar as suas obrigações, mas que não o fazem, ou pessoas a respeito das quais há um risco de não pagarem o que devem, mesmo que tenham sido objecto de decisão judicial; considerando que esses indivíduos têm frequentemente activos em diferentes entidades, depositários e fundos e que não é possível qualquer execução eficaz sem a informação pertinente; considerando que é frequentemente necessário obter essa informação sem alertar o devedor recalcitrante – que estará frequentemente em posição de deslocar rapidamente esses bens para outra jurisdição,

J.

Considerando que o Parlamento teve conhecimento, além disso, de que certos Estados soberanos não honram as decisões arbitrais ou as decisões judiciais proferidas pelos tribunais de outro Estado, o que tem resultado no aparecimento de «fundos abutre» que adquirem esta dívida soberana a um valor muito inferior, procurando posteriormente realizar lucros com a execução; considerando que seria preferível e mais justo dar aos credores originais os meios para obterem, eles próprios, reparação,

K.

Considerando que são poucos os Estados que não dispõem de quaisquer activos fora das suas fronteiras e que, se o devedor não tiver esperança de obter execução no seu próprio Estado-Membro (apenas) ou no Estado em causa, então a única compensação efectiva possível será através dos tribunais estrangeiros, em particular nos tribunais de outros Estados-Membros da União Europeia,

L.

Considerando que, nos termos do Regulamento Bruxelas I (4), cada Estado-Membro dispõe das suas próprias medidas provisórias enquadradas e regidas pelas respectivas legislações nacionais e que as decisões ex parte não estão sujeitas ao reconhecimento mútuo e à execução ao abrigo do referido Regulamento; considerando que às decisões inter partes é dada execução por um tribunal competente com a reparação equivalente mais próxima proporcionada por esse tribunal;

M.

Considerando que as medidas provisórias incluem: (i) uma ordem de divulgação da informação sobre os bens que poderão estar sujeitos a medidas de execução de uma decisão judicial e (ii) decisões que preservem os bens enquanto se aguarda a execução e (iii) estas medidas poderão revestir a forma de uma injunção de pagamento provisória que proporcione ao credor pagamento imediato enquanto se aguarda a resolução do litígio subjacente,

N.

Considerando que as medidas provisórias deveriam estar sujeitas a condições semelhantes às aplicadas pelo Tribunal de Justiça, nomeadamente, o credor teria que convencer o tribunal de que tem um bom argumento sobre o mérito do pedido (um direito executório sob a forma de uma decisão judicial ou um acto autêntico ou de prova suficiente à primeira vista de um caso fumus boni juris) e demonstrar a urgência (um risco real de que a execução do pedido seja frustrada se a medida não for concedida (periculum in mora) e considerando que as medidas provisórias podem depender do depósito de uma caução,

O.

Considerando que nos casos de pequeno montante, especialmente casos em que as custas judiciais possam, de outra forma, ser proibitivas, o atraso na justiça corresponde a uma denegação da justiça e que, em casos de montantes mais avultados, o maior obstáculo poderá ser a ausência de informação sobre os bens; considerando, por conseguinte, que o recurso a medidas provisórias pode proporcionar uma solução clara em ambos os tipos de casos,

P.

Considerando ser necessário que qualquer acção comunitária destinada a disponibilizar informação seja analisada no contexto deste tipo de casos, em que a falta de informação causa graves injustiças; considerando que, a não ser que esteja disponível informação para o credor sobre os activos de um devedor (e, a fortiori, de um devedor recalcitrante) passíveis de execução judicial, o credor não poderá beneficiar dessa execução,

Q.

Considerando que, na prática, este problema não se cinge aos casos em que já exista uma decisão judicial que não tenha sido cumprida: pode surgir igualmente antes de os demandantes apresentarem os respectivos pedidos,

R.

Considerando, no entanto, ser absolutamente essencial que quaisquer medidas propostas sejam proporcionadas; considerando ainda que estas não deverão ser meras réplicas daquilo que já se pode fazer através das medidas nacionais existentes e que deverão cingir-se às queixas transfronteiriças, devendo evitar-se uma harmonização desnecessária e desadequada,

S.

