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Document 62022TJ0371

    Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção) de 17 de julho de 2024 (Extratos).
    Marco Montanari contra EUCAP Sahel Niger.
    Política externa e de segurança comum — Missão EUCAP Sael Níger — Agentes nacionais destacados — Assédio moral — Indeferimento de um pedido de indemnização — Recurso de anulação — Falta de interesse em agir — Inadmissibilidade — Responsabilidade extracontratual — Direito à dignidade — Artigos 1.° e 31.° da Carta dos Direitos Fundamentais — Procedimento de mediação — Falta de notificação do relatório do mediador — Não implementação das recomendações do mediador — Direito a uma boa administração — Artigo 41.° da Carta dos Direitos Fundamentais — Dever de assistência — Danos morais — Danos patrimoniais — Nexo de causalidade.
    Processo T-371/22.

    ECLI identifier: ECLI:EU:T:2024:494

    Edição provisória

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

    17 de julho de 2024 (*)

    « Política externa e de segurança comum — Missão EUCAP Sael Níger — Agentes nacionais destacados — Assédio moral — Indeferimento de um pedido de indemnização — Recurso de anulação — Falta de interesse em agir — Inadmissibilidade — Responsabilidade extracontratual — Direito à dignidade — Artigos 1.° e 31.° da Carta dos Direitos Fundamentais — Procedimento de mediação — Falta de notificação do relatório do mediador — Não implementação das recomendações do mediador — Direito a uma boa administração — Artigo 41.° da Carta dos Direitos Fundamentais — Dever de assistência — Danos morais — Danos patrimoniais — Nexo de causalidade »

    No processo T‑371/22,

    Marco Montanari, residente em Reggio Emilia (Itália), representado por S. Rodrigues e A. Champetier, advogados,

    recorrente,

    contra

    EUCAP Sael Níger, representada por E. Raoult, advogada,

    recorrida,

    O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção),

    composto por: L. Truchot (relator), presidente, H. Kanninen e T. Perišin, juízes,

    secretário: L. Ramette, administrador,

    vistos os autos, designadamente:

    –        as exceções de incompetência e de inadmissibilidade suscitadas pela recorrida por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de setembro de 2022,

    –        as observações do recorrente sobre estas exceções apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de novembro de 2022,

    –        o Despacho de 16 de dezembro de 2022 que determina a apreciação destas exceções na decisão que conheça do mérito,

    após a audiência de 29 de novembro de 2023,

    profere o presente

    Acórdão (1)

    1        Com o seu recurso, o recorrente, Marco Montanari, pede, por um lado, com fundamento no artigo 263.° TFUE, a anulação da Decisão da Missão da Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD) da União Europeia no Níger (EUCAP Sael Níger, a seguir «Missão»), de 28 de abril de 2022, que indeferiu o seu pedido de indemnização de 4 de fevereiro de 2022 e, por outro, com fundamento no artigo 268.° TFUE, a indemnização dos danos que alega ter sofrido em resultado de uma situação de assédio moral e da violação do direito a uma boa administração e do dever de assistência.

     Antecedentes do litígio

    2        O recorrente foi destacado pelo Governo Italiano junto da Missão como consultor político a partir de 14 de abril de 2015.

    3        Em setembro de 2016, o destacamento do recorrente junto da Missão foi prorrogado até 14 de abril de 2018.

    4        Em 8 de março de 2017, o recorrente pediu ao adjunto do chefe de Missão que instaurasse um processo disciplinar contra o responsável pela imprensa e pela informação pública (a seguir «PPIO») por alegadamente o ter assediado o recorrente (a seguir «primeira queixa de 8 de março de 2017»).

    5        No mesmo dia, o recorrente pediu ao adjunto do chefe de Missão que instaurasse um processo disciplinar contra este último e o PPIO, bem como contra o primeiro signatário da autorização de férias concedida ao PPIO para se deslocar, por via terrestre, ao Burkina Faso em 25 e 26 de fevereiro de 2017, com o fundamento de que, por um lado, esta deslocação constituía um comportamento desleal do PPIO para com a autoridade da Missão, e, por outro, que a referida autorização de férias revelava negligência grave da parte do chefe de Missão, que punha em causa o dever de assistência. A título subsidiário, no caso de o adjunto do chefe de Missão ter sido o primeiro signatário da referida autorização de férias, o recorrente pediu que este transmitisse o seu pedido de instauração de um processo disciplinar à Direção da Capacidade Civil de Planeamento e Condução (CPCC) do Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE), e especificou que, nesse caso, solicitava igualmente que fosse instaurado um processo disciplinar contra o mesmo por negligência grave (a seguir «segunda queixa de 8 de março de 2017»).

    6        Em 24 de março de 2017, o adjunto do chefe de Missão informou o recorrente do arquivamento da primeira queixa de 8 de março de 2017.

    7        Em 28 de março de 2017, o recorrente informou o diretor da CPCC, na qualidade de Comandante da Operação Civil (COC) da Missão, de que tinha apresentado a primeira e a segunda queixas em 8 de março de 2017 e pediu que este desse seguimento às mesmas (a seguir «participação de 28 de março de 2017»).

    8        Em 15 de maio de 2017, o adjunto do COC informou o chefe de Missão de que a segunda queixa de 8 de março de 2017 era tratada como um assunto de gestão, sem recurso a um processo disciplinar formal.

    9        Em 17 de julho de 2017, o recorrente pediu ao COC que fosse instaurado um inquérito contra o chefe de Missão e o seu adjunto por assédio (a seguir «participação de 17 de julho de 2017»). Mais tarde no mesmo dia, o chefe de Missão enviou ao recorrente uma advertência escrita alegando que este lhe tinha faltado ao respeito numa reunião realizada no dia 10 de abril de 2017 (a seguir «primeira advertência escrita»).

    10      Em 18 de julho de 2017, o recorrente remeteu a primeira advertência escrita ao COC, pedindo que a mesma fosse tida em conta no âmbito do inquérito relativo à participação de 17 de julho de 2017.

    11      Em 20 de julho de 2017, o recorrente foi informado da designação de um agente da CPCC (a seguir «mediador») para avaliar, na semana seguinte, a situação no local.

    12      Em 25 e 26 de julho de 2017, o mediador realizou várias reuniões na Missão, incluindo algumas com o recorrente.

    13      Em 27 de julho de 2017, o Serviço de Recursos Humanos da Missão (a seguir «Serviço RH») pediu ao recorrente que preenchesse um formulário de avaliação do seu desempenho até 4 de agosto de 2017, com vista a prorrogar o seu destacamento a partir de 14 de abril de 2018.

    14      No mesmo dia, o chefe do Serviço RH enviou ao recorrente uma contagem atualizada dos seus dias de férias, na sequência de um pedido para que este último justificasse uns dias de faltas injustificadas.

    15      Em 28 de julho de 2017, o recorrente informou o COC dos contactos com o Serviço RH mencionados nos n.os 13 e 14, supra, no sentido de completar o processo relativo à participação de 17 de julho de 2017.

    16      Em 29 de julho de 2017, o mediador apresentou o seu relatório (a seguir «relatório de 29 de julho de 2017»).

    17      Em 23 de agosto de 2017, o recorrente informou o Serviço RH de que não iria pedir a prorrogação do seu destacamento na Missão a partir de 14 de abril de 2018.

    18      Em 25 de outubro de 2017, o recorrente enviou ao COC novos elementos a fim de completar o processo relativo à participação de 17 de julho de 2017.

    19      Em 22 de novembro de 2017, a Missão informou as autoridades italianas de que o recorrente tinha faltado injustificadamente entre 17 e 20 de novembro de 2017 e que tinha a intenção de deduzir quatro dias no pagamento das ajudas de custo diárias do recorrente.

    20      Em 23 de novembro de 2017, o chefe de Missão indeferiu o pedido do recorrente de justificação de três dias de faltas injustificadas e enviou‑lhe uma segunda advertência escrita (a seguir «segunda advertência escrita»). No mesmo dia, o recorrente solicitou ao COC que fosse instaurado um novo inquérito com o fundamento de que os factos mencionados no n.° 19, supra, consubstanciavam uma situação de assédio por parte do chefe de Missão e do seu adjunto (a seguir «participação de 23 de novembro de 2017»).

    21      Em 28 de novembro de 2017, o recorrente informou o COC de que lhe tinham sido deduzidos três dias no vencimento e pediu‑lhe também que esclarecesse a sua posição a respeito das participações de 17 de julho e 23 de novembro de 2017.

    22      Em 4 de dezembro de 2017, o recorrente enviou ao secretário‑geral adjunto do SEAE responsável pela CPCC o conteúdo das participações de 17 de julho e 23 de novembro de 2017.

    23      Em 17 de janeiro de 2018, o recorrente pediu à secretária‑geral do SEAE que o informasse o mais rapidamente possível das conclusões do mediador e do seguimento dado às participações de 17 de julho e 23 de novembro de 2017.

    24      Em 18 de março de 2018, o recorrente demitiu‑se das suas funções de consultor político junto da Missão.

    25      Em 10 de abril de 2018, em resposta à carta mencionada no n.° 23, supra, o COC informou o recorrente de que as alegadas infrações que este tinha participado eram «assuntos de gestão da Missão» e que «os elementos do processo não justificavam a instauração de um processo disciplinar» (a seguir «Decisão de 10 de abril de 2018»).

    26      Em 31 de julho de 2018, o recorrente solicitou o acesso, nomeadamente, ao relatório de 29 de julho de 2017.

    27      Por Decisão de 24 de outubro de 2018, o SEAE indeferiu definitivamente o pedido de divulgação mencionado no n.° 26, supra.

    28      Por Acórdão de 12 de dezembro de 2019, Montanari/SEAE (T‑692/18, não publicado, EU:T:2019:850), o Tribunal Geral anulou a Decisão de 24 de outubro de 2018.

    29      Em 13 de dezembro de 2019, assim como em 13 de março e 9 de julho de 2020, o recorrente questionou o SEAE sobre o seguimento que pretendia dar ao acórdão mencionado no n.° 28, supra.

    30      Por carta de 24 de julho de 2020, o SEAE comunicou ao recorrente a integralidade do relatório de 29 de julho de 2017, com exceção dos dados pessoais relativos às outras pessoas em causa.

    31      Em 26 de maio de 2021, o recorrente pediu ao SEAE que pagasse o montante de 971 395,92 euros a título de reparação dos danos patrimoniais, físicos e morais causados por condutas que consubstanciam assédio moral e pela violação do direito a uma boa administração e do dever de assistência que o recorrente imputava à Missão.

    32      Em 24 de setembro de 2021, o SEAE indeferiu o pedido de indemnização mencionado no n.° 31, supra, com o fundamento de que, nomeadamente, o recorrente nunca tinha trabalhado para o SEAE e que a Missão constituía uma entidade totalmente distinta do SEAE, tanto do ponto de vista jurídico como operacional.

    33      Em 22 de dezembro de 2021, o recorrente apresentou ao SEAE uma reclamação baseada no artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto dos Funcionários da União (a seguir «Estatuto») para impugnar a decisão de indeferimento do pedido de indemnização mencionada no n.° 31, supra.

    34      Por duas cartas distintas, de 4 de fevereiro de 2022, o recorrente pediu ao Conselho da União Europeia e à Missão que pagassem o montante de 972 395,92 euros a título de reparação dos danos patrimoniais, físicos e morais alegadamente causados por condutas que consubstanciam assédio moral e pela violação do direito a uma boa administração e do dever de assistência (a seguir, no que respeita ao pedido dirigido à Missão, «terceiro pedido de indemnização»).

    35      Em 25 de março de 2022, o Conselho indeferiu o pedido de indemnização mencionado no n.° 34, supra, que lhe tinha sido apresentado.

    36      Em 28 de abril de 2022, a Missão indeferiu o terceiro pedido de indemnização.

    37      Em 30 de maio de 2022, o SEAE indeferiu a reclamação mencionada no n.° 33, supra.

     Pedidos das partes

    38      O recorrente conclui pedindo, em substância, que o Tribunal Geral se digne:

    –        anular a Decisão de 28 de abril de 2022 que indeferiu o terceiro pedido de indemnização;

    –        condenar a Missão no pagamento do montante de 982 840 euros;

    –        condenar a Missão nas despesas.

    39      A Missão conclui pedindo, em substância, que o Tribunal Geral se digne:

    –        a título principal, julgar o recurso inadmissível em razão da incompetência do tribunal no qual foi interposto;

    –        a título subsidiário, julgar o recurso inadmissível;

    –        a título mais subsidiário, negar provimento ao recurso;

    –        condenar o recorrente nas despesas.

     Questão de direito

     Quanto à exceção de incompetência

    40      A Missão sustenta que o Tribunal Geral não é competente para conhecer do presente recurso com o fundamento de que o recorrente exerceu as funções de consultor político na Missão na qualidade de perito destacado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros Italiano, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 2, da Decisão 2012/392/PESC do Conselho, de 16 de julho de 2012, relativa à Missão PCSD da União Europeia no Níger (EUCAP Sael Níger) (JO 2012, L 187, p. 48).

    41      Assim, a Missão considera que qualquer reclamação do recorrente relacionada com o exercício das suas funções deve ser dirigida contra as autoridades nacionais italianas. A este respeito, a Missão alude a uma ação que o recorrente intentou num tribunal italiano. Refere igualmente a solução adotada pelo Tribunal Geral no Despacho de 23 de abril de 2015, Chatzianagnostou/Conselho e o. (T‑383/13, não publicado, EU:T:2015:246), e que foi confirmada pelo Tribunal de Justiça.

