EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52007AE0205

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão — Travar a perda de biodiversidade até 2010 e mais além — Preservar os serviços ecossistémicos para o bem-estar humano COM(2006) 216 final

OJ C 97, 28.4.2007, p. 6–11 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

28.4.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 97/6


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão — Travar a perda de biodiversidade até 2010 e mais além — Preservar os serviços ecossistémicos para o bem-estar humano»

COM(2006) 216 final

(2007/C 97/03)

Em 22 de Maio de 2006, a Comissão Europeia decidiu, em conformidade com o disposto no artigo 262.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 25 de Janeiro de 2007, tendo sido relator L. RIBBE.

Na 433.a reunião plenária de 15 e 16 de Fevereiro de 2007 (sessão de 15 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 137 votos a favor, 7 contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Resumo das conclusões e das recomendações do Comité

1.1

O CESE e a Comissão estão de acordo quanto ao essencial: a preservação da biodiversidade é essencial não só por razões éticas ou morais; há também bastantes motivos económicos, nomeadamente um comércio mais expedito e eficaz. Os prejuízos económicos decorrentes do desaparecimento dos serviços ecossistémicos elevam-se já a mais de 100 mil milhões de euros, uma perda que as economias europeias não podem continuar a permitir-se.

1.2

A diminuição da biodiversidade na Europa deve-se a uma miríade de decisões das últimas décadas, a maioria das quais perfeitamente legais; a percentagem de espécies perdidas devido a actividades ilegais é ínfima.

1.3

Apesar das promessas políticas, a biodiversidade continua a desaparecer, e esse desaparecimento não se deve à falta de soluções. O que falta é a vontade política de pôr em prática medidas de há muito reconhecidas como indispensáveis. A experiência com a rede NATURA 2000 fala por si.

1.4

As razões deste fracasso são acertadamente descritas pela Comissão na sua comunicação e incluem «falhas da governação e a incapacidade da economia convencional para reconhecer os valores económicos do capital natural e dos serviços ecossistémicos». Estas causas e o facto de que os motivos éticos e morais para a preservação da biodiversidade são geralmente relegados para segundo plano na tomada de decisões e na planificação política levaram ao agravamento da situação.

1.5

Entre os objectivos e a realidade permanece um abismo enorme que importa colmatar se se pretende conter a perda da biodiversidade.

1.6

O CESE louva a apresentação do plano de acção e reconhece a pertinência das 160 (!) medidas nele propostas; muitas dessas medidas não são novas, constando da ordem do dia há vários anos. O futuro revelará se este plano de acção resultará finalmente nas necessárias «alterações substanciais a nível de políticas e de práticas» ou se pelo contrário se concretizará a previsão pessimista de muitos ecologistas de que os responsáveis não dêem seguimento às promessas ambiciosas que fazem ao público.

1.7

Um dos pontos negativos da comunicação é que não analisa de um ponto de vista estratégico a questão levantada pelo parecer exploratório do CESE de 18.5.2006 (1) sobre o fosso entre os objectivos, as promessas e os resultados concretos na preservação da biodiversidade. O CESE lastima que este problema tenha sido praticamente excluído da comunicação e do plano de acção.

1.8

O CESE considera pois particularmente importante dar prioridade ao quarto domínio político («Melhorar a base de conhecimentos») a fim de que tanto cidadãos como políticos possam conhecer as consequências das suas acções.

1.9

Há que chamar a atenção para a necessidade de ajudar os países vizinhos da UE a reforçarem a protecção da biodiversidade e a evitarem o co-financiamento pela UE e pelos diferentes Estados-Membros de projectos que possam contribuir para acelerar a perda de biodiversidade nos países europeus terceiros.

1.10

O Comité concorda com o conceito da responsabilidade global da UE conforme descrita pela Comissão. Embora a UE e os Estados-Membros consagrem menos de 0,004 % do seu poder económico a medidas adequadas de preservação e fomento da biodiversidade, é cada vez mais evidente a sua responsabilidade pela destruição da biodiversidade a nível global (p. ex., nas florestas tropicais). No futuro, o desenvolvimento dos biocombustíveis poderá conduzir a um novo agravamento da situação.