Considerando que foi manifestada alguma preocupação pelo facto de algumas das ideias sobre a execução eficaz das decisões judiciais na União Europeia através da transparência do património dos devedores poderem violar direitos fundamentais, incluindo o direito à privacidade (protecção de dados), prejudicar as salvaguardas processuais e contrariar as tradições constitucionais de muitos Estados-Membros,

T.

Considerando que quaisquer propostas deverão ter uma boa relação custo-eficácia e ser integradas noutras áreas políticas comunitárias a fim de evitar qualquer duplicação desnecessária de esforços,

1.

Saúda o supracitado Livro Verde da Comissão de 6 de Março de 2008 porquanto contribui para a estratégia de Lisboa;

2.

Declara que a opacidade da informação necessária para forçar o devedor a cumprir as suas obrigações é contrária aos princípios comuns de boa fé e de responsabilidade patrimonial; declara que a falta de conhecimento das legislações nacionais relativas às vias de execução ou a ineficácia das mesmas é susceptível de entravar a realização de um mercado interno unificado e implica custos injustificados;

3.

Assinala que o atraso nos pagamentos, a falta de pagamento e a dificuldade de cobrança destas dívidas prejudicam os interesses das empresas e dos consumidores credores, diminuem a confiança no mercado interno e debilitam a acção da justiça;

4.

Apoia uma estratégia integrada e eficaz, segundo os princípios de «legislar melhor», e considera que o objectivo do pagamento deve ser alcançado assegurando a não discriminação, a protecção de dados sensíveis e as garantias judiciais, através de medidas proporcionadas que introduzam a transparência necessária e reduzam consideravelmente os custos de informação e gestão;

5.

Sustenta que, para além da informação pública, o credor deverá poder aceder, sob controlo ou com a assistência de uma autoridade competente, aos dados necessários para dar início ao processo de execução e conseguir cobrar a sua dívida de maneira fácil em todo o mercado interno;

6.

Concorda com a Comissão que a cobrança transfronteiriça de dívidas através da execução de decisões judiciais constitui um importante problema do mercado interno, mas considera que as soluções apresentadas pela Comissão devem ser mais trabalhadas para resolver adequadamente o problema mais difícil, a saber, o dos devedores recalcitrantes;

A proposta de elaboração de um manual sobre as normas e práticas nacionais em matéria de execução

7.

Observa que esse manual poderá ser de elaboração e actualização laboriosas e dispendiosas, que para quem procura obter justiça poderá ser mais fácil ter de lidar com apenas um sistema, e que, na grande maioria dos casos, os credores terão que procurar o aconselhamento de advogados na jurisdição estrangeira em causa; considera, não obstante, que uma versão simplificada poderá ser de utilidade na ausência de um sistema transfronteiriço funcional;

8.

Acredita firmemente que seria útil o lançamento de directórios nacionais de advogados estrangeiros que exercem os seus direitos no quadro do mercado interno ao abrigo das Directivas 77/249/CEE (5) e 98/5/CE (6); salienta que esses directórios nacionais poderiam ser acessíveis a partir de um sítio Web da Comissão e complementares ao manual;

Aumentar as informações disponíveis e melhorar o acesso aos registos públicos

9.

Opõe-se à concessão de acesso injustificado, indiscriminado e arbitrário a todo o tipo de dados sobre os registos civis, da segurança social e fiscais, e defende o estabelecimento de um quadro adequado e proporcionado para assegurar a execução eficaz das decisões judiciais na União Europeia;

10.

É de opinião que um adequado acesso aos registos civis (sempre que existam) pode ser útil para identificar os particulares que não cumprem as suas pensões de alimentos ou os seus empréstimos pessoais e para evitar abusos;

11.

Considera que, embora um maior acesso aos registos de segurança social e aos registos fiscais tenha sido permitido com êxito em determinadas jurisdições, importa igualmente assegurar o respeito das regras relativas à protecção de dados e à confidencialidade; salienta que esta é uma questão delicada para o público; regista, além disso, que poderão existir problemas jurídicos no que respeita à utilização de informação para outros fins que não aqueles para que foi recolhida;

12.