    42      O recorrente contesta a exceção de incompetência suscitada pela Missão, especificando, nomeadamente, que a ação intentada na Secção do Trabalho do Tribunale di Roma (Tribunal de Primeira Instância de Roma, Itália) não está relacionada com o terceiro pedido de indemnização nem com o presente pedido.

    43      A este respeito, importa recordar que a Missão foi criada através da Decisão 2012/392, a fim de apoiar o desenvolvimento de capacidades dos intervenientes nigerinos do setor da segurança para combater o terrorismo e a criminalidade organizada.

    44      Em particular, o artigo 7.°, n.° 1, da Decisão 2012/392 dispõe que a Missão é predominantemente constituída por pessoal destacado pelos Estados‑Membros, pelas instituições da União e pelo SEAE, que suportam os custos relacionados com o pessoal que destacarem, nomeadamente as despesas de deslocação para e do local de destacamento, os vencimentos, a cobertura médica e os subsídios, com exceção das ajudas de custo diárias aplicáveis.

    45      Por outro lado, o artigo 7.°, n.° 2, da Decisão 2012/392 prevê efetivamente que o Estado‑Membro, a instituição da União ou o SEAE, respetivamente, responde pelas reclamações relacionadas com o destacamento apresentadas pelo ou contra o membro do pessoal destacado, e é responsável por quaisquer medidas que seja necessário tomar contra este.

    46      No entanto, em primeiro lugar, resulta da jurisprudência proferida sobre disposições que regulam a atividade de outras missões no âmbito da Política Externa e de Segurança Comum (PESC) e redigidas em termos análogos, ou mesmo idênticos, aos da Decisão 2012/392 que, uma vez que os agentes destacados pelos Estados‑Membros e os agentes destacados pelas instituições da União estão sujeitos às mesmas regras no que respeita ao exercício das suas funções no teatro de operações, o juiz da União é competente para fiscalizar a legalidade dos atos de gestão do pessoal relativos a agentes destacados pelos Estados‑Membros que tenham por objeto responder às necessidades dessas missões no teatro de operações (v., neste sentido, Acórdão de 19 de julho de 2016, H/Conselho e o., C‑455/14 P, EU:C:2016:569, n.os 50 e 55).

    47      Com efeito, qualquer outra interpretação tem, designadamente, como consequência que, quando um mesmo ato de gestão do pessoal relativo às operações no teatro de operações respeite tanto aos agentes destacados pelos Estados‑Membros como aos agentes destacados pelas instituições da União, a decisão proferida relativamente aos primeiros pode ser inconciliável com a decisão proferida pelo juiz da União relativamente aos últimos (v., neste sentido, Acórdão de 19 de julho de 2016, H/Conselho e o., C‑455/14 P, EU:C:2016:569, n.° 57).

    48      Consequentemente, o Tribunal Geral e, no caso de um recurso de uma decisão proferida por ele, o Tribunal de Justiça são competentes para fiscalizar esses atos. Esta competência resulta, respetivamente, tratando‑se da fiscalização da legalidade dos referidos atos, do artigo 263.° TFUE, e, tratando‑se dos litígios em matéria de responsabilidade extracontratual, do artigo 268.° TFUE, lido em conjugação com o artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE, tomando em consideração o artigo 19.°, n.° 1, TUE, e o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») (Acórdão de 19 de julho de 2016, H/Conselho e o., C‑455/14 P, EU:C:2016:569, n.° 58).

    49      Em segundo lugar, há que observar que, ao apresentar ao Tribunal Geral os pedidos mencionados no n.° 38, supra, o recorrente suscita a questão da legalidade de atos de gestão do pessoal relativos às operações no teatro de operações, e não questões relacionadas com o destacamento, na aceção do artigo 7.°, n.° 2, da Decisão 2012/392.

    50      Com efeito, decorre do terceiro pedido de indemnização e dos pedidos apresentados pelo recorrente que este acusa o chefe de Missão de ter adotado a seu respeito, quando estava destacado na Missão e afeto ao teatro de operações, decisões suscetíveis de consubstanciar uma situação de assédio moral contrária às disposições da Carta que garantem o direito à saúde e o direito à dignidade dos trabalhadores. Além disso, acusa igualmente o COC da Missão, e não as autoridades italianas, de ter violado o direito a uma boa administração e o dever de assistência no tratamento das participações de assédio moral que fez durante o período em que esteve afeto no terreno.

    51      Por outro lado, resulta da jurisprudência que o Tribunal Geral se declarou competente para decidir litígios semelhantes referentes a um agente nacional destacado junto de uma missão no âmbito da PESC e a um agente internacional da Missão contratado, sem que a tal obste, neste último caso, uma cláusula de um dos contratos de recrutamento que atribui competência aos tribunais de um Estado‑Membro (Acórdãos de 12 de abril de 2018, PY/EUCAP Sahel Niger, T‑763/16, EU:T:2018:181, e de 18 de novembro de 2020, H/Conselho, T‑271/10 RENV II, EU:T:2020:548).

    52      Em terceiro lugar, os argumentos invocados pela Missão não são suscetíveis de pôr em causa a competência do Tribunal Geral para conhecer do presente litígio.

    53      Com efeito, primeiro, a Missão não pode invocar utilmente a solução adotada pelo Tribunal Geral no Despacho de 23 de abril de 2015, Chatzianagnostou/Conselho e o. (T‑383/13, não publicado, EU:T:2015:246), uma vez que este despacho, que não foi objeto de recurso, é anterior ao Acórdão de 19 de julho de 2016, H/Conseil e o. (C‑455/14 P, EU:C:2016:569), e à jurisprudência referida no n.° 51, supra. Assim, não se pode considerar que a solução adotada pelo Tribunal Geral no despacho acima referido reflita o estado atual do direito.

    54      Segundo, decorre da sentença do Tribunale di Roma (Tribunal de Primeira Instância de Roma) de 19 de outubro de 2020 que a ação intentada pelo recorrente neste tribunal dizia respeito ao cálculo do vencimento e dos subsídios de base que lhe foram pagos pelo Governo Italiano durante o seu período de destacamento na Missão. Assim, esse litígio, cujo objeto era diferente do objeto do presente recurso, não dizia respeito à legalidade de atos de gestão da Missão ou à determinação da sua responsabilidade na adoção desses atos, e, como tal, não influi na competência do Tribunal Geral para conhecer do presente recurso.

    55      Por conseguinte, a exceção de incompetência suscitada pela Missão é infundada e deve ser julgada improcedente.

     Quanto às exceções de inadmissibilidade

    56      A Missão suscita, em substância, cinco exceções de inadmissibilidade, relativas, a primeira, à não imputabilidade dos factos de que é acusada, a segunda, à extemporaneidade da petição, a terceira, a um prazo de prescrição de cinco ou de quatro anos, a quarta, à incompletude do terceiro pedido de indemnização e, a quinta, à ausência de um fundamento que justifique os pedidos de anulação.

    57      Além disso, uma vez que o Tribunal Geral suscitou ex officio, no âmbito das medidas de organização do processo, a questão da admissibilidade dos pedidos de anulação, há que começar por examinar esta questão.

     Quanto à admissibilidade dos pedidos de anulação

    58      Resulta de jurisprudência constante que um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou coletiva só é admissível se essa pessoa tiver interesse na anulação do ato recorrido. Esse interesse pressupõe que a anulação desse ato seja suscetível, por si só, de ter consequências jurídicas e que o resultado do recurso possa, assim, proporcionar um benefício à parte que o interpôs. O interesse em agir constitui, assim, a condição essencial e primeira de qualquer processo judicial. Em contrapartida, não há interesse em agir quando a procedência da ação ou do recurso não seja suscetível, de qualquer modo, de satisfazer o pedido do demandante ou do recorrente (v. Acórdão de 6 de julho de 2023, Julien/Conselho, C‑285/22 P, não publicado, EU:C:2023:551, n.° 47 e jurisprudência referida).

    59      Além disso, há que recordar que cabe ao recorrente fazer prova do seu interesse em agir. Com efeito, para que o recurso de anulação de um ato, apresentado por uma pessoa singular ou coletiva, seja admissível, essa pessoa deve justificar de maneira pertinente o interesse que a anulação desse ato apresenta para ela (v., neste sentido, Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Binca Seafoods/Comissão, C‑268/16 P, EU:C:2017:1001, n.° 45 e jurisprudência referida).

    60      Assim, na falta de semelhante justificação, esta questão da admissibilidade do recurso constitui um fundamento de ordem pública que deve ser conhecido ex officio pelo Tribunal Geral (v. Acórdão de 24 de novembro de 2021, LTTE/Conselho, T‑160/19, não publicado, EU:T:2021:817, n.° 65 e jurisprudência referida).

    61      Por outro lado, também segundo jurisprudência constante, a ação de indemnização, baseada no artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE, foi instituída como via autónoma, com uma função particular no âmbito do sistema dos meios processuais e subordinada a condições de exercício concebidas tendo em vista o seu objetivo específico (v., neste sentido, Acórdão de 25 de março de 2021, Carvalho e o./Parlamento e Conselho, C‑565/19 P, não publicado, EU:C:2021:252, n.° 101 e jurisprudência referida).

    62      Com efeito, a ação de indemnização diferencia‑se do recurso de anulação na medida em que não se destina à revogação ou à alteração de um ato lesivo, mas à reparação dos danos causados por uma instituição, um órgão ou um organismo da União (v., neste sentido, Acórdãos do 24 de outubro de 1973, Merkur‑Außenhandel/Comissão, 43/72, EU:C:1973:108, n.° 4, e de 1 de fevereiro de 2023, Klymenko/Conselho, T‑470/21, não publicado, EU:T:2023:26, n.° 58 e jurisprudência referida).

    63      Ora, os pedidos destinados tanto à anulação da recusa de uma instituição, de um órgão ou de um organismo da União em reconhecer um direito a indemnização que um recorrente invoca igualmente ao abrigo dos artigos 268.° e 340.° TFUE, como a que o Tribunal Geral declare que a instituição, o órgão ou o organismo em causa está obrigado a reconhecer esse direito, visam obter a declaração de que a instituição, o órgão ou o organismo em causa está obrigado a indemnizar e devem ser julgados inadmissíveis, uma vez que, em princípio, o recorrente não demonstra um interesse em apresentar esses pedidos para além do seu pedido de indemnização (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 13 de junho de 1972, Compagnie d’approvisionnement, de transport et de crédit e Grands Moulins de Paris/Comissão, 9/71 e 11/71, EU:C:1972:52, n.os 9 a 11; v. igualmente, por analogia, Acórdão de 3 de outubro de 2019, DQ e o./Parlamento, T‑730/18, EU:T:2019:725, n.° 42 e jurisprudência referida).

    64      No caso em apreço, é facto assente que o recorrente pede que o Tribunal Geral se digne, além de decretar a reparação dos danos patrimoniais e morais que o recorrente imputa à Missão, anular a decisão de indeferimento do seu terceiro pedido de indemnização, que tinha como objetivo obter por via extrajudicial uma compensação destes danos.

    65      Ora, em resposta a uma medida de organização do processo através da qual o Tribunal Geral convidou as partes a tomarem posição sobre o interesse do recorrente em pedir a anulação da Decisão de 28 de abril de 2022, pela qual a Missão indeferiu o seu terceiro pedido de indemnização, este último respondeu que, com os seu pedidos de anulação, não pretendia obter um benefício distinto daquele que obteria se os seus pedidos de indemnização fossem julgados procedentes.

    66      Assim, há que observar que o recorrente não demonstrou ter um interesse em pedir, além dos seus pedidos de indemnização, a anulação da decisão da Missão que indeferiu o seu terceiro pedido de indemnização. Por conseguinte, os pedidos de anulação devem ser julgados inadmissíveis, sem que seja necessário examinar a quarta exceção de inadmissibilidade, nem a quinta, que se referem especificamente a esses pedidos.

     Quanto à primeira exceção de inadmissibilidade, relativa à não imputabilidade à Missão dos factos de que é acusada

    67      A Missão sustenta que não pode ser considerada responsável pelo tratamento das participações feitas pelo recorrente a partir de 28 de março de 2017, uma vez que estas participações foram dirigidas a uma autoridade distinta da Missão, a saber, o COC. A este respeito, invoca as disposições do artigo 9.°, alínea c), e do artigo 11.° do Code de conduite et de discipline pour les missions civiles de la politique de sécurité et de défense communes (PSDC) de l’Union [Código de Conduta e de Disciplina para as Missões Civis da Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD) da União (a seguir «Código de Conduta»)].

    68      Do mesmo modo, a Missão esclarece que o recorrente não a pode acusar de que devia ter instaurado um processo judicial contra o SEAE para aceder ao relatório de 29 de julho de 2017, uma vez que a Missão não é o autor nem o destinatário do referido relatório nem controlava o acesso ao mesmo.

    69      O recorrente contesta o fundamento das alegações da Missão.

    70      A este respeito, resulta de jurisprudência constante que uma ação destinada à reparação de um dano causado por uma instituição, um órgão ou um organismo da União deve ser intentada contra essa instituição, esse órgão ou esse organismo (v., neste sentido, Acórdão de 23 de março de 2004, Provedor de Justiça/Lamberts, C‑234/02 P, EU:C:2004:174, n.° 67, e Despacho de 15 de novembro de 2017, Pilla/Comissão e EACEA, T‑784/16, não publicado, EU:T:2017:806, n.° 70).

