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Document 52003IE0593

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o "Acesso à Cidadania da União Europeia"

JO C 208 de 3.9.2003, pp. 76–81 (ES, DA, DE, EL, EN, FR, IT, NL, PT, FI, SV)

52003IE0593

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o "Acesso à Cidadania da União Europeia"

Jornal Oficial nº C 208 de 03/09/2003 p. 0076 - 0081


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o "Acesso à Cidadania da União Europeia"

(2003/C 208/19)

Em 21 de Janeiro de 2003, nos termos do disposto no n.o 3 do artigo 23.o do Regimento, o Comité Económico e Social Europeu decidiu elaborar um parecer sobre o "Acesso à Cidadania da União Europeia".

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, emitiu parecer em 2 de Abril de 2003, sendo relator L. Pariza Castaños.

Na 399.a reunião plenária de 14 e 15 de Maio de 2003 (sessão de 14 de Maio), o Comité Económico e Social Europeu adoptou por 88 votos a favor e 40 votos contra, com 8 abstenções, o seguinte parecer.

1. Introdução

1.1. A Convenção Europeia está a trabalhar há meses na elaboração de um Tratado Constitucional para a União Europeia. O CESE participa neste processo por intermédio de observadores, levando aos debates da Convenção as propostas e recomendações que adoptou nos seus pareceres e na resolução que aprovou para o efeito.

1.2. Em relação à política europeia de imigração e asilo, decorrente do Tratado de Amesterdão e do Conselho Europeu de Tampere, o CESE elaborou diversos pareceres com os quais contribui para dotar a União Europeia de uma política comum adequada e de legislação transparente, baseada na igualdade de tratamento, na igualdade de direitos e obrigações e na luta contra qualquer tipo de discriminação.

1.3. De 9 a 10 de Setembro de 2002, o CESE organizou, em colaboração com a Comissão, uma Conferência que contou com a participação dos parceiros sociais e de importante organizações sociais dos 25 Estados europeus, com o objectivo de promover a integração dos imigrantes e dos refugiados na sociedade europeia e a assunção de novos compromissos pela sociedade civil(1).

1.4. A população imigrante dos Estados-Membros da UE vai crescer. Todos os peritos são unânimes em afirmar que, por razões demográficas, económicas e sociais a imigração vai aumentar e que grande parte destas populações instalar-se-á de forma estável ou definitiva(2). A mobilidade das pessoas entre os Estados-Membros também vai aumentar como consequência do aprofundamento da liberdade de circulação, o que também afectará os imigrantes. A proposta de directiva sobre o estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração tem por objectivo facilitar a sua mobilidade(3).

1.5. É necessário definir políticas públicas e comportamentos sociais que vão no sentido da integração para que a Europa seja uma terra acolhedora, uma sociedade inclusiva, plural e intercultural. A boa integração dos actuais e futuros residentes oriundos de países terceiros constitui um objectivo estratégico para os europeus.

1.6. A Convenção deve reflectir sobre se as bases políticas e jurídicas em que assenta a política comum de imigração são suficientes para se avançar para uma melhor integração. O CESE deseja que a futura constituição europeia reforce os alicerces que permitirão à União Europeia dispor de uma política comum de imigração e de asilo que dê corpo às conclusões do Conselho de Tampere.

1.7. Uma das conclusões da Conferência foi a proposta feita à Convenção de conceder a cidadania da União aos nacionais de países terceiros que residam de forma estável no território da UE, o que facilitaria o exercício dos seus direitos políticos e, consequentemente, a sua integração. A cidadania europeia e os direitos e obrigações dela decorrentes são, com efeito, um factor determinante para a integração destas pessoas na sociedade de acolhimento.

1.8. A resolução do CESE destinada à Convenção Europeia explicita: "Há que melhorar as políticas de integração dos imigrantes. O Comité solicita que a Convenção estude a possibilidade de atribuir a cidadania da União aos nacionais dos países terceiros com estatuto de residentes de longa duração ...".

1.9. Através do presente parecer de iniciativa, o CESE solicita à Convenção Europeia que considere e analise esta proposta com a devida atenção, tendo em conta o carácter constitucional dos trabalhos da Convenção.

