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Document 62010CJ0293

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 26 de Maio de 2011.
    Gebhard Stark contra D.A.S. Österreichische Allgemeine Rechtsschutzversicherung AG.
    Pedido de decisão prejudicial: Landesgericht Innsbruck - Áustria.
    Seguro de protecção jurídica - Directiva 87/344/CEE - Artigo 4.º, n.º 1 - Livre escolha do advogado pelo tomador do seguro - Limitação do reembolso efectuado a título das despesas com a representação do segurado em juízo - Reembolso limitado ao montante correspondente ao reclamado por um advogado estabelecido na área de jurisdição do órgão jurisdicional de primeira instância competente.
    Processo C-293/10.

    Colectânea de Jurisprudência 2011 I-04711

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:355

    Processo C-293/10

    Gebhard Stark

    contra

    D.A.S. Österreichische Allgemeine Rechtsschutzversicherung AG

    (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Landesgericht Innsbruck)

    «Seguro de protecção jurídica – Directiva 87/344/CEE – Artigo 4.°, n.° 1 – Livre escolha do advogado pelo tomador do seguro – Limitação do reembolso efectuado a título das despesas com a representação do segurado em juízo – Reembolso limitado ao montante correspondente ao reclamado por um advogado estabelecido na área de jurisdição do órgão jurisdicional de primeira instância competente»

    Sumário do acórdão

    Livre circulação de pessoas – Liberdade de estabelecimento – Seguro de protecção jurídica – Directiva 87/344 – Direito do tomador de seguro de escolher livremente o seu mandatário – Alcance

    (Directiva 87/344 do Conselho, artigo 4.°, n.° 1)

    O artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao seguro de protecção jurídica, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma disposição nacional nos termos da qual é possível ser acordado que o segurado em protecção jurídica apenas pode escolher, para representação dos seus interesses em processos administrativos ou judiciais, uma pessoa profissionalmente habilitada para o efeito que tenha o seu escritório no local da sede do órgão jurisdicional ou da Administração competente em primeira instância, desde que, para não esvaziar da sua substância a liberdade de escolha, pelo segurado, do mandatário para o patrocinar, esta limitação apenas diga respeito ao âmbito da cobertura, pelo segurador de protecção jurídica, das despesas relacionadas com a intervenção do mandatário e que a indemnização efectivamente paga por este segurador seja suficiente, o que compete ao órgão jurisdicional nacional verificar.

    (cf. n.° 36 e disp.)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

    26 de Maio de 2011 (*)

    «Seguro de protecção jurídica – Directiva 87/344/CEE – Artigo 4.°, n.° 1 – Livre escolha do advogado pelo tomador do seguro – Limitação do reembolso efectuado a título das despesas com a representação do segurado em juízo – Reembolso limitado ao montante correspondente ao reclamado por um advogado estabelecido na área de jurisdição do órgão jurisdicional de primeira instância competente»

    No processo C‑293/10,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Landesgericht Innsbruck (Áustria), por decisão de 22 de Abril de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 14 de Junho de 2010, no processo

    Gebhard Stark

    contra

    D.A.S. Österreichische Allgemeine Rechtsschutzversicherung AG,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

    composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, K. Schiemann, L. Bay Larsen, C. Toader (relatora) e A. Prechal, juízes,

    advogado‑geral: V. Trstenjak,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    –        em representação de G. Stark, por H. Kofler, Rechtsanwalt,

    –        em representação da D.A.S. Österreichische Allgemeine Rechtsschutzversicherung AG, por E. R. Karauscheck, Rechtsanwalt,

    –        em representação do Governo austríaco, por E. Riedl, na qualidade de agente,

    –        em representação da Comissão Europeia, por K.‑Ph. Wojcik e N. Yerrell, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344/CEE do Conselho, de 22 de Junho de 1987, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao seguro de protecção jurídica (JO L 185, p. 77).

    2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a companhia de seguros D.A.S. Österreichische Allgemeine Rechtsschutzversicherung AG (a seguir «D.A.S.») a G. Stark, a respeito, nomeadamente, da validade de uma cláusula incluída nas cláusulas gerais de seguro de protecção jurídica, que permite ao segurador limitar as suas prestações a título desta cobertura ao reembolso do montante normalmente reclamado por um advogado estabelecido no local da sede do órgão jurisdicional que conheça de um processo abrangido pelo âmbito de aplicação da referida cobertura.