    71      Assim, a questão da identificação da instituição, do órgão ou do organismo encarregado de representar a União no âmbito de uma ação de responsabilidade extracontratual, baseada no artigo 268.° TFUE e no artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE, faz parte da apreciação da admissibilidade dessa ação (v., neste sentido, Despacho de 2 de fevereiro de 2015, Gascogne Sack Deutschland e Gascogne/União Europeia, T‑577/14, não publicado, EU:T:2015:80, n.° 22 e jurisprudência referida).

    72      Ora, em primeiro lugar, é facto assente que as infrações que o recorrente alega consubstanciarem uma situação de assédio moral e que são objeto de um primeiro fundamento em apoio dos seu pedidos de indemnização estão associadas, de acordo com os seus articulados, a determinados atos adotados pelo chefe de Missão e pelo seu adjunto, bem como pelo chefe do Serviço RH que atua sob a responsabilidade dos mesmos.

    73      Em particular, o recorrente queixa‑se, primeiro, de que o chefe da Missão o excluiu das reuniões políticas semanais entre este último e o chefe da Delegação da União no Níger (a seguir «Delegação»), segundo, de ter recebido do chefe de Missão uma primeira advertência escrita em 17 de julho de 2017, menos de uma hora depois da participação efetuada neste mesmo dia, terceiro, de ter recebido do Serviço RH, em 27 de julho de 2017, ou seja, no dia seguinte à partida do mediador, um pedido para preencher o formulário de avaliação do desempenho com vista à renovação do seu destacamento em abril de 2018 e, quarto, de ter recebido, no mesmo dia, do chefe do Serviço RH uma contagem atualizada dos seus dias de férias na sequência de um pedido do referido serviço para que justificasse uns dias de faltas injustificadas.

    74      Ora, o artigo 6.°, n.° 1, da Decisão 2012/392, na redação então em vigor, previa que o chefe de Missão assumia a responsabilidade e exercia o comando e o controlo da Missão no teatro de operações. O artigo 6.°, n.° 1‑A, da mesma decisão especificava que o chefe da Missão podia delegar funções de gestão relacionadas com questões de pessoal em membros do pessoal da Missão, sob a sua responsabilidade geral. Por último, o artigo 6.°, n.° 2, da referida decisão dispunha que o chefe de Missão exercia o comando e o controlo do pessoal, das equipas e das unidades dos Estados contribuintes.

    75      Assim, os atos enumerados no n.° 73, supra, que o recorrente imputa à Missão no âmbito do primeiro fundamento invocado em apoio dos pedidos de indemnização, estão ligados ao exercício, pelo chefe de Missão, das prerrogativas que lhe são atribuídas pela Decisão 2012/392 e, assim, à execução pela Missão do seu mandato, pelo qual esta deve ser considerada responsável por força do artigo 13.°, n.° 4, desta decisão.

    76      Além disso, a Missão não demonstrou, nem sequer alegou, que os atos descritos nesse primeiro fundamento constituem uma violação grave cometida pelo chefe de Missão, pela qual este deveria assumir exclusivamente a responsabilidade, em conformidade com o artigo 13.°, n.° 4, da Decisão 2012/392.

    77      Nestas circunstâncias, a primeira exceção de inadmissibilidade deve ser julgada improcedente no que respeita ao primeiro fundamento em apoio dos pedidos de indemnização.

    78      Em segundo lugar, no âmbito do segundo fundamento invocado em apoio do pedido de indemnização, o recorrente alega que várias das infrações cometidas não só pelo chefe de Missão, mas também pelo COC, constituem violações do direito a uma boa administração e do dever de assistência que são imputáveis à Missão.

    79      Em particular, o recorrente queixa‑se, primeiro, de que as suas queixas e participações não foram tratadas num prazo razoável pelo chefe de Missão nem pelo COC, segundo, de que as conclusões e a recomendação formuladas no relatório de 29 de julho de 2017 não foram comunicadas e, terceiro, de que esta recomendação não foi implementada pelo COC.

    80      A este respeito, primeiro, há que salientar que o artigo 4.°, n.° 1, da Decisão 2012/392 previa que a Missão tinha uma cadeia de comando unificada, enquanto operação de gestão de crises, e que o artigo 5.°, n.° 1, da mesma decisão designava o Diretor da CPCC do SEAE como o COC da Missão. Assim, o artigo 5.°, n.° 2, dessa decisão dispunha que o COC exercia o comando e o controlo da Missão a nível estratégico, e o seu artigo 5.°, n.° 3, previa que este devia assegurar, no que respeita à condução das operações, a execução adequada e efetiva das decisões do Conselho, assim como das decisões do Comité Político e de Segurança (CPS), designadamente através da emissão de instruções no plano estratégico dirigidas ao chefe de Missão, conforme necessário, e da prestação a este último de aconselhamento e apoio técnico.

    81      Resulta destas disposições que as mesmas não excluem a adoção pelo COC de atos de gestão do pessoal necessários à execução do mandato da Missão no teatro de operações (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 4 de dezembro de 2019, H/Conselho, C‑413/18 P, não publicado, EU:C:2019:1044, n.os 69 a 71).

    82      Segundo, decorre das disposições do Código de Conduta, adotado por Decisão do Conselho de 18 de julho de 2016, que o COC está habilitado a adotar atos de gestão do pessoal necessários à execução do mandato da Missão no teatro de operações.

    83      A este respeito, resulta do artigo 6.°, n.° 3, do Código de Conduta, o qual, nos termos do seu artigo 1.°, n.° 1, alínea a), se aplica do mesmo modo a todos os membros das missões civis da União no âmbito da PCSD, incluindo aos membros destacados pelos Estados‑Membros, que todas as participações relativas a uma eventual infração do chefe de Missão devem ser dirigidas ao COC.

    84      Em seguida, decorre igualmente do artigo 9.° do Código de Conduta que a autoridade responsável pelo seguimento a dar em caso de eventual infração cometida pelo chefe de Missão é o COC, que exerce o comando e o controlo da Missão sob o controlo político e a direção estratégica do CPS e sob a autoridade geral do Alto Representante. Em conformidade com o artigo 11.° do mesmo código, neste caso, o COC pode arquivar o processo, tratar o caso como uma questão de gestão sem recorrer a um processo disciplinar formal ou instaurar um inquérito preliminar ou disciplinar.

    85      Por último, o artigo 10.° do Código de Conduta estabelece as condições em que o COC pode pedir ao seu adjunto que substitua irrevogavelmente o chefe de Missão numa situação específica.

    86      Assim, as infrações enumeradas no n.° 79, supra, que o recorrente imputa à Missão no âmbito do segundo fundamento, estão ligadas ao exercício, pelo COC, de prerrogativas que lhe são atribuídas pela Decisão 2012/392 e pelo Código de Conduta e, como tal, à execução pela Missão do seu mandato, pelo qual a Missão deve ser considerada responsável por força do artigo 13.°, n.° 4, desta decisão.

    87      Por conseguinte, é com razão que o recorrente apresenta o seu pedido de indemnização contra a Missão a título das infrações descritas no n.° 79, supra, que imputa ao COC. Daqui resulta que a primeira exceção de inadmissibilidade também deve ser julgada improcedente no que respeita ao segundo fundamento, pelo que esta exceção de inadmissibilidade deve ser julgada improcedente na íntegra.

     Quanto à segunda exceção de inadmissibilidade, relativa à extemporaneidade do pedido

    88      A Missão sustenta que a Decisão de 10 de abril de 2018 constitui uma decisão administrativa lesiva na aceção do artigo 263.° TFUE. Uma vez que esta decisão não foi contestada pelo recorrente no prazo de dois meses a contar da sua notificação, ou quando da notificação, em 23 de julho de 2020, do relatório de 29 de julho de 2017, o recorrente já não pode pedir que a Missão seja responsabilizada pela pretensa ilegalidade desta decisão.

    89      A Missão alega igualmente que o recorrente não expôs as razões pelas quais não interpôs recurso de anulação da primeira e segunda advertências escritas.

    90      O recorrente contesta os argumentos da Missão.

    91      A este respeito, resulta da jurisprudência mencionada no n.° 61, supra, relativa à autonomia da ação de indemnização, que a eventual inadmissibilidade do pedido de anulação de uma decisão lesiva não acarreta automaticamente a anulação do pedido de indemnização do referido prejuízo (v., neste sentido, Acórdão de 25 de março de 2021, Carvalho e o./Parlamento e Conselho, C‑565/19 P, não publicado, EU:C:2021:252, n.° 101 e jurisprudência referida).

    92      No entanto, embora uma parte possa agir através de uma ação de indemnização sem estar obrigada por nenhuma disposição a pedir a anulação do ato ilegal que lhe causa prejuízo, não pode todavia contornar por esse meio a inadmissibilidade de um pedido que visa a mesma ilegalidade e que tem os mesmos objetivos pecuniários (v. Acórdão de 25 de março de 2021, Carvalho e o./Parlamento e Conselho, C‑565/19 P, não publicado, EU:C:2021:252, n.° 102 e jurisprudência referida).

    93      Assim, uma ação de indemnização deve ser declarada inadmissível quando, na realidade, se destine a obter a revogação ou a alteração de uma decisão individual que se tornou definitiva e que, caso fosse aceite, teria como consequência a eliminação total ou parcial dos efeitos jurídicos dessa decisão. É o que acontece quando um recorrente pretende, através de um pedido de indemnização, obter um resultado idêntico ao que teria obtido através da procedência de um recurso de anulação que não interpôs em tempo útil (v., neste sentido, Acórdão de 25 de março de 2021, Carvalho e o./Parlamento e Conselho, C‑565/19 P, não publicado, EU:C:2021:252, n.° 103 e jurisprudência referida).

    94      Do mesmo modo, deve ser julgada inadmissível uma ação de indemnização que é formulada como uma injunção e que visa, não a reparação de um dano imputável a um ato ilícito ou a uma omissão, mas a alteração do ato controvertido (v., neste sentido, Acórdão 25 de março de 2021, Carvalho e o./Parlamento e Conselho, C‑565/19 P, não publicado, EU:C:2021:252, n.° 105).

    95      No caso em apreço, o pedido fundado em responsabilidade apresentado pelo recorrente visa a indemnização dos danos alegadamente causados pelas infrações cometidas pelo chefe de Missão e pelo COC que estão enumeradas, respetivamente, nos n.os 73 e 79, supra, e algumas das quais são suscetíveis de ser qualificadas de decisões lesivas, com o fundamento de que estas infrações consubstanciam, por um lado, uma situação de assédio moral proibida pelas disposições da Carta e, por outro, violações do dever de assistência e do direito a uma boa administração.

    96      Assim, esse recurso não visa a anulação, a revogação nem a alteração de eventuais decisões que possam ter sido adotadas pelo chefe de Missão e pelo COC e que se tenham tornado definitivas, mas antes a indemnização de danos imputáveis à Missão devido à adoção dessas decisões. Em particular, não resulta dos articulados apresentados pelo recorrente que este tenha pedido uma reparação em espécie no sentido de que a Missão devia instaurar um inquérito preliminar ou disciplinar contra o chefe de Missão e o seu adjunto, o que equivaleria a pedir a anulação da Decisão de 10 de abril de 2018. Decorre do exposto que o caráter definitivo dessa decisão individual não pode obstar à admissibilidade do recurso.

    97      Por último, a autonomia da ação de indemnização recordada nos n.os 61 e 91, supra, dispensa igualmente o recorrente de justificar os motivos pelos quais não interpôs recurso de anulação da primeira e segunda advertências escritas.

    98      Por conseguinte, esta segunda exceção de inadmissibilidade deve ser julgada improcedente.

     Quanto à terceira exceção de inadmissibilidade, relativa a um prazo de prescrição de cinco ou de quatro anos

    99      A Missão alega que o recorrente interpôs contra si um recurso cinco anos após a ocorrência dos factos em causa, visto que só lhe apresentou o seu pedido de indemnização em fevereiro de 2022. Sustenta igualmente que o recorrente não se podia basear, volvidos quatro anos, no relatório de 29 de julho de 2017.

    100    O recorrente contesta os argumentos da Missão alegando que o pedido é conforme com as disposições do artigo 46.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

    101    A este respeito, importa recordar que, ao abrigo do artigo 21.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, aplicável aos processos no Tribunal Geral por força do artigo 53.°, primeiro parágrafo, do referido Estatuto, e do artigo 76.°, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a petição deve conter o objeto do litígio, os pedidos e uma exposição sumária dos fundamentos invocados, devendo esta indicação ser suficientemente clara e detalhada para permitir ao demandado ou recorrido preparar a sua defesa e ao Tribunal Geral conhecer da ação ou do recurso, sendo caso disso, sem outras informações (v. Despacho de 7 de setembro de 2022, Rosca/Comissão, C‑802/21 P, não publicado, EU:C:2022:677, n.° 4 e jurisprudência referida).

    102    Em particular, os elementos essenciais de facto e de direito em que a ação ou o recurso se funda devem decorrer, de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição (Acórdão de 3 junho de 2021, Hungria/Parlamento, C‑650/18, EU:C:2021:426, n.° 78).

    103    Assim, não cabe ao juiz da União responder aos argumentos invocados por uma parte que não sejam suficientemente claros e detalhados, na medida em que não são objeto de nenhum desenvolvimento e não são acompanhados de uma argumentação específica na qual se baseiam (v. Acórdão de 18 de novembro de 2021, Grécia/Comissão, C‑107/20 P, não publicado, EU:C:2021:937, n.° 76 e jurisprudência referida).