1.10. Por outro lado, esta proposta beneficia do apoio de inúmeras pessoas e organizações políticas e sociais dos diferentes Estados-Membros que há muito vêm exigindo que os nacionais de países terceiros com residência estável na União Europeia gozem de uma cidadania que lhes permita exercer os seus direitos políticos e sociais.

2. Bases jurídicas

2.1. Cabe à Convenção Europeia redigir propostas para dotar o direito comunitário de novas bases. A instituição da cidadania europeia, criada pelo Tratado de Maastricht, está no cerne desta responsabilidade de actualização das bases do direito comunitário. No anteprojecto de Tratado Constitucional (artigos 1.o a 16.o) publicado pelo secretariado da Convenção, em 6 de Fevereiro de 2003 (CONV/528/03), o Praesidium propõe que a cidadania da União seja um direito que acresce à cidadania nacional, sem a substituir (n.o 1 do art. 7.o). Este artigo estabelece um vínculo claro entre a definição da cidadania da União e a garantia pela UE da igualdade de todos os seus cidadãos perante a lei (n.o 1, art. 7.o).

2.2. Em conformidade com esta correspondência entre cidadania e igualdade jurídica, o CESE propõe que a Convenção Europeia adopte uma definição lata de cidadania europeia, cujo âmbito de aplicação inclua os nacionais de países terceiros que residem estavelmente em qualquer Estado-Membro da União Europeia. Esta definição lata corresponde ao conceito de "cidadania cívica" adoptado pela Comissão(4).

2.3. A proposta de acolher esta dimensão lata de cidadania europeia no direito primário comunitário está escorada pelo objectivo declarado da Convenção de incluir na Constituição Europeia a Carta dos Direitos Fundamentais proclamada solenemente pelo Parlamento, pelo Conselho e pela Comissão(5). A noção lata de cidadania europeia, ou cidadania cívica, traduz a expressão jurídica mais acabada da vontade da União Europeia de tornar real e efectivo, de forma progressiva e crescente, o direito indivisível e universal à igualdade de todos perante a lei. Este valor de igualdade jurídica vem consagrado explicitamente como direito subjectivo fundamental no artigo 20.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. O direito à igualdade jurídica está também inscrito, como característica principal da cidadania da União, no n.o 1 do artigo 7.o do projecto de Tratado Constitucional do Praesidium da Convenção Europeia.

2.4. Invocar o artigo 20.o da Carta dos Direitos Fundamentais da UE como base jurídica desta proposta é compatível e coerente com a reflexão jurídica sobre política de imigração da União Europeia que a Comissão União Europeia tem vindo a desenvolver desde 1997 em virtude do artigo 63.o do Tratado CE. Com efeito, por força do Tratado de Amesterdão, o Conselho é competente em matéria de política de imigração para garantir tratamento equitativo aos nacionais de países terceiros no atinente a condições e títulos de entrada e de residência e quanto à definição dos direitos e condições que permitem, aos que residem legalmente num Estado-Membro, residir noutro Estado-Membro.

2.5. O exercício destas competências vai forçosamente configurar, num futuro próximo, um verdadeiro estatuto comunitário para as diferentes situações jurídicas em que se encontram os nacionais de países terceiros que, tendo entrado regularmente na União Europeia, transitam, permanecem temporariamente ou residem de maneira estável no território dos Estados-Membros da UE. As comunicações da Comissão ao Conselho e ao Parlamento "Uma política comunitária em matéria de imigração"(6) e "Um método aberto de coordenação da política comunitária em matéria de emigração"(7) e as propostas de directivas sobre a matéria apresentadas pela Comissão, anunciam que este estatuto irá incluir um regime jurídico específico para contemplar os nacionais de países terceiros que residem legalmente de maneira estável ou há longa data(8) (quer directamente por direito próprio, quer por exercício do direito ao reagrupamento familiar(9)).

2.6. A noção de cidadania europeia, ou cidadania cívica, assente no artigo 20.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, abrange o mesmo fenómeno social que explica a atribuição ao Conselho das competências consignadas no artigo 63.o do Tratado CE, se bem que se trate aqui essencialmente dos imigrantes que residem legal e estavelmente no território dos Estados-Membros da União Europeia.