1.11

O CESE lastima que o plano de acção propriamente dito só esteja disponível em inglês e como «anexo técnico »(por conseguinte apenas como documento SEC). O Comité exorta a Comissão a traduzir o plano de acção em todas as línguas oficiais e a divulgá-lo quer na Internet quer em formato impresso.

1.12

A concretização dos objectivos do plano de acção será supervisionada pelo Grupo de Peritos em matéria de Biodiversidade existente. O CESE considera absolutamente premente dar à sociedade civil um papel mais eminente nessa supervisão.

2.   Elementos principais e contexto do documento da Comissão

2.1

Depois de a UE ter chamado a atenção, em 1998, no âmbito da sua estratégia para a biodiversidade, para a redução catastrófica desta, os chefes de Estado e de Governo da UE acordaram em 2001 o objectivo de sobrestar até 2010 a perda dramática de diversidade biológica na UE (2). Aos cidadãos europeus foram ainda prometidos esforços de recuperação dos habitats e dos sistemas naturais.

2.2

A presente comunicação, que acompanha o «Plano de acção para a preservação da biodiversidade», descreve mais uma vez de forma exaustiva e perturbante a situação actual no que toca à preservação da biodiversidade ou, mais exactamente, à perda continuada dessa biodiversidade. Essa perda continua a ser, na opinião unânime de todos os estudos da Agência Europeia do Ambiente e das listas nacionais de espécies animais e vegetais ameaçadas, extremamente preocupante. Na comunicação, a Comissão constata que se está ainda muito longe do objectivo declarado de travar a perda da biodiversidade até 2010 e que a tendência negativa só poderá ser invertida «com alterações substanciais a nível de políticas e de práticas».

2.3

A Comissão afirma ainda que «o ritmo e o âmbito da implementação têm sido insuficientes» e apela a «uma implementação acelerada tanto a nível da Comunidade como dos Estados-Membros», caso contrário «existe um risco real de fracasso no que diz respeito ao cumprimento do objectivo para 2010 a nível global».

2.4

Em seu entender, o incumprimento dos objectivos seria duplamente problemático. Isso porque a preservação da biodiversidade não é só uma obrigação ético-moral, mas igualmente uma necessidade económica. A comunicação deixa bem claro que a biodiversidade é essencial para garantir os serviços ecossistémicos, como por exemplo «a produção de alimentos, combustíveis, fibras e medicamentos, a regulação dos recursos hídricos, ar e clima, a manutenção da fertilidade dos solos e o ciclo dos nutrientes». Em todo o mundo, «cerca de dois terços dos serviços ecossistémicos encontram-se em declínio» e a Comissão estima os prejuízos financeiros daí decorrentes (ainda que dificilmente avaliáveis) em «centenas de milhares de milhões de euros por ano».

2.5

A comunicação coloca ainda a questão do que foi feito até à data e qual foi a sua eficácia, descrevendo tanto a situação da UE como a situação global e salientando a responsabilidade global da UE.

2.6

O ponto central da comunicação é o problema das medidas a tomar no futuro. É nessa óptica que surge (embora apenas sob a forma de um documento SEC) o plano de acção da UE, que abrange quatro domínios políticos centrais, define dez objectivos prioritários e refere quatro medidas centrais de apoio.

2.6.1

O primeiro domínio político prende-se com a «Biodiversidade na UE»e abrange 5 dos 10 objectivos prioritários, a saber:

Salvaguarda dos habitats e espécies mais importantes da UE,

Conservação e recuperação da biodiversidade e dos serviços ecossistémicos na generalidade das zonas rurais da UE,

Conservação e recuperação da biodiversidade e dos serviços ecossistémicos na generalidade do meio marinho da UE,

Reforço da compatibilidade do desenvolvimento regional e territorial com a biodiversidade na UE,

Redução substancial do impacto na biodiversidade da UE de espécies alóctones invasivas e de genótipos exóticos.