    104    Além disso, a exigência de precisão que decorre do artigo 21.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 76.° do Regulamento de Processo impõe‑se igualmente, por analogia, ao recorrido quando suscita uma exceção ou um fundamento de inadmissibilidade, dado que esta exigência não tem outro objetivo senão permitir à parte contrária preparar a sua defesa e ao órgão jurisdicional exercer a sua fiscalização, e isto a fortiori quando o demandado ou o recorrido alega que a ação ou o recurso é inadmissível com fundamento em prescrição.

    105    Com efeito, resulta de jurisprudência constante que, diferentemente dos prazos processuais, o respeito do prazo de prescrição não é um elemento de ordem pública e não pode ser apreciado ex officio pelo juiz da União, devendo antes ser invocado pela parte interessada para extinguir a ação de responsabilidade (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de novembro de 2012, Evropaïki Dynamiki/Comissão, C‑469/11 P, EU:C:2012:705, n.° 51 e jurisprudência referida, e de 5 de setembro de 2019, União Europeia/Guardian Europe e Guardian Europe/União Europeia, C‑447/17 P e C‑479/17 P, EU:C:2019:672, n.° 99 e jurisprudência referida).

    106    No caso em apreço, primeiro, decorre dos autos que, embora a Missão tenha mencionado um prazo de cinco anos no termo do qual o presente recurso foi interposto, não esclareceu a base jurídica deste fundamento de inadmissibilidade nem invocou o artigo 46.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, ao abrigo do qual as ações contra a União em matéria de responsabilidade extracontratual prescrevem no prazo de cinco anos a contar da ocorrência do facto que lhes tenha dado origem.

    107    Segundo, resulta dos autos que a Missão também aludiu a um prazo de quatro anos, distinto do previsto no artigo 46.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, que impede que o recorrente se possa valer do relatório de 29 de julho de 2017, sem invocar disposições concretas em apoio desta alegação.

    108    Terceiro, mesmo admitindo que a Missão pretendeu invocar o prazo de prescrição de cinco anos previsto no artigo 46.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, não referiu qual é, no seu entender, o facto gerador do crédito reivindicado pelo recorrente no âmbito do presente recurso nem quando é que o prazo de prescrição começou a correr, nem apresentou os fundamentos de direito e de facto pelos quais considera que o referido crédito prescreveu.

    109    Nestas circunstâncias, cumpre observar que a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Missão e relativa a um prazo de prescrição de cinco ou de quatro anos não é acompanhada de esclarecimentos suficientes para apreciar o seu mérito.

    110    Por conseguinte, esta terceira exceção de inadmissibilidade deve ser rejeitada por carecer de fundamentação e, como tal, deve ser julgada inadmissível.

     Quanto à procedência dos pedidos de indemnização

    111    Em apoio dos seus pedidos de indemnização, o recorrente invoca, em substância, quatro fundamentos, relativos, o primeiro, à violação dos artigos 1.° e 31.° da Carta, bem como do artigo 12.°‑A, n.° 3, do Estatuto, na medida em que foi vítima de assédio moral por parte do chefe de Missão e do seu adjunto, o segundo, à violação do dever de assistência e do direito a uma boa administração, o terceiro, à existência de danos efetivos e certos e, o quarto, à existência de um nexo direto entre as violações invocadas no âmbito do primeiro e do segundo fundamentos e os danos alegados no âmbito do terceiro fundamento.

    112    Antes de examinar os argumentos do recorrente, há que clarificar as condições em que a Missão pode incorrer em responsabilidade para com um agente nacional destacado junto dela.

     Quanto aos requisitos de responsabilização da Missão

    113    Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, para que a responsabilidade extracontratual da União seja suscetível de ser desencadeada num determinado caso, é necessário, entre outras condições, que a pessoa que pede a indemnização do dano ou dos danos que considera ter sofrido devido a um comportamento ou a um ato da União demonstre a existência de uma violação de uma norma jurídica que tenha por objeto conferir direitos aos particulares (v. Acórdão de 22 de setembro de 2022, IMG/Comissão, C‑619/20 P e C‑620/20 P, EU:C:2022:722, n.° 145 e jurisprudência referida).

    114    Além disso, essa violação deve, em princípio, ser suficientemente caracterizada, exigência que depende, por sua vez, do poder de apreciação de que dispõe a instituição, o órgão ou o organismo da União que violou essa norma e da questão de saber se essa instituição, esse órgão ou esse organismo violou de maneira manifesta e grave os limites que se impõem ao seu poder de apreciação, tendo em conta, nomeadamente, o grau de clareza e de precisão da referida norma, as dificuldades de interpretação ou de aplicação que podem daí decorrer, assim como a complexidade da situação a resolver (v., neste sentido, Acórdão de 22 de setembro de 2022, IMG/Comissão, C‑619/20 P e C‑620/20 P, EU:C:2022:722, n.° 146 e jurisprudência referida).

    115    No entanto, resulta de jurisprudência constante que, à luz da responsabilidade acrescida da União quando atua como empregador, a mera declaração da existência de uma ilegalidade praticada, conforme os casos, pela autoridade investida do poder de nomeação (a seguir «AIPN») ou pela autoridade competente para a contratação de pessoal (a seguir «AHCC») é suficiente para se considerar preenchido o primeiro dos três requisitos necessários à responsabilização da União pelos danos causados aos seus funcionários e agentes por violação do direito da função pública da União, e isto, por conseguinte, sem que seja necessário verificar a questão de saber se se trata de uma violação «suficientemente caracterizada» de uma norma jurídica que tenha por objeto conferir direitos aos particulares (v., neste sentido, Acórdão de 10 de junho de 2020, AL/Comissão, T‑83/19, não publicado, EU:T:2020:254, n.os 66 e 67).

    116    Com efeito, o contencioso em matéria de função pública nos termos do artigo 270.° TFUE e dos artigos 90.° e 91.° do Estatuto, incluindo o que visa a reparação de um dano causado a um funcionário ou a um agente, obedece a regras particulares relativamente às que decorrem dos princípios gerais que regulam a responsabilidade extracontratual da União no âmbito do artigo 268.° TFUE e do artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE. Assim, ao contrário de qualquer outro particular, o funcionário ou o agente da União está vinculado à instituição, ao órgão ou ao organismo de que depende por uma relação jurídica laboral constituída por um equilíbrio de direitos e obrigações recíprocos específicos, que se reflete no dever de assistência da instituição, do órgão ou do organismo em causa para com o interessado (v., neste sentido, Acórdão de 14 de dezembro de 2022, SU/AEAPP, T‑296/21, EU:T:2022:808, n.° 73 e jurisprudência referida).

    117    Ora, conforme referido no n.° 46, supra, apesar de não estarem abrangidos pelo Estatuto, os agentes nacionais destacados junto da Missão pelos Estados‑Membros não deixam de estar sujeitos às mesmas regras que as aplicáveis aos agentes que são destacados pelas instituições da União e cuja situação é regulada pelo Estatuto, no que respeita ao exercício das suas funções no teatro de operações.

    118    Por conseguinte, a mera verificação de uma ilegalidade é suficiente para se considerar preenchido o primeiro dos três requisitos necessários para que a União incorra em responsabilidade pelos danos causados a um agente nacional destacado junto da Missão no exercício das suas funções no teatro de operações (v., por analogia, Acórdão de 18 de novembro de 2020, H/Conselho, T‑271/10 RENV II, EU:T:2020:548, n.° 104).

    119    Nestas circunstâncias, incumbe ao Tribunal Geral analisar sucessivamente as violações invocadas pelo recorrente em apoio do primeiro e do segundo fundamentos da petição, a fim de verificar se estão demonstradas, sem que seja necessário examinar se são suficientemente caracterizadas.

     Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação dos artigos 1.° e 31.° da Carta e do artigo 12.°A do Estatuto

    120    O recorrente sustenta que as quatro infrações elencadas no n.° 73, supra, que foram referidas no relatório de 29 de julho de 2017 e que, para efeitos do presente acórdão, devem ser consideradas elementos justificativos do primeiro fundamento, consubstanciam uma situação de assédio moral de que o recorrente alega ter sido vítima e que é proibida pelos artigos 1.° e 31.° da Carta e pelo artigo 12.°‑A, n.° 3, do Estatuto, que é aplicável por analogia.

    121    A Missão contesta as alegações do recorrente.

    122    Antes de examinar as quatro partes mencionadas no n.° 120, supra, e de proceder à sua avaliação contextual, importa, primeiro, apreciar se o recorrente pode invocar utilmente o artigo 12.°‑A, n.° 3, do Estatuto, segundo, recordar a definição de assédio moral e o nível de prova exigido nesta matéria, terceiro, recordar as condições em que a autoridade empregadora deve prestar assistência ao funcionário ou ao agente que alega ser vítima de assédio moral, e, quarto, determinar o grau de fiscalização do Tribunal Geral no presente processo.

    –       Quanto à aplicabilidade do artigo 12.°A, n.° 3, do Estatuto ao litígio

    123    Importa recordar que os agentes ou os peritos nacionais destacados que trabalham ocasionalmente para uma instituição, um órgão ou um organismo da União não estão abrangidos pelo Estatuto (v., neste sentido, Acórdão de 15 de abril de 2010, Gualtieri/Comissão, C‑485/08 P, EU:C:2010:188, n.° 83 e jurisprudência referida).

    124    Por conseguinte, as disposições do Estatuto relativas ao assédio moral e à proteção funcional dos funcionários e dos agentes temporários ou contratuais da União não são diretamente aplicáveis ao recorrente.

    125    No entanto, os agentes destacados junto da Missão pelas instituições da União, cuja situação é regulada pelo Estatuto, e os agentes destacados pelos Estados‑Membros devem, em aplicação da Decisão 2012/392, estar sujeitos às mesmas regras no que diz respeito ao exercício das suas funções no teatro de operações. Por força do princípio da igualdade de tratamento, o Tribunal Geral tem de aplicar à situação do recorrente, por analogia, as disposições estatutárias relativas ao assédio moral e à proteção funcional dos funcionários e dos agentes temporários ou contratuais e a jurisprudência proferida com base nestas disposições (v., por analogia, Acórdão de 18 de novembro de 2020, H/Conselho, T‑271/10 RENV II, EU:T:2020:548, n.° 44 e jurisprudência referida).

    126    Com efeito, o princípio da igualdade de tratamento, consagrado no artigo 20.° da Carta, constitui um princípio geral do direito da União que exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (v. Acórdão de 14 de julho de 2022, Comissão/VW e o., C‑116/21 P a C‑118/21 P, C‑138/21 P e C‑139/21 P, EU:C:2022:557, n.° 95 e jurisprudência referida).

    127    O requisito relativo à comparabilidade das situações, para determinar se existe uma violação do princípio da igualdade de tratamento, deve ser apreciado tendo em conta o conjunto dos elementos que as caracterizam e, nomeadamente, à luz do objeto e da finalidade prosseguida pelo ato que institui a distinção em causa, entendendo‑se que devem ser tidos em conta, para este efeito, os princípios e os objetivos do domínio em que esse ato se integra. Na medida em que as situações não sejam comparáveis, uma diferença de tratamento das situações em causa não viola a igualdade perante a lei consagrada no artigo 20.° da Carta (v. Acórdão de 14 de julho de 2022, Comissão/VW e o., C‑116/21 P a C‑118/21 P, C‑138/21 P e C‑139/21 P, EU:C:2022:557, n.° 96 e jurisprudência referida).

    128    Assim, embora seja verdade que os agentes destacados junto da Missão pelos Estados‑Membros não estão abrangidos pelo Estatuto, contrariamente aos agentes destacados pelas instituições, esta diferença de situação não pode justificar em termos objetivos que os primeiros, quando exercem as suas funções no teatro de operações, estando, assim, numa situação comparável à dos segundos, não beneficiem do mesmo nível e das mesmas regras de proteção contra o assédio moral.

    129    Por conseguinte, o recorrente pode invocar utilmente o artigo 12.°‑A do Estatuto, além dos artigos 1.° e 31.° da Carta.

    –       Quanto à definição de assédio moral e ao nível de prova exigido

    130    Em primeiro lugar, há que recordar que o artigo 1.° e o artigo 31.°, n.° 1, da Carta dispõem, respetivamente, por um lado, que a dignidade do ser humano é inviolável e deve ser respeitada e protegida e, por outro, que todos os trabalhadores têm direito a condições de trabalho saudáveis, seguras e dignas.

    131    Além disso, o artigo 12.°‑A do Estatuto prevê que os funcionários devem abster‑se de qualquer forma de assédio moral ou sexual.

    132    Em particular, por um lado, o conceito de «assédio moral», na aceção do artigo 12.°‑A, n.° 3, do Estatuto, é definido como uma «conduta abusiva» que se materializa em comportamentos físicos, linguagem, verbal ou escrita, gestos ou outros atos intencionais que ocorram «durante um período de tempo, de modo repetitivo ou sistemático», o que implica que o assédio moral deve ser entendido como um processo que se inscreve necessariamente no tempo e pressupõe a existência de ações repetidas ou continuadas e que são «intencionais», por oposição a «acidentais». Por outro lado, para serem abrangidos pelo conceito de «assédio moral», esses comportamentos físicos, linguagem, verbal ou escrita, gestos ou outros atos intencionais devem ter por efeito ofender a personalidade, a dignidade ou a integridade física ou psíquica de uma pessoa (v. Acórdão de 2 de junho de 2022, EM/Parlamento, C‑299/21 P, não publicado, EU:C:2022:429, n.° 102 e jurisprudência referida).