Observa ainda que as declarações fiscais e os registos de segurança social são confidenciais em muitos Estados-Membros e que a ideia de um registo, com todos os riscos de os registos se extraviarem, não seria bem-vinda nesses Estados-Membros e seria vista como um abuso do poder executivo;

13.

Entende que, se a proposta fosse desproporcionada em relação ao fim pretendido, poderia prestar-se a abusos e constituir uma violação do direito à privacidade;

Intercâmbio de informações entre autoridades de execução

14.

Considera que poderá valer a pena explorar a ideia de uma cooperação mais estreita entre as entidades públicas de execução, mas salienta que essas entidades não existem em todos os Estados-Membros;

A declaração do devedor

15.

Considera que uma declaração do devedor pode, com utilidade, fazer parte do processo de execução de uma decisão judicial, sempre que possa ser apoiada por sanções ao abrigo do direito nacional;

16.

Considera não haver necessidade de uma acção comunitária neste domínio, contanto que não tenha sido provada a ineficácia dos instrumentos em vigor nos Estados-Membros;

Outras medidas

17.

Sugere que seja ponderada seriamente a ideia da introdução de uma forma de medida provisória comunitária, adicional às dos tribunais nacionais; considera que esta poderia revestir a forma de um procedimento simples e flexível com efeito em toda a UE, evitando, desse modo, atrasos e despesas desnecessários; entende que essa medida seria igualmente eficaz e justa para quem não é parte no processo;

18.

Propõe que essa medida se aplique também a decisões arbitrais e possa ainda ser tida em conta no contexto da próxima revisão do Regulamento Bruxelas I;

19.

Convida a Comissão a tratar este assunto com prioridade e a proceder (a) a um exame detalhado do problema, (b) elaborar um estudo de viabilidade de possíveis instrumentos comunitários e, (c) efectuar um estudo de impacto de possível legislação confinada aos aspectos transfronteiriços; considera que a análise da Comissão deveria igualmente identificar e justificar devidamente a base legal apropriada para qualquer instrumento comunitário proposta, que se deveria limitar aos casos transfronteiriços e ser complementar e não interferir com a aplicação de disposições puramente nacionais nesta área;

20.

Insta a Comissão a ponderar criteriosamente o estabelecimento de medidas pré-contratuais e contratuais, eventualmente ligadas ao desenvolvimento do QCR e de qualquer instrumento opcional daí decorrente, por forma a assegurar que as partes de contratos transfronteiriços europeus ponderem, no acto da celebração do contrato, as questões de atraso de pagamento e de não pagamento;

21.

Aguarda com expectativa a revisão da directiva relativa aos atrasos de pagamento e, face ao actual clima económico, insta a Comissão a proceder à mesma quanto antes;

22.

Sugere que deveria ser levado a cabo um estudo sobre as abordagens jurídicas nacionais divergentes no que respeita ao mecanismo de retenção do título e outros afins, de modo a assegurar o seu reconhecimento mútuo;

23.

Sugere que o adquirente de direitos patrimoniais reconhecidos numa sentença judicial possa exercer o seu direito nas mesmas condições que o transmitente;

*

* *

24.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos parlamentos nacionais dos Estados-Membros.


(1)  JO C 263 E de 16.10.2008, p. 655.

(2)  Textos Aprovados, P6_TA(2008)0637.

(3)  Directiva 2000/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Junho de 2000, que estabelece medidas de luta contra o atraso de pagamentos nas transacções comerciais (JO L 200, de 8.8.2000, p. 35).

(4)  Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO L 12 de 16.1.2001, p. 1).

(5)  Directiva 77/249/CEE do Conselho, de 22 de Março de 1977, tendente a facilitar o exercício efectivo da livre prestação de serviços pelos advogados (JO L 78 de 26.3.1977, p. 17).

(6)  Directiva 98/5/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Fevereiro de 1998, tendente a facilitar o exercício permanente da profissão de advogado num Estado-Membro diferente daquele em que foi adquirida a qualificação profissional (JO L 77 de 14.3.1998, p. 36).


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