2.6.2

O domínio político 2 compreende «A UE e a biodiversidade mundial», dado que a perda da biodiversidade não se limita ao território da UE e que tanto esta como os Estados-Membros têm, por um lado, obrigações jurídicas de protecção global da biodiversidade e são, por outro lado, através das suas relações comerciais, parcialmente responsáveis pelo que sucede no resto do mundo. Este domínio inclui três objectivos prioritários:

Reforço substancial da eficácia da governação internacional em matéria de biodiversidade e serviços ecossistémicos,

Reforço substancial do apoio à biodiversidade e aos serviços ecossistémicos no âmbito da ajuda externa da UE,

Redução substancial do impacto do comércio internacional na biodiversidade e em serviços ecossistémicos a nível global.

2.6.3

O domínio político 3 diz respeito à «Biodiversidade e alterações climáticas»e formula o objectivo de

Apoio para a adaptação da biodiversidade às alterações climáticas.

2.6.4

O quarto domínio político orienta-se para a «Base de conhecimentos»e propõe como décimo objectivo prioritário o

Reforço substancial da base de conhecimentos para a conservação e utilização sustentável da biodiversidade, na UE e a nível global.

2.6.5

As medidas de apoio são as seguintes:

Garantia de financiamento adequado,

Reforço do processo de decisão da UE,

Constituição de parcerias e

Melhoria do ensino, da sensibilização e da participação do público.

3.   Observações na generalidade sobre a comunicação da Comissão

3.1

O CESE congratula-se pela apresentação da comunicação e do plano de acção em 22.5.2006, escassos quatro dias após a adopção do parecer exploratório do CESE sobre a Campanha da UE para a conservação da biodiversidade: posição e contributo da sociedade civil. Ao CESE apraz constatar que a análise da situação actual e das suas causas é quase idêntica em ambos os documentos.

3.2

O CESE observa que as causas do actual desaparecimento de espécies e de habitats (como sejam a intensificação da exploração do solo, o abandono de espaços anteriormente aproveitados de forma extensiva, a impermeabilização dos solos, a expansão das áreas urbanas, etc.) são conhecidas há muitos anos e estão amplamente documentadas por estudos científicos. Em parte devem-se a opções e medidas adoptadas pelos intervenientes económicos ou a decisões políticas tomadas no quadro da legislação vigente; os riscos para a biodiversidade decorrentes de actividades ilegais são relativamente reduzidos. Segue-se que são decisões políticas, reflectidas e objectivas perfeitamente legítimas que levam à perda da biodiversidade, muitas vezes apoiadas ou iniciadas por decisões e instrumentos de apoio da UE, dos Estados-Membros ou dos municípios.

3.3

A convergência entre as conclusões do CESE e as da comunicação da Comissão quanto à situação actual também se aplica aos argumentos a favor da necessidade de preservar a biodiversidade. Na comunicação, a Comissão cita razões ético-morais e económicas, ao passo que o parecer do CESE refere o «valor intrínseco »e o «valor prático »das paisagens e da biodiversidade.

A biodiversidade entre objectivo político e realidade

3.4

A comunicação em apreço inscreve-se numa longa lista de documentos políticos elaborados com o objectivo de suster a perda da biodiversidade. São frequentes as promessas políticas nesse sentido, tendo a última sido formulada na reunião dos ministros comunitários do Ambiente em Dezembro de 2006, em que foi aprovada a comunicação da Comissão.

3.5

Infelizmente, o CESE não pode senão verificar que também neste caso vai uma enorme distância entre os objectivos e a realidade, distância que não passa despercebida à opinião pública. Por exemplo, em Dezembro de 2006 os ministros responsáveis pela Pesca definiram em Dezembro de 2006 quotas de captura que todos (!) os biólogos marinhos consideram demasiado elevadas e susceptíveis de levar as populações actuais à extinção. Contudo, os ministros falaram de um «bom resultado», o que denota ou duas apreciações muito diferentes da problemática e das relações de causa e efeito, ou que os temas são efectivamente debatidos mas as políticas conscientemente postas em prática continuam a repercutir-se negativamente na biodiversidade.

3.6

O Comité já mencionou para este problema em vários pareceres, chamando a atenção para o risco crescente de perda de credibilidade das políticas.