    133    No entanto, não é necessário demonstrar que os comportamentos físicos, a linguagem, verbal ou escrita, os gestos ou outros atos em causa foram praticados com a intenção de lesar a personalidade, a dignidade ou a integridade física ou psíquica de uma pessoa. Por outras palavras, pode haver assédio moral sem que seja demonstrado que o autor do assédio pretendeu, com os seus atos, desacreditar a vítima ou degradar intencionalmente as suas condições de trabalho. É suficiente que esses atos, desde que praticados voluntariamente, tenham acarretado objetivamente tais consequências (v. Acórdão de 20 de outubro de 2021, ZU/Comissão, T‑671/18 e T‑140/19, não publicado, EU:T:2021:715, n.° 57 e jurisprudência referida).

    134    Em segundo lugar, uma vez que a conduta em causa deve, nos termos do artigo 12.°‑A, n.° 3, do Estatuto, ser abusiva, a qualificação de «assédio» depende do preenchimento do requisito de que esta revista uma realidade objetiva suficiente, no sentido de que um observador imparcial e razoável, dotado de uma sensibilidade normal e colocado nas mesmas condições, consideraria o comportamento ou o ato em causa excessivo e criticável (v. Acórdão de 20 de outubro de 2021, ZU/Comissão, T‑671/18 e T‑140/19, não publicado, EU:T:2021:715, n.° 58 e jurisprudência referida).

    135    Em terceiro lugar, o assédio moral pode, pela sua própria definição, ser o resultado de um conjunto de comportamentos diferentes, que, considerados isoladamente não seriam por si sós necessariamente constitutivos de assédio moral, mas que, apreciados globalmente e de forma contextual, incluindo em virtude da sua acumulação no tempo, podem ser considerados como tal. É por esta razão que, quando se examina a questão de saber se os comportamentos alegados por um recorrente consubstanciam assédio moral, importa examinar esses factos tanto isolada como conjuntamente enquanto elementos de um ambiente global de trabalho criado pelos comportamentos de um membro do pessoal em relação a outro membro desse pessoal (v. Acórdão de 20 de outubro de 2021, ZU/Comissão, T‑671/18 e T‑140/19, não publicado, EU:T:2021:715, n.° 59 e jurisprudência referida).

    136    Em quarto lugar, qualquer decisão que tenha sido adotada durante o período em que uma pessoa alega ter sido vítima de assédio moral e cuja legalidade não foi contestada, enquanto tal, é um elemento factual que pode constituir um indício de assédio a ter em conta entre outros, sem que se deva proceder a apreciação da sua legalidade ou que o decurso dos respetivos prazos de recurso obste a que o juiz declare a existência de assédio. Assim, cabe ao juiz apreciar se uma decisão enquanto elemento factual pode ser considerada um indício de assédio moral, tendo em conta todo o contexto factual relevante (v., neste sentido, Acórdão de 30 de junho de 2021, FD/Entreprise commune Fusion for Energy, T‑641/19, não publicado, EU:T:2021:388, n.° 44).

    –       Quanto ao dever de assistência da instituição, do órgão ou do organismo empregador em caso de alegações de assédio moral

    137    Importa recordar que é jurisprudência constante que o artigo 24.° do Estatuto foi estabelecido para proteger os funcionários da União contra o assédio ou qualquer tratamento degradante por parte, designadamente, dos seus superiores hierárquicos ou dos seus colegas (v. Acórdão de 9 de dezembro de 2020, GV/Comissão, T‑705/19, não publicado, EU:T:2020:590, n.° 76 e jurisprudência referida).

    138    Assim, quando a AIPN ou a AHCC é chamada a pronunciar‑se, nos termos do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, sobre um pedido de assistência, na aceção do artigo 24.° deste estatuto, deve, por força do dever de assistência e se essa autoridade estiver perante um incidente incompatível com a ordem e a serenidade do serviço, intervir com toda a energia necessária e responder com a rapidez e a diligência exigidas pelas circunstâncias do caso a fim de apurar os factos e deles retirar, com conhecimento de causa, as consequências adequadas. Para este efeito, basta que o funcionário ou o agente que solicita a proteção da AIPN ou da AHCC apresente prova indiciária da materialidade dos atos de que afirma ser objeto. Perante tais elementos, compete à instituição, ao órgão ou ao organismo em causa tomar as medidas adequadas, nomeadamente instaurando um inquérito administrativo, para apurar os factos na origem da queixa, em colaboração com o seu autor, e, à luz dos resultados do inquérito, adotar as medidas que se impõem, como a instauração de um processo disciplinar contra a pessoa posta em causa, quando a Administração conclua, no termo do inquérito administrativo, que houve assédio moral (Acórdãos de 3 de outubro de 2019, DQ e o./Parlamento, T‑730/18, EU:T:2019:725, n.° 80, e de 14 de julho de 2021, AI/ECDC, T‑65/19, EU:T:2021:454, n.° 64).

    139    Em particular, face a alegações de assédio moral, o dever de assistência comporta o dever de a Administração analisar seriamente, com rapidez e com toda a confidencialidade, o pedido de assistência no qual esse assédio é alegado e informar o requerente do seguimento que lhe é dado (Acórdão de 3 de outubro de 2019, DQ e o./Parlamento, T‑730/18, EU:T:2019:725, n.° 81).

    140    Por último, quando é invocado um fundamento relativo à violação do artigo 12.°‑A do Estatuto, o Tribunal Geral deve verificar se a instituição, o órgão ou o organismo em causa cometeu um erro de apreciação dos factos à luz da definição de assédio que consta desta disposição, e não um erro manifesto de apreciação desses factos (v. Acórdão de 9 de dezembro de 2020, GV/Comissão, T‑705/19, não publicado, EU:T:2020:590, n.° 81 e jurisprudência referida).

    141    Em particular, o mérito da decisão que indefere um pedido de assistência sem que tenha sido instaurado um inquérito administrativo deve ser apreciado pelo juiz à luz dos elementos que foram levados ao conhecimento da instituição, do órgão ou do organismo em causa, designadamente, pelo autor do pedido de assistência (v., neste sentido, Acórdão de 9 de dezembro de 2020, GV/Comissão, T‑705/19, não publicado, EU:T:2020:590, n.° 82 e jurisprudência referida).

    –       Quanto ao grau de fiscalização do Tribunal Geral no presente processo

    142    Para determinar o grau de fiscalização aplicável no caso em apreço, incumbe ao Tribunal Geral apreciar se o relatório de 29 de julho de 2017 equivale ao resultado de um inquérito administrativo, na aceção da jurisprudência referida nos n.os 138 e 141, supra, cujo objetivo é apurar os factos que estão na origem das participações de 28 de março e de 17 de julho de 2017.

    143    Com efeito, se não for esse o caso, cabe ao Tribunal Geral, em aplicação das disposições e dos princípios recordados nos n.os 130 a 141, supra, apreciar, no âmbito da análise das partes correspondentes, se as quatro infrações imputadas pelo recorrente ao chefe de Missão e ao seu adjunto constituem não um caso de assédio moral, mas antes indícios desse assédio, que teriam justificado a instauração de um inquérito administrativo.

    144    A este respeito, resulta da Decisão de 10 de abril de 2018 que o relatório de 29 de julho de 2017 foi elaborado por um agente da CPCC do SEAE em aplicação do artigo 11.°, n.° 1, alínea b), do Código de Conduta, que habilita o COC, em caso de participação que ponha em causa o chefe de Missão, a tratar o assunto como uma questão de gestão sem recorrer a um processo disciplinar formal e, sendo caso disso, recorrendo a um procedimento de mediação.

    145    Assim, afigura‑se que o relatório de 29 de julho de 2017 foi elaborado com vista a dar conta de uma tentativa de mediação, e não para determinar, no âmbito do inquérito preliminar ou disciplinar previsto no artigo 11.°, n.° 1, alíneas c) e d), do Código de Conduta, o fundamento das alegações de assédio moral que constam das participações de 28 de março e de 17 de julho de 2017.

    146    Esta interpretação é corroborada pelo facto de, no seu relatório de 29 de julho de 2017, o mediador não ter tomado expressamente posição sobre a questão de saber se os factos imputados pelo recorrente ao chefe de Missão e ao seu adjunto consubstanciam uma situação de assédio ou se constituem indícios dessa situação.

    147    É verdade que se pode deduzir da conclusão do relatório de 29 de julho de 2017 que o mediador considerou implicitamente que certos factos imputados pelo recorrente à Missão, designadamente os que são objeto das quatro partes invocadas em apoio do primeiro fundamento, constituem indícios de assédio moral.

    148    Com efeito, nessa conclusão, o mediador propõe uma medida de apaziguamento, isto é, uma afetação temporária do recorrente a um posto em Bruxelas (Bélgica) após as férias de verão, remetendo expressamente para a legislação nacional em matéria de assédio e para as normas aplicáveis às instituições da União que preveem a possibilidade de uma fase informal antes da instauração do procedimento formal, com o fundamento de que, no caso em apreço, as circunstâncias eram propícias a esta fase informal.

    149    No entanto, a apreciação pessoal do mediador que consta do relatório de 29 de julho de 2017 não foi, por sua vez, adotada pela Missão.

    150    Em particular, há que salientar que, com a Decisão de 10 de abril de 2018, adotada posteriormente à cessação do destacamento do recorrente junto da Missão, o COC informou‑o de que as participações de 28 de março e 17 de julho de 2017 eram tratadas como uma questão de gestão, em conformidade com o artigo 11.°, n.° 1, alínea b), do Código de Conduta, sem a instauração de um inquérito preliminar ou disciplinar nem de um processo disciplinar formal contra o chefe de Missão e o seu adjunto.

    151    Assim, cumpre observar que, ao fazê‑lo, a Missão considerou que as alegações de assédio moral que constam das participações de 28 de março e 17 de julho de 2017 são infundadas ou, pelo menos, que não estão suficientemente fundamentadas para constituírem indícios que justifiquem a instauração de um inquérito preliminar ou disciplinar.

    152    Por conseguinte, uma vez que, com a Decisão de 10 de abril de 2018, a Missão se absteve de instaurar um inquérito administrativo para verificar o fundamento das alegações do recorrente e de tomar uma posição sobre a questão de saber se as infrações imputadas pelo recorrente ao chefe de Missão e ao seu adjunto consubstanciavam assédio moral, esta decisão equivale, no que respeita aos seus efeitos, a indeferir um pedido de assistência sem a instauração de um inquérito administrativo, cujo mérito o Tribunal Geral deve, em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 141, supra, apreciar à luz dos elementos que o recorrente apresentou à Missão.

    –       Quanto à primeira parte, relativa à exclusão do recorrente das reuniões políticas semanais entre o chefe de Missão e o chefe da Delegação

    153    Em apoio desta parte, o recorrente sustenta, em substância, que o facto de ser excluído das reuniões políticas semanais entre o chefe de Missão e o chefe da Delegação (a seguir «reuniões de pessoal») constitui um indício de assédio moral que justifica a instauração de um inquérito administrativo.

    154    A este respeito, decorre de uma mensagem de correio eletrónico de 26 de maio de 2017 que, a partir desta data, o chefe de Missão pediu ao recorrente que deixasse de participar nas reuniões de pessoal.

    155    Assim, resulta do relatório de 29 de julho de 2017 que o recorrente considerou que o facto de ter sido excluído das reuniões de pessoal o privou de uma fonte importante de informações para exercer as suas funções de consultor político, o impediu de exercer a sua função de coordenação com a Delegação para a elaboração dos relatórios sobre as questões políticas e ofendeu a sua reputação.

    156    Todavia, decorre igualmente desse relatório que, primeiro, a Decisão do chefe de Missão de 26 de maio de 2017 mencionada no n.° 154, supra, foi adotada devido ao seu descontentamento em relação ao recorrente, por este não ter acompanhado as referidas reuniões semanais, e, segundo, que estas reuniões eram politicamente sensíveis e o chefe de Missão tinha razões para crer que as informações resultantes dessas reuniões tinham sido divulgadas às autoridades italianas.

    157    Efetivamente, no seu relatório de 29 de julho de 2017, o mediador considerou que a exclusão do recorrente das reuniões de pessoal e a decisão de o convidar apenas para as reuniões semanais de gestão não eram viáveis, tendo em conta as suas funções de consultor político e de coordenação neste domínio, e que teria sido preferível que o recorrente tivesse continuado a participar ocasionalmente nas reuniões de pessoal.

    158    No entanto, no que respeita ao primeiro fundamento de exclusão do recorrente das reuniões de pessoal, decorre igualmente de uma mensagem de correio eletrónico enviada pelo chefe de Missão ao recorrente em 6 de abril de 2017 que a contribuição do recorrente nessas reuniões semanais era nula.

    159    A este respeito, primeiro, há que recordar que o artigo 6.°, n.os 2 e 3, da Decisão 2012/392 prevê que o chefe de Missão exerce o comando e o controlo do pessoal, das equipas e das unidades dos Estados contribuintes e emite instruções destinadas a todo o pessoal da Missão, para a eficaz condução desta no teatro de operações, assumindo a sua coordenação e gestão corrente.

    160    Além disso, resulta da jurisprudência que a Administração dispõe de um amplo poder de apreciação em matéria de organização do serviço (v., neste sentido, Acórdão de 29 de outubro de 1981, Arning/Comissão, 125/80, EU:C:1981:248, n.° 19).