     Quadro jurídico

     Regulamentação da União

    3        O décimo primeiro considerando da Directiva 87/344 refere:

    «Considerando que o interesse do segurado em protecção jurídica implica que este possa escolher ele próprio o seu advogado ou qualquer outra pessoa com as qualificações requeridas pela lei nacional, no âmbito de qualquer processo judicial ou administrativo e sempre que surja um conflito de interesses;».

    4        O artigo 1.° desta directiva dispõe:

    «A presente directiva tem por objectivo a coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas ao seguro de protecção jurídica […], de modo a facilitar o efectivo exercício da liberdade de estabelecimento e a evitar o mais possível qualquer conflito de interesses decorrente, nomeadamente, do facto de o segurador cobrir outro segurado ou cobrir o segurado simultaneamente com um seguro de protecção jurídica e um seguro de qualquer outro ramo […] e, no caso de surgir um conflito dessa natureza, a tornar possível a sua solução.»

    5        O artigo 2.°, n.° 1, da referida directiva está formulado da seguinte forma:

    «A presente directiva aplica‑se ao seguro de ‘protecção jurídica’. Consiste aquele na aceitação, mediante o pagamento de um prémio, do compromisso de assumir as custas judiciais e de fornecer outros serviços decorrentes da cobertura do seguro, tendo, nomeadamente, em vista:

    –        […] ressarcir o dano sofrido pelo segurado, de comum acordo ou através de um processo civil ou penal,

    –        […] defender ou representar o segurado num processo civil, penal, administrativo ou outro, ou contra uma reclamação de que ele seja objecto.»

    6        O artigo 4.°, n.° 1, da dita directiva dispõe:

    «Qualquer contrato de protecção jurídica deve reconhecer explicitamente que:

    a)      Sempre que se fizer apelo a um advogado, ou a qualquer outra pessoa com qualificações aceites pela legislação nacional, para defender, representar ou servir os interesses do segurado, em qualquer processo judicial ou administrativo, o segurado tem plena liberdade para o escolher;

    b)      Sempre que surgir um conflito de interesse[s], o segurado tem plena liberdade para escolher um advogado, ou, se o preferir e na medida em que a lei nacional o permita, qualquer outra pessoa com as qualificações necessárias para defender os seus interesses.»

     Regulamentação nacional

    7        Segundo o § 23, n.° 1, da Lei que fixa a tabela dos honorários dos advogados (Rechtsanwaltstarifgesetz, a seguir «RATG»), é aplicada uma tarifa unitária fixa para a remuneração de certas prestações acessórias dos advogados em litígios em matéria civil.

    8        Nos termos do § 23, n.° 5, da RATG, a parte da tarifa unitária que incide sobre estas prestações deve, contudo, ser aumentada para o dobro, se o advogado tiver prestado o seu serviço em local fora daquele onde tem o seu escritório.

    9        O legislador austríaco transpôs o artigo 4.° da Directiva 87/344 por meio do § 158k da Lei do contrato de seguro (Versicherungsvertragsgesetz, a seguir «VersVG»), que estabelece:

    «(1) O tomador do seguro pode escolher livremente uma pessoa profissionalmente apta a patrociná‑lo num processo judicial ou administrativo. Além disso, o tomador do seguro pode escolher livremente um advogado para a defesa dos seus demais interesses legais, quando exista um conflito de interesses com o segurador.

    (2) Pode ser estipulado no contrato de seguro que o tomador do seguro apenas pode escolher para o seu patrocínio num processo judicial ou administrativo pessoas habilitadas a exercer profissionalmente o patrocínio que tenham escritório no local onde estiver sediado o órgão jurisdicional ou administrativo competente para conhecer do processo em primeira instância. Caso nesse local não existam pelo menos quatro profissionais com escritório, o direito de escolha estende‑se aos profissionais de toda a área de jurisdição do Gerichtshof erster Instanz [Tribunal de Primeira Instância] na qual está estabelecida a autoridade referida.

    […]»

     Litígio no processo principal e questão prejudicial

    10      G. Stark e a D.A.S. estavam vinculados, desde 1997, por um contrato de seguro de protecção jurídica. O contrato incluía, nomeadamente, a protecção jurídica perante os tribunais de trabalho para os litígios do foro laboral, assim como, complementarmente, uma protecção jurídica para pessoas que exerçam a título acessório uma actividade independente.