3.7

Parece haver uma grande disparidade entre a forma como a Comissão e o CESE qualificam a apreciação pela população em geral, pelos responsáveis políticos e pelos principais actores económicos do problema do declínio da biodiversidade, e sobretudo o modo como esse declínio é combatido a nível político. O CESE não pretende afirmar que não haja consciência do problema da perda da biodiversidade, nem acusar qualquer cidadão ou político de tomar decisões com o propósito declarado de prejudicar a biodiversidade; mas são inegáveis as dificuldades em avaliar as consequências a longo prazo de algumas decisões e em inferir as conclusões que se impõem. Um exemplo que ilustra esta situação são as medidas de correcção do solo efectuadas nos novos Estados-Membros, incluindo a Polónia, entre 2004-2006 e programadas para 2007-2013 no âmbito dos programas de desenvolvimento rural. A acção «gestão dos recursos hídricos agrícolas», financiada com fundos da UE, diz respeito sobretudo à transformação técnica das bacias hídricas, o que, por seu turno, tem uma variedade de efeitos negativos, começando pela perda de biodiversidade. Infelizmente, esta acção é também realizada e programada em zonas potenciais da rede Natura 2000.

3.8

A Comissão afirma que a preservação da biodiversidade assumirá um papel de destaque nomeadamente na Estratégia de Lisboa, e o Comité das Regiões, no seu parecer sobre a comunicação em apreço, congratula-se igualmente «com as conclusões do Conselho de 23 e 24 de Março de 2006, que preconizam a integração dos objectivos para 2010 em todos os domínios políticos da agenda de Lisboa». O CESE tem, porém, grandes reservas e constata, pelo contrário, que o papel e a importância da biodiversidade no quadro das políticas económicas são marginais. A análise dos documentos sobre a Estratégia Lisboa revela que conceitos como por exemplo «biodiversidade »ou «protecção da natureza »só surgem marginalmente (quando não estão inteiramente ausentes), e o mesmo se aplica aos programas nacionais de reforma.

3.9

A Comissão tem toda a razão quando fala de «falhas da governação e [d]a incapacidade da economia convencional para reconhecer os valores económicos do capital natural e dos serviços ecossistémicos». Se esses «valores »fossem realmente reconhecidos e se os custos externos fossem integrados, o problema não seria tão premente.

3.10

O CESE observara já no seu parecer exploratório sobre a matéria que a incompatibilidade entre as diferentes estratégias de promoção do crescimento económico, por um lado, e a biodiversidade, por outro, é cada vez maior. O crescimento económico é hoje em dia frequentemente equiparado a um crescimento meramente quantitativo, e nessa acepção a preservação da biodiversidade só pode ser vista como um entrave. Assim, a protecção da natureza e da biodiversidade é representada, na maior parte das decisões de fundo ou em matéria de ordenamento do território, não como uma oportunidade de desenvolvimento económico, mas sim como um obstáculo a esse desenvolvimento. Só assim se compreende a pressão que continua a ser exercida contra as Directivas «Fauna-Flora-Habitat »(FFH) e «Protecção das aves», bem como contra a rede Natura-2000 que nelas se baseia. Ainda que o comissário Dimas, responsável pelo Ambiente, se oponha actualmente à alteração dessas directivas (3), é inegável que a protecção da natureza é vista muito mais como um obstáculo ao aproveitamento dos solos e um entrave ao desenvolvimento do que como motor do crescimento económico, da mesma forma que os encargos e obrigações financeiros decorrentes da criação da rede Natura-2000 são vistos como um estorvo e não como um investimento no futuro.

3.11

Para além desta «percepção económica »da protecção da natureza e da biodiversidade, diametralmente oposta aos argumentos económicos que a Comissão invoca para a preservação da biodiversidade, há um outro problema, provocado pelos próprios responsáveis pela protecção da natureza e gerador de conflitos acesos com os proprietários ou exploradores dos solos. O CESE já preveniu várias vezes que a forma como por exemplo a rede Natura-2000 foi planeada e posta em prática constitui o modelo acabado de como não deve proteger-se a natureza: os ministros nacionais (e por vezes regionais) criticam as bases jurídicas que eles próprios estabeleceram anos antes; as compensações prometidas aos agricultores não são pagas, e são tomadas decisões que afectam proprietários ou exploradores de terrenos sem que os mesmos sejam consultados. Uma tal «protecção da natureza »não merece credibilidade e gera desconfiança.