    161    Ora, o recorrente não apresenta elementos suscetíveis de contrariar as alegações do chefe de Missão segundo as quais a sua contribuição nas reuniões de pessoal era nula, pelo que, tendo em conta o amplo poder de apreciação de que este dispõe e o imperativo de eficácia recordado no artigo 6.° da Decisão 2012/392, não se afigura que a sua decisão de dispensar o recorrente de participar nessas reuniões seja excessiva ou criticável atendendo ao interesse do serviço.

    162    Segundo, decorre igualmente do artigo 6.°, n.° 7, da Decisão 2012/392 que, sem prejuízo da cadeia de comando, o chefe de Missão recebe do chefe da Delegação orientação política a nível local.

    163    Consequentemente, uma vez que as reuniões de pessoal tinham nomeadamente por objeto a transmissão de orientações políticas locais pelo chefe da Delegação, não se afigura que a presença do recorrente nestas reuniões fosse indispensável.

    164    Terceiro, não foi demonstrado, nem sequer alegado, que as reuniões de pessoal constituíam o único canal de comunicação entre a Missão e a Delegação sobre as questões políticas, pelo que não se afigura que a exclusão do recorrente destas reuniões obstasse ao exercício das suas funções, na medida em que implicavam uma coordenação com o seu ou os seus homólogos da Delegação sobre as questões políticas.

    165    Por conseguinte, e sem que seja necessário examinar o segundo fundamento da Decisão de 26 de maio de 2017 mencionado no n.° 156 supra, relativo à violação da confidencialidade dessas reuniões e à divulgação pelo recorrente de determinadas informações às autoridades italianas, essa decisão de o excluir das reuniões de pessoal não pode ser considerada, isoladamente, um indício de assédio moral do recorrente, pelo que a primeira parte deve ser julgada improcedente.

    –       Quanto à segunda parte, relativa à receção da primeira advertência escrita pelo recorrente em 17 de julho de 2017, menos de uma hora depois da participação do mesmo dia

    166    No âmbito desta parte, o recorrente sustenta, em substância, que a notificação da primeira advertência escrita menos de uma hora depois de ter feito a participação de 17 de julho de 2017 constitui um indício de assédio moral a seu respeito.

    167    A título preliminar, há que recordar que o artigo 7.°, n.° 1, do Código de Conduta dispõe que o membro da Missão que tenha participado uma eventual infração não é penalizado pelo facto de ter feito essa participação ou na sequência da mesma, desde que tenha atuado de forma razoável e de boa‑fé.

    168    No caso em apreço, decorre das declarações das partes que, em 17 de julho de 2017, o chefe de Missão enviou ao recorrente uma advertência escrita por lhe ter faltado ao respeito numa reunião realizada em 10 de abril de 2017 e na qual a Missão tinha recebido uma personalidade política de um Estado‑Membro. Com efeito, o chefe de Missão acusou o recorrente de ter, com a sua linguagem corporal, expressado muito claramente o seu desagrado por ter de tomar notas nessa reunião, quando era suposto fazê‑lo, e de ter adotado mímicas ou gestos inapropriados sempre que o chefe de Missão falava.

    169    Em particular, esta primeira advertência foi enviada ao recorrente em 17 de julho de 2017, menos de uma hora depois de ele ter enviado ao COC uma participação em que acusava o chefe de Missão e o seu adjunto de assédio moral.

    170    Primeiro, decorre do artigo 11.° do Código de Conduta que, com base num relatório que dá conta de uma eventual infração, a decisão da autoridade responsável quanto ao seguimento a dar à referida alegação, que pode levar a autoridade a tratar o assunto como uma questão de gestão, deve ser adotada no prazo de dez dias úteis.

    171    No caso em apreço, uma vez que a primeira advertência escrita não foi formulada na sequência de um processo disciplinar formal e que resulta do seu título que está relacionada com questões de «gestão», há que observar que a mesma foi adotada em conformidade com o artigo 11.°, alínea b), do Código de Conduta, não tendo a Missão apresentado outro fundamento jurídico.

    172    Segundo, embora resulte do relatório de 29 de julho de 2017 que o chefe de Missão justificou, perante o mediador, o envio tardio da primeira advertência escrita pelo facto de a CPCC do SEAE lhe ter dado instruções no sentido de adiar este envio, a Missão não apresentou nenhuma prova dessa correspondência suscetível de demonstrar a veracidade desta justificação. Além disso, não demonstrou, nem sequer alegou, que a CPCC ou o COC aprovaram a iniciativa do chefe de Missão de notificar a primeira advertência escrita ao recorrente em 17 de julho de 2017.

    173    Por conseguinte, mesmo admitindo que o prazo de dez dias úteis previsto no artigo 11.°, alínea b), do Código de Conduta não constitui um prazo imperativo, não deixa de ser verdade que a Missão não justificou os motivos pelos quais o envio da primeira advertência escrita ocorreu em 17 de julho de 2017, mais de três meses após o evento que esteve na origem desta advertência, e menos de uma hora depois de o recorrente ter feito uma participação na qual punha em causa o chefe de Missão.

    174    Terceiro, é verdade que a participação de 17 de julho de 2017 foi feita pelo recorrente por mensagem de correio eletrónico enviada apenas ao COC e ao seu adjunto, e que a Missão sustenta que o chefe de Missão e o seu adjunto não tiveram conhecimento desta participação no momento em que foi feita.

    175    Todavia, embora o Tribunal Geral não possa fazer recair sobre a Missão o ónus de provar a veracidade das suas alegações, uma vez que esse ónus equivaleria a exigir‑lhe que apresentasse uma prova de facto negativo, também não pode exigir ao recorrente que determine se e, sendo caso disso, a data exata em que o COC comunicou ao chefe de Missão a existência e, eventualmente, o conteúdo da participação de 17 de julho de 2017, uma vez que não existem motivos para considerar que o recorrente dispõe destas informações.

    176    Assim, na falta de prova quanto à data exata em que o COC informou o chefe de Missão da participação do recorrente de 17 de julho de 2017 e quanto ao conteúdo exato desta informação, há que observar, antes de mais, que a Missão não invocou disposições que impedissem a transmissão desta informação ao chefe de Missão ou ao seu adjunto.

    177    Além disso, a Missão também não comunicou ao Tribunal Geral a data exata em que o COC ou a CPCC informaram o chefe de Missão da vinda do mediador, embora seja razoável presumir que o chefe de Missão tomou conhecimento da existência e, eventualmente, do conteúdo da participação de 17 de julho de 2017 no momento em que esta informação foi transmitida.

    178    Resulta do exposto que, na falta de justificação pela Missão da formulação tardia da primeira advertência, tendo em conta tanto o prazo previsto no artigo 11.° do Código de Conduta como a antiguidade dos factos na origem desta advertência, e na falta de declarações quanto à data exata em que o chefe de Missão teve conhecimento da participação de 17 de julho de 2017, a notificação dessa advertência menos de uma hora depois desta participação pode ser considerada excessiva ou criticável.

    179    Com efeito, é suscetível de ser interpretada no sentido de que visa penalizar o recorrente pela referida participação, contrariamente às exigências previstas no artigo 7.° do Código de Conduta, constituindo, por isso, considerada isoladamente, um indício de assédio moral.

    180    Por conseguinte, há que julgar procedente a segunda parte do presente fundamento.

    –       Quanto à terceira parte, relativa ao pedido recebido pelo recorrente em 27 de julho de 2017 e destinado ao preenchimento do formulário de avaliação do desempenho com vista à renovação do seu destacamento

    181    Nesta parte, o recorrente sustenta, em substância, que o momento escolhido pelo Serviço RH para iniciar o procedimento de avaliação do seu desempenho, em 27 de julho de 2017, ou seja, no dia seguinte à partida do mediador, constitui um indício de assédio moral a seu respeito.

    182    Em particular, decorre do relatório de 29 de julho de 2017 que o recorrente considera que o procedimento de avaliação do desempenho não está previsto nas regras de gestão do pessoal da Missão e que o facto de ter sido sujeito a este procedimento tinha como único objetivo excluí‑lo do serviço.

    183    A este respeito, resulta dos autos que, em 6 de abril de 2017, o chefe de Missão decidiu instaurar um procedimento com vista à elaboração de um relatório de avaliação do desempenho (a seguir «PER») do recorrente e que este último se opôs com o fundamento de que, em substância, este procedimento não estava formalmente previsto no plano operacional revisto da Missão (a seguir «OPLAN») de 13 de julho de 2022.

    184    Posteriormente, em 27 de julho de 2017, um agente do Serviço RH enviou ao recorrente o projeto de PER a preencher, com um novo prazo fixado em 4 de agosto de 2017. No entanto, o recorrente recusou‑se novamente a preencher o seu PER com o fundamento de que este novo procedimento era prematuro tendo em conta o fim do seu destacamento previsto para 14 de abril de 2018. O chefe do Serviço RH explicou então ao recorrente que esse procedimento dizia respeito a todo o pessoal da Missão cujo destacamento terminaria, o mais tardar, em 30 de abril de 2018, e que, se não colaborasse, o seu lugar ficaria vago.

    185    Por último, em 23 de agosto de 2017, o chefe do Serviço RH insistiu com o recorrente, pedindo novamente que entregasse o seu PER devidamente preenchido. O recorrente rejeitou novamente este pedido com o fundamento de que não iria solicitar a prorrogação do seu destacamento a partir do mês de abril de 2018.

    186    A título preliminar, cumpre esclarecer que de acordo com artigo 7.° do anexo IX do OPLAN, relativo aos recursos humanos, a prorrogação do destacamento de um agente destacado depende do acordo do chefe de Missão, com base num pedido do agente em causa nesse sentido apresentado três meses antes do termo do período de destacamento em curso e de um PER favorável elaborado pelo seu responsável hierárquico direto.

    187    Além disso, o artigo 10.° do anexo IX do OPLAN prevê que todos os membros da Missão devem ser regularmente objeto de um PER, em particular antes da sua partida definitiva da Missão.

    188    Por último, a Missão baseou‑se num documento intitulado Lignes directrices pour l’évaluation des performances au sein des missions PESD (Orientações para a avaliação do desempenho nas missões PECSD), do qual resulta que o procedimento de elaboração do PER é realizado sistematicamente antes de o agente em causa deixar a Missão, fortemente recomendado no fim de cada período de destacamento ou de contrato, aconselhado após um período de seis meses em caso de destacamento inicial do agente por um período de um ano, e possível em qualquer momento quando seja considerado necessário, em caso de mudança de superior hierárquico ou de alteração do desempenho do agente em causa, em concertação com o Serviço RH.

    189    Em primeiro lugar, há que observar que, embora a possibilidade de avaliar o pessoal da Missão em caso de mudança de superior hierárquico ou de alteração do desempenho do agente em causa não esteja expressamente prevista no anexo IX do OPLAN, não se afigura que esta norma obste a tal prática, uma vez que o artigo 10.° deste anexo não define de forma exaustiva as situações em que os membros da Missão devem ser avaliados.

    190    Além disso, o recorrente não invocou outra norma que impeça a avaliação do seu desempenho pelo chefe de Missão.

    191    Pelo contrário, deduz‑se do artigo 6.° da Decisão 2012/392 e da jurisprudência referida no n.° 160, supra, que o chefe de Missão dispõe de um amplo poder de apreciação para decidir elaborar o PER de um dos seus subordinados se considerar que este procedimento é necessário à sua eficácia no teatro de operações.

    192    Assim, não se pode considerar que, em princípio, a Decisão do chefe de Missão de 6 de abril de 2017 de proceder à avaliação do desempenho do recorrente é excessiva ou criticável tendo em conta o interesse do serviço, tanto mais que decorre da audiência que após junho de 2016 o recorrente nunca mais foi sujeito a avaliação do seu desempenho.

    193    Em segundo lugar, decorre, no entanto, do novo pedido do Serviço RH de 27 de julho de 2017 para que o recorrente preenchesse o seu PER, que este pedido não era referente à Decisão do chefe de Missão de 6 de abril de 2017 mencionada nos n.os 183 e 192, supra, mas antes à necessidade de recensear os pedidos de renovação de destacamento e de antecipar eventuais vagas de emprego para todos os agentes destacados na Missão até 30 de abril de 2018, com vista a proceder às publicações dos lugares dos agentes cujo destacamento terminaria nesta última data.

    194    Ora, embora não seja contestado que essa decisão não dizia apenas respeito ao recorrente, não deixa de ser verdade que a Missão não justificou os motivos pelos quais o Serviço RH iniciou esta diligência administrativa logo em 27 de julho de 2017, quando resulta do artigo 7.° do anexo IX do OPLAN, relativo aos recursos humanos, que o procedimento de avaliação dos agentes que pretendiam solicitar a renovação do seu destacamento na Missão devia ocorrer na sequência da apresentação de um pedido nesse sentido, o mais tardar três meses antes do termo do destacamento, ou seja, em 14 de janeiro de 2018 no caso do recorrente.

    195    Em terceiro lugar, há que observar que o pedido do Serviço RH mencionado nos n.os 184 e 193, supra, ocorreu no dia seguinte ao da partida do mediador.

    196    Ora, pode considerar‑se razoavelmente que as participações de 28 de março e de 17 de julho de 2017 e a Decisão do COC de 20 de julho de 2017 de enviar um mediador para o local em 25 de julho de 2017 exigiam que, na pendência das conclusões do mediador, a Missão adotasse um comportamento em relação ao recorrente com a prudência que é imposta, nomeadamente, pelo princípio da boa administração.