    11      O contrato baseava‑se nas condições gerais aplicáveis ao seguro de protecção jurídica (Allgemeine Bedingungen für die Rechtsschutzversicherung) de 1997 (a seguir «ARB 97»). A cláusula 10 das ARB 97, que resulta directamente do § 158k da VersVG, tem a seguinte redacção:

    «1)      Para sua defesa em tribunais ou serviços administrativos, o tomador do seguro pode escolher livremente uma pessoa profissionalmente habilitada a exercer o patrocínio (advogado, notário, etc.). O segurador é obrigado a informar o tomador do seu direito de escolha, se o seguro for desencadeado para iniciar um processo judicial ou administrativo

    […].

    3)      O direito de escolha previsto no n.° 1 […] só pode recair em profissionais que tenham escritório no local em que estiverem sediados o tribunal ou o serviço administrativo competente para a instauração do processo em primeira instância. Se nesse local não existirem pelo menos quatro profissionais, o direito de escolha estende‑se aos profissionais com escritório na circunscrição do Landesgericht [Tribunal Regional] competente.

    […]»

    12      Resulta da decisão de reenvio que, num acórdão de 16 de Dezembro de 2009, o Oberster Gerichtshof (Supremo Tribunal) validou, em princípio, os fins prosseguidos pelo § 158k, n.° 2, da VersVG, ao decidir que o n.° 3 da referida cláusula 10 deveria ser interpretado no sentido de que o tomador do seguro pode também escolher um advogado «de fora da área de jurisdição», se este se comprometer a facturar despesas e honorários como se tratasse de um advogado estabelecido no local onde está sediado o órgão jurisdicional de primeira instância competente.

    13      G. Stark reside em Landeck (Áustria), a cerca de 600 quilómetros de distância de Viena. Em 24 de Março de 2006, propôs uma acção contra o seu anterior empregador, em co‑autoria com outras quatro pessoas, no Arbeits‑ und Sozialgericht Wien (Tribunal do Trabalho e da Segurança Social de Viena). G. Stark e os outros requerentes mandataram livremente para os representar perante este tribunal um advogado com escritório em Landeck.

    14      Por carta de 8 de Maio de 2006 dirigida a este advogado, a D.A.S. confirmou a cobertura das despesas da acção judicial no Arbeits‑ und Sozialgericht Wien, especificando, no entanto, que a cobertura seria limitada aos honorários normalmente cobrados por um advogado com escritório no local da sede deste tribunal.

    15      Por correio electrónico do mesmo dia, o advogado de G. Stark respondeu que não apresentaria a sua nota de despesas e honorários de acordo com a tabela aplicável a um advogado local com escritório na área de jurisdição do órgão jurisdicional, uma vez que as despesas resultantes do patrocínio em Viena seriam muito elevadas para o seu escritório.

    16      Na audiência de 4 de Julho de 2008 no Arbeits‑ und Sozialgericht Wien, as partes neste processo concluíram uma transacção judicial.

    17      A D.A.S. pagou ao advogado de G. Stark a quantia de 5 782,19 euros, o que corresponde, para os actos praticados no âmbito deste processo, às despesas e honorários de um advogado com escritório na área de jurisdição do Arbeits‑ und Sozialgericht Wien, calculados, não de acordo com a tarifa unitária dupla prevista no § 23, n.° 5, da RATG mas segundo a tarifa unitária simples prevista no § 23, n.° 1, da RATG. Esta quantia não cobria o montante total das despesas e honorários facturados a G. Stark pelo seu advogado.

    18      Por petição de 27 de Fevereiro de 2009, a D.A.S. propôs no Bezirksgericht Landeck (Tribunal do Cantão de Landeck) uma acção contra G. Stark, a fim de obter o pagamento de um prémio de seguro no montante de 211,46 euros, devido a título do contrato de seguro de protecção jurídica celebrado entre ambos.

    19      Contra este pedido, G. Stark deduziu um pedido reconvencional baseado num crédito de 3 000 euros correspondente ao saldo em dívida do custo dos serviços do advogado que o defendeu no processo no Arbeits‑ und Sozialgericht Wien, tendo em conta a aplicação da tarifa unitária dupla prevista no § 23, n.° 5, da RATG. No âmbito do contrato de seguro de protecção jurídica celebrado com a D.A.S., suscitou assim a questão da tomada em conta da diferença entre a tarifa unitária simples e a tarifa unitária dupla para o patrocínio exercido pelo seu advogado, correspondente a cinco audiências que se realizaram neste tribunal. Para fundamentar esta excepção, alegou que o § 158k, n.° 2, da VersVG e a cláusula 10, ponto 3, das ARB 97 são contrários ao direito da União.