3.12

Inversamente, vários exemplos demonstram que podem ser obtidos êxitos assinaláveis se os políticos e a administração cumprirem as suas promessas e aceitarem formar verdadeiras parcerias.

A política financeira da UE como exemplo negativo

3.13

As decisões do Conselho Europeu de Dezembro de 2005 no que toca às Perspectivas Financeiras, com a redução das dotações do segundo pilar da PAC, particularmente importante para a preservação da biodiversidade, são a prova de que apesar de todas as declarações solenes e de todos os objectivos a biodiversidade continua a ser sacrificada nos processos de decisão políticos. Reivindicar, como o faz a Comissão no plano de acção, meio ano após as referidas decisões financeiras, garantias de «financiamento adequado »para a Natura-2000 como uma das quatro medidas de apoio é perfeitamente legítimo, mas denota um desfasamento total com a realidade política. Uma tal reivindicação torna-se antes mais uma prova da discrepância entre o que é dito e o que é feito.

3.14

O CESE já alertou várias vezes para as dotações insuficientes do segundo pilar da PAC depois que lhe foram atribuídas tarefas adicionais como por exemplo o financiamento da rede Natura-2000 e a aplicação da Directiva-quadro sobre a água. Que opinião merece aos cidadãos uma política tão obviamente contraditória e geradora de tais conflitos locais?

3.15

O Comité das Regiões tem pois inteiramente razão ao apelar, no seu parecer sobre esta matéria, «a que a revisão das perspectivas financeiras para 2007-2013, em 2008, reserve uma parte substancial dos recursos à agricultura sustentável e à preservação da paisagem».

3.16

O mesmo vale para o apelo essencialmente justificado da Comissão a «que os fundos comunitários para o desenvolvimento regional sejam benéficos para a biodiversidade e não a prejudiquem». Há que constituir «parcerias entre os planificadores, os promotores e as partes interessadas na biodiversidade». O CESE apoia inteiramente esta posição, entretanto abundantemente defendida. Mas também aqui é evidente a discrepância entre os objectivos anunciados e a prática política quotidiana, que praticamente não evoluiu. Projectos infra-estruturais (co-financiados pela UE) continuam a ser construídos em zonas particularmente importantes para a protecção da natureza; e apesar das necessárias medidas de correcção e compensação, o resultado final (cf. descrição da situação na UE) continua a ser a perda da biodiversidade.

3.17

O CESE considera que a reivindicação da Comissão no que toca aos Fundos Estruturais deve aplicar-se igualmente a todas as intervenções da UE, a fim de promover a coerência entre as políticas comunitárias.

3.18

O entender do CESE, os domínios em que a UE é parcialmente responsável em virtude das suas competências constituiriam bons pontos de partida, e nomeadamente a política agrícola. No entanto, e como demonstra a situação actual, as disposições jurídicas em vigor não são suficientes para assegurar a preservação da biodiversidade. Se os subsídios agrícolas estiverem dependentes «apenas »do cumprimento das leis actuais, isso significa que a biodiversidade não será protegida.

3.19

Os pagamentos directos aos agricultores, que perfazem a maior parte do orçamento para a agricultura, não estão orientados para a promoção da biodiversidade, e sim para preparar os agricultores para os desafios dos mercados mundiais. O CESE salientou já em várias ocasiões que o modelo agrícola europeu, que inclui nomeadamente a preservação da biodiversidade, não deve estar sujeito às imposições do mercado mundial. Não pode esperar-se que os agricultores sejam ao mesmo tempo competitivos à escala mundial e promotores da biodiversidade.

3.20

É por isso que o CESE considera que «Enquanto as condições-quadro à escala mundial tornarem impossível uma agricultura extensiva e compatível com a natureza, deviam-se aumentar as taxas de ajuda às medidas agroambientais até se conseguir persuadir todos os agricultores da UE a empregar métodos de produção respeitadores do ambiente»  (4). Mais uma vez, as acções não correspondem às palavras.

3.21

É inegável que a situação política no que respeita à protecção da biodiversidade é fundamentalmente diferente da de outros domínios, como as políticas financeira e de estabilidade. Nesses domínios, a Comissão procura, por vezes contra grande resistência, impor uma linha política clara e dispõe de instrumentos (cf. os critérios de Maastricht) para exigir o respeito da mesma. Já a preservação da biodiversidade não tem passado das declarações.