    197    Com efeito, além de este dever de atuar com prudência estar contido no princípio da boa administração, consagrado no artigo 41.° da Carta (v., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2022, SGL Carbon e o./Comissão, C‑65/21 P e C‑73/21 P a C‑75/21 P, EU:C:2022:470, n.° 30 e jurisprudência referida), e, particularmente, no dever de diligência, impunha‑se igualmente no caso em apreço, tendo em conta o artigo 7.° do Código de Conduta, que proíbe a Missão de penalizar um membro da Missão que tenha participado uma eventual infração, tendo em conta essa participação ou na sequência da mesma.

    198    Assim, decorre do relatório de 29 de julho de 2017 que o mediador considerou que a atuação do Serviço RH, ao retomar, em 27 de julho de 2017, ou seja, imediatamente após a sua missão de averiguação no local, o procedimento de avaliação do recorrente, foi infeliz e ocorreu antes do que é prática habitual.

    199    Neste contexto, pode considerar‑se que, nas circunstâncias particulares em que foi adotada, a decisão de retomar o procedimento de avaliação do recorrente no dia seguinte à partida do mediador, sem aguardar pelas suas conclusões, e mais de nove meses antes do término do destacamento do recorrente, é excessiva ou criticável.

    200    Com efeito, o facto de iniciar esse procedimento pode ser interpretado no sentido de que visa excluir o recorrente da Missão no termo do seu destacamento sem aguardar pelas propostas do mediador, pelo que esta decisão constitui, considerada isoladamente, um indício de assédio moral.

    201    Por conseguinte, há que julgar procedente a terceira parte.

    –       Quanto à quarta parte, relativa à receção pelo recorrente da contagem atualizada dos seus dias de férias na sequência de um pedido do Serviço RH para que justificasse uns dias de faltas injustificadas

    202    Nesta parte, o recorrente queixa‑se da reação do chefe do Serviço RH ao seu regresso tardio de um período de férias em junho de 2017.

    203    A este respeito, decorre de uma mensagem de correio eletrónico de 28 de julho de 2017 enviada ao COC que o recorrente completou a participação de 17 de julho de 2017 com uma troca de mensagens de correio eletrónico entre este último e o chefe do Serviço RH a propósito do seu regresso de férias em junho de 2017, mais tarde do que inicialmente previsto.

    204    Em particular, resulta dessas mensagens de correio eletrónico que o recorrente recebeu uma carta com um pedido para que justificasse por que razão tinha regressado de férias na segunda‑feira 3 de julho de 2017 em vez da data inicialmente prevista, quinta‑feira 29 de junho de 2017. Numa mensagem de correio eletrónico de 24 de julho de 2017, o recorrente invocou «razões pessoais» e referiu ter pedido a colegas que avisassem a Missão, uma vez que ele próprio estava impossibilitado de o fazer. Posteriormente, por mensagem de correio eletrónico de 27 de julho de 2017, o chefe do Serviço RH enviou ao recorrente uma «contagem atualizada dos dias de férias», que mencionava os dias de 29 e 30 de junho de 2017, com conhecimento, nomeadamente, do chefe de Missão e do seu adjunto. O recorrente referiu que não tinha pedido este documento e que pretendia saber por que razão o seu interlocutor o tinha enviado com o conhecimento de outros destinatários, uma vez que se tratava de um documento que considerava ser estritamente confidencial.

    205    Em primeiro lugar, verifica‑se que o pedido de justificação das férias proveniente do Serviço RH é de 24 de julho de 2017 e que foi notificado no mesmo dia ao recorrente, pelo que foi efetuado na véspera da chegada do mediador.

    206    No entanto, não resulta dos autos que o recorrente tenha participado este pedido de justificação de férias ao mediador nas reuniões que teve com este último em 25 e 26 de julho de 2019, quando podia fazê‑lo.

    207    Por conseguinte, há que observar que o recorrente não considerou que o pedido de justificação de férias de 24 de julho de 2017 constituísse um indício de assédio moral a seu respeito, mas que se tratava do caso no que respeita ao envio da contagem atualizada de dias de férias de 27 de julho de 2017.

    208    Em segundo lugar, importa igualmente salientar que o recorrente regressou tarde das férias em maio de 2017 e que repetiu este comportamento em agosto de 2017, não respeitando as regras internas relativas aos pedidos de férias.

    209    Em terceiro lugar, há que observar que, sem prejuízo do dever de diligência e, nomeadamente, de prudência mencionado no n.° 197, supra, na pendência das conclusões do mediador, nem os artigos 1.° e 31.° da Carta, nem o artigo 12.°‑A do Estatuto e, no caso em apreço, nem as disposições do anexo IX do OPLAN e do Código de Conduta impunham à Missão que dispensasse o recorrente dos procedimentos de gestão dos recursos humanos da Missão pelo simples facto de este ter feito participações por assédio moral contra o chefe de Missão e o seu adjunto.

    210    Assim, as participações de 28 de março e 17 de julho de 2017 não podiam impedir que o Serviço RH, sob o controlo do chefe de Missão e do seu adjunto, enviasse ao recorrente, em 27 de julho de 2017, um formulário com a contagem atualizada dos seus dias de férias, na sequência das faltas injustificadas de 29 e 30 de junho de 2017, quando esse documento é, em princípio, necessário para conhecer com exatidão os direitos a férias do agente em causa para o resto do ano em curso.

    211    Por conseguinte, o envio pelo Serviço RH ao recorrente, em 27 de julho de 2017, de uma contagem atualizada dos seus dias de férias não pode ser considerado, isoladamente, um ato excessivo ou criticável suscetível de constituir um indício de assédio moral a seu respeito, pelo que a quarta parte deve ser julgada improcedente.

    –       Quanto à apreciação global e contextual dos comportamentos imputados pelo recorrente ao chefe de Missão e ao seu adjunto

    212    Em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 135, supra, cabe ao Tribunal Geral proceder à apreciação global e contextual dos comportamentos que são imputados pelo recorrente ao chefe de Missão e ao seu adjunto.

    213    A este respeito, decorre de uma mensagem de correio eletrónico enviada pelo chefe de Missão ao recorrente em 6 de abril de 2017 que o primeiro tinha comunicado a sua vontade às autoridades italianas e ao COC de que o recorrente fosse repatriado devido a uma perda de confiança, por este último ter alegadamente violado o seu segredo profissional.

    214    É verdade que o artigo 8.° do anexo IX do OPLAN permite ao chefe de Missão pôr termo ao destacamento de um agente antes do termo previsto, nomeadamente por motivos disciplinares, em conformidade com o Código de Conduta, ou devido à incapacidade do agente em causa de respeitar as exigências de base da Missão.

    215    No entanto, não resulta dos autos que a Missão tenha solicitado às autoridades italianas a cessação do destacamento do recorrente antes do seu termo nem que tenha instaurado o procedimento previsto no artigo 8.° do anexo IX do OPLAN.

    216    Com efeito, em resposta a uma questão na audiência, a Missão esclareceu que o procedimento de cessação antecipada do destacamento previsto no artigo 8.° do anexo IX do OPLAN apresenta uma certa complexidade administrativa e exige a criação de um comité encarregado de avaliar a situação do agente em causa e os motivos pelos quais o chefe de Missão pretende que o seu destacamento cesse antecipadamente.

    217    Assim, o ambiente global de trabalho em que ocorreram os factos invocados pelo recorrente caracterizava‑se pela intenção do chefe de Missão, conforme decorre da mensagem de correio eletrónico de 6 de abril de 2017 referida no n.° 213, supra, de remover o recorrente do seu posto sem, no entanto, implementar o procedimento previsto no artigo 8.° do anexo IX do OPLAN.

    218    Ora, por um lado, a verificação desse contexto é suscetível de corroborar a apreciação feita pelo recorrente dos factos imputados ao chefe de Missão e ao seu adjunto no âmbito da segunda e terceira partes, que o Tribunal Geral considerou constituírem indícios de assédio moral. Por outro lado, os factos imputados pelo recorrente ao chefe de Missão e ao seu adjunto no âmbito da primeira e quarta partes, que o Tribunal Geral decidiu que não constituem, considerados isoladamente, indícios de assédio moral, são em si suscetíveis de parecer como tal atendendo ao referido contexto, nomeadamente devido à ocorrência de todos estes factos num período de tempo limitado.

    219    Por conseguinte, o recorrente tem fundamentos para sustentar que, ao não diligenciar um inquérito administrativo na sequência das suas alegações de assédio moral, a Missão violou o artigo 1.° e o artigo 31.°, n.° 1, da Carta, bem como o artigo 12.°‑A do Estatuto, pelo que há que julgar o primeiro fundamento integralmente procedente.

     Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do direito a uma boa administração e do dever de assistência

    220    No âmbito deste fundamento, o recorrente sustenta que as três alegadas infrações que estão elencadas no n.° 79, supra, e que, para efeitos do presente acórdão, devem ser consideradas como partes justificativas do presente fundamento, constituem violações do direito a uma boa administração e do dever de assistência.

    221    A Missão contesta o fundamento das alegações do recorrente.

    222    Antes de examinar estas três partes, o Tribunal Geral deve apreciar se o recorrente pode invocar utilmente uma violação do dever de assistência e, em caso afirmativo, se o conteúdo deste dever difere do direito a uma boa administração.

    –        Quanto à aplicabilidade do dever de assistência ao litígio

    223    Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o dever de assistência da Administração para com os seus agentes reflete o equilíbrio dos direitos e obrigações recíprocos que o Estatuto criou nas relações entre os agentes do serviço público e a sua Administração. Juntamente com o princípio da boa administração, este equilíbrio implica nomeadamente que, quando decide sobre a situação de um funcionário, a Administração tome em consideração todos os elementos suscetíveis de determinar a sua decisão e que, ao fazê‑lo, tenha em conta não apenas o interesse do serviço mas também o interesse do funcionário em causa [v. Despacho de 31 de março de 2022, Barata/Parlamento, C‑305/21 P, não publicado, EU:C:2022:253, n.os 7 e 8 (posição do advogado‑geral, n.° 14 e jurisprudência referida)].

    224    No entanto, como resulta dos n.os 125 a 129, supra, o princípio da igualdade de tratamento impõe que se proceda a uma aplicação por analogia de certas disposições do Estatuto e da jurisprudência específica em matéria de função pública da União ao caso dos agentes nacionais destacados junto de um órgão ou de um organismo como a Missão, quando esses agentes se encontrem numa situação comparável à dos agentes sujeitos ao Estatuto e a diferença de situação entre uns e outros não possa justificar objetivamente que os primeiros, no exercício das suas funções no teatro de operações, não beneficiem do mesmo nível e das mesmas regras de proteção que os segundos.

    225    É o que sucede, nomeadamente, com o dever de assistência da instituição, do órgão ou do organismo da União empregador para com os seus funcionários e agentes (v., neste sentido, Acórdão de 18 de novembro de 2020, H/Conselho, T‑271/10 RENV II, EU:T:2020:548, n.° 105 e jurisprudência referida).

    226    Por conseguinte, o recorrente pode invocar utilmente o dever de assistência.

    –       Quanto ao alcance do dever de assistência e do direito a uma boa administração

    227    Há que recordar que o recorrente queixa‑se, em substância, numa primeira parte, que a Missão não tratou as suas queixas de 8 de março de 2017 nem as suas participações de 28 de março e 17 de julho de 2017 num prazo razoável, numa segunda parte, que não teve conhecimento das conclusões nem da recomendação que figuram no relatório de 29 de julho de 2017 e, numa terceira parte, que a Missão não deu seguimento às recomendações do mediador.

    228    A este respeito, o artigo 41.°, n.° 1, da Carta dispõe que todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável. Além disso, o artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta prevê que o direito a uma boa administração compreende o direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente.

    229    Em contrapartida, o dever de assistência, conforme definido pela jurisprudência, não menciona a obrigação de a instituição, o órgão ou o organismo da União empregador de tomar uma decisão sobre a situação ou o pedido de um dos seus agentes num prazo razoável, ou após o ter ouvido, nem, em particular, a obrigação de seguir as recomendações apresentadas por um mediador designado na sequência de uma queixa por assédio moral.

    230    Além disso, não decorre da jurisprudência uma ligação direta ou explícita entre, por um lado, o dever de assistência e, por outro, a obrigação de instruir um pedido num prazo razoável, designadamente uma queixa por assédio moral, o direito de ser ouvido e a eventual obrigação de seguir as recomendações apresentadas por um mediador designado na sequência de uma queixa por assédio moral.

    231    É certo que resulta da jurisprudência que o dever de assistência corresponde a uma exigência acrescida de responsabilidade para as instituições, os órgãos ou os organismos da União quando agem como empregadores (v., neste sentido, Acórdão de 14 de dezembro de 2022, SU/AEAPP, T‑296/21, EU:T:2022:808, n.° 73 e jurisprudência referida).

    232    Todavia, no caso em apreço, o recorrente não especificou a natureza das obrigações que, no presente processo, incumbem à Missão por força do dever de assistência e que são distintas das que decorrem do direito a uma boa administração.

    233    Por conseguinte, há que observar que o presente fundamento, na parte em que assenta numa eventual violação do dever de assistência, não é acompanhado de elementos suficientemente concretos para apreciar a sua procedência e, nessa medida, deve ser rejeitado por carecer de precisão e por ser inadmissível em conformidade com o artigo 76.°, alínea d), do Regulamento de Processo.