2.7. A diferença entre estas duas perspectivas não está ligada à realidade social objecto de regulamentação jurídica, mas à forma como se interpreta a noção de "cidadania cívica" para criar um instrumento jurídico constitucional que:

a) consagre, ao mais alto nível do ordenamento comunitário, o compromisso a favor do um tratamento equitativo dos nacionais de países terceiros, a fim de promover e facilitar a integração cívica dos nacionais de países terceiros que residem legalmente e de maneira estável num dos Estados-Membros da União Europeia (igualdade perante a lei);

b) reforce a garantia de não discriminação no âmbito do estatuto jurídico dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração (igualdade perante a lei);

c) contribua, indirectamente, para a concretização da garantia de uma aplicação não discriminatória do regime jurídico comunitário que rege os nacionais de países terceiros (igualdade na aplicação da lei).

2.8. A noção estrita de cidadania da União corresponde à regulação de uma situação jurídica prevista nos artigos 17.o a 22.o do Tratado CE. Paralelamente, a noção lata de cidadania europeia, ou "cidadania cívica" pode configurar uma situação fundada no futuro Tratado Constitucional, cujo âmbito pessoal inclua as pessoas com residência permanente não nacionais de um Estado-Membro. O acolhimento, pelo direito da UE, deste novo critério de atribuição da cidadania deverá traduzir-se na fixação de direitos, prestações objecto de tutela nesta situação jurídica (de "cidadania cívica"). O conteúdo desta futura regulamentação deveria manter uma proporcionalidade equitativa com a vinculação destas pessoas à observância do ordenamento jurídico comunitário e dos princípios jurídicos da União aplicáveis. É de esperar também que este reconhecimento jurídico da noção de "cidadania cívica" responda à dinâmica do conteúdo que o artigo 22.o do Tratado CE prevê para a fixação do conteúdo da cidadania da União.

2.9. O alargamento do âmbito de aplicação da cidadania europeia mercê deste novo critério de atribuição não exige nenhuma modificação das competências e atribuições conferidas pelos Tratados às instituições da União. O facto de a Convenção acolher a noção lata de cidadania europeia significaria que, em relação aos nacionais de países terceiros, se concretiza progressivamente o compromisso da União de respeitar o conteúdo essencial do direito fundamental à igualdade das pessoas perante a lei, na lei e na aplicação da lei, proclamado na Carta dos Direitos Fundamentais da União e consignado na Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos Humanos e das Liberdades Públicas, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950.

2.10. De acordo com o artigo 51.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União este compromisso deverá vincular também os Estados-Membros quando aplicam o direito comunitário. Mais concretamente, deverá servir de referência para a aplicação do n.o 4 do artigo 63.o do Tratado CE, no atinente à adopção pelos Estados-Membros de disposições regulamentares sobre as condições e os títulos de entrada e de residência dos nacionais de países terceiros (n.o 3 e n.o 4 do art. 63.o) que sejam compatíveis com o Tratado e os acordos internacionais.

3. A Convenção europeia

3.1. Em 6 de Fevereiro, o Praesidium da Convenção publicou o seu projecto para os artigos 1.o a 16.o do Tratado Constitucional. O artigo 5.o faz da Carta dos Direitos Fundamentais um elemento da Constituição. O artigo 7.o define o conceito de cidadania da União, a saber: "Possui a cidadania da União toda a pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado-Membro. A cidadania da União acresce à cidadania nacional, não a substitui."

3.2. Esta proposta exclui da cidadania da União os residentes, nacionais de países terceiros, mesmo com residência permanente na UE.

3.3. O CESE propôs em alguns pareceres, referidos em anexo, que a Constituição conceda a cidadania da União aos nacionais de países terceiros que residam de forma estável na União Europeia.

3.4. Na Resolução que o CESE dirigiu à Convenção Europeia solicitou-lhe que, para melhorar as políticas de integração dos imigrantes, se conceda a cidadania da União aos nacionais de países terceiros com estatuto de residentes de longa duração. A igualdade de todos os residentes, sejam eles nacionais dos Estados-Membros ou nacionais de países terceiros, é uma condição necessária para a integração. Uma comunidade não pode albergar no seu seio pessoas ou grupos de pessoas excluídos de direitos políticos ou de outros direitos de que gozam os "estrangeiros" nacionais de um Estado-Membro.