3.22

Por esse motivo, o CESE interrogou-se no seu parecer exploratório sobre a matéria como é possível que numa sociedade em que todos defendem a preservação da biodiversidade esta continue a diminuir. O parecer concluiu que a sociedade (e em boa parte os próprios políticos) não estão suficientemente informados sobre o valor intrínseco e prático da biodiversidade. Se esse valor não for, porém, plenamente aceite e compreendido, a política de preservação da biodiversidade não poderá vingar. O CESE recomendou, por isso, que fosse dada uma maior prioridade à divulgação da importância de preservar a biodiversidade. O plano de acção ora proposto tenta, com efeito, solucionar este problema através do quarto domínio político e das medidas de apoio, mas não da forma exaustiva que seria necessária.

3.23

O CESE não pretende repetir aqui as recomendações do seu parecer de 18.5.2006, mas apela a que a Comissão, o Conselho e o Parlamento as releiam. A situação dramática da biodiversidade é bem conhecida e deve-se essencialmente a medidas e decisões perfeitamente legais. Se é certo que a UE já adoptou algumas medidas necessárias, estas não surtiram ainda efeito por não receberem a prioridade devida. Ao mesmo tempo, continuam a ser tomadas decisões prejudiciais para a biodiversidade.

4.   Observações na especialidade

4.1

Quando um plano de acção apresenta mais de 160 propostas diferentes para a melhoria de uma situação, torna-se claro que há problemas sérios em muitos domínios políticos e a vários níveis. Ao mesmo tempo, importa saber se todas as medidas são igualmente importantes e se poderão todas ser aplicadas em simultâneo. Estas questões não significam que o CESE se oponha a qualquer das medidas referidas, mas sim que subsistem reservas quanto à possibilidade de as aplicar na prática.

4.2

Na opinião do CESE, é urgente aplicar na íntegra as medidas do quarto domínio político: a base de conhecimentos sobre a importância real da biodiversidade e sobre o impacto que nela têm a longo prazo as diferentes decisões políticas deve ser melhorada o quanto antes. Só quando essa base de conhecimentos estiver efectivamente disponível e for aceite pelos responsáveis políticos e pela sociedade em geral serão possíveis as «alterações substanciais a nível de políticas e de práticas» que a Comissão propõe. Resta saber se o que falta são os conhecimentos e as ideias, ou muito mais a vontade ou a capacidade política.

4.3

A UE será julgada em função da sua capacidade de cumprir os compromissos assumidos, e nomeadamente de rever as suas políticas específicas e de apoios. As decisões financeiras de Dezembro alimentaram o cepticismo de muitos dos implicados quanto à seriedade das intenções da UE. Cepticismo ainda reforçado pelo facto de que mesmo nos domínios em que os interesses económicos não constituem obstáculo a uma melhor protecção da biodiversidade não terem sido assinalados êxitos dignos de nota no passado.

4.4

Um exemplo dessa situação é uma prática totalmente ignorada pelo documento da Comissão mas fundamental para o destino de muitas espécies ameaçadas: a caça. Nos 27 Estados-Membros, na Suíça e na Noruega são anualmente mortas cerca de 102 milhões de aves, 37 milhões das quais canoras. Estes números baseiam-se nas estatísticas da caça. É inegável que a caça é um dos principais factores de mortalidade para muitas espécies de aves migratórias.

4.5

Espécies como o abibe, a narceja comum, o marreco, a laverca, a codorniz, a rola comum e a narceja galega, cuja presença na Europa ou em partes do continente está em declínio, deveriam e poderiam ser protegidas contra a caça. Cumpre ter em conta que a caça de aves migratórias é uma actividade que na maior parte dos Estados-Membros ocupa apenas uma pequena minoria da população. Não há, pois, qualquer justificação económica para essa caça, que é apenas lúdica. E no entanto (ou antes talvez por isso mesmo) não foram registados quaisquer progressos a esse respeito. É extremamente difícil erradicar hábitos tão entranhados, e ainda mais difícil, por conseguinte, introduzir «alterações substanciais».