    –       Quanto à primeira parte, relativa ao não tratamento das queixas de 8 de março de 2017 e das participações de 28 de março e 17 de julho de 2017 num prazo razoável

    234    Nesta parte, o recorrente sustenta, em substância, que a Missão não tratou as suas queixas de 8 de março de 2017 nem as suas participações de 28 de março e 17 de julho de 2017 num prazo razoável, tendo presente que as mesmas lhe foram submetidas em março de 2017, que o mediador apresentou o seu relatório em 29 de julho de 2017 e que a Missão só respondeu ao recorrente em 10 de abril de 2018.

    235    Em primeiro lugar, importa recordar que o recorrente apresentou, em 8 de março de 2017, duas queixas ao chefe de Missão, uma das quais por assédio moral por parte de um colega de trabalho, antes de fazer, em 28 de março de 2017, uma participação ao COC para que instruísse estas duas queixas.

    236    Ora, a primeira queixa de 8 de março de 2017 por assédio moral foi arquivada pelo adjunto do chefe de Missão, tendo o recorrente sido informado deste facto por mensagem de correio eletrónico de 24 de março de 2017.

    237    Assim, não se pode considerar que esta primeira queixa não foi instruída num prazo razoável.

    238    Em seguida, no que respeita à segunda queixa de 8 de março de 2017, decorre dos documentos apresentados pela Missão que, em 20 de março de 2017, o chefe de Missão solicitou ao COC a aplicação do artigo 10.° do Código de Conduta para que o adjunto do COC assumisse irrevogavelmente a instrução desta queixa, o que o COC aceitou, tendo o recorrente sido informado deste facto em 30 de março de 2017. Em 24 de abril de 2017, o adjunto do COC elaborou um relatório de inquérito preliminar e, por mensagem de correio eletrónico de 15 de maio de 2017, informou o chefe de Missão de que, em conformidade com o Código de Conduta, tinha sido decidido que esta queixa seria tratada como uma questão de gestão, sem recurso a um processo disciplinar formal.

    239    Em particular, nessa mensagem de correio eletrónico, o adjunto do COC recordou ao chefe de Missão a necessidade de todos os membros da Missão respeitarem as disposições aplicáveis em matéria de segurança e pediu‑lhe que velasse pelo cumprimento desta obrigação.

    240    O recorrente foi informado por telefone, em 29 de maio de 2017, do desfecho da segunda queixa de 8 de março de 2017, pelo que também não se pode considerar que o prazo de tratamento desta queixa, que durou pouco mais de dois meses, não foi razoável.

    241    Em segundo lugar, o recorrente fez uma primeira participação em 28 de março de 2017 para que o COC assegurasse a instrução das duas queixas de 8 de março de 2017.

    242    Ora, no que respeita à segunda queixa de 8 de março de 2017, resulta do n.° 238, supra, que a respetiva instrução estava a correr em 28 de março de 2017 e que foi efetivamente instruída pelo adjunto do COC em 15 de maio de 2017.

    243    Por conseguinte, o COC não tinha de interferir no tratamento desta queixa, tanto mais que não decorre do Código de Conduta que o COC disponha dessa prerrogativa relativamente às participações apresentadas ao chefe de Missão ou ao seu adjunto.

    244    Por último, no que respeita à primeira queixa de 8 de março de 2017 por assédio moral, também não decorre das disposições do Código de Conduta que o COC tenha a possibilidade de alterar a decisão do chefe de Missão ou do seu adjunto de arquivar uma queixa de um agente relativa a um eventual incumprimento das regras de segurança aplicáveis à Missão.

    245    Por conseguinte, a participação de 28 de março de 2017 destinada a submeter ao COC a primeira queixa de 8 de março de 2017 não podia dar início a um novo prazo de instrução.

    246    Em terceiro lugar, no que respeita à participação feita em 17 de julho de 2017 pelo recorrente junto do COC por assédio moral contra o chefe de Missão e o seu adjunto, há que recordar que o recorrente foi informado, em 20 de julho de 2017, de que o mediador viria na semana seguinte e que o mediador elaborou o seu relatório em 29 de julho de 2017.

    247    Em particular, nas suas conclusões o mediador recomendava que, nessa fase, não fosse instaurado um inquérito formal conforme previsto no Código de Conduta, tendo em conta a possibilidade prevista no artigo 11.°, alínea b), deste código, que permite à Missão tratar uma participação como uma questão de gestão sem recorrer a um processo disciplinar formal e, se necessário, submetê‑la a procedimentos de mediação.

    248    Nestas circunstâncias, há que considerar que a participação de 17 de julho de 2017 por assédio moral foi objeto de uma primeira instrução que terminou em 29 de julho de 2017 e que o prazo desta instrução não foi desrazoável.

    249    Por conseguinte, há que julgar improcedente a primeira parte do presente fundamento.

    –       Quanto à segunda parte, relativa à falta de notificação ao recorrente das conclusões e da recomendação que figuram no relatório de 29 de julho de 2017

    250    Nesta parte, o recorrente acusa a Missão de não lhe ter dado conhecimento das conclusões e da recomendação formuladas no relatório de 29 de julho de 2017.

    251    A este respeito, resulta da jurisprudência que, no âmbito de um processo de instrução de um pedido de assistência ou de uma queixa por assédio moral, a alegada vítima de assédio pode invocar o direito de ser ouvida ao abrigo do princípio da boa administração (v., neste sentido, Acórdão de 4 de junho de 2020, SEAE/De Loecker, C‑187/19 P, EU:C:2020:444, n.° 66 e jurisprudência referida).

    252    Em particular, o artigo 41.° da Carta dispõe, no seu n.° 2, que o direito a uma boa administração compreende, nomeadamente, o direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente e o direito de qualquer pessoa a ter acesso aos processos que se lhe refiram, no respeito pelos legítimos interesses da confidencialidade e do segredo profissional e comercial, bem como a obrigação, por parte da administração, de fundamentar as suas decisões.

    253    Mais especificamente, o direito de ser ouvido garante que qualquer pessoa tenha a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista no decurso do procedimento administrativo e antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses (v. Acórdão de 25 de junho de 2020, HF/Parlamento, C‑570/18 P, EU:C:2020:490, n.° 58 e jurisprudência referida).

    254    Assim, resulta da jurisprudência que, no âmbito de litígios em matéria de assédio que envolvam funcionários ou agentes da União, a pessoa que apresentou queixa por assédio tem direito, a fim de poder apresentar utilmente as suas observações à instituição em causa antes de a mesma tomar uma decisão, a que lhe seja comunicado pelo menos um resumo das declarações da pessoa acusada de assédio e das diferentes testemunhas ouvidas no decurso do procedimento de inquérito, sendo que a comunicação desse resumo deve ser efetuada, sendo caso disso, respeitando o princípio da confidencialidade (v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, HF/Parlamento, C‑570/18 P, EU:C:2020:490, n.° 60 e jurisprudência referida).

    255    Isto aplica‑se na medida em que essas declarações tenham sido utilizadas no relatório entregue à autoridade que tomou a decisão de não dar seguimento à queixa, o qual contém recomendações à luz das quais esta autoridade baseou a sua decisão (v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, HF/Parlamento, C‑570/18 P, EU:C:2020:490, n.° 60 e jurisprudência referida).

    256    A fim de garantir a confidencialidade dos depoimentos e os objetivos que a mesma protege, ao mesmo tempo que se assegura que o funcionário ou o agente que apresentou um pedido de assistência por assédio moral é utilmente ouvido antes de ser tomada uma decisão que lhe cause prejuízo, é possível recorrer a determinadas técnicas como o anonimato, ou a divulgação do essencial dos depoimentos sob a forma de um resumo, ou ainda a ocultação de certas partes do conteúdo desses depoimentos (v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, HF/Parlamento, C‑570/18 P, EU:C:2020:490, n.° 66 e jurisprudência referida).

    257    No caso em apreço, não é contestado que, embora o recorrente tenha sido efetivamente inquirido pelo mediador quando da sua visita ao local em 25 e 26 de julho de 2017, não teve conhecimento do conteúdo das declarações do chefe de Missão e do seu adjunto, nem do conteúdo das declarações das outras testemunhas inquiridas pelo mediador.

    258    Além disso, também não é contestado que o recorrente não teve conhecimento da recomendação que o mediador pretendia fazer ao COC.

    259    Ora, uma vez que o COC adotou a Decisão de 10 de abril de 2018 com base no relatório de 29 de julho de 2017 e atendendo à recomendação nele contida, devia ter assegurado o respeito do direito a ser ouvido do recorrente dando‑lhe a possibilidade de apresentar as suas observações sobre este relatório e de indicar eventuais informações complementares antes de adotar essa decisão. Com efeito, a audição do recorrente podia ter levado o COC a tirar uma conclusão diferente, isto é, a decisão de instaurar um inquérito administrativo (v., neste sentido, Acórdão de 4 de junho de 2020, SEAE/De Loecker, C‑187/19 P, EU:C:2020:444, n.° 73).

    260    Além disso, se o recorrente tivesse sido informado da recomendação do mediador que figura no relatório de 29 de julho de 2017, teria podido, após ter verificado que esta recomendação não tinha sido implementada, invocá‑la junto da Missão, nomeadamente, para impugnar a decisão pela qual foi recusada a instauração de um inquérito preliminar ou disciplinar, de que só teve conhecimento em 10 de abril de 2018.

    261    Por conseguinte, o recorrente tem fundamento para sustentar que a Missão violou o direito a uma boa administração ao não lhe comunicar as conclusões e a recomendação que figuram no relatório de 29 de julho de 2017, pelo menos, sob a forma de um resumo anonimizado, a fim de poder formular utilmente observações sobre o conteúdo deste documento, antes de o COC adotar a decisão sobre o seguimento a dar às referidas conclusões e à referida recomendação relativas às participações de 28 de março e de 17 de julho de 2017.

    262    É verdade que a Missão alega que o chefe de Missão não recebeu o relatório de 29 de julho de 2017, pelo que ficou impossibilitada de o notificar ao recorrente.

    263    Ora, mesmo sendo verdade, este facto não afeta a possibilidade de imputar as violações mencionadas no n.° 261, supra, à Missão, dado que resulta dos n.os 78 a 87, supra, que as decisões tomadas pelo COC a respeito do recorrente, em aplicação do Código de Conduta, são suscetíveis de fazer a Missão incorrer em responsabilidade.

    264    Nestas circunstâncias, a segunda parte do segundo fundamento deve ser julgada procedente.

    –       Quanto à terceira parte, relativa à não implementação da recomendação do mediador

    265    Nesta parte, o recorrente acusa a Missão de não ter implementado a recomendação do mediador de prever um período de apaziguamento, nomeadamente através da sua transferência para Bruxelas.

    266    A este respeito, resulta da análise do primeiro fundamento que o recorrente tem razão ao alegar que as infrações imputadas ao chefe de Missão e ao seu adjunto no âmbito das quatro partes que compõem este fundamento constituem indícios de assédio moral que justificam a instauração de um inquérito administrativo para determinar a sua procedência.

    267    Ora, resulta da jurisprudência referida no n.° 138, supra, que quando a autoridade empregadora é chamada a pronunciar‑se sobre um pedido de assistência, deve, por força do dever de assistência, se estiver perante um incidente incompatível com a ordem e a serenidade do serviço, não só responder com a rapidez e a diligência exigidas pelas circunstâncias do caso a fim de apurar os factos, mas também tomar as medidas adequadas sempre que o funcionário ou o agente que reclama a sua proteção apresente prova indiciária dos ataques de que afirma ser alvo.

    268    Este dever de assistência é uma expressão do dever de diligência que resulta do direito a uma boa administração e que impõe às instituições, aos órgãos e aos organismos da União que atuem com cuidado e prudência examinando todos os elementos relevantes do caso em apreço (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2022, SGL Carbon e o./Comissão, C‑65/21 P e C‑73/21 P a C‑75/21 P, EU:C:2022:470, n.os 30 e 31 e jurisprudência referida).

    269    No caso em apreço, uma vez que decorre da análise do primeiro fundamento que o recorrente apresentou prova indiciária do assédio moral de que alega ter sido vítima, incumbia à Missão, por um lado, instaurar, em conformidade com o Código de Conduta, um inquérito preliminar ou disciplinar para apurar este assédio e, por outro, proteger o recorrente, eventualmente, afetando‑o temporariamente a um posto que o retirasse da hierarquia direta do chefe de Missão e do seu adjunto, caso não existisse outra medida mais adequada para garantir esta proteção temporária.

    270    A este respeito, a Missão não pode sustentar que não podia, por razões práticas, transferir temporariamente o recorrente para Bruxelas, uma vez que decorre tanto do artigo 6.°, n.° 3, da Decisão 2012/392 como do seu organigrama que esta dispõe de um «Elemento de Apoio» situado nesta cidade.

    271    Nestas circunstâncias, a terceira parte do segundo fundamento deve igualmente ser julgada procedente.

    [OMISSIS]

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

    decide:

    1)      Os pedidos destinados à anulação da Decisão de 28 de abril de 2022 pela qual a EUCAP Sael Níger indeferiu o pedido de indemnização de Marco Montanari de 4 de fevereiro de 2022 são inadmissíveis.

    2)      A EUCAP Sael Níger é condenada a pagar a M. Montanari o montante de 6 000 euros.

    3)      A EUCAP Sael Níger é condenada nas despesas.

    4)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

    Truchot

    Kanninen

    Perišin

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de julho de 2024.

    Assinaturas


    *      Língua do processo: francês.


    1      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.

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