4. Uma cidadania europeia plural, inclusiva e participativa

4.1. De acordo com o princípio de subsidiariedade, a legislação sobre a concessão da nacionalidade é prerrogativa nacional, ainda que seja necessária uma certa harmonização para evitar discriminações indesejáveis e promover medidas positivas em prol da integração, tais como o acesso à nacionalidade dos residentes estáveis que o desejem. A subsidiariedade não deve ser utilizada para cercear os direitos dos residentes. O CESE(10) teve o ensejo de apontar que "as legislações nacionais que permitem a dupla nacionalidade revelam-se positivas para a integração".

4.2. Contudo, cabe à União definir a cidadania da União e suas características. Quando a Convenção redefine a cidadania da União está a exercer correctamente o seu mandato pois compete à União determinar no Tratado Constitucional a natureza desta cidadania. A cidadania europeia começou a ganhar corpo no Tratado de Maastricht e consolidou-se nos Tratados de Amesterdão e Nice. Trata-se de um figura jurídica e política muito consolidada na União Europeia. Actualmente, o Tratado considera cidadãos da União as pessoas que possuem a cidadania de um dos Estados-Membros pelo que, de facto, são os Estados que, indirectamente, decidem quem é (ou não é) cidadão da União.

4.3. A cidadania europeia deve estar no centro do projecto europeu. A Convenção está a desenvolver um grande projecto político, para que todos os cidadãos sintam que participam numa comunidade política democrática de carácter supranacional. É chegado o momento de enriquecer o conceito de cidadania com um novo critério de atribuição: uma cidadania da União ligada não só à nacionalidade, mas também à residência estável na União Europeia. Na Carta dos Direitos Fundamentais, nas legislações nacionais, nos tratados e na legislação comunitária a residência é já um critério para a atribuição de diversos direitos económicos, sociais, culturais e cívicos. Mas hoje, determinados direitos políticos (direito de voto, por exemplo) estão excluídos. Ora, o CESE entende que a residência legal estável deve ser também um meio de aceder à cidadania europeia.

4.4. O CESE congratula-se com a inclusão da Carta dos Direitos Fundamentais na Constituição e com a adesão da UE à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que passa pelo reconhecimento de uma cidadania cívica como primeiro passo para uma cidadania participativa para todas as pessoas com residência permanente no território da União.

4.5. O CESE concorda com a natureza da cidadania da União, que acresce à cidadania nacional, mas não a substitui. O novo critério de atribuição da cidadania da União que o Comité propõe pode abrir novas perspectivas para os residentes não nacionais dos Estados-Membros.

4.6. Actualmente, as pessoas são ou não cidadãos europeus consoante a sua nacionalidade. Reconhece-se a cidadania europeia a cinco milhões de pessoas que residem nos Estados-Membros e são nacionais de outro Estado-Membro. Mas discriminam-se 15 a 20 milhões que residem na União Europeia e não possuem a nacionalidade de nenhum Estado-Membro. Alguns Estados-Membros e alguns países candidatos reconhecem o direito de sufrágio activo nas eleições autárquicas. Porém, a maioria dos Estados negam a estas pessoas os direitos políticos. Com base no princípio de igualdade, é necessário acabar com estas discriminações baseadas na nacionalidade.

4.7. Além disso, muitas destas pessoas fazem parte de minorias objecto das mais variadas discriminações por parte da sociedade onde vivem, juntando-se assim uma discriminação legal à discriminação social de que padecem. Para estas pessoas, a discriminação legal em razão da nacionalidade vem agravar a sua marginalização na sociedade.

4.8. A cidadania europeia não pode construir-se à custa destas pessoas. Numa altura em que se abre à maior parte dos Estados e dos cidadãos da Europa Central e Oriental, a União Europeia não pode continuar a excluir milhões de cidadãos com residência permanente no seu território. A abertura da cidadania europeia ao exterior deve ser completada com a inclusão no interior, sem o que milhões de pessoas em vias de integração terão, sem dúvida alguma, um sentimento negativo e muito forte de exclusão. Dado que se lhes exige que cumpram as leis, é lógico que possam gozar dos mesmos direitos que o resto da comunidade.