    20      O Bezirksgericht Landeck julgou procedente o pedido apresentado pela D.A.S., absolvendo a autora do pedido reconvencional de G. Stark, e, assim, condenou‑o no pagamento do valor de 211,46 euros à D.A.S., acrescido de juros. Na sua decisão, o Bezirksgericht Landeck considerou que o direito da União não se opõe à aplicação do § 158k, n.° 2, do VersVG, pois tal disposição não limita o direito de livre escolha, mas apenas impõe uma limitação pecuniária ao advogado «de fora da comarca».

    21      G. Stark interpôs recurso desta decisão para o órgão jurisdicional de reenvio, invocando novamente que o artigo 4.° da Directiva 87/344 se opõe à aplicação do referido § 158k, n.° 2.

    22      Foi nestas condições que o Landesgericht Innsbruck decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «O artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344/CEE deve ser interpretado no sentido de que se opõe ao § 158k, n.° 2, da [VersVG] e à cláusula das condições gerais do contrato de seguro de protecção jurídica nele baseada, que permite se estipule num contrato de seguro que o tomador só pode escolher para seu patrocínio num processo judicial ou administrativo uma pessoa profissionalmente habilitada a exercê‑lo que tenha escritório no local em que estão sediados o tribunal ou o serviço administrativo em que deva ser instaurado o processo em primeira instância?»

     Quanto à questão prejudicial

    23      O Landesgericht Innsbruck coloca, em substância, a questão de saber se o artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344 se opõe a uma regulamentação nacional nos termos da qual é possível acordar que o segurado apenas possa escolher, para o representar em processos administrativos ou judiciais, uma pessoa com habilitação profissional para este efeito, que tenha o seu escritório no local da sede do órgão jurisdicional ou da instância administrativa competente para conhecer do processo em primeira instância.

     Quanto à admissibilidade

    24      Segundo o Governo austríaco, a questão coloca‑se a nível hipotético, visto que o desfecho do processo não depende da resposta a esta questão, já que não foi efectivamente limitado o direito do requerido à livre escolha de advogado.

    25      A este respeito, segundo jurisprudência assente, o Tribunal de Justiça só pode recusar­‑se a responder a uma questão prejudicial submetida à sua apreciação por um órgão jurisdicional nacional, quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe foram submetidas (v., designadamente, acórdão de 24 de Junho de 2008, Commune de Mesquer, C‑188/07, Colect., p. I‑4501, n.° 30).

    26      Ora, como foi exposto nos n.os 18 a 21 do presente acórdão, a solução do litígio no processo principal depende precisamente de saber se o facto de G. Stark não ter sido reembolsado da totalidade das despesas e honorários facturados pelo seu advogado, contrariamente ao que teria acontecido se tivesse escolhido um advogado com escritório em Viena, é compatível com o estabelecido no artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344.

    27      Para decidir o litígio principal, o órgão jurisdicional de reenvio necessita, no entanto, da interpretação desta disposição do direito da União. Consequentemente, a excepção de inadmissibilidade suscitada pelo Governo austríaco deve ser julgada improcedente.

     Quanto ao mérito

    28      É de sublinhar que resulta tanto do décimo primeiro considerando da Directiva 87/344 como do artigo 4.°, n.° 1, da mesma que o interesse do segurado em protecção jurídica implica que ele próprio possa livremente escolher o seu advogado ou qualquer outra pessoa com as qualificações requeridas pela lei nacional, no âmbito de qualquer processo judicial ou administrativo.

    29      A este respeito, o Tribunal de Justiça já se pronunciou no sentido de que esta disposição que prevê a livre escolha do representante tem alcance geral e valor obrigatório (v., neste sentido, acórdão de 10 de Setembro de 2009, Eschig, C‑199/08, Colect., p. I‑8295, n.° 47).