4.6

A ilha grega de Tilos é um exemplo positivo do que pode ser alcançado através da proibição da caça. A caça deixou de ser praticada nessa ilha em 1993, o que tem permitido um aumento enorme da diversidade das espécies e do número de espécimes. A UE contribuiu para esta melhoria nomeadamente através do Projecto LIFE.

4.7

O CESE salienta ainda, a concluir, que compartilha inteiramente o conceito de responsabilidade global referida pela Comissão. Contudo, tem de constatar mais uma vez que a UE não tem, a este respeito, nada de que se orgulhar. A Comissão afirma na comunicação que actualmente «menos de 1/100 dos orçamentos anuais totais da ajuda ao desenvolvimento da Comunidade e dos Estados-Membros», ou seja, menos de 0,004 % de todas as despesas são consagradas a projecto internacionais de preservação da biodiversidade.

4.8

Por outro lado, a responsabilidade partilhada pela UE pela destruição da biodiversidade noutras partes do mundo é inegável. A comunicação cita como exemplo a destruição das florestas tropicais. O CESE faz notar que essa desflorestação não é apenas contraprodutiva do ponto de vista da biodiversidade, mas também no que ao clima diz respeito: 20 % das emissões globais de CO2 devem-se à destruição das florestas.

4.9

O CESE chama a atenção para o risco evidente de concorrência entre a produção agrícola e a pecuária face ao rápido processo de erosão dos recursos genéticos destinados à produção de alimentos.

4.10

O CESE receia que a execução da estratégia da UE em matéria de combustíveis biológicos venha a ocasionar destruições ainda mais maciças caso encoraje o consumo de produtos importados mais baratos em vez de artigos produzidos no interior da UE de forma compatível com a natureza e com o ambiente. A Malásia produz já cerca de 5 milhões de toneladas de óleo de palma por ano, e as culturas plantadas para o efeito foram responsáveis, entre 1985 e 2000, por cerca de 90 % da desflorestação do país. Agora está prevista a destruição de mais 6 milhões de hectares (e na Indonésia 16,5 milhões de hectares) para introduzir novas plantações de palma. O óleo de palma destina-se à exportação. Uma central de energia térmica do município alemão de Schwäbisch-Hall, amiúde citada como exemplo positivo de política energética, funciona a mais de 90 % a óleo de palma.

4.11

Após estas considerações sobre o fundo, o CESE gostaria de fazer ainda duas observações sobre a forma:

4.11.1

Para os implicados e interessados pode revelar-se penoso ter de consultar diferentes documentos comunitários para obter uma visão de conjunto sobre um mesmo domínio político. Devido aos requisitos técnico-administrativos que impõem limites espaciais aos documentos da Comissão, o plano de acção propriamente dito, referido no índice da comunicação como Anexo 1, não foi publicado juntamente com a comunicação; só está disponível como documento SEC, e na página de rosto nem sequer surge a expressão «plano de acção». Fala-se apenas de um «anexo técnico». O plano de acção só existe em versão inglesa (e não nas outras línguas oficiais) e num formato dificilmente legível. Isto torna a sua consulta particularmente incómoda. O Comité exorta, pois, a Comissão a traduzir o plano de acção em todas as línguas oficiais e a divulgá-lo quer na Internet quer em formato impresso.

4.11.2

A Comissão propõe que a concretização dos objectivos do plano de acção seja supervisionada pelo Grupo de Peritos em matéria de Biodiversidade existente. O CESE recomenda, ao invés, que a sociedade civil seja convidada a desempenhar um papel mais importante nessa supervisão, sobretudo à luz do problema já aqui referido, e descrito em pormenor no parecer exploratório do Comité, da deficiente informação e sensibilização do público em geral.

Bruxelas, 15 de Fevereiro de 2007.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  JO C 195 de 18.8.2006, p. 96.

(2)  Conclusões da Presidência, Conselho Europeu de Gotemburgo, 15 e 16 de Junho de 2001.

(3)  O que o Comité não pode senão louvar.

(4)  O futuro da PAC, parecer do CESE de 21.3.2002, JO C 125 de 27.5.2002, pp. 87-99.


Top