4.9. O CESE deseja que o alargamento da cidadania europeia se faça também para dentro, isto é para os nacionais de países terceiros ou apátridas com residência permanente na União. Estas populações representam actualmente o sétimo grupo demográfico da UE. A Europa dos cidadãos não pode ser uma Europa-fortaleza que estabelece diferenças entre as pessoas, em razão da nacionalidade. E cada vez mais da sua visibilidade.

4.10. O CESE pergunta à Convenção Europeia se a exclusão política e social de milhões de pessoas é compatível com os valores que ela própria propõe para a Europa no artigo 2.o da futura Constituição - dignidade humana, liberdade, Estado de Direito, direitos humanos, tolerância, justiça e solidariedade - e se esta situação está em sintonia com o longo combate que as democracias europeias travaram contra a discriminação jurídica e social.

4.11. O CESE considera que a Convenção pode pôr termo a esta discriminação na futura Constituição Europeia. A obtenção da cidadania da União pelos nacionais de países terceiros com residência permanente pressupõe o fim de algumas discriminações de que padecem inúmeras pessoas em matéria de direito à participação política, livre circulação, utilização de serviços públicos, participação nas eleições laborais, direito à propriedade, etc.

4.12. Os cidadãos europeus são diferentes em numerosos domínios: língua, costumes, religião, cor do cabelo e da pele, sexo e orientação sexual, origem étnica, social, geográfica e nacional, raízes culturais, convicções morais e ideológicas. As democracias europeias foram capazes de integrar a diferença, evitando que as leis consagrem discriminações ilícitas. Porém, no que se refere aos direitos políticos e sociais, mantêm-se legislações discriminatórias negativas e de exclusão em razão da origem nacional.

4.13. Na primeira Constituição Europeia, no início dos século XXI, é imperioso que o direito à cidadania europeia supere os limites da pertença à nacionalidade, e se abra ao conceito de residência estável. Se a base dos direitos políticos e sociais é a pertença a uma comunidade de carácter nacional ou a um grupo étnico-cultural, não é possível configurar uma cidadania europeia. A Europa é plural em todos os sentidos. É, por essência, intercultural. A base da União Europeia não é a "nação europeia". A cidadania europeia não pode assentar exclusivamente na nacionalidade. A cidadania europeia deve superar a mera soma dos nacionais dos Estados-Membros para constituir uma cidadania política, de carácter plural, integradora e participativa. Esta cidadania participativa, que faz parte da identidade comum dos cidadãos europeus, não pressupõe apenas uma relação democrática entre os cidadãos e "o Estado". Vai mais além. Significa também um sistema de relações de participação entre os cidadãos e as organizações da sociedade civil.

5. O direito de voto

5.1. Na Grécia e na Roma antigas, as mulheres, os escravos e os "estrangeiros" estavam excluídos do direito de cidadania (tal como hoje o entendemos). Do mesmo modo, aquando das revoluções dos últimos séculos negavam-se aos assalariados e aos não proprietários o direito de voto e demais direitos públicos, em diversas circunstâncias. Na Europa, só tarde no século XX é que as mulheres obtiveram o direito de voto e uma cidadania igual à dos homens, e também no século passado vários Estados recusaram a cidadania a pessoas pertencentes a grupos étnicos minoritários. A conquista da democracia e dos direitos políticos foi um processo constante que os cidadãos da nossa geração têm o dever de defender e aprofundar.

5.2. Quando a sociedade nega a uma pessoa ou a um grupo de pessoas o direito ao voto e à participação política está a manifestar uma vontade de excluir, pois lhes recusa a pertença à comunidade. Permite-se a essas pessoas residir, trabalhar, pagar impostos e cotizações sociais, aceitar e cumprir as nossas leis ... mas não se lhes concede o direito à participação política. Não são cidadãos da União Europeia, porque mesmo que o solicitem, não fazem parte da comunidade política da civitas onde residem.