    30      Daqui resulta que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, conforme interpretada no acórdão do Oberster Gerichtshof de 16 de Dezembro de 2009, referido no n.° 12 do presente acórdão, não pode restringir esta liberdade de escolha apenas aos advogados que tenham escritório no local onde se situe o órgão jurisdicional ou a Administração competente para decidir o processo em primeira instância, ou apenas aos advogados que se comprometam a facturar as suas despesas e honorários como fariam os primeiros.

    31      Contudo, nos n.os 65 e 66 do acórdão Eschig, já referido, o Tribunal de Justiça observou que a referida directiva não visa uma harmonização completa das regras aplicáveis aos contratos de seguro de protecção jurídica, pelo que, no estado actual do direito da União, os Estados‑Membros permanecem livres de determinar o regime aplicável aos referidos contratos, desde que tal tenha lugar no respeito do direito da União, em especial, do artigo 4.° da Directiva 87/344.

    32      Assim, esta directiva não regula expressamente a questão, em causa no processo principal, do âmbito da cobertura das despesas relacionadas com o patrocínio. De facto, nem as disposições nem os considerandos da referida directiva permitem considerar que a determinação do montante que deve ser atribuído pelo segurador da protecção jurídica a título da cobertura das despesas efectuadas pelo mandatário para representar o segurado seja regulamentada pela mesma directiva.

    33      Assim sendo, a liberdade de escolha na acepção do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344 não implica a obrigação de os Estados‑Membros imporem aos seguradores, em qualquer circunstância, a cobertura, na íntegra, das despesas efectuadas no âmbito da defesa de um segurado, independentemente do local onde se encontra estabelecida a pessoa profissionalmente habilitada a exercer o patrocínio em relação à sede do órgão jurisdicional ou da Administração competente para conhecer de um litígio, desde que esta liberdade não seja esvaziada da sua substância. Isto seria o caso se a limitação introduzida na cobertura destas despesas tornasse de facto impossível uma escolha razoável de um mandatário pelo segurado. Em qualquer caso, cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais aos quais seja eventualmente submetido um pedido a este respeito verificar a inexistência de uma limitação desta natureza.

    34      Por outro lado, uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal não exclui a liberdade das partes contratantes de acordarem que o seguro de protecção jurídica cubra também o reembolso das despesas relacionadas com a intervenção de mandatários não estabelecidos no local da sede do órgão jurisdicional competente, eventualmente através do pagamento de um prémio mais elevado pelo segurado.

    35      No presente caso, G. Stark pôde escolher o seu advogado sem que o segurador a tal se opusesse. Para além disso, apenas teve de suportar as despesas relacionadas com a distância entre o escritório do seu advogado e o local da sede do tribunal competente, o que, sem prejuízo das verificações a efectuar a este respeito pelo órgão jurisdicional de reenvio, não se afigura, em regra, susceptível de limitar a liberdade de escolha do seu advogado.

    36      Tendo em conta o conjunto das considerações que antecedem, há que responder à questão colocada que o artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma disposição nacional nos termos da qual é possível ser acordado que o segurado em protecção jurídica apenas pode escolher, para representação dos seus interesses em processos administrativos ou judiciais, uma pessoa profissionalmente habilitada para o efeito, que tenha o seu escritório no local da sede do órgão jurisdicional ou da Administração competente em primeira instância, desde que, para não esvaziar da sua substância a liberdade de escolha, pelo segurado, do mandatário para o patrocinar, esta limitação apenas diga respeito ao âmbito da cobertura, pelo segurador de protecção jurídica, das despesas relacionadas com a intervenção do mandatário e que a indemnização efectivamente paga por este segurador seja suficiente, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

     Quanto às despesas

    37      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

    O artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 87/344/CEE do Conselho, de 22 de Junho de 1987, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao seguro de protecção jurídica, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma disposição nacional nos termos da qual é possível ser acordado que o segurado em protecção jurídica apenas pode escolher, para representação dos seus interesses em processos administrativos ou judiciais, uma pessoa profissionalmente habilitada para o efeito que tenha o seu escritório no local da sede do órgão jurisdicional ou da Administração competente em primeira instância, desde que, para não esvaziar da sua substância a liberdade de escolha, pelo segurado, do mandatário para o patrocinar, esta limitação apenas diga respeito ao âmbito da cobertura, pelo segurador de protecção jurídica, das despesas relacionadas com a intervenção do mandatário e que a indemnização efectivamente paga por este segurador seja suficiente, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

    Assinaturas


    * Língua do processo: alemão.

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