5.3. Num outro parecer(11), o CESE considerou que tanto as autoridades públicas como a sociedade civil devem adoptar políticas e atitudes integradoras. A base da integração é a "integração cívica", ou seja, a "progressiva equiparação dos imigrantes ao resto da população, quanto a direitos e deveres, bem como acesso a bens, serviços e canais de participação cívica em condições de plena igualdade de oportunidades e de tratamento". Trata-se, por conseguinte, de um conceito de integração de natureza política que inclui o direito de voto e os outros direitos políticos derivados da cidadania.

5.4. As vantagens para as pessoas que passam a beneficiar dos direitos políticos são óbvias: assiste-lhes os mesmos deveres e gozam dos mesmos direitos que os outros cidadãos. Quais são as vantagens para a sociedade de acolhimento? Alguns Estados-Membros que reconheceram o direito de voto nas eleições municipais aos residentes "estrangeiros" retiram benefícios do ponto de vista da integração. Se um certo nível de conflito é inerente a todas as sociedades, os conflitos são sempre menos graves quando o exercício da participação política é respeitado, já que a participação na elaboração das regras contribui para a sua correcta aplicação. O Conselho Europeu havia elaborado, já em 1992, a Convenção 144, que versa sobre o sufrágio activo (direito de voto) dos "cidadãos-residentes" nas eleições autárquicas.

5.5. O direito de voto (de eleger e ser eleito), derivado da cidadania europeia que reivindicamos para os nacionais de países terceiros que residem estavelmente na UE, refere-se tanto às eleições municipais no local de residência como às eleições para o Parlamento Europeu, pois esta é a instituição política que representa todos os cidadãos da União Europeia.

6. Conclusões

6.1. Reconhecer a cidadania da União aos nacionais de países terceiros que residem estavelmente na UE constitui um passo em frente na confirmação da vontade da União Europeia de integrar todas as pessoas, qualquer que seja a sua nacionalidade.

6.2. No futuro, o número de imigrantes vai aumentar nos Estados-Membros da União Europeia. Muitas destas pessoas serão residentes estáveis ou de longa duração. Também a mobilidade vai sofrer grande incremento com a liberdade de circulação. Por conseguinte, a Convenção deve examinar se as actuais bases políticas e jurídicas são suficientes (ou não) para fomentar a integração.

6.3. O CESE solicita à Convenção que, no texto da primeira Constituição da União, o princípio de igualdade se aplique a todas as pessoas com residência legal e permanente na UE, sejam elas nacionais de Estados-Membros ou de países terceiros.

6.4. O CESE solicita à Convenção que a cidadania europeia integre um novo critério de atribuição, ou seja, estar vinculada não só à nacionalidade de um Estado-Membro, mas também à residência permanente (estável) na União Europeia.

6.5. Por conseguinte, o CESE propõe à Convenção que o artigo 7.o (Cidadania da União) conceda a cidadania da União não só aos nacionais dos Estados-Membros, mas também a todas as pessoas que residam estavelmente na UE. A cidadania da União acrescerá à cidadania nacional mas não a substituirá. Desta forma, estas pessoas serão cidadãos europeus e, por conseguinte, iguais perante a lei.

Bruxelas, 14 de Maio de 2003.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger Briesch

(1) A Conferência analisou ainda outros temas relacionados com a imigração, nomeadamente a situação dos "sem-papéis". Considerou que a contenção da imigração irregular passa por legislação adequada que permita uma gestão legal e transparente da imigração. Os "sem-papéis" devem beneficiar de um tratamento digno e ver a sua situação regularizada, na medida das possibilidades dos Estados-Membros.

(2) COM(2001) 127 final - Parecer CESE, JO C 36 de 8.2.2002.

(3) Parecer CESE sobre a "Proposta de directiva do Conselho relativa ao direito ao reagrupamento familiar" JO C 241 de 7.10.2002; JO C 204 de 18.7.2000.

(4) COM(2000) 757 final.

(5) JO C 364 de 18.12.2000.

(6) COM(2000) 757 final.

(7) COM(2001) 387 final.

(8) COM(2001) 127 final.

(9) JO C 204 de 18.7.2000.

(10) JO C 125 de 27.5.2002.

(11) JO C 125 de 27.5.2002.

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